Por ANNATERESA FABRIS*
Considerações sobre os usos de trechos de óperas de Rossini no cinema norte-americano de animação
A música é um elemento fundamental no cinema de animação, pois ela ajuda a identificar “personagens, gêneros, estilos e linguagens”. Para tanto, diretor, músico e animadores devem trabalhar em conjunto, quer para abrir mão de certos movimentos em função da música, quer para alongar ou abreviar a música em função da ação a ser comentada. Guido Michelone e Giuseppe Valenzise, de cujo livro foram retiradas as primeiras considerações sobre o tema, acreditam que esse tipo de colaboração contribui para o desenvolvimento da própria animação. A seu ver, a necessidade de seguir os compassos musicais “disciplina o trabalho dos desenhistas, obrigando-os a encontrar sempre a maneira mais concisa de elaborar uma ação, sem fotogramas extras. Isso ajuda a buscar a essência da ação e da ideia que está em sua base”.
Se Walt Disney é, sem dúvida, um pioneiro na introdução do som no universo animado graças a O vapor Willie (Steamboat Willie, 1928), não se podem esquecer as experiências feitas pelo estúdio Fleischer com a série Ko-Ko song car-tunes (também conhecida como Song car-tunes) entre 1924 e 1927. Max e Dave Fleischer inventam em 1924 a bouncing ball, que consistia numa bola animada saltando de sílaba em sílaba na letra de uma canção popular para que os espectadores pudessem cantá-la em conjunto, acompanhados pela orquestra da sala. Richard Huemer, o principal animador do estúdio, lembra que a primeira animação cantada foi Oh Mabel, apresentada em 1924 no Circle Theatre de Nova York. O público gostou tanto da experiência que o diretor da sala projetou de novo o filmete, confirmando a intuição dos irmãos Fleischer, que se dedicaram em seguida à produção de inúmeras fitas cantadas.
Dezenove filmes da série foram realizados com o sistema Phonofilm, patenteado por Lee De Forest em 1920. Tratava-se de uma trilha sonora óptica gravada na película, que formava linhas paralelas; transmitidas para caixas de som, estas criavam ondas. Outro nome pouco lembrado nas histórias da animação deve ser destacado nesse contexto. Em 1928, Paul Terry, coadjuvado por John Foster, dirige o curta-metragem Dinner time, que fazia parte de um conjunto de animações inspiradas em fábulas de Esopo. O filme, que utiliza som “sincronizado” a cargo de Josiah Zuro, estreia em agosto de 1928 no Strand Theatre de Nova York e é oficialmente lançado em 14 de outubro, mas não desperta o interesse do público. É possível que essa reação deva ser atribuída ao fato de a música que acompanhava as histórias de um pica-pau e um gato e de cachorros à procura de ossos ter sido concebida como fundo, sem apresentar uma relação mais íntima entre ação e som.
A estreia de O vapor Willie em 18 de novembro de 1928 no nova-iorquino Universal Colony Theatre representa, ao contrário, uma revolução na história do desenho animado. Inspirado em O cantor de jazz (The jazz singer), dirigido por Alan Crosland e lançado em 1927, Disney utiliza uma trilha sonora composta de duas canções: Steamboat Bill, popularizada na década de 1910 pelo barítono Arthur Collins, e Turkey in the straw, muito executada no século XIX. Os responsáveis pela trilha sonora – Wilfred Jackson e Bert Lewis – utilizam a primeira canção na parte inicial do filme; a segunda ritma a parte final, na qual Mickey e Minnie interagem com diversos animais, utilizados como fonógrafo (bode), instrumentos de percussão (gato e pato) e xilofone (vaca).
Se a segunda parte da fita se caracteriza por situações inusitadas e engraçadas – notas musicais saindo da boca do bode, que engoliu o ukelele e as partituras de Minnie; boca da vaca transformada em xilofone –, ela se destaca sobretudo pelo tom de pantomima que adquire em alguns momentos, fruto direto da relação intrínseca entre ação e som. De acordo com Leonard Maltin, a presença da música ajudou a vender o filme ao público e à indústria cinematográfica. O que atraía as pessoas nessas primeiras fitas faladas era a ideia de que os personagens (e até mesmo os objetos inanimados) se moviam em sincronização com um compasso musical.
O princípio do sincronismo entre os aspectos visuais e sonoros do desenho animado acabará sendo conhecido como “mickeymousing” graças ao sucesso de O vapor Willie. De acordo com Michel Chion, o “mickeymousing” consiste na enfatização e acompanhamento das ações e movimentos que ocorrem nas imagens do filme por meio de figuras e ações musicais exatamente sincrônicas que, ao mesmo tempo, podem expressar “os rumores estilizados e transpostos em notas musicais”. O “mickeymousing” faz parte de um fenômeno maior que o autor denomina “síncrese”, neologismo que engloba os termos “síntese” e “sincronização”. Associação “psicofisiológica automática entre um fenômeno sonoro e um fenômeno visual pontuais, pelo seu simples sincronismo”, a síncrese permite que o desenho animado sistematize uma relação não naturalista do som com a imagem.
