A cena brasileira – XI

Imagem: Lara Mantoanelli
Whatsapp
Facebook
Twitter
Instagram
Telegram

Por BENICIO VIERO SCHMIDT*

Comentários sobre acontecimentos recentes.

O grande destaque da semana, sem dúvida, será a instalação e o funcionamento da CPI da COVID-19. Ela foi instalada nessa terça-feira, 27, com o senador Omar Aziz de presidente, Randolfe Rodrigues de vice, e Renan Calheiros de relator, apesar da oposição governamental e apesar da liminar, que caiu, vetando a sua condução à relatoria.

Não se espera muito dessa Comissão, a não ser a publicização em massa das informações que denunciam um mau comportamento do Executivo Federal na condução da pandemia, especialmente promessas de compras não realizadas de vacinas. Estará na pauta também as ações dos governos estaduais contra a União, a favor das vacinas; e a posterior perseguição da Procuradoria Geral da República contra dezessete governos estaduais, alegando malversação de verbas e problemas na administração da vacinação.

A comissão tem no mínimo 90 dias para funcionar, podendo existir durante até um ano, ou seja, até às vésperas da eleição de 2022. Pode vir a ser a melhor publicidade que a oposição terá acerca das agruras cultivadas pela má condução da política de vacinação e de contenção da pandemia. Não deixa de ser interessante observar que o governo, por meio da Casa Civil, já levantou vinte e três questões – como se fosse um shadow cabinet, um governo nas sombras contra a si mesmo – na preparação de seus quadros para os interrogatórios da CPI, especialmente o ex-ministro Eduardo Pazuello e o ex-secretário do Exército responsável pela compra e fabricação em massa de cloroquina.

Não se espera muito de um processo de investigação que poderia, teoricamente, redundar inclusive no impeachment do presidente Jair M. Bolsonaro, pois as circunstâncias não parecem favoráveis a isso. Estimo que o grande mérito dessa CPI virá a ser a publicização dos atos do governo Federal.

Ressalte-se, também, que o juiz Marco Aurélio de Mello, do STF, acaba de mandar ao plenário um pedido do PSol e de outros partidos de esquerda solicitando a instalação de uma Comissão independente de cientistas, membros do Poder Judiciário e do parlamento, além do executivo, para orientar a condução da pandemia. Trata-se de mais um ingrediente na luta contra o modo como tem sido tratada a disseminação da pandemia pelo Brasil afora.

24 horas após o pronunciamento do presidente do Brasil na Cúpula do Clima comandada por Joe Biden e Kamala Harris (presidente e vice-presidente dos EUA), Jair Bolsonaro, ao sancionar o orçamento federal de 2021, cortou mais de 200 milhões do Instituto Chico Mendes e do Ibama, órgãos responsáveis pela fiscalização da política ambiental, especialmente na região Amazônica, no Cerrado e no Pantanal.

Além disso, uma portaria interna do Ministério do Meio-ambiente faz com que as multas pelo descumprimento da legislação ambiental deixem de ser expedidas diretamente pelos fiscais do Ibama. Doravante terão de ser encaminhadas a um superior que aprovará ou não a efetividade da multa. Isso significa que haverá um controle absoluto sobre quem deve e quem não deve explorar e desmatar a Amazônia, o Cerrado e o Pantanal. Mais um passo do governo brasileiro para a desmoralização do Brasil no contexto global de políticas ambientais necessárias para zerar o carbono nas próximas décadas. Um vexame.

A não realização pelo IBGE do Censo econômico e demográfico neste ano é uma não-política ativa, que visa, sob o pretexto de não haver recursos disponíveis no orçamento, cercear a captação de informações necessárias para a formulação de políticas públicas no Brasil. Um ato discricionário profundamente negativo que afeta todas as instâncias que tomam decisões sobre políticas públicas no país.

Na pauta do Senado encontra-se um Projeto de lei, previsto para votação nesta semana, sobre a quebra de patentes dos produtos farmacêuticos utilizados no tratamento da COVID-19. Os grandes laboratórios são contra, o Executivo brasileiro é contra, e algumas forças de oposição são a favor da quebra de patentes.

Os laboratórios afirmam (e ameaçam) que se houver a quebra o Brasil não poderá comprar medicamentos por conta de um provável boicote dos grandes grupos farmacêuticos internacionais. Ora, isso é discutível. A atual Birmânia quebrou as patentes e fornece medicamentes para tratamento da COVID-19 a vários países do mundo. No plano interno, durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, o então ministro da saúde José Serra quebrou as patentes dos medicamentos necessários para a proteção da população em relação ao HIV.

