Por JULIAN RODRIGUES*
Muito antes de Monark o neoconservadorismo vem cavando raízes no Brasil, dando voz a idiotas e fascistas
Jair M. Bolsonaro não foi um raio em céu azul. O reacionarismo crescia há tempos no Brasil, na forma de um neoconservadorismo. Macaqueando os EUA, já tínhamos aqui nossos fundamentalistas religiosos, nossos humoristazinhos reaças e sem graça e todo um movimento político-cultural que vinha abrindo espaço, alargando imites. Lembrem-se de programas televisivos como CQC, ou o lixo do Pânico.
Esse neoconservadorismo, inspirado no Tea Party estadunidense, bem antes até do Trump virar modinha, foi cavando raízes aqui. Bolsonaro não teria sido eleito se o ambiente sócio-cultural-político não estivesse tão contaminado pelas ideias, valores e símbolos neocons.
O Pânico na TV (2003-2012) foi um dos vetores importantes na construção do ambiente reacionário, para não falar do CQC, entre tantos outros. Mesmo durante os governos do PT, avançou muito e de todo jeito, a difusão de valores conservadores, moralistas, reacionários, autoritários, racistas, machistas, homofóbicos e transfóbicos.
Bruno Monteiro Aiub, vulgo “Monark” é só a bola de vez. Sintoma e símbolo.
As redes sociais e todas inovações e tal vieram juntas com muito irracionalismo, fora a permissão tácita de divulgar qualquer besteira como se fosse algo sério, mais os discursos de ódio e as oportunidades para que qualquer bobalhão ou bobalhona ficassem famosos, ricas e ricos, desde que abarrotados de cliques.
O Flow Podcast é um dos maiores desse segmento. Apresentado por Igor Coelho (discreto e preciso) e por Monark, virou referência.
Monark nunca escondeu sua abissal ignorância. Pelo contrário, se orgulha de ser inculto e iletrado. Em inúmeras entrevistas, passou muita vergonha – mas sempre mantendo a pose. Defensor do capitalismo neoliberal de forma aberta, mesmo sem muitos argumentos, sei lá por qual razão esse podcast bombou muito.
Um dia a casa cai. No último dia 7 de fevereiro, entrevistando a deputada funcionária do bilionário Jorge Paulo Lehman (Tábata Amaral) e Kim Kataguiri, Monark soltou pérolas indigestas. Defendeu abertamente o direito dos nazistas se organizarem em um Partido. (Antes de defender os nazi, o moço disse que a esquerda radical tem muito mais espaço que a direita radical).
Além de defender o direito dos nazistas, o gênio Monark diz que “ a gente tem que liberar tudo, porque se o cara quiser ser anti-judeu ele tem o direito de ser”.
Nem vamos destacar agora que o nazismo não perseguia somente judeus, mas também a população LGBT, ciganos, comunistas, pessoas com deficiência.
Monark não está sozinho. Já faz um tempinho que a extrema-direita e os neofascistas de Bolsonaro vêm difundindo a ideia de que a liberdade de expressão é ilimitada. Não, não é. Os direitos humanos são um conjunto indissociável, nenhum deles se sobrepõe ao outro. A liberdade de expressão não é maior que o direito à dignidade humana, à pluralidade, à não discriminação.
Discurso de ódio não é direito humano. Liberdade de expressão não é permissão para propagar discriminação. Disseminar ofensas não é algo protegido pela liberdade de expressão. Ninguém pode falar algo que desqualifique outro ser humano e incite o ódio.
O fato é que o imbecil do Monark só chegou a esse ponto porque estamos num ambiente toxico. Monark é cria do bolsonarismo. Não vai ser suficiente derrotar Bolsonaro nas urnas. Vamos ter que construir um movimento amplo de “desfascistização” do Brasil. Muita luta cultural. Ideológica. Disputa de valores. Sem concessões.
Contra o autoritarismo, a democracia. Contra o machismo, a igualdade de gênero. Contra a violência, a cultura de paz. Enfrentar já o racismo com a afirmação dos direitos da população negra nesse país preto. No lugar da discriminação às LGBT, o respeito à diversidade sexual e de gênero.
Sairá a manipulação da fé popular e o fundamentalismo religioso. Alternativamente propagaremos a laicidade do Estado e a pluralidade das crenças. Desbolsonarizar o Brasil não será tarefa fácil. E nem imediata. Contudo, a luta pela democracia precisa começar imediatamente. Mas não dá mais para contemporizar com os monarks da vida (bolsominions em profusão). O fascismo deve ser esmagado, de frente, sem tergiversação, sem titubeios. A batalha cultural, nos meios de comunicação, no dia a dia é imprescindível. Cercear os espaços desses imbecis neofascistas.
*Julian Rodrigues, professor e jornalista, é ativista LGBT e dos Direitos Humanos.