Tendo como referências a série Sinfonias tolas (Silly Symphonies), Chion afirma: “Todo o objeto desenhado sincronizado com uma nota de música transformava-se nessa música, e esta transformava-se no objeto. A síncrese permitia fazer cantar e dançar o mundo desenhado mais facilmente do que o mundo filmado, porque o primeiro é mais maleável, abstrato, estilizado. Assim caía a resistência que o mundo opunha a submeter-se ao ritmo e à melodia”.
O primeiro filme da série Sinfonias tolas representa um exemplo eloquente de “mickeymousing” graças à trilha sonora concebida por Carl Stalling. Este inspira-se em Edvard Grieg[1] para criar um foxtrote a partir do qual Ub Iwerks, Les Clark e Wilfred Jackson animam uma singular dança de esqueletos. Dirigido por Disney e lançado em junho de 1929, A dança dos esqueletos (The skeleton dance) é uma reinterpretação jocosa da “dança macabra” medieval, que tem como cenário um cemitério. Nele, quatro esqueletos dançam e tocam música, atingindo um resultado altamente criativo sobretudo na sequência em que a coluna de um deles é transformada num xilofone. A revista Variety, que detecta nessa sequência o ponto alto da fita, destaca ainda o acompanhamento de xilofone “perfeitamente sincronizado” que completa o efeito buscado pelos realizadores.
Lançado no Brasil sob o título de A dança macabra, o filme é acolhido com entusiasmo por Mário de Andrade, que o define como “uma obra-prima perfeita, coisa das mais perfeitas que o cinema inventou até agora. A qualidade do desenho, a invenção das atitudes, o a propósito dos efeitos musicais, das paródias de Grieg e outros compositores, a aplicação perfeita do jazz a isso, dão ao filme uma qualidade artística ótima. Essas são as obras-primas do cinema sonoro. Tudo o mais pode de vez em longe apresentar um efeito excelente, uma qualidade nova, porém ou não passa de tentativa, ou é confusão, monotonia e cultivo da banalidade”.
Tais palavras são uma clara evidência de que o escritor, descontente com o uso do som no cinema, que se resumia a “uns romances sentimentais da pior espécie e jazz”, via uma saída criadora nos “filmezinhos de abertura das sessões”. Era aos desenhos animados que a música conferia efeitos cômicos, e isso era importante para ele, por acreditar que a comicidade era “a parte mais saliente da criação artística da nossa época”. Além da produção de Disney, Andrade apreciava a “série do gato”, que estava “formando um colar de filmezinhos admiráveis”.[2]
A ideia de Stalling de construir animações em volta da trilha sonora será adotada por outros estúdios, expandindo o fenômeno do “mickeymousing”. É importante lembrar que este forja uma técnica de composição inspirada, em parte, nas improvisações e nas compilações de sugestões musicais usadas pelos músicos que faziam os acompanhamentos dos filmes silenciosos. Stalling, de fato, começa sua carreira na década de 1920 como organista do Iris Theatre, de Kansas City, onde conhece Disney. Em 1928, o realizador incumbe-o de compor as trilhas sonoras de The gallopin’ gaucho, Plane crazy e The barn dance. Destes, só o último era um filme sonoro, lançado em 15 de março de 1929; os outros dois, concebidos como produções silenciosas, estrearam no novo formato em 30 de dezembro de 1928 e 17 de março de 1929, respectivamente. Dentre essas realizações Ross Care destaca Plane crazy, no qual Stalling juntou “vertiginosamente” fragmentos de melodias conhecidas pelo público, que estavam em domínio público.
Entre 1929 e janeiro de 1930, Stalling trabalha no Estúdio Disney em dois tipos de produções: animações em que a música se adaptaria à ação (notadamente as protagonizadas por Mickey) e desenhos em que a música seria o elemento determinante com o conseguinte ajuste da ação à trilha sonora (Sinfonias tolas). Essa segunda solução é uma inovação, pois, em geral, cabia à música ajustar-se à ação. Stalling é também responsável pela ideia de não usar os termos “música” e “musical” na série para evitar um lugar-comum. O título Sinfonias tolas é resultado desse desígnio, acompanhado de uma “palavra cômica”. Os protagonistas da série são também sugeridos pelo músico, o qual propõe “figuras inanimadas como esqueletos, árvores, flores etc., que ganham vida, dançam e fazem outras ações animadas ajustadas à música, num espírito mais ou menos cômico e rítmico”.
