Modernização ao estilo chinês

Imagem: L JY/ Horizonte Noturno Colorido De Chongqing - China
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Por LU XINYU*

Embora o socialismo tenha se originado na Europa, a “modernização ao estilo chinês” representa sua implementação bem-sucedida na China, explorando formas de se libertar das amarras da globalização capitalista

Na ideologia ocidental, a China deixou de ser vista como um país socialista, embora alguns traços de seu legado revolucionário permaneçam. De acordo com esta visão, o objetivo de modernização da China substituiu aquele da revolução, o que, por sua vez, desempenhou um importante papel na estabilização do sistema capitalista global. Em outras palavras, a integração da China ao capitalismo mundial ajudou a consolidar o processo de globalização capitalista.

Consequentemente, modernização e revolução, assim como globalização e revolução, são apresentadas como dicotomias semelhantes àquelas entre democracia e autoritarismo, liberdade e autocracia, e Estado e sociedade. Essas dicotomias podem ser consideradas uma extensão da ideologia da Guerra Fria nas políticas da década de 1990, sutilmente incorporadas às teorias da “globalização” e da “modernidade”.

Atualmente, o mundo permanece aprisionado pelo pensamento dicotômico, que fundamenta a continuidade intelectual e ideológica da chamada “Nova Guerra Fria” e, em grande medida, também serve como fronteira entre o Norte e o Sul globais. Esse pensamento, no entanto, presta um desserviço à compreensão do caminho de desenvolvimento seguido pela China para a modernização socialista e a soberania nacional desde que a República Popular da China (RPC) foi formada em 1949.

Olhando em retrospectiva para o século XX, a fragilidade do modelo de agricultura da União Soviética foi uma das principais causas da crise estrutural experimentada pelo socialismo soviético. De modo contrário, o sistema do agronegócio desenvolvido nos Estados Unidos teve um papel essencial na vitória do país na Guerra Fria. Após a Segunda Guerra Mundial, os Estados Unidos alcançaram gradualmente a hegemonia mundial, e um dos meios utilizados para consolidá-la foi transformar os alimentos em armas geopolíticas. Sistematicamente, essa estratégia desmantelou as economias camponesas do Sul Global e agravou a polarização na economia mundial.

A partir de 1929, com o início da Grande Depressão nos Estados Unidos, houve uma acentuada queda nos preços globais dos alimentos. A União Soviética encontrava-se então em uma etapa crucial da industrialização, dependendo fortemente das exportações agrícolas, de tal forma que precisou pagar o dobro das quantidades planejadas de matérias-primas e produtos agrícolas para adquirir maquinaria.

Para piorar a situação, a produção agrícola como um todo também estava em declínio. O economista Ievguêni Preobrajenski argumentara no The New Economics (1926) que a industrialização viria ao custo de uma implacável fase de acumulação primitiva socialista (expropriação originária), o período mais desafiador para um país socialista em desenvolvimento, envolvendo a expropriação do campesinato.

Alguns, como Nikolai Bukharin, defendiam uma abordagem mais gradual. Ainda assim, como um país subdesenvolvido confrontado por inimigos poderosos no Ocidente, a União Soviética não tinha outra escolha — e nisso todos os analistas concordavam — a não ser expropriar os camponeses em alguma medida no processo de industrialização, levando a inevitáveis e violentos conflitos entre o campesinato e o Estado.

Em seu discurso de 1929, O Ano da Grande Virada[i], Josef Stalin explicou que nenhuma industrialização seria possível sem o desenvolvimento da indústria pesada. A história dos países industrialmente atrasados indicava que, sem empréstimos substanciais de longo prazo, eles não conseguiriam avançar em seu desenvolvimento: “É precisamente por esta razão que os capitalistas de todos os países nos recusam empréstimos e créditos, assumindo que não conseguiremos lidar com o problema da acumulação através de nossos próprios esforços; que haveremos de naufragar na tarefa de reconstruir nossa indústria pesada e seremos obrigados a procurá-los, de chapéu na mão, sujeitando-nos à escravidão”[1]. A solução foi desenvolver-se da mesma forma como o capitalismo se desenvolveu originalmente — por meio de uma espécie de “acumulação primitiva”, apropriando-se do excedente agrícola do campesinato. Mas no caso do capitalismo, tal “expropriação originária”, como Karl Marx a chamou, ocorrera durante um período de tempo mais longo, sendo facilitada por um sistema de pilhagem global via colonialismo.

A União Soviética adotou altas taxas de acumulação de capital, mantendo baixo o nível de consumo, e concentrou-se no desenvolvimento da indústria pesada em seu processo de industrialização. Como resultado, estabeleceu rapidamente um sistema industrial dominado pela indústria de defesa. Este país agrícola e dependente de capital estrangeiro transformou-se com sucesso em uma grande potência industrial[2]. Durante a Primeira Guerra Mundial, a Rússia czarista, com seu atraso industrial, foi derrotada por uma Alemanha prussiana industrializada. Durante a Segunda Guerra Mundial, a União Soviética conquistou uma vitória esmagadora contra o fascismo, embora ao custo de vinte milhões de vidas soviéticas. Essa vitória estava diretamente associada à estratégia do período pré-guerra de desenvolver as indústrias pesada e militar a todo custo.

No entanto, o desenvolvimento da indústria à custa da agricultura teve seu preço. Após suceder Stalin, Nikita Kruschev realizou uma série de reformas agrícolas, descentralizando o poder político e seus interesses econômicos. Mas justamente quando Kruschev estava implementando essas reformas, a União Soviética enfrentou outra escassez de grãos em 1963. A escassez foi tão severa que o país precisou restabelecer o cartão de racionamento que havia sido abolido após a guerra. Durante os dez anos de Kruschev no poder, os grãos recebidos pelos membros das fazendas coletivas diminuíam à medida que sua remuneração caía ano a ano. A renda agrícola era inferior ao custo dos insumos e ao aumento dos preços, enquanto a quantidade de grãos requisitada pelo Estado continuava aumentando. As condições agrícolas estavam se deteriorando. Em 1963, as fazendas coletivas recebiam menos da metade da remuneração em grãos em comparação ao que recebiam antes da guerra, levando ao fracasso da reforma agrária[3].

Quando Leonid Brejnev assumiu o poder, os problemas agrícolas da União Soviética tinham se agravado muito. Para lidar com a questão da escassez, Brejnev reformou intensamente o Novo Sistema Econômico, ampliando a autonomia das fazendas, elevando o preço de aquisição dos grãos e aprimorando o sistema de contratos coletivos. Além disso, o Estado também aumentou substancialmente os investimentos e os subsídios financeiros à agricultura. Contudo, o valor da produção agrícola da União Soviética caiu drasticamente, provocando uma grave reação em cadeia na economia nacional. O contínuo declínio na produção de grãos forçou a dependência de importações.

Em 1972, a União Soviética gastou 860 toneladas de suas reservas de ouro na importação de 28 milhões de toneladas de cereais do mercado mundial, sendo 18 milhões provenientes dos Estados Unidos. Isso ajudou os Estados Unidos a resolver sua prolongada crise de [realização do] excedente alimentar após a Segunda Guerra Mundial, dando um forte impulso à agricultura estadunidense e gerando uma série de contradições[4]. Em 1973, a União Soviética tornou-se, pela primeira vez, uma importadora líquida de grãos. Antes da industrialização em larga escala, a Rússia já era uma grande exportadora desse produto agrícola.

De 1981 a 1982, os mercados mundiais foram novamente surpreendidos pela massiva compra de trigo pela União Soviética. Os grãos tornaram-se o segundo maior item de importação no comércio exterior soviético (depois de máquinas e equipamentos), provocando restrições cambiais. A escassez de divisas estrangeiras não possibilitou o apoio necessário para o desenvolvimento de outros setores da economia, limitando assim a reestruturação da economia como um todo. Como as matérias-primas, tanto da indústria leve quanto da indústria alimentícia, provêm da agricultura, a crise agrícola impediu a expansão da produção industrial. A falta de oferta no mercado de bens manufaturados dificultava a melhoria das condições de vida da população. Como a demanda do consumidor não pôde ser satisfeita, houve um aumento da poupança. O descompasso entre as taxas de poupança e o faturamento do varejo prenunciava a subsequente inflação[5].

