Por JOSÉ MICAELSON LACERDA MORAIS*
Reflexões sobre o dilema razão/humanização no processo histórico de desenvolvimento do capitalismo.
Introdução
Por que a razão ainda não foi capaz de humanizar o nosso mundo? Nem a razão iluminista ou qualquer outra, desde então, foi capaz de eliminar a necessidade de luta pela existência entre os homens. Pelo contrário, serviu e serve, tão somente, para sofisticar e disfarçar tal luta, de forma que a nossa existência e reprodução, está mais associada as relações entre os seres vivos que existem na natureza que a um genuíno processo social. Na verdade, o dilema razão/humanização, se apresenta como um grande enigma, para o qual os grandes sistemas de pensamento, elaborados desde o Iluminismo até o presente, parecem ainda não ter encaminhado uma solução adequada. Pois, continuamos em um mundo de intensa exploração do homem pelo homem, de profundas desigualdades sociais, de relações sociais fundamentadas em dominação e dependência, em todos os níveis sociais e espaciais (local, regional, nacional e mundial), preconceitos e discriminações de todas as ordens e tons.
De forma geral, o papel do desenvolvimento da razão e da ciência tem sido o de proporcionar instrumentos e meios para perpetuar tal luta. O papel da razão e da ciência deveria caminhar no sentido de mostrar que a luta do homem não é contra ele mesmo, contra o outro, mas com, e pelo outro. Pois, se assim não o for, o sentido da razão não será diferente do sentido das relações entre os seres vivos que ocorrem na natureza. A única diferença entre a sociedade e a natureza, seria que nesta, a sobrevivência se realiza através da relação predador/presa, onde um é sacrificado para a existência do outro. Na sociedade, todavia, a existência não acontece pela morte da presa, mas através da exploração do trabalho humano. A habilidade de trabalhar dos humanos torna o benefício da exploração do trabalho muito mais vantajoso para a existência e reprodução social. Então, humanizar deveria significar uma forma de superar a luta pela existência no seio da sociedade, ou seja, usar a razão para igualizar a condição social e humana, e não o contrário; como observado ao longo da história humana. Acreditamos que já dispomos de conhecimento suficiente, das condições e dos meios necessários para tal empreitada, talvez apenas esteja faltando “pensar” um pouco mais a respeito.
A ideia da razão como princípio de organização social, subtendida em todo período, que compreende do iluminismo aos dias atuais, é de que as consequências necessárias da razão e da fala nos levaria da escuridão, representada por uma sociedade tipo feudal, para a luz, representada por uma “[…] esclarecida e iluminada sociedade de indivíduos independentes que racionam e discutem, permutam e trocam, homens justos e deliberados que enxergam através dos seus próprios preconceitos […]” (ROTHSCHILD, 2003, p. 18). Todavia, dessa ótica não enxergamos os fundamentos do processo. É como se olhássemos uma árvore de longe. De uma determinada distância não conseguimos enxergar o que acontece nos seus galhos: destruição. Na natureza a vida é ao mesmo tempo destruição, é luta pela existência, como Darwin (2005, p. 125), constatou: “[…] as aves que cantam alegremente ao nosso redor vivem geralmente de insetos ou de sementes, e […] assim estão constantemente destruindo a vida […]”. Se não entendermos realmente o significado da luta pela existência na natureza, se não conseguirmos fazer a analogia necessária, entre aquela luta e a nossa, de utilizar a nossa razão para superar e não para justificar tal luta, talvez nunca sejamos capazes de dar uma resposta adequada ao dilema razão/humanização. Capitalismo, Estado, socialismo real, representaram até agora apenas formas particulares da razão justificando a luta pela existência; não do seu uso para superar tal luta do seio da sociedade, em favor de uma sociabilidade genuinamente humana. Darwin é onde todos nós nos encontramos. Será somente a partir do entendimento do real significado da luta pela existência e suas implicações na sociabilidade humana que poderemos nos revolucionar enquanto humanidade: a nossa última revolução.
A incongruência do liberalismo econômico
Pareceu que com o Iluminismo havíamos, finalmente, alcançado o cerne do processo civilizatório. Os ideais de liberdade, igualdade e fraternidade, que emergiram da Revolução Francesa, e se espalharam pela Europa e pelo mundo, são resultado de uma iluminação racionalizada. Resulta daí a elaboração de uma doutrina ética para uma nova sociedade. A princípio, esta ética está voltada a demonstrar que se o homem age de forma virtuosa a sociedade será encaminhada para o melhor dos mundos. Portanto, para essa ética, a luta pela existência deixa de ser considerada em sua essência e, em seu lugar, passa a figurar, uma luta interior entre sentimentos virtuosos e sentimentos vis; entre vícios e virtudes. Daí resulta o liberalismo econômico e a ideia da mão invisível que o justifica, enquanto princípio de organização econômica e social.
A mão invisível tem como fundamento a doutrina do interesse: a ideia do auto-interesse como chave para a compreensão da ação humana; a transformação do vício da avareza na virtude do bem estar social. Doutrina que procurou explicar uma nova sociedade, baseada numa nova razão, a razão econômica, e que tinha como regra elementar de conduta para o indivíduo, a busca sem limites de valor econômico. Dessa forma, foi com a sistematização econômica de Smith, que “na sua forma limitada e domesticada, a ideia do aproveitamento [da mobilização das paixões] foi capaz de sobreviver e prosperar tanto como um dos princípios do liberalismo do século XIX quanto como uma construção fundamental da teoria econômica” (HIRSCHMAN, 2002, p.40). Pois, foi capaz de estabelecer uma “[…] poderosa justificativa econômica para a busca desenfreada do interesse próprio individual […]” (HIRSCHMAN, 2002, p.120).
Em 1993, o eminente Professor Giannetti, publicou um livro no qual procurava enquadrar a Economia na perspectiva ética. A sua tese é a da “ética como fator produtivo”, determinante do desempenho econômico, da riqueza da nação, e sua proposição central é a de que:
[…] a presença de valores morais e a adesão a normas de conduta são requisitos indispensáveis para que o mercado se firme como regra de convivência civilizada e se torne, alimentado pelo desejo de cada indivíduo de viver melhor, uma interação construtiva na criação de riqueza (GIANNETTI, 1993, p. 154).
Infelizmente, parece não existir sustentação no argumento do professor Giannetti. Simplesmente, porque quando confrontamos a “ética como fator produtivo” com o “fetiche do dinheiro” (mistificação do dinheiro), é a busca desenfreada do interesse próprio individual que parece sempre prevalecer. Pois, o dinheiro, na mão dos proprietários dos meios de produção, temo mágico poder de transmutar-se em capital (valor que se valoriza incessantemente). Nesse sentido, o dinheiro, de forma geral, e o capital, de forma particular, estão acima da ética e da moral. Prova cabal dessa afirmação está no padrão sistêmico de riqueza do capitalismo contemporâneo, representado pela financeirização. Conforme explicava Braga, ainda no ano de 1998, esse novo padrão, “[…] sinaliza um movimento desequilibrador da divisão internacional do trabalho e disparidades crescentes de renda, de riqueza e de sociabilidade; compreendidas como acesso ao emprego, à expansão vital e cultural, à conivência democrática e civilizada” (BRAGA, 1998, p. 238-239).
