O ataque de drones da Ucrânia à infraestrutura russa

Whatsapp
Facebook
Twitter
Instagram
Telegram
image_pdfimage_print

Por ANDREW KORYBKO*

Algumas observações sobre a última provocação de Kiev – levando em conta um panorama mais amplo

A Rússia acusou a Ucrânia de tentar um ataque de drone contra uma das estações de compressão de gás da TurkStream, o que o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, descreveu como “ terrorismo energético”, enquanto o Ministro das Relações Exteriores Sergey Lavrov afirmou que os EUA deram sinal verde para obter um monopólio energético sobre a UE. Isso ocorre menos de duas semanas após a Ucrânia cortar as exportações de gás russo para a Europa em seu território.

Esta não é a primeira tentativa de ataque ucraniano contra o TurkStream

A Ucrânia tentou destruir este gasoduto pelo menos três vezes no final de 2022 sozinha (analisamos duas de suas tentativas de sabotagem fracassadas aqui e aqui), mas esta é a primeira vez que tentou-se usar drones. Isso na realidade mostra que o TurkStream continua sendo um alvo prioritário para Kiev. Mas, estranhamente, isso não levou a um rompimento de laços com Ancara, como comprovado por sua cooperação militar contínua que inclui até mesmo uma fábrica de drones. Não se espera, portanto, que a última tentativa de ataque prejudique suas relações.

Nem a Turquia nem a OTAN se importam com esta provocação

A posição da Turquia é difícil de entender: ou a Turquia não acredita nas alegações da Rússia de que a Ucrânia está tentando atacar o TurkStream, ou inexplicavelmente acredita que tem mais a ganhar continuando a apoiar a Ucrânia – apesar dessas provocações – do que suspender a ajuda como resposta. Quanto à OTAN, enquanto o estado-membro Hungria condenou o ataque classificando de uma violação de sua soberania devido à dependência parcial do país das exportações daquele gasoduto, o bloco como um todo previsivelmente não se importa, já que é anti-Rússia na essência da sua política.

A Ucrânia queria concluir a dissociação do gasoduto entre a Rússia e a União Europeia

A motivação da Ucrânia era destruir o último gasoduto operacional entre a Rússia e a União Europeia, o que – acreditava ela – tornaria mais difícil para ambos entrarem numa reaproximação significativa após o fim do conflito, ao mesmo tempo que privaria o Kremlin de receitas para financiar o seu atual programa Operação Especial. Esse ataque foi essencialmente concebido para complementar o ataque terrorista ao Nord Stream de setembro de 2022, com o objetivo de servir no jogo de poder geopolítico buscando influenciar o futuro pós-guerra da Europa.

Esta foi uma operação desonesta do Deep State ou foi aprovada por Joe Biden?

O primeiro cenário se alinharia com a hipótese – sobre os ataques da Ucrânia contra os sistemas de alerta precoce da Rússia – de que foram pensados como uma tentativa desesperada de escalada, mais tarde controlada; enquanto o segundo se alinharia com o precedente Nord Stream II. Lavrov já culpou os EUA, então a questão é até que ponto seu governo estava ciente disso. A resposta ajudará a prever se o retorno de Donald Trump ao cargo na próxima semana fará ou não diferença nessas correlações.

Como Donald Trump reagirá a esse acontecimento?

Com base no exposto acima, seria mais difícil para Donald Trump controlar o comportamento desonesto do Deep State se ele – Trump – fosse contra o ataque, mas o precedente de Joe Biden (ou melhor, daqueles que o controlam) ser capaz de impedir os ataques da Ucrânia contra os sistemas de alerta precoce da Rússia sugere que não é impossível. Por outro lado, não se pode descartar que Donald Trump possa apoiar a sabotagem do TurkStream para obter um monopólio de energia sobre a União Europeia e/ou alavancagem sobre a Turquia, caso em que mais tentativas desse tipo poderiam ocorrer.

O melhor cenário é que Donald Trump logo deixe claro para a Ucrânia que é inaceitável atacar o TurkStream e então encarregue seus apoiadores no Deep State de erradicar os elementos subversivos associados. O TurkStream pode desempenhar um papel na diplomacia de energia criativa como parte de um grande acordo russo-americano sobre a Ucrânia, cujo resultado se alinha com seu objetivo de acabar rapidamente com o conflito. Desviar-se desse curso pode facilmente implicar uma escalada que perigosamente corre o risco de sair do controle.

*Andrew Korybko é mestre em Relações Internacionais pelo Instituto Estadual de Relações Internacionais de Moscou. Autor do livro Guerras híbridas: das revoluções coloridas aos golpes (Expressão Popular). [https://amzn.to/46lAD1d]

Tradução: Artur Scavone.


A Terra é Redonda existe graças aos nossos leitores e apoiadores.
Ajude-nos a manter esta ideia.
CONTRIBUA

Veja todos artigos de

10 MAIS LIDOS NOS ÚLTIMOS 7 DIAS

Os véus de Maya
Por OTÁVIO A. FILHO: Entre Platão e as fake news, a verdade se esconde sob véus tecidos por séculos. Maya – palavra hindu que fala das ilusões – nos ensina: a ilusão é parte do jogo, e desconfiar é o primeiro passo para enxergar além das sombras que chamamos de realidade
Régis Bonvicino (1955-2025)
Por TALES AB’SÁBER: Homenagem ao poeta recém-falecido
Distopia como instrumento de contenção
Por GUSTAVO GABRIEL GARCIA: A indústria cultural utiliza narrativas distópicas para promover o medo e a paralisia crítica, sugerindo que é melhor manter o status quo do que arriscar mudanças. Assim, apesar da opressão global, ainda não emergiu um movimento de contestação ao modelo de gestão da vida baseado do capital
A fragilidade financeira dos EUA
Por THOMAS PIKETTY: Assim como o padrão-ouro e o colonialismo ruíram sob o peso de suas próprias contradições, o excepcionalismo do dólar também chegará ao fim. A questão não é se, mas como: será por meio de uma transição coordenada ou de uma crise que deixará cicatrizes ainda mais profundas na economia global?
Na próxima vez em que encontrar um poeta
Por URARIANO MOTA: Na próxima vez em que encontrar um poeta, lembre-se: ele não é um monumento, mas um incêndio. Suas chamas não iluminam salões — consomem-se no ar, deixando apenas o cheiro de enxofre e mel. E quando ele se for, você sentirá falta até de suas cinzas
Síndrome da apatia
Por JOÃO LANARI BO: Comentário sobre o filme dirigido por Alexandros Avranas, em exibição nos cinemas.
O ateliê de Claude Monet
Por AFRÂNIO CATANI: Comentário sobre o livro de Jean-Philippe Toussaint
Aura e estética da guerra em Walter Benjamin
Por FERNÃO PESSOA RAMOS: A "estética da guerra" em Benjamin não é apenas um diagnóstico sombrio do fascismo, mas um espelho inquietante de nossa própria era, onde a reprodutibilidade técnica da violência se normaliza em fluxos digitais. Se a aura outrora emanava a distância do sagrado, hoje ela se esvai na instantaneidade do espetáculo bélico, onde a contemplação da destruição se confunde com o consumo
Donald Trump ataca o Brasil
Por VALERIO ARCARY: A resposta do Brasil à ofensiva de Trump deve ser firme e pública, conscientizando o povo sobre os perigos crescentes no cenário internacional
Veja todos artigos de

PESQUISAR

Pesquisar

TEMAS

NOVAS PUBLICAÇÕES