Sob a rigorosa política de contenção conduzida pelos Estados Unidos, somada às necessidades impostas pela corrida armamentista, o modelo econômico da União Soviética configurou-se de modo a priorizar as indústrias pesada e militar, em detrimento da agricultura e da indústria leve. As reformas econômicas, desde Kruschev até Mikhail Gorbachev, falharam em solucionar o problema da estagnação no desenvolvimento agrícola e reativar a economia. Consequentemente, os problemas do setor agrícola tiveram grande responsabilidade na estagnação econômica daqueles anos, contribuindo para a dissolução da União Soviética.

A China enfrentou muitos dos mesmos problemas que a União Soviética, mas seguiu um caminho diferente, refletindo toda a sua história. Uma dinâmica distinta entre a agricultura e a indústria tem sido determinante para a modernização ao estilo chinês.

Revisitando a aliança operário-camponesa e a modernização ao estilo chinês

Por trás das frequentes críticas de que a China seria um Estado autoritário, encontra-se uma questão fundamental: sociedades agrárias, sobrecarregadas pelas pressões do imperialismo e do colonialismo, poderiam alcançar a industrialização por meio de um caminho socialista? Essa questão, de fato, constituiu a luta ideológica e o debate teórico mais significativo nos primórdios da Internacional Comunista.

A forma de lidar com as questões rurais tornou-se um ponto central para determinar a trajetória de industrialização e modernização no Terceiro Mundo — com a reforma agrária emergindo como fator definitivo. Entre as reformas econômicas chinesas desde 1978, a reforma agrária se destaca como a mais complexa, provocando transformações profundas nas áreas urbanas e rurais. Atualmente, a reforma agrária segue em andamento e irá, por fim, moldar a trajetória futura da China.

Para os países de desenvolvimento tardio é essencial equilibrar cuidadosamente a relação entre industrialização e agricultura. Um dos aprendizados mais significativos das revoluções russa e chinesa consiste na importância de uma “aliança operário-camponesa” como base para um caminho socialista bem-sucedido. Essa compreensão advém de lições históricas duramente conquistadas, demonstrando que qualquer desvio da aliança operário-camponesa resultava em crises políticas e sociais.

A China, em particular, tem sido compelida continuamente a encontrar novas formas de navegar por esses desafios. Nas últimas décadas, sua estratégia de desenvolvimento tem oscilado entre abordagens mais à esquerda e mais à direita, sendo a “aliança operário-camponesa” o eixo central dessa oscilação.

A chamada “modernização ao estilo chinês” tem suas origens na década de 1950, sendo inicialmente formulada durante a primeira sessão da 1ª Assembleia Popular Nacional, em 1954, quando foi proposta uma modernização baseada na aliança operário-camponesa. Nessa sessão, ratificou-se a primeira constituição da China socialista, declarando a RPC como um Estado democrático popular liderado pela classe trabalhadora e baseado na aliança operário-camponesa. Simultaneamente, no Relatório de Trabalho do Governo, o primeiro-ministro Zhou Enlai indicava quatro áreas que deveriam ser priorizadas, visando a “modernização da indústria, da agricultura, do transporte e da defesa nacional”.

Nas décadas seguintes, a partir das bases lançadas nos anos de 1950 sob a liderança de Mao Zedong, a ideia de modernização ao estilo chinês se desenvolveria ainda mais. A primeira sessão da 3ª Assembleia Popular Nacional[ii], realizada no final de 1964, introduziu formalmente o objetivo das “Quatro Modernizações”, a fim de transformar a China em uma potência socialista com sua agricultura, indústria, defesa nacional e ciência e tecnologia modernizadas. Essa perspectiva foi reiterada no Relatório de Trabalho do Governo apresentado na quarta sessão da 4ª Assembleia Popular Nacional, em 1975, o qual introduziu também uma abordagem em duas fases: estabelecer um sistema econômico e industrial independente e relativamente abrangente até 1980, e alcançar as “Quatro Modernizações” até o final do século XX.

Em 1978, a terceira sessão plenária do 11° Comitê Central do Partido Comunista da China (PCCh) redirecionou seu foco para o enfrentamento dos desequilíbrios estruturais da economia. Nessa plenária crucial, tomou-se a decisão de iniciar a reforma rural implementando o Sistema de Responsabilidade Familiar, redistribuindo a terra para as famílias, introduzindo a independência contábil e a responsabilidade pelos lucros e perdas — marco inicial da reforma econômica na China. Acredita-se amplamente que isso tenha libertado a vitalidade da produção econômica nas áreas rurais, indicando que o processo de industrialização na China havia superado o modelo econômico dos tempos de guerra e já não dependia da expropriação agrícola. Na sequência, a China adotou uma estratégia de industrialização orientada à exportação que facilitou seu rápido crescimento econômico.

No centro dessas mudanças estava o Sistema de Responsabilidade Familiar, estabelecido durante as reformas econômicas da década de 1980. Esse sistema garantiu às famílias rurais o direito de contratar e operar a terra sem dissolver sua propriedade coletiva, enfatizando que a terra pertencia coletivamente à aldeia. Se alguém deixasse a aldeia ou abandonasse o coletivo, seu direito de operação da terra seria restituído ao coletivo e redistribuído entre os membros da aldeia com base nas mudanças demográficas. Dentro dessa estrutura, o coletivo da aldeia poderia determinar de forma autônoma a escala e o modo de cultivo da terra para alcançar a máxima eficiência.

A introdução do Sistema de Responsabilidade Familiar pode ser vista como uma forma de transformação envolvendo 700 milhões de habitantes rurais — o equivalente a 70% da população — que passaram da produção coletiva para a produção familiar. Isso aumentou rapidamente a produção de grãos e gerou benefícios para os setores rurais e urbanos.

Ainda assim, é importante observar que as reformas só foram possíveis, e de fato realizadas, em função das conquistas da modernização agrícola da era Mao. Por exemplo, após a visita do presidente dos Estados Unidos, Richard Nixon, à China em 1972, o país aproveitou a oportunidade para importar quatro tipos de fibras químicas e treze conjuntos de equipamentos para fabricação de fertilizantes. A adoção dos têxteis sintéticos, em vez dos tradicionais de algodão, permitiu que mais terras fossem destinadas ao cultivo de cereais. Simultaneamente, o uso generalizado de fertilizantes aumentou rapidamente a produção de grãos.

A transição para a “agricultura do petróleo” apoiou-se no grande progresso da indústria petrolífera durante a era Mao na década de 1960, incluindo o desenvolvimento do campo petrolífero de Daqing, que ajudou a garantir a autossuficiência e o excedente de petróleo. Além disso, variedades superiores de culturas — como o arroz híbrido de Yuan Longping, de 1975, inicialmente desenvolvido durante a era Mao — aumentaram significativamente a produtividade por hectare. Como resultado, a antiga tensão entre a limitação de terras cultiváveis e uma grande população na China foi consideravelmente atenuada, contribuindo para a superação dos desafios relacionados à alimentação e ao vestuário. Ademais, isso marcou um bem-sucedido afastamento da “acumulação primitiva socialista” de capital na China, deixando para trás a era da extração agrícola conhecida como “tesoura de preços” — posterior à crise econômica causada pelo crescente descompasso entre os preços industriais e agrícolas, e desencadeada pela Nova Política Econômica soviética na década de 1920.[6]

No entanto, é importante não subestimar as implicações prejudiciais dessas reformas. O Sistema de Responsabilidade Familiar e a industrialização orientada à exportação levaram ao desacoplamento da agricultura em relação ao desenvolvimento industrial. Além disso, a retirada do apoio estatal ao setor agrícola resultou na rápida divisão urbano-rural e no desequilíbrio do desenvolvimento regional leste-oeste. Enquanto as cidades costeiras prosperavam, a economia rural se deteriorava, levando à desintegração social. A modernização da agricultura chinesa passou por uma prolongada estagnação, e até mesmo retrocessos, causando uma crise na economia camponesa após um breve ressurgimento. Em 1984, apesar de colheitas abundantes, a China enfrentou dificuldades na venda dos grãos produzidos pelos agricultores familiares, marcando o declínio da autossuficiência alimentar, a desolação rural, o abandono das terras agrícolas e uma enorme onda de migração do campo para as cidades.