A dinâmica capitalista eleva o auto-interesse a uma posição muito além do princípio autorregulador previsto para a mão invisível, muito acima do comportamento ético e moral. Pois, o dinheiro “enquanto conceito existente e atuante de valor”, como Marx, ainda muito jovem, constatou:
[…] se apresenta também contra o indivíduo e contra os vínculos sociais etc., que pretendem ser, para si, essência. Ele transforma a fidelidade em infidelidade, o amor em ódio, o ódio em amor, a virtude em vício, o vício em virtude, o servo em senhor, o senhor em servo, a estupidez em entendimento, o entendimento em estupidez (MARX, 2008, p. 160).
A insuficiência do socialismo real
Para Marx, a realização da existência na história acontece a partir da luta de classes: “a história de todas as sociedades até hoje existentes é a história das lutas de classes” (MARX e ENGELS, 2010, p. 40). Contestou, assim, a realização da história pela oposição entre moralidade subjetiva e moralidade objetiva, como pensava Hegel. Para Marx, muito pelo contrário, “[…] o modo de produção da vida material condiciona o processo de vida social, política e intelectual […]” (MARX, 2008a, p.47).
[…] Na produção social da própria existência, os homens entram em relações determinadas, necessárias, independentes de sua vontade; essas relações de produção correspondem a um grau determinado de desenvolvimento de suas forças produtivas materiais. A totalidade dessas relações de produção constitui a base econômica da sociedade, a base real sobre a qual se eleva uma superestrutura jurídica e política e à qual correspondem formas sociais determinadas de consciência […] (MARX, 2008a, p.47).
No capitalismo, de forma específica, a luta ocorre entre duas grandes classes, burguesia e proletariado. Nesse contexto, a necessidade de governo e de administração não pode mais representar a forma de realização da liberdade. Passa a constituir, tão somente, uma forma de manutenção e reprodução de uma totalidade social determinada, com uma estrutura econômica específica, uma forma de propriedade e acumulação, que lhe são também específicas e a ela relacionadas. Para Hegel (1997, p. 149), o Estado, o domínio do direito, é a liberdade realizada, “[…] o fim e a realidade em ato da substância universal e da vida pública nela consagrada. […]”. Para Marx, o Estado é tão somente um comitê burguês.
[…] a burguesia, com o estabelecimento da grande indústria e do mercado mundial, conquistou, finalmente, a soberania política exclusiva no Estado representativo moderno. O executivo no Estado moderno não é senão um comitê para gerir os negócios comuns de toda a classe burguesa (MARX e ENGELS, 2010, p. 42).
No item 7, do capítulo XXIV, de “O capital”, intitulado, “tendência histórica da acumulação capitalista”, com base no contexto histórico de sua época, Marx, então anunciou “a hora derradeira da propriedade privada capitalista”, na qual os “expropriadores serão expropriados”. Esta conclusão é de uma lógica inquestionável, dado que, por um lado, o processo de concentração de riqueza e, por outro, a constituição de uma massa de proletários, com condições de organização política e formação de uma consciência de classe, tornava o processo de exploração injustificável.
Todavia, como sabemos hoje, o domínio de uma classe sobre outra, mesmo que com a melhor das intenções, pode não ser condição suficiente para levar a uma sociedade sem classes ou sem grupos privilegiados. O socialismo real do século XX nos permitiu levantar tal questão. Pois, nem a coletivização dos meios de produção por ele realizada eliminou a existência de grupos privilegiados dentro daquela sociedade. Sobre este ponto, a lucidez da análise de Hobsbawm, sobre o fim do socialismo real, é por demais reveladora. Em primeiro lugar, para o autor, o domínio do comunismo como ideologia se mostrou superficial, porque a “[…] aceitação do comunismo pelas ‘massas’ dependia não das convicções ideológicas ou outras semelhantes, mas de como julgavam o que a vida sob regimes comunistas faria por elas, e como comparavam sua situação com a de outros […]” (HOBSBAWM, 1995, p. 480). Em segundo lugar, a única forma de organização governamental possível foi um “[…] tipo de socialismo de comando implacável e brutal […]” (HOBSBAWM, 1995, p. 482); baseado na luta interna por poder e comando, e os privilégios a eles associados. E, em terceiro lugar,
[…] mesmo onde os regimes comunistas sobreviveram e tiveram êxito, como na China, abandonaram a ideia original de uma economia única, centralmente controlada e estatalmente planejada, baseada em um Estado completamente coletivizado – ou uma economia de propriedade coletiva praticamente operando sem mercado […] (HOBSBAWM, 1995, p. 481).
Portanto, o resultado da experiência socialista no século XX, realizou-se “[…] a um custo humano enorme […] uma economia sem saída e um sistema político em favor do qual nada havia a dizer […]” (HOBSBAWM, 1995, p. 481).
O dilema razão/humanização
Acreditamos por muito tempo que a razão seria a solução para a questão social, para humanização do homem. Talvez porque seja a própria razão o que nos diferencia dos outros animais. Mas, até os nossos dias, o uso da razão, mesmo com todo progresso científico proporcionado, não teve outro papel senão o de sofisticar a dominação e a exploração do homem pelo homem. Precisamos dar um passo além. Às vezes para dar um passo além precisamos dar dois passos para trás. Nesse caso, precisamos voltar até Darwin:
[…] estou convencido que nos parecerão obscuros, ou serão totalmente mal interpretados, todos os fatos relacionados com a economia da natureza, com a distribuição, com a raridade, a abundância, a existência e a variação. Quando contemplamos a natureza a mesma nos parece brilhante e jubilosa quando em situação de superabundância de alimentos, mas não vemos, ou não imaginamos, que as aves que cantam alegremente ao nosso redor vivem geralmente de insetos ou de sementes, e que assim estão constantemente destruindo a vida; ou comumente nos esquecemos de como é frequente serem esses pássaros cantores, e também seus ovos e filhotes, destruídos pelos predadores; tampouco trazemos na mente a lembrança de que, embora o alimento, no momento, seja abundante, nem sempre foi assim durante as estações do ano (DARWIN, 2005, p. 125).
A vida só é vida porque é destruição. Este último termo no nosso consciente está associado a tudo o que é contrário à vida. Mas na natureza, e talvez no nosso inconsciente, ele represente o fundamento da existência e da reprodução; como exposto de forma radiante por Darwin na citação anterior. Na natureza, existência e reprodução são de uma violência descomunal. Violência que significa, em muitos casos, dilacerar a presa viva, ir comendo sua carne enquanto ela ainda respira. Todavia, é destruição da presa assegura a existência e a reprodução do predador; a destruição da vida assegura a existência de vida.
Na sociedade humana, existência e reprodução não estão diretamente relacionadas a destruição como na natureza. Não precisamos matar o outro e comer, embora estejamos o tempo todo destruindo recursos. Mesmo porque, somos apenas variedades de uma mesma espécie, e até na natureza, a prática do canibalismo constitui mais uma exceção que uma regra. Muito embora, entre nós, isso também possa acontecerem situações extremas, como relatado na literatura e no cinema das mais variadas formas.
Ao longo do processo histórico de desenvolvimento da humanidade todas as sociedades foram constituídas numa dinâmica muito mais próxima da luta pela existência do que imaginamos. Até o presente nenhuma sociedade conseguiu eliminar tal lutado seio de suaestrutura.
No capitalismo, o processo de exploração da força de trabalho é apenas um dos aspectos da exploração do homem pelo homem. A dimensão total do processo exige entendermos o processo como uma forma de expropriação contínua, que parte de um tipo de relações sociais estreitamente relacionadas à luta pela existência, como observada na natureza. O próprio surgimento do capitalismo se expressa dessa forma.
