Por FRANCESCA ALBANESE, RICHARD BENNETT, MOHAMED BABAIKER*
Uma carta aberta de especialistas independentes em direitos humanos das Nações Unidas que servem em diversas funções de relatoria e assessoria sob o comando do Conselho de Direitos Humanos da ONU
Pedimos urgentemente a todos os países-membros da ONU que imediatamente parem e desistam de articular apoio político e moral ou de fornecer assistência econômica ou militar para ações de atores estatais e não estatais que compreendam violações da lei humanitária internacional e da lei internacional de direitos humanos – algumas das quais representam graves infrações à Convenção de Genebra de 1949, crimes de guerra e crimes contra a humanidade.
Acontecimentos em diferentes partes do mundo, e as reações a eles por poderosos países-membros terceiros, ameaçam minar fatalmente a aplicabilidade universal de normas internacionais decisivas para a proteção de civis e seus direitos humanos fundamentais – e com isso a credibilidade de várias diretrizes específicas de cada país.
A perturbadora erosão gradual e constante desses critérios universais tem sido observada em conflitos nas últimas duas décadas e especialmente desde a declaração da “guerra ao terror”. Entretanto, diversos conflitos armados recentes ameaçam desintegrar completamente critérios e sistemas de proteção que foram implantados ao longo de décadas. Sentimo-nos forçados a lembrar aos países-membros as seguintes salvaguardas básicas, que todos são obrigados a respeitar e a garantir que os outros também respeitem.
Punição coletiva, visar e atacar indiscriminadamente civis, instalações e profissionais médicos, edifícios religiosos e residenciais, mercados e instituições educacionais, assim como deslocamento forçado e deportação, a tomada de reféns, violência sexual, saque, pilhagem, detenção arbitrária e escravidão são todos proibidos pela lei internacional.
No caso de necessidade militar urgente, ou denúncias de que um determinado local infringiu seu status civil, o ônus da prova recai sobre os que atacam tais locais – e não os que estão sendo atacados, isto é, os civis que eles abrigam ou protegem.
A penúria de uma população, a privação de seu acesso a alimentação adequada, habitação, água, combustível e medicamentos é proibida. As partes de conflitos são obrigadas a permitir que ajuda humanitária e socorro em níveis adequados entrem em áreas sob seu controle militar; terceiras partes devem garantir que essa obrigação seja cumprida. Terceiros permanecem comprometidos por suas próprias obrigações sob o direito internacional a não facilitar ou garantir atos ou acordos que violem essa lei.
Lembramos aos países-membros da ONU que mecanismos de remediação e reparação por violação dos direitos humanos fundamentais, crimes de guerra e crimes contra a humanidade existem nos fóruns nacionais, regionais e internacionais. Esses mecanismos podem e devem ser mobilizados, de maneira vigorosa e imparcial, não somente contra os perpetradores, mas também contra autoridades de outros lugares que variadamente incentivam tais crimes, os facilitam ou deixam de evitar seu cometimento.
É imperativo que países-membros terceiros desistam imediatamente de ações ou inações que minem os padrões, princípios e salvaguardas internacionais de direitos humanos, incluindo ação tomada como aliados e apoiadores.
Esperamos seu apoio imediato e ativo. Uma área particular onde seria bem-vindo o apoio de todos os países-membros é garantir nosso acesso total e livre, como especialistas independentes da ONU em direitos humanos, a todos os países para permitir o cumprimento de nossos objetivos de ajudar a comunidade internacional em seu compromisso proclamado de promover a proteção dos direitos humanos universais em todo o mundo, sem distinção e sem discriminação.
*Francesca Albanese é relatora especial sobre a situação dos direitos humanos no território palestino ocupado.
*Richard Bennett é relator especial sobre a situação dos direitos humanos no Afeganistão.
*Mohamed BaBaiker é relator especial sobre a situação dos direitos humanos na Eritreia.
Assinam esta carta mais 14 especialistas que servem em vários mandatos de investigação no Conselho de Direitos Humanos da ONU, em Genebra (Suíça)
Tradução: Luiz Roberto M. Gonçalves.
Publicado originalmente no jornal Folha de S. Paulo.
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