Depois de um período em que trabalha no estúdio de Iwerks, como freelance para outros produtores e como colaborador eventual de Disney (faz arranjos para partituras e toca piano durante as gravações), Stalling é contratado pela Warner Bros em julho de 1936. No novo estúdio, integra a equipe de duas séries de animação que faziam grande sucesso: Looney Tunes (criada em 1930) e Merrie Melodies (lançada em 1931). Ao lado de Tex Avery, Bob Clampett, Friz Freleng, Robert McKinson e Chuck Jones, Stalling participa da criação do “estilo Looney Tunes”, que tinha como características a presença de personagens esguios, desengonçados, ágeis, anti-heroicos, atrevidamente engraçados, que atuavam em cenários reduzidos ao mínimo, apenas para situar a ação. O humor era acelerado por variações de ângulo de câmeras, cortes fulgurantes e por um domínio absoluto do tempo. A duração dos acontecimentos era pontuada por sugestões musicais rápidas e firmemente coordenadas, que podiam ser acompanhadas de efeitos sonoros instrumentais ou gravados.
No Estúdio Disney, Stalling devia trabalhar com canções do século XIX e música clássica; na Warner, ao contrário, tinha à disposição um vasto repertório popular cujos direitos pertenciam à produtora. Esta tinha como política empresarial utilizar nas animações músicas que tinham integrado as trilhas sonoras dos longas-metragens live-action para induzir o público a adquiri-las. Nas trilhas sonoras das Sinfonias tolas, o compositor lança mão de trechos da ópera Carmen (1875), de Georges Bizet (El terrible toreador, 1929); de Peer Gynt (1876), de Grieg; de Flores murmurantes (1902), de Franz von Blon, de A dança das horas (1876); de Amilcare Ponchielli, e de Alegria parisiense (1858), de Jacques Offenbach (Springtime, 1929); de Peer Gynt e da Marcha fúnebre de uma marionete (1872), de Charles Gounod (Hell’s bells, 1929); de O trovador (1853), de Giuseppe Verdi (Os anões felizes/The merry dwarfs, 1929).[3]
A esses cavalos de batalha da música clássica, bastante conhecidos pelo público dos filmes silenciosos, Stalling e outros músicos da Warner Bros e de outras produtoras irão acrescentar a ópera O barbeiro de Sevilha (1816), de Gioacchino Rossini. A cavatina “Largo al factotum”[4], cantada por Fígaro no início da ópera bufa, é utilizada por Stalling em diversos títulos: Você devia estar no cinema (You ought to be in pictures, 1940); Serenata que mata (Notes to you, 1941); The ducktators (1942); Tokio Jokio (1943); Rhapsody rabbit (1946); Back alley oproar (1948); Maestro Pernalonga (Long-haired hare, 1949); Wise quackers (1949); e Hare we go (1951).
A ária de Rossini desempenha diversas funções nas trilhas concebidas por Stalling. Este aproveita a feição virtuosística da peça para inseri-la rapidamente na imitação que Patolino faz de Fred Astaire a fim de convencer Leon Schlesinger, o produtor das séries Looney Tunes e Merrie Melodies, a dar-lhe o lugar ocupado por Gaguinho no setor de animação da Warner (Você devia estar no cinema). Uma ideia semelhante é explorada em Rhapsody rabbit: ao tocar a Rapsódia húngara n. 2 (1847), Pernalonga começa a cantar “Fi-ga-ro! Fi-ga-ro!”, quando chega no fim de uma frase de Franz Liszt que lembra a ária rossiniana. Nos filmes de propaganda realizados durante a Segunda Guerra Mundial, o músico acentua o aspecto histriônico do ganso Benito Mussolini (The ducktators) e sua relação com o passado e não com o futuro (Tokio Jokio).[5] Na animação de 1942, a música de Rossini abre também caminho para o avanço das tropas alemãs; na do ano seguinte, tocada de maneira fugaz, a peça cria um contraponto entre seu andamento brioso e um Mussolini de aspecto melancólico, sentado em cima de uma ruína e brincando com um ioiô.
Em Serenata que mata e Back alley oproar[6], a cavatina é cantada no início do desenho por um gato de beco e Frajola, respectivamente; mas é possível pensar que ela sirva de fio condutor para toda a ação, se for levada em conta a ideia de faz-tudo. O gato anônimo do primeiro filme, atingido pelo livro Dr. Fu-Manchu, devolve a Gaguinho The return of Fu-Manchu; canta no telefone; rouba um pires e uma garrafa de leite e deixa um bilhete de agradecimento; faz barulho com uma tampa de panela; protagoniza uma cena clássica de corrida paralela com seu perseguidor; canta para ele uma canção de ninar, coloca-o na cama e liga o rádio; faz malabarismos na cerca e canta mais uma vez; é alvejado pelo porco e morre cantando de maneira operística; suas nove vidas entoam o “Sexteto” da Lucia de Lammermoor (1835), de Gaetano Donizetti, exasperando o antagonista, que se atira pela janela, a julgar pelo barulho de vidro quebrado com que se encerra a fita.