Na história da acumulação primitiva, o que faz época são todos os revolucionamentos que servem de alavanca à classe capitalista em formação, mas, acima de tudo, os momentos em que grandes massas humanas são despojadas súbita e violentamente de seus meios de subsistência e lançadas no mercado de trabalho como proletários absolutamente livres. A expropriação da terra que antes pertencia ao produtor rural, ao camponês, constitui a base de todo o processo […]. (MARX, 2017, p. 787)
O roubo dos bens da Igreja, a alienação fraudulenta dos domínios estatais, o furto da propriedade comunal, a transformação usurpatória, realizada com inescrupuloso terrorismo, da propriedade feudal e clânica em propriedade privada moderna, foram outros tantos métodos idílicos da acumulação primitiva. Tais métodos conquistaram o campo para a agricultura capitalista, incorporaram o solo ao capital e criaram para a indústria urbana a oferta necessária de um proletariado inteiramente livre (MARX, 2017, p. 804).
Como Marx constatou, “a violência é uma potência econômica” e “parteira de toda sociedade velha que está prenhe de uma sociedade nova” (MARX, 2017, p. 821). O sistema colonial, por exemplo, foi um dos processos de mais brutal violência na trajetória da acumulação primitiva. Todavia, capitalismo desde seu início e de forma contínua, combina métodos econômicos (mercado) e métodos extra econômicos, no seu processo de reprodução e expansão. Nesse sentido, a acumulação primitiva, tanto faz parte da pré-história do capitalismo quanto da sua própria dinâmica de funcionamento.
Wood (2014), no seu livro “O império do capital”, discutiu a relação entre a força econômica e extraeconômica no capitalismo, tanto na era clássica do imperialismo quanto no que ela denominou de “novo imperialismo”. Como explica a autora, foi a Inglaterra a primeira a criar uma forma de imperialismo movido pela lógica do capitalismo; os imperativos capitalistas de competição, acumulação de capital e aumento da produtividade. Uma forma de imperialismo que vai além do domínio imperial ou da supremacia comercial, para incluir “armas inteiramente novas ao arsenal ideológico”, como o liberalismo econômico e “[…] as concepções pseudobiológicas de raça, que excluíam certos seres humanos não simplesmente por lei, mas pela natureza, do universo normal da liberdade e igualdade” (WOOD, 2014, p. 83).
Para Hobsbawm (2002), a era clássica do imperialismo pertenceu ao período entre 1975 e 1914, e constituiu um mundo onde os países “avançados” (o núcleo capitalista desenvolvido) dominaram os “atrasados”. Teve como causa a rivalidade entre economias industriais. O papel dos dominados apresentava-se sempre como uma contínua experiência de dependência e exploração. Por seu turno, Galeano no seu livro clássico As veias abertas da América Latina, analisou esse processo desde o nascimento do novo mundo. Para ele “um equívoco de grandiosas consequências”.
Não tem sido a nossa história uma contínua experiência de mutilação e desintegração, disfarçada de desenvolvimento? Séculos atrás, a conquista arrasou os solos para implantar culturas de exportação e aniquilou as populações indígenas nos socavões das minas e nas lavagens para satisfazer a demanda de prata e ouro de ultramar. A alimentação da população pré-colombiana que conseguiu sobreviver ao extermínio piorou com o progresso alheio. Em nossos dias, o povo do Peru produz farinha de peixe, muito rica em proteínas, para as vacas dos Estados Unidos e da Europa, mas as proteínas brilham pela ausência na dieta da maioria dos peruanos. A filial da Volkswagen na Suíça planta uma árvore para cada automóvel que vende, gentileza ecológica, ao mesmo tempo em que a filial da Volkswagen no Brasil arrasa centenas de hectares de matas que dedicará à produção intensiva de carne para exportação. Cada vez vende mais carne ao exterior o povo brasileiro, que raramente come carne. Darcy Ribeiro me dizia que uma república Volkswagen, no essencial, não é diferente de uma república das bananas. Para cada dólar que produz a exportação de bananas, apenas onze centavos ficam no país produtor, e desses onze centavos uma parte insignificante corresponde aos trabalhadores das plantações. Alteram-se as proporções quando um país latino-americano exporta automóveis? (GALEANO, 2019, p. 387)
O século XX, talvez tenha sido o século de maiores e mais amplas transformações já registradas na história humana. Seja através de eventos dramáticos como as duas guerras mundiais, a Revolução Russa, a Grande Depressão de 1929, ou pela Revolução Técnico-Científico-Informacional, nos anos 1970. Desta última, resultaram as novas configurações do capitalismo e de seu processo de acumulação de capital que, por sua vez, produziram esse “novo imperialismo”, com novas formas de expropriação extraeconômica (acumulação por espoliação e expulsões, por exemplo), e uma nova corrida entre países pelo poder hegemônico mundial.
Quando Marx escreveu o capítulo maquinaria e grande indústria, no livro I do capital, ele asseverou que a maquinaria no modo de produção capitalista, nada mais era no seu fundamento, que um meio para a produção de mais-valor. Afirmação que continuou extremamente válida para os novos setores e novas formas de acumulação derivados da Revolução Informacional. Nesse contexto, continuamos mais próximos da luta pela existência, como no mundo animal, que verdadeiramente na direção de uma sociedade mais humana.
Além da leitura, agora podemos ver imagens, contextos, e ouvir depoimentos sobre os resultados dessa nova etapa mundial do capitalismo. Alguns documentários são surpreendentes. Destacamos o documentário austríaco o “Pesadelo de Darwin”, de 2005, do Diretor Hubert Sauper, que retrata um verdadeiro processo de acumulação primitiva nas margens do Lago Vitória, o maior lago tropical do mundo, localizado na Tanzânia, nos anos 1960. Mais recentemente, em 2009, o famoso diretor Michael Moore, lançou o documentário “Capitalismo: uma história de amor”, no qual retrata não só as repercussões econômicas e sociais da crise de 2008, como também o avanço: da mercantilização (inclusive da delinquência juvenil); da privatização e precarização do trabalho; enfim, de como, para o autor, o capitalismo derrotou a democracia. Destacamos, por último, a série de streaming “Rotten”, especialmente os episódios da segunda temporada: a “guerra do abacate”; “águas turbulentas”; “doce negócio”; e “chocolate amargo”. Nesse último, por exemplo, foi retratada a miséria por trás dos pequenos produtores fornecedores de cacau e o papel dos intermediários, diante de uma forma de produção que lembra a dinâmica do setor têxtil da Revolução Industrial Inglesa. Um dos mais impressionantes tratou da indústria da água engarrafada: domínio de exploração de grandes corporações que atuam em detrimento da própria vida humana.
Neste século também, alguns autores como Saskia Sassen e David Harvey, retomaram o tema da acumulação primitiva nas atuais condições do capitalismo. Sassen, no seu livro “Expulsões”, de 2014, tratou do que ela denominou de “novas lógicas de expulsão”. O título de sua introdução já se apresenta bastante sugestivo, “a seleção selvagem”. Para ela, essa nova fase do capitalismo avançado reinventou os mecanismos de acumulação primitiva, seja através de inovações que aumentaram a capacidade de extração de recursos naturais, resultando em extensões cada vez maiores de terras e águas mortas; seja através de operações complexas e de muita inovação especializada, relacionadas, por exemplo, a logística das terceirizações ou ao algoritmo das finanças, fazendo ressurgir formas extremas de pobreza e brutalização social.
