Revolushow entrevista Alysson Leandro Mascaro

Jackson Pollock, Untitled, c. 1943–44
Whatsapp
Facebook
Twitter
Instagram
Telegram

Por THIAGO KÜHL*

Comentário sobre o livro recém-lançado.

Destacado pensador, jurista e filósofo brasileiro, Alysson Leandro Mascaro possui grande produção teórica de larga repercussão. Desde suas primeiras reflexões teóricas públicas, que datam do lançamento de Crítica da Legalidade e do Direito Brasileiro (Quartier Latin, 2003), vem trilhando profícua caminhada acadêmica jusfilosófica e se posicionando como um dos principais pensadores do marxismo e da esquerda revolucionária no Brasil e na América Latina.

Sua obra magna, Filosofia do Direito (Atlas: 2010), é vastamente utilizada como livro referencial em cursos de Direito pelo país, já possuindo oito edições atualizadas e complementadas ao longo dos últimos 10 anos. Suas reflexões sobre o direito, o Estado e a política, com destaque para as obras Estado e Forma Política (Boitempo: 2013) e Crise e Golpe (Boitempo: 2018), têm se mostrado como importantes marcos teóricos do pensamento marxista, norteadoras das lutas verdadeiramente transformadoras, sendo reconhecidas nacional e internacionalmente.

Durante o ano de 2020, em meio à maior crise sanitária do nosso tempo, Mascaro foi chamado a divulgar seu pensamento por um sem-número de lives, podcasts, palestras, aulas e eventos virtuais, pelo Brasil e pelo exterior. Nesse contexto, como num deságue de suas reflexões de fôlego lançadas até então, publicou pela editora Boitempo Crise e Pandemia, dando conta de aplicações concretas na formação social brasileira de questões mais gerais do marxismo já apresentadas em suas obras anteriores.

Foi em 29 de maio de 2020, então, que Mascaro concedeu a entrevista que viria a se tornar o livro recentemente lançado pela editora LavraPalavra. Na ocasião, na edição de número 75 do podcast Revolushow, intitulada “As Encruzilhadas da Crise e da Pandemia”, Zamiliano Frossard, João Carvalho e Jones Manoel conduziram um elusivo bate-papo com o professor, que em memorável intervenção apresentou suas reflexões acerca dos desdobramentos da pandemia causada pela COVID-19 dentro da sociabilidade capitalista pós-fordista, de tal sorte que tais desdobramentos devem ser vistos não como um desvio no curso do neoliberalismo ou como uma corrupção do capitalismo, mas da sua própria manifestação e movimento histórico de acumulação, sendo a atual crise sanitária nada mais que um agravante derivado da crise do próprio capital.

No decorrer de suas falas, fica evidente a importância da reflexão mascariana e da compreensão seu pensamento como um todo coeso e linear, partindo de suas proposições sobre a filosofia e a filosofia do direito, bem como das suas análises concretas. Valendo-se de suas contribuições ao marxismo, Mascaro afastará toda e qualquer ilusão de salvação por intermédio do Estado e pelo liberalismo, reforçando que só há esperança de transformação do mundo pelo socialismo.

Nessa toada, não sobra espaço para quaisquer tipos de ilusões institucionais, idealismos, tentativas de suavização de discursos ou de reprodução das pautas liberais e da ordem capitalista contemporânea. Se torna evidente também a necessidade de avanço teórico para além das concepções marxistas clássicas, buscando dentro das mais avançadas fontes teóricas do marxismo de nosso tempo a compreensão da sociabilidade capitalista atual, sem tentativas de produzir discursos morais, mas sim avançando para a disputa ideológica constitutiva das subjetividades estruturantes da sociabilidade.

A entrevista de Mascaro traz o arcabouço teórico necessário para a compreensão deste tempo, com o coração cheio da paixão dos revolucionários do passado e com a mente afiada pela mais alta ciência marxista da atualidade, se levanta como um farol que fornece a luz que deverá ser seguida pelas práticas diárias de luta, mas não somente isso. Suas palavras atingem o leitor com forte impacto, com intuito de quebrar com as posições confortáveis em que se mapeiam as esquerdas do Brasil, para que possam deixar de lado proposições institucionais e juspositivistas, para assim avançar na compreensão e transformação da sociabilidade.

O necessário tom duro e crítico da entrevista se mistura também com a palavra de esperança do autor também de Utopia e Direito: Ernst Bloch e a Ontologia Jurídica da Utopia (Quartier Latin: 2008). É importante que se compreenda a importância central da entrevista do Professor Alysson ao Revolushow. Não se basta apenas como um ataque a certas posições, mas sim de posicionamento e avanço estratégico para além da estética e narrativa habitual da esquerda liberal. É o fincar da estaca fundamental da aposta de Mascaro na maneira de avançar à forma revolucionária de atuação das esquerdas brasileiras da atualidade. De buscar atingir os corações e almas do povo, das massas, de falar de peito aberto e abandonar o pedantismo e academicismo para angariar para a luta contra a exploração, todos os explorados do mundo.