Freleng[7] volta a filmar uma história muito parecida sete anos mais tarde, mas lhe imprime um tom mais amalucado com laivos de absurdo. O antagonista de Frajola é Hortelino Trocaletras, impedido de dormir pela cantoria do gato. Ameaçado com o arremesso de objetos, o felino entra na casa, sobe e desce a escada cantando; volta para o quintal, é atingido pelo livro The thin man e envia em troca Return of the thin man; canta no telefone; espalha graxa nos degraus e tachinhas no chão, que machucam Hortelino; canta e dança como se estivesse num palco; pede a ajuda de uma gata para incrementar o concerto; recrimina o perseguidor pela ausência de “senso estético” e de “ouvido para a apreciação musical”; canta uma canção de ninar, coloca o antagonista na cama e se exibe como homem-orquestra; rema num barco sobre a cerca; bebe leite com alume e perde a voz; em cima de um monte de lixo imita Spike Jones cantando Angel in disguise (1940). Exasperado, Hortelino usa explosivo para livrar-se de Frajola e ambos morrem. Quando acreditava ter encontrado finalmente a paz, o homem é cercado pelos espíritos das nove vidas do felino[8] cantando a ária de Donizetti e acaba caindo da nuvem.
Em Wise quackers, a ária de Rossini está a serviço de uma breve ilustração dos “dotes” de Patolino como barbeiro. Já em Hare we go, ela é usada para ritmar o embarque da tripulação de Cristóvão Colombo sob a supervisão de Pernalonga, criando uma articulação dinâmica entre música e imagem. O uso mais criativo de “Largo al factotum” está, sem dúvida, em Maestro Pernalonga, no qual a parceria entre Stalling e Chuck Jones consegue atingir a dimensão de um casamento perfeito entre ritmo musical e ritmo visual. O embate entre Pernalonga, que representa a música popular, e o tenor Giovanni Jones, cioso de seu repertório clássico, vai muito além de um conjunto de gags bem encadeadas, pois envolve duas concepções de cultura. Enquanto o coelho canta seu repertório popular no bosque, acompanhando-se com um banjo, uma harpa e uma tuba, numa casa próxima o tenor Jones ensaia “Largo al factotum”. A música de Pernalonga interfere no ensaio, levando Jones a cantar uma estrofe de A rainy night in Rio (1947) de maneira operística; a dançar e a entoar a letra da segunda canção; a nota de uma rumba sai de sua boca quando o coelho toca tuba. Nas três ocasiões, o tenor, chocado e furioso com as interferências no ensaio, castiga o cantor, que jura vingança.
Como escreve Daniel Goldmark em Tunes for ‘toons: music and Hollywood cartoon, o embate entre o tenor e o coelho não deriva apenas do fato de o primeiro ter tido seu ensaio interrompido três vezes por interferências musicais estranhas. A razão de sua raiva está sobretudo em ter sucumbido a um repertório alheio à alta cultura, desperdiçando sua voz com a música menos refinada praticada por um “antiesteta”. A cavatina de Rossini está também na base do início da vingança do coelho. Disposto a humilhar o tenor, Pernalonga atrapalha seu concerto: enquanto este canta uma ária de Lucia de Lammermoor, martela no telhado da sala fazendo-a vibrar e interrompe a récita; quando Jones vai voltar para apresentar o trecho de Rossini, lhe borrifa a garganta com alume líquido, o que provoca o encolhimento da cabeça e o sumiço da voz.
Se o embate entre Pernalonga e Jones se transforma numa guerra cultural, em que a ópera e seus rituais são vistos a partir de um prisma humorístico, em outras ocasiões a ária de Rossini se presta a novos exercícios de “mickeymousing”. Um colaborador de Stalling na Warner, Milt Franklyn, usa rapidamente um pequeno trecho da música em One froggy evening (1955) para sublinhar uma particularidade de Michigan J. Frog, um sapo encontrado numa demolição: ele sabia cantar, mas só se exibia para o operário que o tinha resgatado da caixa em que estava encerrado. Produzido por Walter Lantz, The barber of Seville (1944) é um exemplo brilhante de sincronização entre música e ação. O protagonista, Pica-pau, aparece neste filme dirigido por Shamus Culhane com a nova aparência desenhada por Emery Hawkins e Art Heinemann: corpo mais ágil e atenuação dos traços grotescos. O diretor musical Darrell Calker, um dos maiores representantes do “mickeymousing”, consegue estabelecer um mesmo grau de atividade rítmica entre o canto do personagem e suas ações cada vez mais frenéticas e claramente lunáticas.