Enfrentamos um terrível problema em nossa economia política global: o surgimento de novas lógicas de expulsão. Nas duas últimas décadas, houve grande crescimento da quantidade de pessoas, empresas e lugares expulsos das ordens sociais e econômicas centrais de nosso tempo. Essa guinada em direção à expulsão radical foi possibilitada por decisões elementares em alguns casos; em outros, por algumas de nossas conquistas econômicas e técnicas mais avançadas. O conceito de expulsões leva-nos além daquela ideia que nos é familiar da desigualdade crescente como forma de entender as patologias do capitalismo global atual. Também põe em primeiro plano o fato de que algumas formas de conhecimento e inteligência que respeitamos e admiramos muitas vezes estão na origem de longas cadeias de transação que podem terminar em simples expulsões. (SASSEN, 2016, p. 9)
Já Harvey, no seu livro “O novo imperialismo”, de 2003, descreveu o que ele denomina de “acumulação via espoliação”. O termo espoliação foi utilizado pelo autor porque, no seu entender, as características da acumulação primitiva, descritas por Marx, ainda, constituem um processo em andamento na geografia histórica do capitalismo. A citação seguinte contém alguns parágrafos do referido livro e sintetizam de forma precisa a acumulação primitiva em nosso tempo. Mas principalmente, retratam à semelhança existente, mesmo como todo desenvolvimento técnico ocorrido desde a Revolução Industrial Inglesa, entre os processos naturais da luta pela existência, como descrito por Darwin, e os processos sociais de existência e reprodução do homem.
[…] A expulsão de populações camponesas e a formação de um proletariado sem terra tem se acelerado em países como o México e a Índia nas três últimas décadas; muitos recursos antes partilhados, como a água, têm sido privatizados (com frequência por insistência do Banco Mundial) e inseridos na lógica capitalista da acumulação; formas alternativas (autóctones e mesmo, no caso dos Estados Unidos, mercadorias de fabricação caseira) de produção e consumo têm sido suprimidas. Indústrias nacionais têm sido privatizadas. O agronegócio substituiu a agricultura familiar. E a escravidão não desapareceu (particularmente no comércio sexual). […]
O sistema de crédito e o capital financeiro se tornaram, como Lenin, Hilferding e Luxemburgo observaram no começo do século XX, grandes trampolins de predação, fraude e roubo. […]
A biopirataria campeia e a pilhagem do estoque mundial de recursos genéticos caminha muito bem em benefício de umas poucas grandes companhias farmacêuticas. A escalada da destruição dos recursos ambientais globais (terra, ar, água) e degradações proliferantes de hábitats, que impedem tudo exceto formas capital-intensivas de produção agrícola, também resultaram na mercadificação por atacado da natureza em todas as suas formas. A transformação em mercadoria de formas culturais, históricas e da criatividade intelectual envolve espoliações em larga escala (a indústria da música é notória pela apropriação e exploração da cultura e da criatividade das comunidades). A corporativização e privatização de bens até agora públicos (como universidades), para não mencionar a onda de privatizações (da água e de utilidades públicas de todo gênero) que tem varrido o mundo, indicam uma nova onda de ‘expropriação das terras comuns’. […] A regressão dos estatutos regulatórios destinados a proteger o trabalho e o ambiente da degradação tem envolvido a perda de direitos. A devolução de direitos comuns de propriedade obtidos graças a anos de dura luta de classes (o direito a uma aposentadoria paga pelo Estado, ao bem-estar social, a um sistema nacional de cuidados médicos) ao domínio privado tem sido uma das mais flagrantes políticas de espoliação implantadas em nome da ortodoxia neoliberal. (HARVEY, 2004, p. 121-123)
Para Žižek (2011, p. 18), uma nova classe global, resultante do regime de acumulação capitalista com dominância financeira, tem contribuído para o estabelecimento de novas formas de apartheid.
Na China contemporânea, os novos-ricos construíram comunidades isoladas de acordo com o modelo idealizado de uma cidade ocidental ‘típica’; perto de Xangai, por exemplo, há uma réplica ‘real’ de uma cidadezinha inglesa, com uma rua principal, pubs, uma igreja anglicana, um supermercado Sainsbury etc.; a área toda é isolada das cercanias por uma redoma invisível, mas nem por isso menos real. Não há mais hierarquia de grupos sociais dentro da mesma nação: os moradores dessa cidade vivem num universo em que, em seu imaginário ideológico, o mundo circundante da “classe baixa” simplesmente não existe […] São Paulo […] ostenta 250 helipontos em sua área central. Para evitar o perigo de se misturar com gente comum, os ricos de São Paulo preferem utilizar helicópteros, de modo que, olhando para o céu da cidade, temos realmente a impressão de estar numa megalópole futurista do tipo que se vê em filmes como Blade Runner ou O quinto elemento: as pessoas comuns enxameando as perigosas ruas lá embaixo e os ricos flutuando num nível mais alto, no céu.
Revolução econômica já: necessidades sociais iguais, rendimentos monetários iguais, independentemente da função social
Em uma sociedade tão distópica como a nossa, a moralidade figura somente como mais uma forma de reificação. Além do fetiche da mercadoria e do fetiche do dinheiro, parece existir um outro de fetiche no qual o objeto fetichizado é o próprio homem em suas relações sociais. Para apresentar o nosso argumento para fraseamos a exposição de Marx relacionada ao que as mercadorias diriam se pudessem falar. A nossa apresentação é a seguinte.
É possível que o nosso valor de uso enquanto homens (atributo de ser consciente e autônomo como ser social), tenha algum interesse para o capital. A nós e entre nós, como homens-coisas, o valor de uso em si não diz respeito, porque aceitamos que somos somente um meio para um fim, do capital. O que nos diz respeito reificadamente é o quanto podemos ser explorados (gerar mais valor); disso não reclamamos, pois de algum modo somos convencidos do sonho da riqueza abstrata que nos espera no fim do caminho. Porém, nossa própria circulação, como coisas-mercadorias, nos afasta e nos condena a uma alienação perpétua, tanto no plano vertical quanto no horizontal. A primeira, diz respeito a alienação da relação capital/trabalho. A segunda, retrata a alienação entre nós, homens-coisas, que nos relacionamos uns com os outros apenas como valores de troca, como indivíduos abstratos, cada vez mais individualizados e bestializados, pelas novas tecnologias. Aguardamos apenas as ordens do capital (simbolizando o homem-homem, o verdadeiro, o caminho), emitidas para poucos de nós que permaneceremos coisas, àqueles de nós não chamados nem coisas poderemos mais ser.
A fetichização do homem acontece quando as relações sociais entre os mesmos são mediadas pelo homem como não ser, como coisa, o homem-coisa, alienado, bestializado e coisificado, tanto pela relação capital/trabalho quanto pelas relações sociais no próprio mundo do trabalho. Esse fetiche faz parte dos resultados humanos da Revolução Técnico-Científico-Informacional. Especificamente o de promover um processo incessante de fetichização do homem ao lhe proporcionar uma falsa sensação de autonomia, liberdade e de autoconhecimento. O texto original de Marx é o seguinte:
Se as mercadorias pudessem falar, diriam: é possível que nosso valor de uso tenha algum interesse para os homens. A nós, como coisas, ele não nos diz respeito. O que nos diz respeito materialmente [dinglich] é nosso valor. Nossa própria circulação como coisas-mercadorias [Warendinge] é a prova disso. Relacionamo-nos umas com as outras apenas como valores de troca (MARX, 2017, p 128).
