Por HERALDO CAMPOS*
A importância da gestão compartilhada dos royalties do petróleo e do gás natural
Outro dia, andando pelo Mercado Municipal de Pescados de Ubatuba, cidade com forte vocação turística do Litoral Norte do Estado de São Paulo, na procura de um peixe de mar para a mistura do almoço de casa, acabei voltando de mãos abanando.
Na busca de um peixe das proximidades dessa região marítima e não de outros lugares distantes, uma vez que, segundo informação local, mais de 70% dos pescados que são comercializados nos boxes vêm de outras praças de abastecimento, me deparei com um cartaz fixado numa das colunas do Mercado e depois com uma faixa fixada nas suas proximidades.
Essa faixa, com o logotipo do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), informa sobre audiência pública da atividade de produção e escoamento de petróleo e gás natural do polo pré-sal da bacia de Santos – etapa 4 do empreendedor Petrobras, a ser realizada no município de Caraguatatuba dia 30 de maio de 2023.
Na direção para acesso www.comunicabaciadesantos.com.br existente nessa faixa, para os quatro municípios que constituem o Litoral Norte paulista, Caraguatatuba, Ilhabela, São Sebastião e Ubatuba, a informação diz o seguinte: “A Petrobras fornecerá transporte gratuito aos interessados em participar das Audiências Públicas, que residam nos municípios acima, até os locais dos eventos. Oportunamente serão publicadas informações sobre locais e horários do transporte”.
Para o projeto etapa 4, está prevista a instalação e a operação de 13 unidades de produção, localizadas em distância mínima de 171 km da costa do litoral dos estados de São Paulo e Rio de Janeiro, em águas com profundidade acima de 1.745 m. Essas unidades serão responsáveis por produzir petróleo e gás em 13 projetos de Desenvolvimento da Produção (Dps)”.
“O tripé educação-saúde-saneamento é um direito da população. Os valores existentes na “Declaração Universal dos Direitos Humanos” da Organização das Nações Unidas (ONU), proclamada pela sua Assembleia Geral, em Paris, no dia 10 de dezembro de 1948, ressaltam e reforçam esse direito”.
“Apesar de, aparentemente, o Brasil estar iniciando na administração dos fundos soberanos entende-se que eles poderiam ser direcionados para a melhoria do cotidiano da vida da população e dar início à diminuição do grande déficit nessa área fundamental para o bem-estar das pessoas, muitas vezes desassistidas de um serviço público de qualidade”.
“Nos anos 80 do século passado, algumas prefeituras do território brasileiro adotaram o “Orçamento Participativo”, como mecanismo de possibilitar a participação dos munícipes nas discussões e nas deliberações na busca da melhor forma de aplicar os investimentos pelos administradores locais. Quem sabe se essa experiência do “Orçamento Participativo” de participação popular direta não poderia voltar a ser de novo uma prática política, visando a adequada aplicação dos recursos econômicos gerados pelos fundos soberanos provenientes dos royalties do petróleo e do gás natural”.[1]
Em 31 de janeiro de 2022, o portal G1 informava a seguinte situação para os quatro municípios do litoral norte do estado de São Paulo:[2] “Em 2020, foram repassados o total de R$ 463.251.112,43 para o Litoral Norte. No ano passado, a soma foi de R$ 548.924.857,78. Entre as quatro cidades, foi Ilhabela a que mais recebeu. Confira abaixo quanto cada cidade recebeu em 2021, de acordo com dados da ANP: (i) Ilhabela – R$ 296.547.618,11; (ii) São Sebastião – R$ 134.805.117,66; (iii) Caraguatatuba – R$ 105.249.008,63; (iv) Ubatuba – R$ 12.323.113,38”.
Nessa mesma matéria, o portal G1 prosseguia com esse esclarecimento sobre o cálculo dos royalties:
“O cálculo é feito com base em um estudo cartográfico que analisa os municípios com fronteira com os campos de produção. A fatia em dinheiro depende dessa proporção territorial. A partilha é feia a partir de um estudo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O instituto traça um ângulo para cada poço em alto mar e reflete seu caminho até o continente, observando os municípios impactados”.
Para encerrar, entende-se que certas coisas do chamado “mundo globalizado” como, por exemplo, os pescados, terminam por fazer dessa importante fonte de proteínas um prato sem gosto, insosso, de tanto que rodam debaixo do gelo, de um lugar para outro, até chegarem ao prato do consumidor. E, cá entre nós, nem os chefes de cozinha “bonitões”, que vira e mexe aparecem na televisão dando receitas culinárias, consertam uma mercadoria de qualidade comprometida.
Será que uma cooperativa de pescadores não poderia melhorar essa oferta e, ao mesmo tempo, dar segurança para essa categoria de trabalhadores do setor? E, em paralelo, espelhando essa ideia do cooperativismo, um tipo de consórcio entre os municípios, não seria um caminho interessante para a gestão compartilhada dos royalties do petróleo e do gás natural e, consequentemente, do fundo soberano?
Seria interessante, inclusive, passar a resolver de forma compartilhada, um problema crônico comum a esses municípios, que é do saneamento básico e a coleta de lixo, também degradadores da qualidade desse pescado e da vida das pessoas. O mar não é o mesmo?
“A falta de cooperação é um protesto contra a falta de consciência e participação involuntária no mal” (Mahatma Gandhi).
*Heraldo Campos, geólogo, é pós-doutorado pelo Departamento de Hidráulica e Saneamento da Escola de Engenharia de São Carlos-USP.
Notas
[1] https://aterraeredonda.com.br/fundos-soberanos-e-qualidade-de-vida/
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