A ária de Rossini vai muito além de um comentário à ação: ela se confunde com o frenesi do personagem que, levado pela música, assusta o cliente a seus cuidados. O canto do Pica-pau é mecanicamente acelerado para equiparar-se com sua voz e coincidir com a velocidade da ação. A ária de Rossini é cantada quase integralmente e começa no momento em que o Pica-pau prepara a espuma de barbear, com a qual cobrirá a cabeça, o rosto e os sapatos do cliente, um operário da construção civil de origem italiana. Totalmente entregue ao canto, o pássaro brande a navalha perigosamente; interrompe o trabalho para exibir seu virtuosismo; pula graciosamente como se fosse uma dançarina; busca o operário escondido; multiplica-se ao som de “Figaro! Figaro! Figaro”; não deixa que a “vítima” fuja e finalmente conclui seu serviço com um autoelogio (“Ah bravo Figaro! Bravo, bravissimo: a te fortuna non mancherà”). A saída do cliente é acompanhada por “Sono il factotum della città” e pelo grito típico do Pica-pau, que se sai mal, pois o homem volta e o arremessa dentro do salão através da vitrine.
Duas animações da Metro-Goldwin-Mayer – Magical maestro (1952) e Gato lá em cima, rato lá em baixo (The cat above and the mouse below, 1964) – usam igualmente a ária de Rossini. No primeiro, dirigido por Tex Avery e musicado por Scott Bradley, Butch Dog interpreta o Grande Poochini (uma brincadeira com Giacomo Puccini), que está ensaiando “Largo al factotum” no camarim. É interrompido pelo mágico Mysto à procura de emprego e o expulsa irritado. Este resolve vingar-se e usa uma varinha mágica para perturbar a récita do cantor. Toma o lugar do maestro e, enquanto Poochini se exibe na ária que estava ensaiando, começa a fazer surgir no palco flores, coelhos, lenços que saem do bolso. Sempre cantando, o tenor passa por uma série de transformações: bailarina, índio, tenista, presidiário, jogador de futebol americano, chinês, cantor country, criança com balão, Carmen Miranda, Bill Kenny e “Hoppy” Jones (ambos do Ink Spots)[9] e, finalmente, guerreiro havaiano. Quando Poochini percebe o truque, apossa-se da varinha e submete Mysto ao mesmo tratamento até que a cortina com os dizeres “The end” cai sobre ele.
O tema da contaminação cultural, que tinha sido o cerne da primeira parte de Maestro Pernalonga, abarca toda a duração de Magical maestro com o transformismo frenético do cantor. Se, no curta-metragem dirigido por Jones, o ambiente rústico em que vivia o coelho formava um contraste evidente com a elegância da casa do tenor, sugerindo um contraponto entre natureza e cultura, na realização de Avery toda a ação transcorre num dos templos da burguesia, uma sala de concerto. A ideia de Philip Brody de que o canto de Pernalonga “gera um discurso musicológico que infecta a linhagem refinada das árias operísticas do tenor” pode ser aplicada a Magical maestro, no qual o tema do contágio é o leitmotiv das diversas ações. O que distingue “Largo al factotum” de canções tradicionais do século XIX, como Oh, my darling Clementine (cantor country) e A-tisket A-tasket (menina com balão), de Mamãe eu quero e Everything I have is yours (1933), executada por Kenny e pela voz grave dos Ink Spots? Todas elas integram o repertório da cultura de massa, embora os amantes da ópera não admitam essa constatação.
A relutância em admitir um novo regime cultural é simbolizada no filme pelo protesto de um espectador contra as contínuas interferências na récita de Poochini. Suas intervenções, no entanto, nada mais fazem do que enfatizar essa interdependência. Quando atira frutas no palco, materializa-se a figura de Carmen Miranda. Quando tinge o rosto de Poochini de preto com um jato de tinta, este se transforma em Bill Kenny. Quando lança a indefectível bigorna das animações, surge “Hoppy” Jones… A nota humorística que permeia a narrativa torna-se ainda mais aguda, se for lembrado que a figura do maestro é uma caricatura de Scott Bradley, o responsável pela contaminação da ópera com um repertório popular e de massa. O diretor musical e Avery conseguem criar um fluxo rítmico entre música e ação filmada, não permitindo que as “interferências” quebrem o andamento da récita de Poochini, cujas sucessivas transformações adicionam um ponto de vista irônico sobre o universo da alta cultura.
Embora o “mickeymousing” comece a ser deixado de lado na década de 1960, ele é ainda o elemento central de Gato lá em cima, rato lá em baixo, no qual toda a ação se articula em volta da cavatina de Rossini. O barítono Thomasino Catti-Cazzaza, interpretado por Tom, começa sua apresentação cantando as duas primeiras estrofes da ária, irritando Jerry, que mora em baixo do palco e está dormindo. Começa um embate entre os dois, que leva o cantor a sair do palco para recompor-se. Ao voltar, Tom retoma a ária a partir do começo, pula no palco e desarruma a casa do rato. Enquanto entoa a terceira estrofe, Jerry aparece na abertura do palco pedindo silêncio e dando início a uma nova batalha entre os dois, que se desenrola ao som de um trecho virtuosístico (“V’è la risorsa/poi del mestiere/colla donnnetta… col cavaliere”) e do momento mais conhecido da ópera em que Figaro entoa “Tutti mi chiedono, tutti mi vogliono”. Enquanto Tom está concentrado em cantar “Sono il factotum della città”, Jerry solta um dos pesos da cortina e o gato precipita no buraco aberto pela queda do objeto. O espetáculo, no entanto, não para. Vestido a caráter, Jerry canta o final da ária, recebendo uma calorosa ovação.