Um novo padrão de sociabilidade que nos afaste da luta pela existência e nos aproxime da ideia de humanidade, somente será possível a partir de um novo princípio: dos rendimentos monetários iguais para necessidades sociais iguais, independentemente das funções sociais. Para tanto, precisamos formar uma nova consciência, para um novo paradigma, no qual sejam eliminadas as ideias de meritocracia e plutocracia. No estágio atual do conhecimento humano, no qual as funções sociais são plenas de sentido, no qual existe um grande alcance da educação e da formação intelectual, embora de forma bastante desigual, essa parece ser uma ideia possível.
Apresentamos em linhas muito gerais, algumas sugestões para tal empreitada. O desenvolvimento e a implementação de outras formas de humanização ficarão a cargo dos leitores, de gestores…, enfim, dos diversos atores sociais, como um exercício de imaginação, mudança de consciência e ação, muita ação.
Comecemos com um exemplo prático. Utilizamos informações do portal da transparência do Ceará referentes a uma determinada Instituição de Ensino Superior (I.E.S). Em dezembro de 2020, em termos de servidores ativos, esta I.E.S. contava com 764 matrículas e um total de R$ 6.312.001,24, em pagamento de salários. A distância entre o menor salário (R$ 1.066,04) e o maior salário (R$ 27.232,44), era de 27 vezes. Significa dizer que o salário de 01 funcionário equivale ao de 27, ou em termos de valor de troca, 01 humano vale por 27, segundo a lógica da economia vulgar. Existem distâncias exponencialmente maiores nos setores financeiros modernos. Por exemplo, o salário de um CEO, maior cargo hierárquico de uma grande empresa, que inclui o salário mensal e também bônus e outras vantagens, pode chegar a R$ 46,880 milhões anuais. Esta foi justamente a remuneração do diretor-presidente do Itaú Unibanco, em 2018. Comparado ao menor salário da I.E.S., mesmo o de 2020, em valores mensais, representa, simplesmente, uma diferença de 3.665 vezes. Considerando agora, o salário de um Doutor da I.E.S., professor associado no último nível de progressão, o salário mensal de um CEO equivale ao de 216 doutores. Dificilmente encontraremos justificativa aceitável para essa realidade moral do capitalismo.
A lógica corrente de remuneração é que o professor, porque passou mais tempo estudando, deve obter um rendimento diferenciado; o sistema da meritocracia. Todavia, um auxiliar de serviços gerais, o funcionário que tem o menor salário, do ponto de vista social, tem as mesmas necessidades que o professor. Ora, parece plausível que o que tem de ser diferente é a forma de ingresso de ambos no serviço público, não os rendimentos; já que ambos têm necessidades sociais iguais, que somente podem ser satisfeitas de igual forma através de rendimentos monetários também iguais. A discussão sobre a questão do incentivo, de que com salários iguais ninguém escolherá determinadas funções sociais, é uma discussão que nos foge no momento. O que podemos adiantar para uma reflexão do leitor é que diferenças intelectuais e físicas podem adequar pessoas e funções, em lugar da diferença de remuneração.
Imaginemos agora, que a partir de encontros e discussões entre os funcionários da referida I.E.S., houvesse uma mudança de consciência, e que existisse um mecanismo legal no qual a administração superior, de acordo com a vontade estabelecida, solicitasse ao governo do estado do Ceará igualizara remuneração de todos. Existem duas formas de observar o resultado dessa mudança. Uma forma pessimista, própria da economia ortodoxa, na qual estaríamos piorando a situação de um para melhorar a situação de outro, situação que vai contra a alocação ótima de recursos (que situação ótima, na qual 01 pessoa vale por outras 26). A outra forma de observar, é entendendo o processo como resultado de uma nova lógica, uma nova razão, uma razão verdadeiramente humana. Pois, fundada não só na ficção da igualdade jurídica, mas na igualdade econômica. Significando, assim, uma transformação radical na estrutura econômica da sociedade, ou seja, nas relações sociais de produção. Em termos práticos, se o salário de todos for igualizado a partir da divisão do total de salários pelo número de matrículas, o valor médio seria de R$ 8.261,78. De forma geral, a ideia não está relacionada ao rebaixamento salarial, e sim, com a procura de um nível médio de remuneração adequado para satisfação de todas as nossas necessidades, provenientes do estômago ou da imaginação, como diria Marx. Imagine agora que todas as instituições do tipo realizassem o mesmo procedimento, já que todas são organizadas de forma meritocrática. E ainda, que tal iniciativa fosse estendida para todas as esferas da administração pública, envolvendo todas as instituições e órgãos, do executivo, do legislativo e do judiciário. Existiriam ainda, diferentes salários médios pelos diversos setores, bem como a complexidade de estabelecer padrões médios de remuneração que refletissem diferentes custos de vida entre cidades grandes e pequenas, por exemplo.
A média citada acima, calculada por instituição, funciona apenas para ilustrar tanto um indicador de igualdade econômica quanto uma ação política na busca dessa igualdade. Destarte, seja muito mais adequado igualar a remuneração por uma medida mais geral. Dessa perspectiva, o PIB per capita poderia funcionar como um indicador de rendimento médio geral, passando de uma ferramenta limitada, para medir o padrão de vida, a uma medida de distribuição da riqueza produzida, a ser alcançada via sua operacionalização como renda per capita (mas que considere tanto aspectos de desigualdade social quanto de concentração de renda). A título de ilustração, o PIB per capita brasileiro, em valores correntes, foi de R$ 33.593,82, em 2018.
Tomamos como exemplo uma I.E.S., porque como lugar formador de conhecimento, nada mais ideal para começar uma mudança radical nas relações sociais. Esse movimento de mudança vai muito mais além da mera remuneração igual, pois avança em direção da anulação do fetichismo do dinheiro e da mercadoria. Acreditamos que essa mudança pode ter mais chance de começar pelo serviço púbico (universidades, prefeituras, governos estaduais e federal, embaladas através das lutas dos movimentos e organizações sociais). No entanto, quando a remuneração monetária é realizada pelo setor privado, uma série de nuanças de diferentes ordens está associada a tal mudança. Precisaremos de muita imaginação e ação para ir resolvendo tal problemática, como sugerimos mais adiante. Adiantamos que nesse caso o que precisa ser desmantelado é a plutocracia.
Atingimos um nível de sofisticação técnica e produtiva jamais imaginado por qualquer pensador. Realmente temos um sistema produtivo e de comunicação integrado em nível mundial. Podemos agora pensar em uma produção e distribuição em nível planetário. Entretanto, vivemos em um mundo dominado pela plutocracia. Hoje, a partir da Revolução Informacional, podemos pensar verdadeiramente numa comunidade mundial, na qual as forças produtivas sejam em favor da humanização e não contra a humanidade. Parece um pensamento um tanto ingênuo, mas talvez essa seja nossa última chance, diante do desastre no qual estamos mergulhados. Precisamos racionalizar sobre uma nova propriedade privada, um novo processo de acumulação, um novo Estado (sua configuração e papel), e sobre a necessidade, urgência e possibilidade de um governo mundial.
