Jenny von Westphalen Marx

Imagem: Engin Akyurt
Whatsapp
Facebook
Twitter
Instagram
Telegram
image_pdfimage_print

Por ARI MARCELO SOLON*

A presença da esposa de Marx

“O peso das gerações passadas assombra como um pesadelo as novas” (Karl Marx).

Nós, marxistas, temos com o que nos orgulhar. Jenny von Westphalen Marx redigiu as obras mais importantes do socialismo revolucionário. Deu à luz a muitos filhos, perdeu tantos outros, e, apesar da tragédia, foi uma mulher exemplar na militância política a favor do socialismo revolucionário. Abrigou os communards em sua casa, em Londres, os refugiados da comuna de Paris. Ela não tinha nem pão para comer e dar a seus filhos, mas o concedia aos pobres exilados. Amava seu marido incondicionalmente. Tinha um pouco de sua origem na aristocracia: era da pequena nobreza, proveniente de funcionários públicos

Seu marido, entretanto, era imperfeito. Ao longo de sua vida, várias expressões racistas utilizava. Referiu-se ao socialista Lassale como “negro judeu”.

Enquanto Jenny dava a luz a uma de suas queridas filhas, Marx engraçava-se com a empregada, e obrigou-a a conceber a criança anonimamente (posteriormente adotada por Engels).

Qual era o problema de Karl Marx?

O problema era o Complexo de Édipo com sua mãe judia.

Tanto do lado materno quanto do lado paterno, Marx descende de dinastias rabínicas. Ocorre que do lado paterno o pai, por questões de oportunidade, converte-se ao cristianismo. Observa-se na passagem a seguir a presença dessa origem: “Marx was converted to Christianity when he was six years old. His father had converted a year before his birth; his mother was to convert a year after his own conversion, so that when we address the question of Marx’s Jewish identity it is clearly not within any theological or ethnic definition” (GILMAN, 1988, p. 275).

E é uma conversão bem-sucedida. Tanto o pai quanto o filho acreditam que, de fato, converteram-se ao espírito prussiano. A Prússia germânica estava acima de tudo: “Karl Marx’s father, Heinrich Marx, born Heschel Marx, was not atypical of the acculturated Jews who saw conversion to Christianity as the natural next step in entering German society. He had strong emotional ties to his sense of “Germanness,” opposing Napoleon and supporting the German position during the “War of Liberation.” This identification with the German society was heightened by the family’s life in Trier, a city perched on the linguistic border between German, French, and Dutch. Of all the cities in Loter, the ancient settlement of German Jewry, it was the area in which the level of awareness of the political and social implication of language was the highest. Marx’s language as a child was German. His father’s identification was with the Prussian state and thus with the German language and its concomitant rhetoric” (GILMAN, 1984, p. 276).

Já a mãe mal sabia alemão. Todas as cartas escrevia ao filho com yiddishismos e desconhecimento total da língua pátria. Isso fez com que as obras perfeitas, hegelianas, que Jenny digitava tivessem erros ideológicos. Quando criticou o antissemita Bauer, por negar emancipação cívica aos judeus, e Marx a defendendo, não deixou de constatar o espírito do materialismo da religião materna.

Até na obra máxima que Jenny digitou, O Capital, há erros ideológicos. A bela teoria aristotélico-hegeliana da mercadoria é um pouco comprometida com resquício da raiva com que Marx sentia pela herança materna. A mercadoria fala uma língua de trapaceiros, de mercadores, de Ostjuden (judeus polacos).

Ainda bem que tivemos Jenny e todas as suas filhas (quatro belas Jenny) para nos orgulharmos cem por cento do socialismo revolucionário.

*Ari Marcelo Solon é professor da Faculdade de Direito da USP. Autor, entre outros, livros, de Caminhos da filosofia e da ciência do direito: conexão alemã no devir da justiça (Prismas).

Referências


GILMAN, Sander L. Karl Marx and the Secret Language of Jews. Modern Judaism, v. 4, n. 3, p. 275-294, out. 1984.

VON KROSIGK, Lutz Schwerin. Jenny Marx. Liebe und Leid im Schatten von Karl Marx. Wuppertal: Staats-Verlag, 1976.

 

Veja todos artigos de

10 MAIS LIDOS NOS ÚLTIMOS 7 DIAS

Os véus de Maya
Por OTÁVIO A. FILHO: Entre Platão e as fake news, a verdade se esconde sob véus tecidos por séculos. Maya – palavra hindu que fala das ilusões – nos ensina: a ilusão é parte do jogo, e desconfiar é o primeiro passo para enxergar além das sombras que chamamos de realidade
Régis Bonvicino (1955-2025)
Por TALES AB’SÁBER: Homenagem ao poeta recém-falecido
A fragilidade financeira dos EUA
Por THOMAS PIKETTY: Assim como o padrão-ouro e o colonialismo ruíram sob o peso de suas próprias contradições, o excepcionalismo do dólar também chegará ao fim. A questão não é se, mas como: será por meio de uma transição coordenada ou de uma crise que deixará cicatrizes ainda mais profundas na economia global?
O ateliê de Claude Monet
Por AFRÂNIO CATANI: Comentário sobre o livro de Jean-Philippe Toussaint
O cinema de Petra Costa
Por TALES AB´SÁBER: Petra Costa transforma Brasília em um espelho quebrado do Brasil: reflete tanto o sonho modernista de democracia quanto as rachaduras do autoritarismo evangélico. Seus filmes são um ato de resistência, não apenas contra a destruição do projeto político da esquerda, mas contra o apagamento da própria ideia de um país justo
De Burroso a Barroso
Por JORGE LUIZ SOUTO MAIOR: Se o Burroso dos anos 80 era um personagem cômico, o Barroso dos anos 20 é uma tragédia jurídica. Seu 'nonsense' não está mais no rádio, mas nos tribunais – e, dessa vez, a piada não termina com risos, mas com direitos rasgados e trabalhadores desprotegidos. A farsa virou doutrina
Saliência fônica
Por RAQUEL MEISTER KO FREITAG: O projeto ‘Competências básicas do português’ foi a primeira pesquisa linguística no Brasil a fazer uso do computador no processamento de dados linguísticos
Universidade Harvard e fluoretação da água
Por PAULO CAPEL NARVAI: Nem a Universidade Harvard, nem a Universidade de Queensland, nem nenhum “top medical journal”, chancelam as aventuras sanitárias terraplanistas implementadas, sob o comando de Donald Trump, pelo governo dos EUA
A extrema direita nas universidades
Por MARCOS AURÉLIO DA SILVA: Entre a violência e a política: a nova direita e os desafios ético-políticos nas instituições de ensino superior
Veja todos artigos de

PESQUISAR

Pesquisar

TEMAS

NOVAS PUBLICAÇÕES