A interação entre Chuck Jones e o diretor musical Eugene Poddany é responsável pelo aspecto de pantomima que caracteriza a fita. Os já conhecidos embates entre o gato e o rato ganham densidade com os diferentes andamentos que a música imprime à ação, sem com isso desempenhar um papel de ilustração ou comentário. Ao contrário, é graças à música que a comicidade das situações adquire um caráter absurdo, transformando a pantomima numa sátira do mundo da ópera, pronto a aceitar tudo em nome do espetáculo.
A sátira ao universo lírico começa pela limusine desproporcional, cuja capota é coroada por um Cupido dourado, com a qual o barítono chega ao teatro. Seu interior lembra uma sala de estar de gosto duvidoso, pois é decorado com um busto antigo, um candelabro, um vaso de flores, um porta-retratos, uma garrafa e uma taça de champanhe gigantescas, um sofá no qual Thomasino está refastelado e um tapete de pele animal no chão. A caracterização do cantor é um compêndio irônico de poses e trejeitos, a começar pelo ar autossuficiente que assume perante as fãs. No palco, depois de exibir uma atitude compungida, o barítono faz cara de bravo, depois se torna afetado e sucessivamente presunçoso, arrogante e embevecido. Jerry, ao contrário, aparece como um duende alegre, capaz de transformar o final da cavatina num musical da Broadway: dança, voa com a vassourada desferida por Tom na parte inferior do assoalho do palco e aterrissa com a leveza de uma bailarina, infundindo uma graça inusitada na peça.
O Estúdio Disney não permanece imune ao chamado da ária de Rossini, utilizando-a num dos segmentos do longa-metragem Música maestro! (Make mine music), que estreia nos Estados Unidos em 20 de abril de 1946. O segmento “Uma baleia na ópera” (“The whale who wanted to sing at the Met”)[10] tem um de seus pontos altos no encontro entre o cachalote Willie, conhecido por seus dotes canoros, e o empresário Tetti-Tatti que, inspirado na história de Jonas e a baleia, acreditava que ele tinha engolido um cantor. Para mostrar seus dotes, Willie emerge das ondas cantando “Largo al factotum”; levanta o navio de Tetti-Tatti ao som de “Figaro! Figaro!”; mergulha enquanto entoa “Uno alla volta…”; e nada ao ritmo de “Figaro su, Figaro giù”. Quando finalmente começa o trecho “Bravo, bravissimo”, encanta os marinheiros do navio, que o aplaudem e impedem sua captura por Tetti-Tatti. Durante a exibição, o narrador demonstra que Willie é um “milagre canoro”, pois era dotado de três úvulas e de três timbres vocais (tenor, barítono e baixo).
A alegria infantil com que o cachalote canta trechos da ária rossiniana e as brincadeiras que faz para convencer o empresário de seu talento contrastam com o ar sério que assume no interlúdio imaginário. Grande sucesso nas casas de concerto mundiais, Willie interpreta uma peça que evoca a ária “Vesti la giubba” de Pagliacci (1892), de Ruggero Leoncavallo[11], além de trechos de Tristão e Isolda (1865), de Richard Wagner, e Mefistófeles (1868), de Arrigo Boito. Transformado em Mefistófeles, Tetti-Tatti determina o final trágico da história: arpoa Willie que desaparece nas águas do Ártico. Pouco depois, ouve-se sua voz no alto, entoando “Que o céu os perdoe” da ópera cômica Martha (1847), de Friedrich von Flotow.
“Largo al factotum” é a peça de música clássica mais utilizada no cinema de animação, mas outro trecho da ópera de Rossini serve de trilha sonora a dois desenhos que estrearam em 1948 e 1950. Dirigido por William Hanna e Joseph Barbera, Gato escaldado (Kitty foiled)[12] cadencia os embates entre Tom e Jerry com a abertura[13] de O barbeiro de Sevilha, Here’s to the girls (1945), My blue heaven (1926) e Auld lang syne (1907), conhecida no Brasil como A valsa da despedida. A música de Rossini, com a qual o diretor musical Scott Bradley abre a fita, é suspensa em alguns momentos, mas adquire um ritmo cada vez mais acelerado na sequência dramática em que Tom tenta atropelar Jerry com um trem de brinquedo. À medida que a ação se torna mais excitada, a música vai num crescendo para acompanhar o estado de espírito do gato: focalizado num primeiro plano, ele parece enlouquecido. A associação entre o frenesi da ação e o incalzando da música culmina no final da sequência, quando o felino precipita no buraco aberto pela bola de boliche atirada pelo canário amigo de Jerry.