O Estado, nessa nova etapa do capitalismo, está marcado pelo “[…] aprofundamento mundial da desigualdade econômica, a erosão global do bem-estar social e a penetração planetária das indústrias financeiras […]” (APPADURAI, 2010, p. 29). A respeito do seu papel, por exemplo, Bauman (2019, p. 48), fala de uma “[…] desativação gradual mas inexorável das instituições de poder político […]”,Appadurai (2019, p. 30), de “fadiga da democracia”, e Geiselberger (2019, p. 10), de “[…] ‘securitização’ (securitization) e de política simbólica pós-democrática […]”. De forma geral, para esses autores, passamos a conviver num contexto de incapacidade política de tratar os problemas globais (desigualdade econômica, migração, terrorismo, etc.). Contexto também associado a transformação da cultura em palco de soberania que termina por produzir líderes populistas autoritários, visto que a soberania econômica não cabe mais dentro da soberania nacional. Estes, por sua vez, “[…] prometem a purificação da cultura nacional como via de poder político global […]” (APPADURAI, 2019, p. 25). E ainda, vivemos a transformação do debate político democrático em uma via de “saída” da própria democracia; porém, mantendo a configuração de Estado e de poder inalteradas, criando assim, um verdadeiro simulacro de democracia ou uma democracia às avessas. Quem são os ganhadores e quem são os perdedores de tal processo?
[…] Os principais vencedores são financistas extraterritoriais, fundos de investimento e operadores de commodities de todos os tons de legitimidade; já os principais derrotados são a igualdade econômica e social, os princípios da justiça intra e inter-Estados, além de grande parte, provavelmente uma maioria crescente, da população mundial. (BAUMAN, 2019, p. 48)
O outro lado da moeda é a configuração do Estado. O problema da configuração está relacionado a concentração de poder por ela gerada. Tomemos como exemplo as democracias presidencialistas. A repartição de poderes, entre executivo, legislativo e judiciário, é um aspecto fundamental da democracia, mas nem mesmo ela foi capaz de evitar a dramática situação descrita acima. Precisamos urgentemente de uma nova configuração de Estado que resulte numa nova configuração de poder na sociedade em todos os níveis de governo, local, regional e nacional. Nesse aspecto trataremos apenas do poder executivo, presidência e ministérios, sendo que as sugestões servem para todos os níveis de governo.
Comecemos pelo presidente. Por que razão uma única pessoa deve comandar um país inteiro? Por que devemos nos sujeitar a governos que não representem os interesses sociais? Por que ainda nos sujeitamos a eleger e aceitar governantes como Trump e Bolsonaro? Por que não eleger no lugar destes um conselho governamental com assento para os setores representativos da sociedade? Qual seria o seu papel? Pensar e formular políticas para a execução por parte dos ministérios, bem como atender as demandas ministeriais. Com qual meios? Um quadro técnico permanente selecionado, via concurso público, para transformar soluções políticas em soluções técnicas. Qual o papel dos ministérios? Por que de quatro em quatro anos se trocam os ministros e suas equipes? Se pensarmos nos ministérios, a partir de suas atividades e funções, poderemos concluir que a única resposta válida para a última pergunta, está relacionada ao poder discricionário (barganhas de poder por elevados cargos e todas as formas de corrupção daí derivadas). Imaginemos agora uma situação diferente, na qual o ministério seja um órgão estruturado completamente a partir de concurso público e no qual, também, sua direção seja exercida por um conselho formado por funcionários de carreira. O papel dos ministérios continuaria o mesmo: elaboração de planos, projetos e sua execução. Talvez, se conseguíssemos implantar um executivo nessa perspectiva pudéssemos também ter alguma esperança na democracia novamente: uma verdadeira revolução democrática.
Contra a meritocracia e a plutocracia
Vimos como a propriedade privada gera acumulação incessante de capital e como este processo amplifica e aprofunda a propriedade privada. Como a associação entre propriedade privada e acumulação representa o cimento da forma capitalista de geração contínua de exploração e desigualdade. E ainda, como a produção capitalista representa uma forma de sociabilidade fetichizada. Todavia, esse incessante processo de acumulação nos alçou a um grau de desenvolvimento científico tal, que através dele temos a capacidade e a chance de nos reinventar enquanto humanidade. Quem poderia imaginar o computador, os algoritmos, as redes sociais, e tudo mais que realiza o mundo novo da informação e da computação. Nenhum aspecto, seja da natureza ou da sociedade, ficou de fora das transformações desencadeadas por essas novas tecnologias. Até o momento, elas têm sido utilizadas para reforçar, amplificar e perpetuar a forma de sociabilidade e de sociedade que temos. Em uma palavra, elas são as mais poderosas ferramentas já criadas para alavancagem do processo de acumulação capitalista. É a razão mais avançada já produzida pela razão humana. O clímax das forças produtivas como denominado por Marx. E é justamente nesse clímax das forças produtivas que pode operar uma nova revolução. Porque somente com esse instrumental torna-se possível a superação de comportamentos dualistas, tais como: dominação/dependência, exploração/desigualdade, riqueza/pobreza, exclusão/discriminação.
As bases dessa revolução assentam-se na extinção da propriedade privada e da acumulação. Historicamente, esse foi o motivo da revolução socialista, e como mostrou a história, mesmo essa revolução não foi capaz de gerar um outro processo de humanização. A nova revolução exige uma nova dialética, na qual continue existindo a propriedade privada, mas ao mesmo tempo não exista propriedade privada. Na qual, exista acumulação, mas ao mesmo tempo não exista acumulação. A propriedade privada é a própria individualidade humana. Ela não pode deixar de existir. Ao mesmo tempo, a propriedade privada não pode servir como instrumento de dominação e exploração, por isso ela deve ficar circunscrita a idiossincrasia humana. Da mesma forma, não pode existir sociedade sem acumulação, sem produção de excedente, de grandes somas de capital para grandes investimentos, mas a acumulação não pode ser privada. Portanto, precisamos criar os meios para assegurar ao mesmo tempo, a existência e não existência da propriedade privada, e a existência e não existência da acumulação. Para tanto, deverá existir uma nova relação entre o homem e o dinheiro, mediada pelas novas tecnologias da informação. Não para amplificar o capital e a acumulação, muito pelo contrário, para nivelar os homens em suas relações sociais.
O que precisamos entender é que toda realidade histórica vivida até hoje teve como base a luta pela existência. O alcance do desenvolvimento da nossa razão parece ainda não ter produzido uma razão da razão humana. Talvez tenhamos atingido a capacidade material para tal feito apenas nessa etapa do desenvolvimento histórico. Pois, somente nessa quadra histórica temos as ferramentas produtivas e tecnológicas adequadas, do ponto de vista das informações, do seu processamento, das formas de administração, em todos os domínios que constituem a totalidade social. Finalmente, nesse período temos o poder para igualizar os homens e, ao mesmo tempo, manter as suas diferenças. Eliminar a ideia de heróis e vilões, tornar a administração pública social, dar a empresa privada um caráter realmente social, ao contrário da ideia central da acumulação pela acumulação. A liberdade que possibilita a um homem concentrar riqueza e poder sem medida, e utilizá-los da forma que bem entender, não pode ser a verdadeira liberdade. Esta tem de vir, necessariamente, da superação da ideia de luta pela existência, arraigada desde sempre em todas as sociedades históricas. Uma consciência realmente social não é compatível com a luta pela existência como observada na natureza. Ou a nossa natureza se torna diferente ou não nos tornaremos realmente humanos. Dessa forma, a liberdade humana exigirá um sacrifício monumental: a negação de nossa própria origem, nossa primeira natureza, nossa natureza animal, fundada na luta pela existência. Parece paradoxal falar ao mesmo tempo em liberdade e sacrifício. Mas, se por liberdade entendermos que todos os homens são semelhantes, são irmãos, possuem as mesmas necessidades, do ponto de vista social, a única forma de liberdade que podemos conceber seria a da equivalência econômica, entre cada um e entre todos. Para tanto, qualquer forma de propriedade privada que promova a acumulação incessante, é por si só incompatível com a liberdade. É, nesse sentido, que a liberdade exige sacrifício e, nesse sentido também, que o processo de humanização exige uma forma de superar a luta pela existência no seio da sociedade e entre todas as sociedades. Sem essa racionalização, todos os revolucionamentos no capitalismo ou em qualquer outro sistema, talvez nunca permitam a verdadeira emancipação humana. Porque essa emancipação não é apenas do homem em relação à natureza, mas principalmente do homem na sua luta pela existência contra os outros homens. Para tanto, torna-se fundamental eliminarmos da existência social a meritocracia e a plutocracia, como afirmado anteriormente. A ideia é simples, mas seu desenvolvimento e aplicação, em nível social, pode ser, no mínimo complexo, e dependendo da disposição social, poderá nunca ser colocada em prática: necessidades sociais iguais, rendimentos iguais. Para dar conta dessa ideia sugerimos o termo econocracia, base e fundamento de outra ideia, a sociocracia.