O ministro Paulo Guedes demitiu o secretário da Fazenda (nos governos anteriores o cargo tinha estatuto de ministério), ao mesmo tempo em que o líder de Centrão e presidente da Câmera dos deputados, Arthur Lira coloca na pauta a Reforma Tributária.

*Benicio Viero Schmidt é professor aposentado de sociologia na UnB. Autor, entre outros livros, de O Estado e a política urbana no Brasil (LP&M).

Outros artigos de

AUTORES

TEMAS

MAIS AUTORES

Lista aleatória de 160 entre mais de 1.900 autores.
Anderson Alves Esteves Ronald Rocha Carlos Tautz Mário Maestri Luiz Bernardo Pericás João Paulo Ayub Fonseca Fernando Nogueira da Costa Lorenzo Vitral João Feres Júnior Marcos Aurélio da Silva Eduardo Borges Ricardo Fabbrini Eleutério F. S. Prado Valerio Arcary Luiz Roberto Alves Luís Fernando Vitagliano Leonardo Boff Antonino Infranca Paulo Nogueira Batista Jr Samuel Kilsztajn Daniel Brazil João Adolfo Hansen Celso Frederico João Sette Whitaker Ferreira José Raimundo Trindade Igor Felippe Santos Roberto Bueno Remy José Fontana Gabriel Cohn Jorge Luiz Souto Maior Mariarosaria Fabris Flávio Aguiar Plínio de Arruda Sampaio Jr. Dênis de Moraes Caio Bugiato Henri Acselrad Alexandre de Freitas Barbosa Marilia Pacheco Fiorillo Denilson Cordeiro Roberto Noritomi Michael Löwy Manuel Domingos Neto André Márcio Neves Soares Luiz Carlos Bresser-Pereira Jorge Branco Gilberto Maringoni Milton Pinheiro Annateresa Fabris Berenice Bento Flávio R. Kothe Boaventura de Sousa Santos Sergio Amadeu da Silveira Armando Boito Eugênio Trivinho José Micaelson Lacerda Morais João Carlos Loebens Atilio A. Boron Ladislau Dowbor Alexandre de Lima Castro Tranjan Daniel Costa Paulo Fernandes Silveira Valerio Arcary Chico Alencar Daniel Afonso da Silva Airton Paschoa José Luís Fiori Kátia Gerab Baggio Rubens Pinto Lyra Marcelo Módolo Slavoj Žižek André Singer Tadeu Valadares Leonardo Avritzer Tarso Genro Paulo Martins Francisco Pereira de Farias Henry Burnett Marcelo Guimarães Lima Lucas Fiaschetti Estevez José Geraldo Couto Osvaldo Coggiola Eleonora Albano Renato Dagnino Luiz Eduardo Soares Anselm Jappe Heraldo Campos Julian Rodrigues Luciano Nascimento Benicio Viero Schmidt Juarez Guimarães Yuri Martins-Fontes Luis Felipe Miguel José Costa Júnior Francisco Fernandes Ladeira Marilena Chauí Walnice Nogueira Galvão Carla Teixeira Liszt Vieira Bento Prado Jr. Ricardo Musse Gerson Almeida Alysson Leandro Mascaro Rafael R. Ioris Paulo Capel Narvai Ricardo Abramovay Fernão Pessoa Ramos Paulo Sérgio Pinheiro Marcos Silva Claudio Katz Eliziário Andrade Eugênio Bucci Michael Roberts Sandra Bitencourt Vanderlei Tenório Matheus Silveira de Souza Everaldo de Oliveira Andrade Jean Marc Von Der Weid José Dirceu Ronald León Núñez Maria Rita Kehl Marcus Ianoni Otaviano Helene Fábio Konder Comparato José Machado Moita Neto Luiz Renato Martins Jean Pierre Chauvin Leonardo Sacramento Vinício Carrilho Martinez Bruno Machado Ari Marcelo Solon Leda Maria Paulani Andrew Korybko Ricardo Antunes Antonio Martins Priscila Figueiredo Érico Andrade Francisco de Oliveira Barros Júnior João Lanari Bo Vladimir Safatle Lincoln Secco Luiz Werneck Vianna Thomas Piketty Manchetômetro Marjorie C. Marona João Carlos Salles Afrânio Catani Rodrigo de Faria Alexandre Aragão de Albuquerque Luiz Marques Celso Favaretto Chico Whitaker Bruno Fabricio Alcebino da Silva Dennis Oliveira Gilberto Lopes Bernardo Ricupero Elias Jabbour Antônio Sales Rios Neto Tales Ab'Sáber Salem Nasser Ronaldo Tadeu de Souza

NOVAS PUBLICAÇÕES

Pesquisa detalhada