Após as reformas econômicas, a compreensão do PCCh sobre a relação entre indústria e agricultura foi submetida a mudanças contínuas, evidenciadas pelos ajustes nas políticas nacionais. O Comitê Central do PCCh emitiu uma série de Documentos Centrais nº 1 (中央一号文件; Zhōngyāng Yī Hào Wénjiàn) com foco na agricultura, nas áreas rurais e nos agricultores por cinco anos consecutivos, de 1982 a 1986. Durante esse período, à medida que o programa de contratação de terra por quinze anos era implementado, o antigo sistema estatal de compra e venda unificada (统购统销; tǒnggòu tǒngxiāo) de grãos e de outros produtos agrícolas importantes, em vigor há três décadas, foi abolido. Isso marcou o fim da prática da era Mao de extrair excedente agrícola para impulsionar a industrialização e promover uma estrutura econômica orientada à indústria pesada. Na época, o lema camponês era: “Entregar o suficiente ao país, reservar o suficiente para o coletivo, e o restante é todo nosso”.

Outra mudança crucial nesse período foi a adesão da China à Organização Mundial do Comércio (OMC) em 2001, o que envolveu concessões substanciais no comércio agrícola e teve consequências de longo alcance que ainda hoje são perceptíveis. A dinâmica comercial resultante acabou levando à falência generalizada dos pequenos agricultores, desencadeando crises sociais e ecológicas severas. A divisão urbano-rural exacerbou as disparidades regionais entre as províncias do leste e do oeste, além de trazer desafios ecológicos e ambientais. Ficou claro que as crises que a China estava enfrentando não poderiam ser efetivamente resolvidas apenas por meio de teorias ocidentais de desenvolvimento.

Precisamente por esse motivo, em 2003, sob a liderança de Hu Jintao, o PCCh introduziu o “Conceito Científico de Desenvolvimento” (科学发展观; Kēxué Fāzhǎn Guān), [no documento] intitulado “Decisão do Comitê Central do Partido Comunista da China sobre Várias Questões Importantes Relativas ao Aperfeiçoamento do Sistema de Economia de Mercado Socialista”. Esse conceito enfatiza as necessidades de “desenvolvimento urbano-rural coordenado; desenvolvimento regional coordenado; desenvolvimento econômico e social coordenado; desenvolvimento harmonioso e coordenado entre a humanidade e a natureza; e desenvolvimento doméstico e abertura ao exterior coordenados”. Além disso, em 2007, o PCCh oficialmente incorporou o “Conceito Científico de Desenvolvimento” à constituição do partido.

Em 2004, a formulação das “Três Questões Rurais” — referente à agricultura, às áreas rurais e aos agricultores — foi o foco do “Documento Político Central nº 1” da China, estabelecendo as principais tarefas para o país. De fato, por vinte anos consecutivos, o trabalho relacionado à agricultura e às áreas rurais tem sido a principal prioridade política da China. Cada Documento Central nº 1, publicado anualmente, abrange uma ampla gama de medidas, incluindo o aumento da renda dos agricultores, o fortalecimento da infraestrutura rural e a conservação hídrica, bem como o aumento sistemático do investimento total em áreas rurais, entre outras.

Em 2005, um importante marco foi alcançado quando o Comitê Permanente da Assembleia Popular Nacional aprovou o documento que aboliu a Regulamentação do Imposto Agrícola, aliviando os encargos econômicos dos agricultores e melhorando drasticamente o bem-estar social dos residentes rurais. O fim do imposto agrícola, que perdurava por milhares de anos, marcou um momento crucial na história da China, encerrando esse antigo fardo tributário que pesava sobre os 900 milhões de agricultores familiares do país[iii]. No entanto, esses esforços não reverteram completamente a crise. As áreas rurais, onde a taxa de autossuficiência alimentar continua a cair, estão frequentemente desoladas, com terras sendo abandonadas e o fluxo de trabalhadores migrantes aumentando, o que exige que a China identifique, entre diversas alternativas, o caminho de desenvolvimento mais adequado.

Em 2017, o 19º Congresso Nacional do PCCh reafirmou as tarefas de uma Nova Era (新时代; Xīn Shídài) iniciada em 2012, concentrando-se nas questões mais prementes do “desenvolvimento desequilibrado e insuficiente”[iv]. A Estratégia de Revitalização Rural e a Estratégia de Desenvolvimento Coordenado Regional foram elevadas ao status de estratégias nacionais. Os esforços em nível nacional para o “alívio direcionado da pobreza” nas áreas rurais resultaram na bem-sucedida erradicação da pobreza extrema no país em 2022. No entanto, esta conquista histórica foi apenas um ponto de partida para a próxima fase do desenvolvimento rural. Em 2022, o conceito de “modernização ao estilo chinês” — que pretende revitalizar as áreas rurais e reduzir as disparidades de desenvolvimento regional — foi introduzido pelo PCCh em meio a um cenário de crescente pressão internacional, com a presença simultânea de riscos e de oportunidades de desenvolvimento, além de um grau de imprevisibilidade cada vez maior. Esse caminho de modernização visa estabelecer um padrão de desenvolvimento de “dupla circulação”, liderado pelo ciclo econômico doméstico, com o ciclo econômico internacional desempenhando um papel complementar. Em maio de 2020, a dupla circulação foi anunciada pelo governo chinês como uma estratégia para estimular a demanda e a inovação domésticas, assim como promover uma maior independência em termos de tecnologia e recursos, ao mesmo tempo em que permanece aberta ao investimento estrangeiro e ao comércio internacional.

Se a China conseguirá ou não resolver as questões agrícolas que persistem desde a década de 1980 e reverter a deterioração da produção agrícola torna-se um fator decisivo para o objetivo estratégico de reduzir a divisão urbano-rural e alcançar a “prosperidade comum”. A maneira como a China enfrenta hoje a questão agrária desempenha um papel crucial para contrapor os esforços de contenção da Nova Guerra Fria iniciada pelos Estados Unidos e proteger a soberania nacional chinesa. Nesse sentido, a modernização ao estilo chinês se apresenta como um possível caminho de desenvolvimento alternativo ao modelo capitalista ocidental, especialmente importante para os países do Sul Global, que buscam libertar-se dos grilhões do colonialismo e do imperialismo.

A importância atribuída à circulação interna na China implica a necessidade de reconstruir a reciprocidade da relação entre a indústria e a agricultura, e estabelecer uma estrutura favorável de mobilidade entre as áreas rurais e urbanas. A aliança operário-camponesa enfrentou grandes desafios na década de 1990, quando a reforma das empresas estatais levou ao desemprego de milhões de trabalhadores, enquanto centenas de milhões de agricultores afluíam para as cidades em busca de emprego. Atualmente, para restaurar uma aliança operário-camponesa robusta, é essencial reconstruir as bases políticas, econômicas e culturais únicas das áreas rurais.

A revolução rural liderada por Mao conseguiu incorporar o PCCh entre a maioria camponesa por meio da abordagem de “linha de massas”. Isso integrou a sociedade rural, que estava em processo de desintegração, transformando o campo em uma fonte inesgotável de força revolucionária. A revolução rural de Mao cumpriu as tarefas históricas de resistir à agressão imperialista do exterior e consolidar internamente o poder nacional. Após 1949, a China socialista incorporou a aliança operário-camponesa à sua constituição e acelerou consideravelmente a industrialização por meio das novas relações urbano-rurais estabelecidas. Essas relações compeliram a absorção do excedente agrícola para sustentar a industrialização, ao mesmo tempo em que forneciam assistência à agricultura, aos agricultores e às áreas rurais mediante iniciativas estatais de cima para baixo. Por exemplo, o envio de serviços médicos para as áreas rurais e a mobilização de jovens instruídos para o campo visavam reduzir as “três grandes disparidades” na China socialista — a disparidade entre trabalho manual e mental, entre indústria e agricultura e entre operários e camponeses.

