Por BENÍCIO VIERO SCHMIDT*
Comentário sobre acontecimentos recentes
O STF, a partir da liminar da ministra Rosa Weber, depois confirmada pelo plenário (8 x 2), exigiu do Congresso a plena publicidade dos responsáveis pela “emendas do relator, emendas individuais e de bancadas.
Os dirigentes do Congresso, Athila Lira e Rodrigo Pacheco, negam-se ao atendimento pleno da decisão do Judiciário, alegando razões de ordem operacional. Uma tremenda manobra, acobertando interesses suspeitos em designação de municípios, ordens para obras e compra de maquinário superfaturado. Em alguns casos, já esclarecidos pela imprensa, ficam evidentes as operações particularistas beneficiando interesses eleitorais de familiares dos próprios congressistas, como é exemplificado pelas emendas favorecendo o clã de Lira em Alagoas, presidente da Câmara de Deputados.
Apesar do desgaste, a Câmara de Deputados vota em comissão o abandono de teto de 75 para 70 anos dos juízes das cortes superiores; obviamente em retaliação ao STF, beneficiando ao Presidente da República, que nomearia mais dois ministros ao STF e outros 23 de tribunais superiores, até dezembro de 2022. Resta saber se a ameaça terá trânsito ao plenário da Câmara e posterior envio ao Senado. Mas, trata-se, inequivocamente, de uma ameaça à estabilidade dos tribunais superiores, incluindo o TCU (Tribunal de Contas da União), órgão vinculado ao Senado Federal. Isso indica que o governo e sua máquina administrativa estão buscando o exercício de um casuísmo que permitirá um maior controle dos órgãos judiciários. O exemplo de Donald Trump, nomeando novos ministros e juízes federais de índole ultraconservadora nos Estados Unidos, durante sua gestão, frutifica no Brasil.
Ainda que haja desgaste, frente aos critérios de moralidade e publicidade na gestão pública, Rodrigo Pacheco, presidente do Senado, participa de efemérides que o lançam como candidato à presidência da república, sob a égide de um extremo moralismo e uma verborrágica defesa da convivência democrática, “em um país dilacerado pelo órdio”!
O Auxílio Brasil, em substituição e em acréscimo ao Bolsa Família, foi aprovado pela Câmara Federal (344 x 0), com possibilidades de aumento substantivo nos gastos de outra natureza, abrigados pelo teto fiscal em rompimento. Prevê-se um descontrole das finanças, com verdadeiro calote na maior parte dos precatórios e acumulação das dívidas oficiais até 2033. O ano de 2022 será contemplado por operações semelhantes de mudanças nas rubricas dos gastos sociais, tendo em vista as eleições. Um quadro dramático, que trará efeitos permanentes sobre as finanças públicas, daqui para o futuro.
As pesquisas de opinião sobre as eleições presidenciais continuam na direção já constatada há meses: Lula e Bolsonaro lideram a liça, agora com o surgimento repentino de Sergio Moro (Podemos) como terceiro colocado. Manifestações e filiações ao partido de Álvaro Dias, inclusive de quadros militares com destaque na taverna, indicam possibilidades de crescimento desta candidatura. Moro tem se pronunciado, com apoio nas ideias conservadores e recessionistas de Afonso Celso Pastore (ex-Banco Central), com reparos à política econômica e fiscal atual; contudo, sem apresentar reais alternativas. Tudo parece sinalizar para que Moro seja uma versão de Bolsonaro mais “civilizada”. Nada mais.
As demais agremiações partidárias continuam a testar o mercado de opiniões; como faz o DEM (futuro União Brasil) com o lançamento do ex-ministro Luiz Mandetta e também o MDB com o nome de Simone Tebet. São lançamentos com intenções de composição com forças políticas de maior vigor.
O caso fora da curva é a presença de Geraldo Alckmim – saindo do PSDB e indo para o PSD ou PSB – como primo inter pares, aberto a toda e qualquer composição eleitoral Ele é a própria indicação da debilidade ideológica e política do sistema partidário nacional.
Enquanto isto, aguardamos a votação da prévia tucana que, depois do fiasco da primeira tentativa com as urnas eletrônicas, deve dar a vitória a João Doria, apoiado por Arthur Virgílio. O PSDB sai enfraquecido da refrega e provavelmente alimentará muitas deserções daqui até 2022.
A vida política nacional espera, com ansiedade, o pronunciamento mais efetivo das forças partidárias frente às questões mais dramáticas da realidade, como a inflação e o desemprego. Neste sentido, a viagem consagradora de Lula ao exterior teve o dom de despertar na opinião pública, novamente, a aspiração à reintegração do Brasil na esfera decisória mundial. Mas, ainda é pouco diante da decadência do sistema democrático e popular entre nós.
*Benicio Viero Schmidt é professor aposentado de sociologia na UnB e consultor da Empower Consult. Autor, entre outros livros, de O Estado e a política urbana no Brasil (LP&M).