A solução prática disto viria a ser dada ainda no desenrolar do próprio ano de 2020 com a proposta concreta desta aposta da mobilização das massas e das bases, da forma social para alcançar o povo, nos inéditos Centros Socialistas, espaços que serviriam para a sociabilidade das pessoas, enraizado e com capilaridade nos bairros, nas comunidades e subúrbios das cidades do Brasil. Essa iniciativa já começa a tomar forma e se espalhar pelo país em 2021.

Os leitores de Mascaro ainda receberam alguns presentes inéditos neste Revolushow Entrevista Alysson Leandro Mascaro: uma entrevista complementar, ao estilo pinga-fogo, que não fizera parte da entrevista original ao Revolushow, além de dois textos sobre as obras e as ideias mascarianas e outros textos de apresentação.

Os textos extras, escritos especialmente para a edição do LavraPalavra por Juliana Paula Magalhães e Lucas Ruíz Balconi apresentam o entrevistado para os novos leitores por duas perspectivas importantes, a das suas ideias e a das suas obras, servindo assim quase como um manual de leitura do pensamento mascariano. O caminho adotado pelos autores para apresentação de Mascaro é de didática impecável e servirá por longos anos como introdução para aqueles que se aventurarem pelas obras de Mascaro.

Tal como posto por João Carvalho, Daniel Fabre e Carlos Rivera-Lugo em seus textos de apresentação, orelha e quarta capa do livro, o advento da entrevista de Alysson Leandro Mascaro para o Revolushow se mostra como uma verdadeira ferramenta para entendimento das estratégias de nosso tempo. Suas palavras surgem como sentinela da mais alta compreensão teórica do marxismo na defesa do pensamento crítico para desvelar as estruturas da nossa sociabilidade, mas que também têm a dura tarefa de dar a pancada que libertará o nosso povo e o orientará para a derrubada da exploração, para romper com as práticas que estruturam a subjetividade capitalista, de agir e falar não para dentro da academia, mas atingir verdadeiramente o coração daqueles que sofrem os horrores do capital. As palavras e ideias de Alysson Leandro Mascaro se apresentam como a luz da sabedoria e o martelo da luta, como ciência e revolução.

*Thiago Kühl é doutorando em Teoria Geral e Filosofia do Direito na Faculdade de Direito da USP.

Referência


Revolushow entrevista Alysson Leandro Mascaro. São Paulo, LavraPalavra 2021, 144 págs.

Veja neste link todos artigos de

10 MAIS LIDOS NOS ÚLTIMOS 7 DIAS

__________________
  • A colonização da filosofiamar estacas 14/11/2024 Por ÉRICO ANDRADE: A filosofia que não reconhece o terreno onde pisa corrobora o alcance colonial dos seus conceitos
  • A massificação do audiovisualcinema central 11/11/2024 Por MICHEL GOULART DA SILVA: O cinema é uma arte que possui uma base industrial, cujo desenvolvimento de produção e distribuição associa-se à dinâmica econômica internacional e sua expansão por meio das relações capitalistas
  • Ainda estou aqui — habeas corpus de Rubens Paivacultura ainda estou aqui 2 12/11/2024 Por RICARDO EVANDRO S. MARTINS: Comentário sobre o filme dirigido por Walter Salles
  • O entretenimento como religiãomóveis antigos máquina de escrever televisão 18/11/2024 Por EUGÊNIO BUCCI: Quando fala a língua do rádio, da TV ou da Internet, uma agremiação mística se converte à cosmogonia barata do rádio, da televisão e da internet
  • A execução extrajudicial de Sílvio Almeidaqueima de livros 11/11/2024 Por MÁRIO MAESTRI: A denúncia foi patrocinada por uma ONG de raiz estadunidense, o que é paradoxal, devido à autoridade e status oficial e público da ministra da Igualdade Racial
  • Os concursos na USPMúsica Arquitetura 17/11/2024 Por LINCOLN SECCO: A judicialização de concursos públicos de docentes na USP não é uma novidade, mas tende a crescer por uma série de razões que deveriam preocupar a comunidade universitária
  • O porto de Chancayporto de chankay 14/11/2024 Por ZHOU QING: Quanto maior o ritmo das relações econômicas e comerciais da China com a América Latina e quanto maior a escala dos projetos dessas relações, maiores as preocupações e a vigilância dos EUA
  • A falácia das “metodologias ativas”sala de aula 23/10/2024 Por MÁRCIO ALESSANDRO DE OLIVEIRA: A pedagogia moderna, que é totalitária, não questiona nada, e trata com desdém e crueldade quem a questiona. Por isso mesmo deve ser combatida
  • Ainda estou aquicultura ainda estou aqui 09/11/2024 Por ERIK CHICONELLI GOMES: Comentário sobre o filme dirigido por Walter Salles
  • Não existe alternativa?lâmpadas 23/06/2023 Por PEDRO PAULO ZAHLUTH BASTOS: Austeridade, política e ideologia do novo arcabouço fiscal

PESQUISAR

Pesquisar

TEMAS

NOVAS PUBLICAÇÕES