No entanto, as reformas econômicas posteriores à década de 1980 ampliaram dramaticamente essas disparidades. Os recursos rapidamente se concentraram nas áreas urbanas, intensificando a divisão urbano-rural e ameaçando a viabilidade da aliança operário-camponesa, que corria o risco de se tornar mera retórica. Na década de 1980, a sociedade rural desintegrou-se gradualmente, e a incapacidade do Estado em alcançar as áreas rurais reapareceu. Durante a era Mao, apesar da existência da “tesoura de preços” e da disparidade irracional entre produtos industriais e agrícolas, os vínculos emocionais e materiais entre as áreas urbanas e rurais persistiam. Sun Liping denominou a isso de “estrutura dual sob liderança administrativa”, referindo-se à era Mao[7]. Atualmente, surgiu uma ruptura entre as áreas urbanas e rurais em decorrência da economia de mercado, referida por Sun como uma “estrutura dual liderada pelo mercado”. Em sua visão, sob as relações de mercado, o vínculo entre as áreas urbanas e rurais chinesas, assim como entre a agricultura e a indústria, foi rompido — e essa tendência provavelmente será irreversível. Embora a “estrutura dual sob liderança administrativa” da era Mao visasse eliminar as três disparidades, esse objetivo foi abandonado no contexto da “estrutura dual liderada pelo mercado”.

Para lidar com problemas rurais críticos, é imperativo remodelar a relação de aliança e reciprocidade urbano-rural no processo de urbanização. Desde a década de 1980, a acelerada urbanização na China tem se baseado na propriedade pública da terra urbana e na propriedade coletiva da terra rural. Primeiro, foi a capitalização das terras públicas pelos governos locais que impulsionou significativamente a urbanização, servindo como fonte de financiamento primário para a construção pública nas áreas urbanas. Segundo, o Sistema de Responsabilidade Familiar não aboliu a propriedade coletiva das terras rurais. A distribuição de terras nas aldeias ainda é ajustada com base na igualdade per capita, o que tem proporcionado uma rede de segurança social para os residentes rurais. Os trabalhadores migrantes que perdem o emprego nas cidades ainda podem retornar ao campo e recorrer à sua terra para a subsistência, evitando assim os problemas da favelização generalizada comumente observados no processo de urbanização de outros países em desenvolvimento. Se a privatização da terra fosse implementada, as terras rurais logo cairiam sob o controle do capital externo às aldeias, deixando os trabalhadores migrantes sem ter para onde voltar, levando a uma rápida desintegração da sociedade rural. Assim, para o bom funcionamento da economia de mercado na China, a propriedade coletiva da terra precisa ser mantida, não abolida.

A propriedade coletiva das terras rurais requer uma reavaliação em função de sua contribuição para o desenvolvimento orientado ao mercado. Nesse sistema, as áreas rurais servem como uma vasta reserva de mão de obra para o processo de urbanização, com o trabalho fluindo entre as áreas urbanas e rurais conforme a necessidade. Além disso, a economia dos pequenos agricultores sustenta o maior grupo populacional — os próprios agricultores —, o que permite que a China não dependa do mercado global de alimentos para alimentar seus 1,4 bilhão de habitantes. Na “economia de mercado socialista” chinesa, a propriedade coletiva da terra rural continua sendo um elemento “socialista” fundamental. O desafio atual consiste em saber se a retenção desse elemento pode proporcionar as condições de modernização agrícola da China, para além da economia de mercado capitalista mundial.

Questões rurais e urbanas estão interconectadas. As grandes cidades chinesas, como Shanghai e Beijing, possuem populações residentes acima de vinte milhões, superando a população total de muitos países europeus. Em 2017, Beijing registrou episódios controversos de despejo envolvendo “pessoas de nível inferior” (低端人口; dīduān rénkǒu), um termo altamente discriminatório que desencadeou muitas críticas. Após um incêndio em uma área de baixa renda, o governo municipal de Beijing conduziu uma operação especial para eliminar riscos à segurança, e muitos trabalhadores migrantes de baixa renda foram expulsos da cidade. Resolver questões de segurança em áreas com grande população de migrantes não é algo que se possa alcançar apenas com microgerenciamento. É necessária a coordenação das relações urbano-rural em nível macro; caso contrário, os problemas urbanos continuarão a emergir de diferentes formas e serão difíceis de resolver. A distintividade do caminho socialista chinês, comparado a outros países do Sul Global, está na propriedade coletiva da terra e na estratégia de revitalização rural construída a partir dela.

Os partidários do neoliberalismo na China estão ansiosos para promover a privatização das terras rurais, por duas razões principais: primeiro, a privatização facilita a rápida expansão urbana e a capitalização da terra em larga escala; segundo, ela abre caminho para a agricultura capitalista. A agricultura capitalista nos moldes estadunidenses é o desejado (mas ainda não realizado) objetivo dos neoliberais chineses, que pressupõem a concentração das terras rurais nas mãos de alguns poucos grandes proprietários por meio da privatização, transformando os residentes rurais em trabalhadores agrícolas ou migrantes nos centros urbanos. No entanto, tais concepções neoliberais acabariam por prejudicar a agricultura e as áreas rurais na China.

A Rodada de Desenvolvimento de Doha[v] demonstrou a relutância dos países desenvolvidos em abandonar as políticas protecionistas sobre sua agricultura, o que inclui altos subsídios, diversas barreiras não tarifárias e limites de acesso aos mercados. Mesmo que a China privatizasse suas terras, sua agricultura ainda enfrentaria dificuldades e acabaria indo à falência na tentativa de competir com as nações capitalistas desenvolvidas. A única motivação para a compra de terras rurais pelo capital chinês é a expectativa de valorização decorrente da expansão urbana, e não a produção agrícola. Assim, em um país em desenvolvimento como a China, a privatização da terra não beneficiaria a modernização agrícola.

As medidas tomadas desde o 18º Congresso Nacional do PCCh, quando Xi Jinping assumiu a liderança, incluíram tentativas de restabelecer a abordagem de “linha de massas” e fortalecer a aliança operário-camponesa. Isso fica evidente no programa de Alívio Direcionado da Pobreza (精准扶贫; Jīngzhǔn Fúpín), que enviou três milhões de quadros do PCCh para viver e trabalhar no campo, além de mobilizar milhares de empresas privadas e estatais, estudantes e professores, profissionais da saúde e outros setores da sociedade para garantir que os quase 100 milhões de pessoas restantes saíssem da pobreza extrema.

No enfrentamento ao problema da dicotomia urbano-rural, a China se esforçou para eliminar as três grandes disparidades que remontam à era Mao. Na contemporaneidade, a China lida com esse desafio por meio da concepção de “Desenvolvimento Urbano-Rural Integrado” (城乡融合发展; Chéngxiāng Rónghé Fāzhǎn), buscando soluções que impeçam que a urbanização agrave ainda mais a lacuna urbano-rural e, em invés disso, promovam sua convergência. O estabelecimento de um novo tipo de relação urbano-rural constitui a base para a busca dessas soluções, com a reorganização das áreas rurais cumprindo um papel central nesse processo.

A principal preocupação da economia rural coletiva contemporânea é cultivar uma vitalidade endógena em seu interior. Os programas de Alívio Direcionado da Pobreza e de Revitalização Rural do PCCh representam duas abordagens estratégicas distintas nesse sentido. O primeiro consiste em injetar recursos nas áreas rurais, como uma transfusão de sangue, permitindo que os residentes rurais superem a pobreza. Já a Revitalização Rural busca fomentar o crescimento econômico endógeno nas áreas rurais, tornando-as autossustentáveis ou, em outras palavras, capazes de gerar seu próprio “sangue”.