A segunda animação, O coelho de Sevilha (Rabbit of Seville), desenrola-se no palco do Hollywood Bowl, no qual irrompem Pernalonga e Hortelino durante uma perseguição. Stalling mantém quase integralmente a estrutura básica da peça rossiniana, suprimindo algumas passagens repetitivas e adotando um andamento mais rápido para adequá-la à duração do desenho dirigido por Chuck Jones. Richard Freedman acredita que a parceria entre Stalling e Jones tenha alcançado o apogeu nessa fita, na qual a música de Rossini serve de andaime a uma “disputa inesquecível”. As ideias musicais – melodias líricas, síncopes orquestrais repentinas, o crescendo rossiniano – são traduzidas em “tesouras cortantes, legumes voadores, cadeiras de barbeiro rodantes e uma corrida armada burlesca”.
A junção entre uma música conhecida e personagens conhecidos proporciona “momentos sublimes de pantomima cômica”, um dos quais é uma brincadeira com As bodas de Fígaro (1786), de Wolfgang Amadeus Mozart. Se o filme revela as possibilidades cômicas da peça de Rossini, não se pode esquecer que Jones concebe “uma ópera dentro da ópera”[14], diretamente relacionada com o eterno embate entre Hortelino e Pernalonga. Goldmark não teme afirmar que se a música guia a ação, é indubitável, porém, que a sequência de gags remete mais à comédia pastelão do que à ópera em si.
A música de Rossini sublinha com grande eficácia as situações cômicas do enredo e o transformismo de Pernalonga – barbeiro, odalisca, encantador de serpentes –, o qual sujeita Hortelino a todo tipo de tratamento, frequentemente com resultados vexatórios. O momento mais hilariante é, sem dúvida, o casamento entre Hortelino e Pernalonga, ao som da Marcha nupcial (1842), de Felix Mendelssohn. Vestido de noiva, Hortelino acaba finalmente caindo num grande bolo ornamentado com os dizeres As bodas de Fígaro. Pernalonga, por sua vez, olha para a câmera, sorri, rompe a quarta parede e exclama “O próximo”, enquanto come uma cenoura.
Freedman não discorda de todo da hipótese aventada por Goldmark, quando escreve que os sons desses desenhos “tolos” podem levar a admirar a capacidade artística e a erudição, inspiradas, às vezes, pela loucura. Além disso, o crítico destaca que o uso da música clássica nas trilhas sonoras desses filmes tem uma função educativa: pode servir de ponto de entrada nos “distantes mundos musical e tímbrico” para um público jovem que, de outro modo, não teria contato com esse repertório. Nisso é acompanhado por Hilary Poriss, para quem O coelho de Sevilha pode ser considerado “a introdução de mais longo alcance e sem igual dessa música fora do teatro lírico”, dirigida não apenas ao público infantil, mas igualmente aos adultos.
Evidentemente, essa função educativa assume tons próprios, pois os diretores musicais das fitas de animação não demonstram nenhuma reverência pelas peças com as quais trabalham, provenientes, em geral, de um repertório já conhecido. Se, de um lado, confiam no significado histórico das músicas selecionadas, de outro, não hesitam em dobrá-las aos desígnios da produção. Reduzem sua duração, imprimem um ritmo mais acelerado a certos trechos, concebem verdadeiras caricaturas, propõem novas orquestrações, pois o que importa de fato é situar uma cena, caracterizar um personagem e uma situação, sugerir um estado de espírito. Leonard Maltin é bem enfático a esse respeito, quando lembra de que modo a música constitui a espinha dorsal das animações. Cabe-lhe o papel de impulsionar e comentar as ações, salientar a comédia, realçar a atmosfera e acelerar as perseguições.
Tendo como fio condutor o trabalho de Stalling e Bradley, Daniel Goldmark e Yuval Taylor escrevem que estes não se limitaram a narrar musicalmente os episódios que orquestraram: acrescentaram velocidade a tombos, dor às bigornas na cabeça, amor, paixão e ritmo a cada sequência de dança que passava por suas mesas de trabalho. Desse modo, conseguiram algo mais do que adicionar vida a suas criações: eles tornaram os desenhos animados “maiores do que a vida”. Para Michael Barrier, a inovação de Stalling deve ser buscada no modo como ele encadeava trechos de diferentes melodias, estabelecendo, não raro, elos entre elas. Graças a “pontes” de material original, o compositor conseguia resultados originais, mesmo quando voltava para uma melodia ou se detinha nela para conseguir um efeito cômico.