O termo econocracia não é novo, mas a nossa interpretação é totalmente oposta da sua ideia original. Esta se refere a um mundo governado por uma ciência econômica de linguagem hermética, inacessível as pessoas comuns. No qual as decisões políticas e as políticas sociais são pautadas pela aplicação de instrumentos quantitativos, ou seja, as pessoas são apenas inputs para as equações do sistema. De acordo com os autores Earle, Cahal e Ward (2016), a econocracia seria o sistema político que governa a maioria dos países atualmente, numa redução da política e do sistema político aos estreitos limites da economia neoclássica. Muito pelo contrário, a nossa ideia de econocracia está relacionada a rendimentos iguais para necessidades sociais iguais, ou seja, a completa eliminação do sistema meritocrático na sociedade. Por seu turno, a econocracia seria o fundamento da sociocracia. Este também não é um termo novo. O seu uso pelo filósofo francês Auguste Comte data da década de 1850. Mas, seu significado atual data da década de 1940, como descreve Koch-Gonzalez e Rau (2019). Existe uma gama de variações da sociocracia, mas de forma geral todas referem-se a modelos de governança. A nossa interpretação da sociocracia leva em consideração a configuração do Estado, como descrita no capítulo anterior. Considera também, que qualquer modelo de governança, seja para empresas ou governos, só ocorrerá com justiça e liberdade, na hipótese de rendimentos iguais, ou seja, na hipótese da econocracia.
Se as necessidades humanas, do ponto de vista social, são iguais, por que os rendimentos pessoais ou familiares são tão desiguais? Ao longo da história humana foi necessário muito pioneirismo, heroísmo e originalidade, para fazer surgir a agropecuária moderna, a fábrica, a escola, o hospital, etc. Destacamos esses sistemas por suas referências a produção, educação e saúde, como elementos fundamentais da existência social, representantes de uma totalidade social. Entretanto, a propriedade privada e a acumulação de capital, como fundamentos dessa totalidade, nos legaram um mundo de luta pela existência, como descrito anteriormente. Para a econocracia funcionar precisamos nos concentrar nas funções sociais dos sistemas acima mencionados. Portanto, há de se pensar novas formas jurídicas para dar conta das nuanças que envolvem a problemática dos rendimentos iguais na esfera privada da economia.
Do ponto de vista econômico, qualquer empresa ou entidade que se organize como tal, constitui-se num montante de receita, de despesa, desgaste ou depreciação, e necessidade de investimento (renovação, ampliação, modernização). O resultado que aparece dessa equação deverá ser o rendimento dos participantes, que deverá ser igual, independentemente de seu grau de instrução, cargo, função, tempo de empresa etc. Podemos, agora, estender esse raciocínio para um setor econômico e para estrutura produtiva de uma região, de um país, e até do mundo.
Nessa nova forma, o individual se torna coletivo sem deixar de ser individual, e o coletivo se torna individual sem deixar de ser coletivo. O instrumento de tal mudança é o mesmo da acumulação incessante e da relação capital, e não poderia ser diferente. O que foi separado pelo dinheiro somente pelo dinheiro retornará à unidade. A econocracia como base social e a sociocracia, como forma de organização política, de acordo com o capítulo anterior, tornará possível eliminar o fetiche da mercadoria, do dinheiro e do próprio homem. Um resumo das sugestões desse capítulo e do anterior são pontuadas a seguir.
1) Igualização de rendimentos para todos;
2) Acumulação para fins coletivos e não mais como meta do indivíduo ou de grupos;
3) Limitação da propriedade privada e favorecimento dos bens públicos coletivos;
4) Ações, títulos, e demais formas de participação em empreendimentos terão funções sociais e não serão objetivos de acumulação e fortuna pessoal;
5) Transição da organização privada das empresas, do sistema produtivo, enfim de toda base econômica e de negócios da sociedade, para uma gestão sociocrática;
6) Administrações governamentais, no caso do poder executivo, serão exercidas através de conselhos dirigentes, eleitos democraticamente. Secretarias e ministérios serão constituídos exclusivamente por quadro técnico selecionado via concurso público. Não haverá mais designações políticas. A sua direção será eleita a partir do seu quadro profissional;
7) formação de um governo mundial para pensar, desenvolver e implantar formas de econocracia e de sociocracia.
Posto isto, considerando o desprezo do capitalismo pela existência dos povos, pelos conteúdos da vida, pela destruição da natureza e do ser, precisamos formular um novo enfoque para o desenvolvimento, que tenha como centro e fundamento a vida humana e seus conteúdos, não como mera retórica, mas como sentido último.
Para tanto, a vida humana precisa assumir a dimensão de um equivalente geral, em nível global, com força para sobrepujar outro equivalente geral, o dinheiro, em uma concretude que torne comum e igual o valor da vida para cada um e para todos, isto é, na produção do espaço. A vida humana entendida enquanto direito de existência igual para todos, direito ao resultado da produção social, da distribuição da produtividade do trabalho. Tendo em consideração que cada vida tem o mesmo valor. Todavia, para trilharmos esse caminho torna-se necessário o despertar de uma nova consciência global. Esta consciência tem como ponto de partida a ideia de que nenhum homem deve subjugar outro, seja por raça, riqueza ou poder, na medida em que tais ideias tendam a desaparecer. Nessa perspectiva, a limitação das grandes fortunas, dos super salários, a imposição de limites sociais à propriedade privada, podem representar o primeiro passo nessa direção. Na direção da igualização de rendimentos, como apresentado anteriormente.