Segurança alimentar, relações urbano-rurais e socialismo com características chinesas

Na China, a economia orientada à exportação levou, por um lado, à superprodução industrial e, por outro, à produção agrícola insuficiente. Em 2006, o país introduziu o conceito de “Linha Vermelha de Preservação de 1,8 bilhão de mu de Terras Cultiváveis”, indicando a implementação de um rigoroso sistema de proteção que assegura que a área total de terras aráveis no país permaneça acima de 1,8 bilhão de mu (120 milhões de hectares). Atualmente, a China ainda enfrenta essa dificuldade histórica, tendo menos de 10% das terras aráveis do planeta e 1/5 da população mundial para alimentar. Se essa “linha vermelha” deve ou não ser mantida é uma questão controversa, com muitos liberais chineses argumentando que as terras aráveis deveriam ser disponibilizadas para o setor imobiliário e para a urbanização em razão do crescimento da população urbana. Eles acreditam que a medida da linha vermelha prejudica a industrialização, a urbanização e o crescimento econômico. Influenciada por esse pensamento, a China reduziu suas terras aráveis em mais de 10 milhões de hectares durante o processo de urbanização[8]. Visões contrárias ressaltam que o volume anual do comércio global de grãos é superior a 400 milhões de toneladas, enquanto a demanda anual de grãos na China ultrapassa 600 milhões de toneladas — o que indica que o país não pode depender apenas do mercado global de grãos para suprir suas necessidades alimentares. A razão pela qual a China tem sido capaz de manter o preço dos alimentos baixo, apesar da alta demanda, deve-se à autossuficiência dos pequenos agricultores e à existência de instituições não orientadas ao mercado (nonmarket institutions) como o sistema de reserva de grãos, que exige das províncias a manutenção de um estoque mínimo decommodities estratégicas,e o Sistema de Responsabilidade do Governador Provincial para a Segurança Alimentar, criado em 2015 para avaliar com precisão o trabalho de cada província nessa área.

Em muitos países do Norte e do Sul Global, o abastecimento de grãos depende do mercado capitalista mundial, o que implica ceder o poder de precificação global dos grãos à Wall Street. Após a entrada da China na OMC, em 2001, o país tornou-se, na prática, um local de descarte para os produtos agrícolas geneticamente modificados dos Estados Unidos. Um exemplo emblemático é a transformação do mercado de soja na China. Antes de aderir à OMC, a China era uma exportadora líquida de soja. No entanto, em 2004, o país enfrentou uma grave escassez desse grão, com o fechamento de muitas indústrias de esmagamento que produziam farelo e óleo de soja, dando um duro golpe na indústria doméstica. Gigantes do agronegócio transnacional, como ADM, Bunge, Cargill e Louis Dreyfus, passaram a exportar soja geneticamente modificada para a China, desmantelando a cadeia de suprimentos doméstica. O influxo de capital estrangeiro fez com que a China perdesse o controle sobre os preços da soja, tornando-a altamente dependente do mercado mundial para o abastecimento interno e transformando a soja no componente mais vulnerável da segurança alimentar chinesa. Ao longo da última década, a taxa de autossuficiência da China em relação à soja manteve-se em torno de 15%, com as importações representando mais de 60% das exportações globais de soja.

A situação da China em relação à soja não é, de fato, um caso isolado. Desde a década de 1990, após o colapso da União Soviética, os países em desenvolvimento começaram a abrir progressivamente seus mercados agrícolas, submetidos a diversas medidas coercitivas impostas pelos Estados Unidos. Isso levou à falência generalizada e à fome entre as populações camponesas nesses países. Enquanto isso, nas nações desenvolvidas, as megafazendas capitalistas voltadas ao mercado externo têm exportado alimentos em larga escala e colhido lucros substanciais. A reorientação capitalista da agricultura no mundo em desenvolvimento tem minado o bem-estar das populações locais.

Desde o início da guerra comercial sino-estadunidense em 2019, o Brasil substituiu os Estados Unidos como principal fornecedor de soja para a China, beneficiando o grande agronegócio à custa dos produtores camponeses. O comércio agrícola da China com países do Sul Global como o Brasil, gerou críticas da esquerda, incluindo as de João Pedro Stédile, dirigente nacional do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), que expressou perplexidade e insatisfação com o intenso comércio de soja entre a China e o Brasil. Segundo Stédile, os produtores de soja no Brasil são essencialmente grandes proprietários de terras que, não raro, residem em Miami. Esses grandes proprietários monopolizam a terra, o financiamento público e a assistência técnica para a produção agroexportadora. Enquanto essas fazendas capitalistas e o agronegócio no Brasil lucram enormemente no comércio com a China, não conseguem beneficiar o povo brasileiro. Na busca por lucros, grandes extensões de terras aráveis para o cultivo de alimentos, incluindo terras de povos indígenas, são convertidas para o cultivo de soja, empurrando o povo brasileiro para a fome em razão da monocultura, e gerando a necessidade paradoxal de importar alimentos apesar da abundância de terras produtivas. De fato, durante os anos de presidência de Jair Bolsonaro, respaldado pelos interesses do agronegócio, trinta milhões de brasileiros voltaram a passar fome em um dos maiores produtores agrícolas do mundo. Essas questões derivam de um sistema de posse de terra injusto, que exclui do sistema agrícola modernizado a maioria dos pequenos agricultores e dos agricultores sem terra nos países em desenvolvimento. Consequentemente, favelas urbanas de grande porte e a recorrência de movimentos de resistência camponesa têm surgido nesses países, como o MST e os protestos de agricultores na Índia, em 2020.

A partir da virada do século, o agronegócio global intensificou seu controle sobre a cadeia de suprimentos mundial de alimentos, detendo 80% do volume comercializado de grãos. Essas corporações exercem influência sobre os mercados de grãos dos grandes países produtores, como os Estados Unidos, o Brasil e a Argentina, além de dominarem a infraestrutura de transporte e armazenamento de grãos em nível global. Elas também expandiram seu alcance sobre diversos segmentos do mercado de alimentos da China, representando uma ameaça à soberania e à segurança alimentar do país.

Desde 2012, a China tem trabalhado ativamente para resolver a questão do controle das corporações multinacionais sobre o fornecimento de sementes. Xi Jinping elevou a segurança das sementes à condição de prioridade estratégica, intimamente ligada à segurança nacional. Além disso, Xi enfatizou particularmente a soja, expressando o desejo de acelerar projetos adicionais de pesquisa em biotecnologia voltados ao melhoramento genético dessa semente[9]. Esse esforço visa estabelecer na China a capacidade de pesquisa independente e o controle sobre as sementes de soja, um produto agrícola crucial, evitando, assim, que outras nações manipulem o abastecimento chinês.

A modernização ao estilo chinês só pode ser alcançada através da resolução abrangente das questões relacionadas à agricultura, às áreas rurais e aos agricultores. A atual liderança chinesa parece ter reconhecido isso. Em 2022, foi publicada a coletânea de textos de Xi, intitulada “On ‘Three Rural’ Work” (Sobre as Três Questões Rurais[vi]). Essa coleção inclui 61 artigos e discursos de sua autoria, desde o 18º Congresso Nacional. Alguns textos retratam explicitamente o período atual como um “momento histórico para abordar a relação entre a indústria e a agricultura, bem como a relação entre as áreas urbanas e rurais”. O discurso “Implementando de Forma Eficaz a Estratégia de Revitalização Rural”, de 2018, fornece uma discussão abrangente sobre essas questões. Abaixo, alguns excertos do texto:

“Durante o processo de modernização, a forma de lidar com a relação entre indústria e agricultura, bem como a relação entre áreas urbanas e rurais, determina, em certa medida, o sucesso ou o fracasso da modernização. Como um país socialista, liderado pelo Partido Comunista da China, nossa nação deve possuir a capacidade e as condições de gerir a relação entre indústria e agricultura, bem como a relação entre áreas urbanas e rurais, a fim de avançar, de forma harmoniosa, no processo de modernização socialista em nosso país

Desde o 18º Congresso Nacional do PCCh, temos nos dedicado a ajustar a relação entre indústria e agricultura, bem como a relação entre áreas urbanas e rurais. Adotamos uma série de medidas para promover o princípio de ‘a indústria apoia a agricultura e as cidades apoiam o campo’. O 19º Congresso Nacional do Partido introduziu a implementação da estratégia de revitalização rural precisamente para compreender e lidar de forma abrangente com a relação entre indústria e agricultura, bem como a relação entre áreas urbanas e rurais, a partir de uma perspectiva global e estratégica.