Freedman, por sua vez, amplia o significado dessa “reciclagem enérgica” de peças operísticas bem conhecidas, ao inseri-las numa longa tradição de paródias escritas para os palcos populares no século XIX, que incluíam sátiras de Wagner e Giacomo Meyerbeer e alusões a Christoph Gluck, no caso de Jacques Offenbach. Cada teatro nacional parece ter optado por “esvaziar a seriedade extenuada de suas formas de arte elevadas, não raro exagerando seus traços marcantes e justapondo-os com formas triviais”. Essa “mistura audaciosa de idiomas e estilos” não olha apenas para o passado.
Ela tem relações com as experiências da vanguarda musical do século XX, que lançou mão de recursos como a colagem e a citação, como demonstram os exemplos de Erik Satie, Karlheinz Stockhausen, Mauricio Kagel, Luciano Berio, Bernd Alois Zimmermann, Charles Ives e George Rochberg. Inserido nesse contexto, o “mickeymousing” deve ser visto como uma linguagem específica que, longe de trivializar a música clássica por associá-la com uma ação que se desenrola na tela, lhe confere uma nova vitalidade e uma nova possibilidade de escuta fora dos esquemas consagrados, feita de dissonâncias e descontinuidades, em sintonia com a sensibilidade do século XX.
*Annateresa Fabris é professora aposentada do Departamento de Artes Plásticas da ECA-USP. Autora, entre outros livros, de Realidade e ficção na fotografia latino-americana (Editora da UFRGS).
Referências
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Notas
[1] Stalling nega que tenha inserido um trecho de Grieg, mas David Smith, do Arquivo Disney, afirma que o estúdio obteve permissão para usar a música no curta-metragem.
[2] Andrade está se referindo ao Gato Félix, criado por Otto Messmer para o estúdio de Pat Sullivan (1919). Ele demora para aderir ao novo tipo de cinema e, num primeiro momento, contrata Jacques Kopfstein para acrescentar uma trilha sonora a quinze desenhos silenciosos. Nem sempre a sincronização é perfeita, podendo existir um pequeno hiato entre a ação e o efeito sonoro. Entre 1929 e 1930, o Estúdio Sullivan realiza doze películas com som original. Como os cinemas não divulgavam os títulos dos complementos, não é possível determinar quais foram os filmes vistos por Andrade.
[3] Stalling foi também responsável pelas trilhas sonoras de Summer (1930) e Autumn (1930), mas não foram encontrados dados sobre as músicas utilizadas.
[4] A relação de desenhos animados que utilizam a ária foi encontrada em “Largo al factotum”. Sobre um dos títulos listados – The talking dog –, só foi possível apurar que a animação, dirigida por Alex Lovy, data de 1956.
[5] O título é uma brincadeira com o nome da capital do Japão (Tokyo em inglês) e o termo “joke” (troça), já que seu alvo principal são os nipônicos.
[6] O título é um jogo de palavras com “uproar” (rebuliço) e “opera”.
[7] Em maio de 1967, um dos episódios da série The inspector (1965-1969), produzida por DePatie-Freleng Enterprises, retoma o enredo do gato barulhento (Le quiet squad). Inspirado na figura de Jacques Clouseau, de A pantera cor de rosa (The pink panther), dirigido por Blake Edwards (1963), o inspetor tenta evitar que o comissário estressado seja perturbado por qualquer barulho. Porém, um gato põe em risco o desígnio: mia; toca A Marselhesa e dança em cima do telhado para celebrar o 14 de julho; tenta acender fogos de artifício; começa a cantar em cima da cerca, mas é alvejado pelo inspetor. Sua morte não resolve a questão, pois as nove vidas do felino entoam um canto.
[8] O motivo dos espectros das nove vidas tinha sido utilizado em Dinner time, de maneira bastante criativa. Depois de cair da corda cortada pelo pica-pau, o gato vê suas vidas ascenderem. Agarra-se à última e volta a subir apressado.
[9] The Ink Spots foi um grupo vocal de jazz atuante entre 1934 e 1954. Bill Kenny foi seu primeiro tenor a partir de 1936.
[10] Em 1954, o segmento é lançado isoladamente, sob o título de Willie the operatic whale.
[11] Consta que Disney não conseguiu adquirir os direitos da ária, levando Nelson Eddy, responsável pelos vários timbres do segmento (soprano, tenor, barítono e baixo), a escrever uma peça que a evocava, inclusive com os famosos soluços.
[12] A tradução literal de “foiled” seria “derrotado”, mas o título é uma paródia do longa-metragem Kitty Foyle (1940), dirigido por Sam Wood.
[13] A abertura já tinha sido utilizada pelo compositor em duas óperas anteriores: Aureliano in Palmira (1813) e Elisabetta, regina d’Inghilterra (1815).
[14] A ideia de uma “ópera dentro da ópera” ganha reforço com o cartaz que anuncia a récita de O barbeiro de Sevilha. Nele aparecem os nomes italianizados de três intérpretes: Eduardo Selzeri (o produtor Edward Selzer), Michele Maltese (o autor do enredo Michael Maltese) e Carlo Jonzi (o diretor Chuck Jones).