Precisamos enfim, reconhecer que a vida individual e a vida coletiva não são diversas, pois derivam da mesma substância: o ser. Insistimos, em um primeiro momento, na institucionalização de normas e leis que limitem salários e iguale rendimentos, rendas e patrimônio, de forma que as relações de reprodução sejam conformadas por controle social e não pelas leis da acumulação capitalista. A partir dessa consciência poderá se obter uma certa solidariedade contra a acumulação pela acumulação, contra o desmonte social e contra a destruição do meio ambiente. Algo como uma desmercadorização das relações de reprodução e, consequentemente, da cidade, da política, da cultura, da natureza e do próprio ser. Evidentemente, semelhante caminho não pode ser de uma região ou nação, mas tem de ser orquestrado de forma global. Para Žižek (2012, p. 334),
[…] é ilusório esperar mudar de fato a situação, “ampliando” a democracia para a esfera econômica (digamos, reformulando os bancos para que sejam submetidos ao controle popular) […]. Por mais radical que seja nosso anticapitalismo, nos processos “democráticos” (que podem ter um papel positivo, é claro), as soluções são buscadas apenas por meio dos mecanismos democráticos que fazem parte dos aparelhos ideológicos do estado “burguês” que garante a reprodução imperturbada do capital […], a aceitação dos mecanismos democráticos como se constituíssem o único arcabouço para todas as mudanças possíveis […] impede a transformação radical das relações capitalistas.
Todavia, a mudança tem de começar em algum lugar. Nesse contexto, como afirmamos anteriormente, a Universidade parece um lugar bastante promissor. Pode, por exemplo, animar e participar junto de movimentos e organizações sociais nas lutas democráticas necessárias, inclusive desafiando governos para a implementação de instrumentos e medidas adequadas para uma nova ordem social.
Quando em algum lugar perdemos as nossas utopias, também perdemos o sentido do que é “ser humano”. É urgente, pois, resgatar esse sentido. Como afirma, Altvater (2010, p. 334), “[…] a utopia concreta está presa com âncoras pesadas no fundo real da sociedade capitalista […]”, reificada, fetichizada nas relações de reprodução. É preciso resgatar a utopia, resgatar um sentido de humanidade, um fundamento comum pelo qual lutar. Até o momento, nem as teorias do desenvolvimento econômico, nem o aprofundamento da questão ambiental e suas soluções parcelares, conseguiram chegar ao âmago dessa questão. Justamente porque não tocaram no ponto fundamental: a monstruosidade das relações de reprodução no capitalismo contemporâneo. É preciso desfazer estes e outros mitos em direção a uma “utopia realizável”.
Será que podemos estabelecer essa nova utopia, tendo como fundamento que a reprodução das relações sociais não foi nem é “natural” ou “normal”? Será que ainda não percebemos a necessidade de pôr tal reprodução sob controle social, para além dos mecanismos de mercado? Será que deixaremos o século XXI produzir uma proletarização global, a destruição do ser e da natureza? Para Žižek (2011, p. 83), “corremos o risco de perder tudo: a ameaça é que sejamos reduzidos a sujeitos abstratos vazios de todo conteúdo substancial, despossuídos de nossa substância simbólica, nossa base genética fortemente manipulada, vegetando num ambiente inóspito”. Resta-nos a esperança de uma nova consciência, de uma nova política, de um novo Estado, de uma nova forma de propriedade, e de uma nova práxis social; que em algum momento, torne evidente a equivalência da vida humana em qualquer lugar do planeta. Será um despertar diante dessa grande degeneração, do ponto zero apocalíptico, da possibilidade da destruição do ser e da mãe-terra, será a nossa última revolução.
Conclusão
O dilema razão/humanização continua sem solução aparente. A doutrina do autointeresse criou um mundo econômico totalmente avesso aos preceitos de tal doutrina: os ideais de igualdade e de liberdade que representavam “argumentos políticos a favor do capitalismo antes do seu triunfo”. A solução apontada por Hegel foi contestada ainda muito cedo por Marx. A solução de Marx, da forma como foi posta em prática, também não se mostrou viável no século XX. O capitalismo em sua nova configuração (dominância financeira) se mostra cada vez mais avesso ao processo civilizatório e a democracia. Resulta daí a urgência e a necessidade de uma nova razão, para uma nova economia, uma nova política e uma nova economia política: revolução econômica já!
*José Micaelson Lacerda Morais é professor do Departamento de Economia da Universidade Regional do Cariri (URCA).
Referências
ALTVATER, Elmar. O fim do capitalismo como o conhecemos: uma crítica radical do capitalismo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2010.
APPADURAI, Arjun. Fadiga da democracia. In: APPADURAI, Arjun et al. A grande regressão: um debate internacional sobre os novos populismos e como enfrentá-los. São Paulo: Estação Liberdade, 2019.
BAUMAN, Zygmunt. Sintomas à procura de um objeto e um nome. In: APPADURAI, Arjun et al. A grande regressão: um debate internacional sobre os novos populismos e como enfrentá-los. São Paulo: Estação Liberdade, 2019.
BRAGA, José Carlos de Souza. Financeirização global: o padrão sistêmico de riqueza no capitalismo contemporâneo. In: TAVARES, Maria da; FIORI, José Luís. Poder e dinheiro: uma economia política da globalização. 4ª ed. Rio de Janeiro: Vozes, 1997.
DARWIN, Charles. A origem das espécies. São Paulo: Martin Claret, 2005.
EARLE, Joe; MORAN, Cahal; WARD-PERKINS, Zach. The Econocracy: The Perilsof Leaving Economicsto the Experts. Manchester University Press, 2016.
FONSECA, Eduardo Giannetti da. Vícios privados, benefícios públicos? A ética na riqueza das nações. São Paulo: Companhia das Letras, 1993.
GALEANO, Eduardo. As veias abertas da América Latina. Porto Alegre: L&PM, 2019.
HARVEY, David. O novo imperialismo. 3ª ed. São Paulo: Edições Loyola, 2004.
HEGEL, Georg Wilhelm Friedrich. Princípios da filosofia do direito. São Paulo: Martins Fontes, 1997. (Clássicos)
HIRSCHMAN, Albert O. As paixões e os interesses: argumentos políticos a favor do capitalismo antes do seu triunfo. Rio de Janeiro: Record, 2002.
HOBSBAWM, Eric. A era dos impérios. 7ª ed. Rio de janeiro: Paz e Terra, 2002.
________. Era dos extremos: o breve século XX – 1914-1991. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.
KOCH-GONZALEZ, Jerry; RAU, Ted J. Muitas vozes uma canção: autogestão por meio da sociocracia. Curitiba: Voo, 2019.
MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. Manifesto do partido comunista. São Paulo: Boitempo, 2010.
MARX, Karl. Manuscritos econômicos-filosóficos. São Paulo: Boitempo, 2008.
________. Contribuição à crítica da economia política.2ª ed. São Paulo: Editora Expressão Popular, 2008a.
________. Sobre a questão judaica. São Paulo: Boitempo, 2010a. (Coleção Marx-Engels)
________. Crítica da filosofia do direito de Hegel. 2ª ed. São Paulo: Boitempo, 2010b.
________. O Capital: crítica da economia política. Livro I: o processo de produção do capital. 2ª ed. São Paulo: Boitempo, 2017.
ROTHSCHILD, Emma. Sentimentos econômicos: Adam Smith, Condorcet e o Iluminismo. Rio de Janeiro: Record, 2003.
SANDEL, Michael J A tirania do mérito: o que aconteceu com o bem comum? São Paulo: Editora José Olympio, 2020.
SASSEN, Saskia. Expulsões. Rio de Janeiro, 2016.
WOOD, Ellen Meiksins. O império do capital. São Paulo: Boitempo, 2014.
ŽIŽEK, Slavoj. Primeiro como tragédia, depois como farsa. São Paulo: Boitempo, 2011.
________. Problemas no paraíso. In: MARICATO, Ermínia et al. Cidades rebeldes: Passe Livre e as manifestações que tomaram as ruas do Brasil. São Paulo: Boitempo/Carta Maior, 2013.
________. Vivendo no fim dos tempos.