A coexistência de cidades prósperas lado a lado com áreas rurais em dificuldades contradiz o propósito governamental de nosso Partido, não estando de acordo com os requisitos essenciais do socialismo. Tal forma de modernização está destinada ao fracasso. Há 40 anos, embarcamos no caminho da reforma e abertura por meio das reformas rurais. Atualmente, depois de quatro décadas, devemos revitalizar o campo, iniciando uma nova fase de desenvolvimento urbano-rural integrado e de modernização”[10].

Remodelar a relação entre as áreas urbanas e rurais, bem como a relação entre a indústria e a agricultura, exige uma profunda reflexão sobre os padrões de desenvolvimento desde a década de 1980 e a implementação de ajustes nesse sentido. Isso representa um novo desafio para a China socialista.

A propriedade coletiva da terra na China rural difere dos sistemas de posse de terra em países socialistas como a União Soviética, o que pode ter desempenhado um papel determinante para o sucesso da modernização ao estilo chinês. A nacionalização de terras urbanas e a coletivização de terras rurais constituem a base da aliança operário-camponesa chinesa. Do ponto de vista marxista, a dicotomia urbano-rural é considerada uma consequência inevitável do desenvolvimento capitalista e um desafio comumente enfrentado pelos países do Sul Global durante seus processos de desenvolvimento.

A propriedade coletiva da terra na China, por meio do Sistema de Responsabilidade Familiar, consiste essencialmente na propriedade comunal da terra rural. No entanto, o atual sistema de propriedade coletiva da terra pode vir a ser enfraquecido pelo endurecimento dos direitos de contrato e gestão da terra. Esses direitos permitem que os membros da comunidade utilizem e lucrem com a terra por meio de contratos, embora limitem seu uso à produção agrícola. Os membros da comunidade podem transferir os direitos de gestão, possibilitando operações agrícolas em larga escala e resolvendo a questão das terras ociosas. Contudo, surge um possível problema: o coletivo da aldeia deixa de ter prioridade no manejo da terra, levando à incapacidade do capital interno de gerir efetivamente o investimento e o controle sobre ela. Nesse cenário, a propriedade coletiva existiria apenas no papel.

O atual sistema fundiário chinês está passando por transformações significativas, sendo de fundamental importância saber se a propriedade coletiva da terra nas áreas rurais pode ser sustentada e se é necessário manter esse modelo. Caso a propriedade coletiva da terra se torne de difícil manutenção, pode surgir um número considerável de proprietários ausentes. Isso implica a necessidade de estabelecer uma entidade rural completamente nova, que não apenas cumpra um papel politicamente vital, mas também assuma uma função econômica crucial para conter a expansão predatória do capital externo sobre as áreas rurais.

Há um consenso predominante de que a economia familiar [rural] precisa passar por um processo de reorganização. Nesse sentido, o debate gira em torno da metodologia para essa reestruturação. Em primeiro lugar, existe a solução neoliberal, que defende a transferência de terra para as principais empresas ou para o capital urbano, visando operações agrícolas em larga escala e orientadas ao mercado como forma de alcançar a modernização agrícola. Embora essa perspectiva desfrute um maior destaque entre os economistas do mainstream, ela também enfrenta críticas. Uma vez que os direitos operacionais sobre a terra sejam transferidos, recuperá-los torna-se extremamente difícil. Em último caso, os membros da aldeia podem acabar descobrindo que se tornaram indivíduos sem terra da noite para o dia, perdendo tanto suas terras quanto seus empregos. A escala potencial desse problema pode representar desafios políticos significativos à legitimidade e à estabilidade do governo do PCCh, constituindo uma das consequências politicamente sensíveis para as quais o sistema socialista chinês pode se descobrir mal preparado.

Em segundo lugar, existe a solução socialista, que envolve um retorno ao modelo de propriedade coletiva como solução abrangente para uma série de questões. Nessa abordagem, as organizações partidárias de base assumirão uma posição de liderança, e a propriedade coletiva da terra servirá como pedra angular da reorganização rural. O coletivo da aldeia irá atuar como entidade responsável por implementar a economia de escala, substituindo os agricultores individuais nessa função. Os direitos operacionais estarão circunscritos à aldeia e serão alocados por meio de processos licitatórios conduzidos pelo próprio coletivo. Essa abordagem não exclui a economia de mercado, mas sim designa o coletivo da aldeia como seu principal participante. Ao reforçar as capacidades de negociação do coletivo da aldeia, esse modelo busca lidar com os desafios agrícolas e unir pequenas famílias rurais para confrontar coletivamente os obstáculos do mercado. O objetivo final é alcançar uma integração orgânica entre a eficiência econômica e a equidade social, oferecendo, assim, um caminho socialista promissor para o desenvolvimento da China rural. Nesse processo de criação de uma nova sinergia entre as organizações partidárias de base e o desenvolvimento rural na China, é essencial combinar o apoio institucional de cima para baixo e as práticas sociais de baixo para cima, a fim de fornecer soluções eficazes. Essa abordagem depende das organizações de base do PCCh para facilitar a reorganização das áreas rurais. O sistema socialista chinês fornece às áreas rurais recursos organizacionais que ultrapassam o escopo típico da economia de mercado — os residentes rurais são liberados dos custos organizacionais relacionados e as organizações de base do PCCh podem auxiliá-los na harmonização entre os desenvolvimentos endógeno e exógeno.

Tais transformações podem atrair críticas e serem vistas como regressão a uma “linha ultraesquerdista” por exigirem uma liderança partidária forte e eficaz do PCCh. De fato, minha concepção de uma “China rural neocoletivista”, como modelo de desenvolvimento coletivo emergente, continua a evoluir através de diversas práticas sociais em várias regiões da China. Cada caso está profundamente enraizado nos contextos político, econômico e cultural locais, trazendo percepções únicas e valiosas. Esses exemplos práticos acumularam experiências significativas que merecem documentação sistemática e ampla disseminação. O que unifica esses diversos casos é a sua habilidade de aproveitar os pontos fortes da economia coletiva para atrair a participação voluntária dos residentes rurais, redescobrindo, assim, caminhos para o desenvolvimento de uma economia de mercado socialista na qual os habitantes rurais utilizam seu poder coletivo de forma eficaz para fazer frente aos riscos do mercado, fortalecendo sua competitividade. Simultaneamente, eles ajudam a combater a fragmentação social rural e mitigar a potencial deterioração das relações urbano-rurais. Por meio desses esforços, o nobre objetivo de alcançar a prosperidade comum pode genuinamente concretizar-se. Na verdade, há diferentes experimentos em andamento por todo o país, a fim de encontrar abordagens de desenvolvimento adequadas para a China rural socialista.

Como a urbanização pode ser um motor do desenvolvimento integrado entre as áreas urbanas e rurais, ao invés de exacerbar as disparidades entre elas? Como uma relação urbano-rural mutuamente benéfica pode ser cultivada? Atualmente, a China promove de forma ativa um padrão de desenvolvimento de dupla circulação, tomando o mercado interno como seu principal ponto de apoio, enquanto permite que os mercados externo e interno se reforcem reciprocamente. Que novas dinâmicas urbano-rurais este modelo de desenvolvimento inovador trará? Como intelectuais, devemos ser pacientes e esperar as respostas para estas questões, ou nos engajar diretamente nos esforços práticos para respondê-las.

Conclusão – um olhar do Sul global

Os desafios, imprevistos e infortúnios vivenciados ao longo da jornada de modernização ao estilo chinês são, na verdade, um microcosmo das várias crises enfrentadas no processo de modernização do Sul Global. A ascensão da China serve como um caso emblemático do despontar do Sul Global, rompendo com uma ordem mundial desigual há muito tempo selada e imposta. A trajetória chinesa de desenvolvimento está intrinsecamente entrelaçada com a história das revoluções russa e chinesa, com o leninismo e com o destino da União Soviética no século XX. Trata-se de um fato histórico essencial. O desafio consiste em como interpretá-lo. Nesse sentido, é de vital importância enfrentar as críticas — especialmente aquelas advindas do marxismo ocidental sobre o “populismo” na Revolução Chinesa. Ao mesmo tempo, é preciso responder às críticas e às rejeições contra as revoluções russa e chinesa provenientes do liberalismo de direita. Essas críticas e rejeições, ecoando a narrativa do “fim da história” no pós-Guerra Fria, tentam abrir caminho para uma nova Guerra Fria, desafiando a legitimidade do leninismo e das revoluções russa e chinesa. O marxismo ocidental e o liberalismo de direita, embora representem visões políticas fundamentalmente opostas, encontram um terreno comum ao discutirem as questões agrárias dessas revoluções. Ambos ressuscitam clichês sobre o “despotismo oriental” e o “modo de produção asiático”, esforçando-se conjuntamente para obscurecer o significado da modernização ao estilo chinês, isto é, a busca exploratória por um caminho socialista na história mundial.

Esse desenvolvimento representa as aspirações do Sul Global de se libertar da hegemonia mundial do Ocidente, ecoando as expectativas que Samir Amin tinha para a China em seus últimos anos. Amin via um caminho de “desconexão” — independente e orientado ao socialismo — como a esperança para o desenvolvimento do Sul Global. Ele defendia a formação de uma nova frente unida para lidar com e resistir ao crescente agravamento da crise sistêmica do capitalismo, e acreditava que uma China unida e poderosa deveria assumir um papel de liderança no enfrentamento dessa crise, o que seria decisivo para o desenvolvimento mundial. Em uma entrevista de 2015, em Beijing, Amin voltou a expor o conceito de “desconexão”:

“Na minha visão, a ‘desconexão’ deve ser considerada um princípio estratégico abrangendo diversos aspectos. Em primeiro lugar, ele enfatiza fortemente o desenvolvimento das nações soberanas, colocando-o como prioridade. Em segundo lugar, preconiza a abertura, conclamando os países a se envolverem com o resto do mundo e a participarem da competição global. Isso pode ser entendido como nações soberanas utilizando-se da globalização para atenderem suas necessidades de desenvolvimento, aproveitando as oportunidades de crescimento e alcançando gradualmente a transformação social. Assim, quando discutimos a ‘desconexão’, estamos nos apropriando da globalização. Por um lado, o capitalismo monopolista usa a globalização para acumular capital e expandir sua dominação. Por outro lado, também podemos utilizá-la para atender prioritariamente às necessidades do desenvolvimento nacional. Devemos atribuir máxima importância a essa transformação interna orientada ao crescimento, o que envolve mudanças contínuas e progressivas.”[11]

A visão de Amin, segundo a qual nações soberanas utilizam-se da globalização e se “desconectam” com sucesso por meio de uma transformação interna, está em estreita ressonância com o caminho de desenvolvimento da China. Já em 1997, em seu livro Capitalism in the Age of Globalization (O Capitalismo na Era da Globalização), Amin expressou sua esperança em relação à China e previu mudanças nas relações sino-estadunidenses. Ele descreveu, a princípio, como o processo de globalização capitalista liderado pelos Estados Unidos resultou em um mundo polarizado e deixou a globalização em um estado extremamente frágil e precário. Simultaneamente, as políticas neoliberais da direita chegaram ao poder (frequentemente apoiadas pela suposta esquerda) nos Estados Unidos e na União Europeia, obstruindo toda a esperança de uma globalização “humanitária”. Portanto, tal como V. I. Lenin antes e depois da Primeira Guerra Mundial, Amin voltou seu foco para a Ásia e profetizou: “É quase desnecessário dizer que o futuro desenvolvimento da China ameaça todos os equilíbrios globais. E é por isso que os Estados Unidos se sentirão ameaçados pelo desenvolvimento dela. Na minha opinião, os Estados Unidos e a China serão os principais antagonistas em qualquer conflito mundial futuro”.[12]

Em uma entrevista de 2018, Amin alertou repetidamente a China de que, mesmo que ela buscasse se tornar um país capitalista, a tríade das principais potências capitalistas — Estados Unidos, Japão e Europa — não aceitaria nem permitiria a ascensão da China. A aspiração de superar os países capitalistas desenvolvidos dentro do sistema capitalista é ingênua. Se a China viesse a adotar de forma plena o sistema, a ideologia e a globalização do capitalismo, e até mesmo se tornasse voluntariamente parte dele, então as potências capitalistas, sob a liderança dos Estados Unidos, poderiam agir rapidamente para desmantelar o país. Caso isso acontecesse, a China voltaria a ser uma nação subordinada, fornecedora de matérias-primas para o campo imperialista[13]. Na verdade, o alerta de Amin funciona tanto como uma advertência sobre o futuro da China quanto uma descrição das experiências da extinta União Soviética.

Outro ponto fundamental da visão de Amin é que “o Sul Global deve alcançar a solidariedade política; com a China desempenhando o papel de protagonista na busca por essa solidariedade. Neste processo, não devemos permitir que a falta de uma comunicação eficaz prejudique nossos interesses comuns”. Quanto a isso, a tarefa atual mais urgente consiste em promover a solidariedade e a comunicação entre os países do Sul Global, visando estabelecer uma “Nova Ordem Econômica Internacional”[vii] e uma “Nova Ordem Internacional de Comunicação e Informação”[viii]. Essas novas ordens internacionais são pré-requisitos para o desenvolvimento socialista, a comunicação global e o autêntico avanço econômico. Para resistir à aliança entre a burguesia compradora do Sul Global e o imperialismo do Norte Global, devemos buscar um consenso semelhante ao Movimento dos Não-Alinhados (MNA) e aos movimentos socialistas do século XX. Além disso, devemos reavaliar, a partir de uma perspectiva teórica, todos os sucessos e fracassos ocorridos nos processos de industrialização da China e da União Soviética ao longo do século passado.

Embora o socialismo tenha se originado na Europa, a “modernização ao estilo chinês” representa sua implementação bem-sucedida na China, explorando formas de se libertar das amarras da globalização capitalista e buscando um novo caminho para o desenvolvimento humano. A “modernização ao estilo chinês” não pertence somente à China — ela carrega profundas implicações para a paz e para o desenvolvimento global. Essa busca exploratória está longe de estar concluída, englobando não apenas desafios e crises, mas também um lampejo de esperança.

Lu Xinyu  é titular da Cátedra Zijiang da Escola de Comunicação da East China Normal University.

Chinese-Style Modernization: Revolution and the Worker-Peasant Alliance por Lu Xinyu

Tradução: Ricardo d’ Arêde.

Publicado originalmente na Monthly Review [https://monthlyreviewarchives.org/mr/article/view/6382]

Notas


 [1] STALIN, Joseph. Sidalin Quanji (Collected Works). Beijing: People’s Publishing House, 1955. v. 12, p. 112-120.
[2] LU, Nanquan et al. Sulian Xingwang Shilun (Theoretical Analyses on Rise and Fall of Soviet Union). Beijing: People’s Publishing House, 2002. p. 406-409.
[3] SUN, Zhenyuan. Sulian Sige Shiqi de Nongye Tizhi Gaige (Four Periods of Agricultural System Reform in the Soviet Union). Shenyang: Liaoning People’s Publishing House, 1985. p. 119.

[4] LU, Nanquan et al. Sulian Xingwang Shilun. Beijing: People’s Publishing House, 2002. p. 562-563.

[5] SCHERTZ, Lyle P. et al. Meiguo Nongye de Youyici Geming (Another Revolution in US Farming?). Tradução de Wang Qimo. Beijing: Agriculture Press, 1984. p. 35.

[6] LU, Nanquan et al. Sulian Xingwang Shilun. Beijing: People’s Publishing House, 2002. p. 634-637.

[7] CHEN, Jinhua. Guoshi Yishu (Memoirs of National Affairs). Beijing: History of Chinese Communist Party Publishing House, 2005. p. 1-32.

[8] WANG, Shaoguang et al. China in the 1970s. Open Times, [s. l.], n. 1, p. 70-73, 2013.

[9] LIPING, Sun. Duanlie: Zhongguo Shehui de Xinbianhua (Rupture: The Urban-Rural Divide in Changing Chinese Society). Southern Weekly, [s. l.], 16 maio 2002. p. A11.

[10] XINPING, Xi. Lun “Sannong” Gongzuo (Xi Jinping’s Discourse on “Three Rural” Work). Beijing: Central Party Literature Press, 2022. p. 332.

[11] XINPING, Xi. Lun “Sannong” Gongzuo. Beijing: Central Party Literature Press, 2022. p. 8-10.

[12] XINPING, Xi. Lun “Sannong” Gongzuo. Beijing: Central Party Literature Press, 2022. p. 247-246.

[13] AMIN, Samir; XIAOMENG, Zhang. The Systemic Crisis of Capitalism and the Way Forward: An Interview with Egyptian Economist Professor Samir Amin. Studies on Marxist Theory, [s. l.], v. 2, n. 1, p. 8, 2016.

[14] AMIN, Samir. Capitalism in the Age of Globalization. Tradução de Ding Kaijie. Beijing: China Renmin University Press, 2005. p. 8-9.

[15] AMIN, Samir; XIAOMENG, Zhang. The Systemic Crisis of Capitalism and the Way Forward. Studies on Marxist Theory, [s. l.], v. 2, n. 1, p. 18, 2016.

Notas do tradutor


[i] No presente artigo, lemos em inglês “A Year of Great Change”(“Um Ano de Grande Mudança”). O referido ano marca uma mudança radical na política econômica da URSS entre 1928 e 1929, quando a Nova Política Econômica (NEP) foi abandonada e a coletivização acelerada. A expressão foi extraída do artigo de Josef Stalin publicado em 7 de novembro de 1929, intitulado “Великий перелом” (“O Ano da Grande Virada”). O mesmo pode ser lido no link https://www.marxists.org/reference/archive/stalin/works/1929/11/03.htm (em inglês)
[ii] Há uma incorreção no texto em inglês a respeito da sessão plenáriae da legislatura da Assembleia Popular Nacional. O texto indica a “Third Session of the First National People’s Congress, held in late 1964”. Contudo, de 1964 a 1975 ocorrera a 3ª Assembleia Popular Nacional, que, devido à Revolução Cultural (1966-1976), contou apenas com a sessão de abertura (a primeira sessão). Aparentemente houve uma inversão de termos na frase original, corrigida na presente tradução,

 [iii] Segundo dados do National Bureau of Statistics da China, em 2005 a população rural era estimada em 744 milhões de habitantes, equivalendo a 57% da população total do país (cf. https://www.stats.gov.cn/english/NewsEvents/200603/t20060322_25744.html, consultado em 24/05/2025).

 [iv] cf. a íntegra do documento pode ser lida no site da embaixada chinesa no Brasil, em http://br.china-embassy.gov.cn/por/ssht/SJD/201711/t20171118_4953282.htm

 [v] A título de maior contextualização, as Rodadas de Doha tiveram início em novembro de 2001, no Qatar, com a IV Conferência Ministerial da Organização Mundial do Comércio, a mais alta instância da organização. O objetivo era encerrar as barreiras comerciais para facilitar o acesso dos países em desenvolvimento aos mercados internacionais e incentivar o intercâmbio mundial. Em função das dificuldades, foi estabelecido um prazo de quatro anos para negociação, período no qual ocorreriam mais duas conferências ministeriais, as chamadas Rodadas de Doha que dariam continuidade aos debates iniciados na reunião no Qatar. Como explica Andréa Wolffenbüttel, “A conferência de 2003, em Cancun, foi um retumbante fracasso. As economias mais desenvolvidas se recusaram a reduzir os subsídios agrícolas e decidiram manter as barreiras tarifárias. Por outro lado, os países em desenvolvimento reagiram e criaram o G-20, um grupo reunindo 20 nações dispostas a lutar por seus interesses. Em dezembro de 2005, houve mais uma conferência ministerial, em Hong Kong, na qual não se avançou muito, mas foi assinado acordo prevendo a eliminação de todos os subsídios aos bens agrícolas para exportação até 2013. Diante da impossibilidade de um consenso, foi estendido até o fim de 2006 o prazo para chegar a um entendimento”. (cf. Andréa Wolffenbüttel, Revista de Informações e Debates do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada/IPEA. 2006. Ano 3. Edição 24),

 [vi] On Three Rural Work refere-se ao conceito das Três Questões Rurais e constitui uma compilação de escritos específicos sobre o tema, sem publicação em português. Contudo, uma coletânea de escritos e discursos de Xi Jinping, com publicação iniciada no mesmo ano, está disponível em português em quatro volumes intitulados “A Governança da China”, abordando, entre outros, as questões relacionadas à agricultura, às áreas rurais e aos agricultores, que constituem as Três Questões Rurais.

 [vii] NOEI; Nova Ordem Econômica Internacional. Proposta política e econômica representada pelos países do Sul Global, inicialmente na década de 1970, visando reformar uma ordem econômica desigual, centrada nos interesses do Norte Global, e refletindo as aspirações e necessidades de países recém-independentes e em desenvolvimento. Seus marcos históricos remontam ao debate sobre soberania econômica na esteira da crise do petróleo de 1973, sendo o principal deles a resolução da Assembleia Geral da ONU, aprovada em 1974 (Declaração sobre o Estabelecimento de uma Nova Ordem Econômica Internacional/NOEI) que “consolidou as experiências e entendimentos políticos coletivos dos países recém-independentes” e “convocou o mundo a construir um novo sistema global ‘baseado na equidade, igualdade soberana, interdependência, interesse comum e cooperação entre todos os Estados’. Essa resolução, juntamente com o Programa Ambiental da ONU (1972) e a Declaração Cocoyoc da Unctad (1974), desafiou diretamente o sistema capitalista mundial e reimaginou o desenvolvimento centrado nas necessidades da humanidade, não do capital” (cf. https://www.brasildefato.com.br/2023/03/21/dossie-tricontinental-soberania-dignidade-e-regionalismo-na-nova-ordem-internacional/) [viii] NOMIC; Nova Ordem Internacional da Informação e da Comunicação. Os debates sobre a NOMIC surgiram nas décadas de 1970 e 1980, visando uma distribuição mais justa, democrática e equilibrada da informação e da comunicação no mundo, em contraposição ao domínio das potências do Norte Global sobre os fluxos de mídia. O marco fundador e legitimador da NOMIC foi o relatório Muitas Vozes, Um Só Mundo (também conhecido como o Relatório MacBride) divulgado na Conferência Geral da UNESCO, em 1980. O relatório propôs uma nova ordem comunicacional promotora da paz e do desenvolvimento humano, reconhecendo a comunicação como um direito fundamental, e denunciou a concentração da produção de informação nos países ricos, a dependência informativa dos países do Sul Global em relação às agências de notícias do Norte e a necessidade de os países em desenvolvimento construírem sistemas próprios de mídia e infraestrutura autônomas de comunicação (cf. https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000040066


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Por TALES AB´SÁBER: Petra Costa transforma Brasília em um espelho quebrado do Brasil: reflete tanto o sonho modernista de democracia quanto as rachaduras do autoritarismo evangélico. Seus filmes são um ato de resistência, não apenas contra a destruição do projeto político da esquerda, mas contra o apagamento da própria ideia de um país justo
A Rússia e a sua viragem geopolítica
Por CARLOS EDUARDO MARTINS: A Doutrina Primakov descartou a ideia de superpotências e afirmou que o desenvolvimento e integração da economia mundial tornou o sistema internacional um espaço complexo que só poderá ser gerido de forma multipolar, implicando na reconstrução dos organismos internacionais e regionais
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