Marcos Costa Lima (1951-2022)

Cathy Wilkes, Papai descansando, 2009
image_pdf

Por RUBENS PINTO LYRA*

Homenagem ao professor da Universidade Federal de Pernambuco, recém-falecido

Marcos Costa Lima, no dia 29 de junho passado, despediu-se de nós, seus admiradores, profundamente consternados, especialmente colegas, alunos e ex-alunos que com ele tiveram o privilégio de conviver e dentre os quais fez sólidas amizades. Não são poucos, felizmente, os que, nas universidades, também partiram deixando lembranças, não só dos seus predicados intelectuais, mas também de suas qualidades como cidadão e ser humano.

Porém, o que há de peculiar na trajetória luminosa desse grande colega e amigo, que contribuiu sobremaneira para que seu brilho acadêmico se irradiasse mais amplamente, contagiando os que o conheceram, foi seu “seu trato gentil e generoso”, conforme se expressou, em “Nota de Pesar”, a diretoria do Centro Celso Furtado, onde teve atuação marcante. Ela destaca ainda, que Marcos deixou “não somente um patrimônio intelectual, mas também afetivo”.

Não se trata de confetes lançados, muitas vezes, por mera formalidade, aos que morrem. As opiniões sobre Marcos a não deixam dúvidas, por serem unânimes e enfáticas. Ele era, com efeito, “uma pessoa cativante, fora de série, que sempre procurava conciliar”, conforme frisou nota da Universidade Federal de Pernambuco. Já para a Associação Nacional de Pós-Graduação em Ciências Sociais (ANPOCS), da qual foi presidente entre 2011 e 2012, “foi uma personalidade agregadora e uma liderança gentil e alegre”.

Os aspectos de sua personalidade, aqui ressaltados, foram fortemente influenciados pelo seu ilustre genitor, Osvaldo Lima Filho, ministro da Agricultura do governo João Goulart e ex-vice-presidente da Câmara dos Deputados, na década de sessenta do século passado. Ele também atuou, de forma marcante, na Constituinte de1988, como importante liderança do PMDB. Em 1991, filou-se ao PT.

Pai e filho foram espíritos conciliadores e tolerantes. Mas essas características não se confundem com leniência, pois os seus posicionamentos políticos e ideológicos sempre foram firmes e claros, comprometidos com a busca de mais igualdade e justiça social. Destarte, a sua gentileza nunca foi expressão de sociabilidade alienada, mas sim, reflexo de uma práxis humana impregnada de virtù.

Marcos Costa Lima, este “ser humano fantástico, autor de vastíssima obra, foi uma figura ímpar, que deixa grandioso legado acadêmico” conforme divulgado na “Nota de Pesar” emitida pela coordenadoria dos Estudos da Ásia da UFPE. Transitou por múltiplas esquinas das ciências sociais, tendo publicado trabalhos em temas tão diversos como desenvolvimento, meio ambiente, política internacional, Mercosul, globalização, pensamento social brasileiro e sobre a China, Coréia do Sul e a América Latina.

Sua reconhecida competência o fez, desde 2015, Coordenador dos Estudos da Ásia, além de professor visitante de várias instituições internacionais, como as universidades de Leiden, de Walles-Swamsea, a Sorbonne Nouvelle e a Sciences Politiques de Lille. Foi, também, membro do Conselho Científico do Centro Internacional Celso Furtado de Estudos para o Desenvolvimento (2013-2017).

Fui um dos muitos beneficiários de sua atuação, voltada para criar pontes e estabelecer os mais diversos intercâmbios. Ele levou-me a participar, como colunista, da revista eletrônica Jornalismo e cidadania, do PPGCOM da UFPE e a figurar como membro do Conselho editorial da Revista de Estudos da Ásia. Marcos também prefaciou o meu livro sobre o bolsonarismo e escreveu a contracapa da minha última obra que versa sobre teoria política, transcrita em forma de apresentação no site A terra é redonda, tendo sido este seu derradeiro texto publicado.

O legado de Marcos Costa Lima vai muito além da obra que produziu pois não poucos, como eu próprio, ampliaram, ainda que modestamente, sua contribuição às ciências sociais e à ciência política graças à sua estimulante mediação, que descortinou novos horizontes para meus trabalhos.

Assim, as referências aparentemente superlativas a esse extraordinário colega são apenas a expressão fiel da fecundidade de sua atuação voltada para o engrandecimento das ciências sociais e para o seu aprimoramento como instrumento de transformação. Seu comovente exemplo de vida e de trabalho continuará a inspirar a todos que comungam de seus ideais.

*Rubens Pinto Lyra, doutor em direito (área de Política e Estado), é Professor Emérito da UFPB. Autor, entre outros livros, de Bolsonarismo: ideologia, psicologia, política e temas afins (Ed. do CCTA/UFPB).

 

Veja todos artigos de

MAIS LIDOS NOS ÚLTIMOS 7 DIAS

1
O segundo choque global da China
06 Dec 2025 Por RENILDO SOUZA: Quando a fábrica do mundo também se torna seu laboratório mais avançado, uma nova hierarquia global começa a se desenhar, deixando nações inteiras diante de um futuro colonial repaginado
2
Energia nuclear brasileira
06 Dec 2025 Por ANA LUIZA ROCHA PORTO & FERNANDO MARTINI: Em um momento decisivo, a soberania energética e o destino nacional se encontram na encruzilhada da tecnologia nuclear
3
Simulacros de universidade
09 Dec 2025 Por ALIPIO DESOUSA FILHO: A falsa dicotomia que assola o ensino superior: de um lado, a transformação em empresa; de outro, a descolonização que vira culto à ignorância seletiva
4
A guerra da Ucrânia em seu epílogo
11 Dec 2025 Por RICARDO CAVALCANTI-SCHIEL: A arrogância ocidental, que acreditou poder derrotar a Rússia, esbarra agora na realidade geopolítica: a OTAN assiste ao colapso cumulativo da frente ucraniana
5
Asad Haider
08 Dec 2025 Por ALEXANDRE LINARES: A militância de Asad Haider estava no gesto que entrelaça a dor do corpo racializado com a análise implacável das estruturas
6
Uma nova revista marxista
11 Dec 2025 Por MICHAE LÖWY: A “Inprecor” chega ao Brasil como herdeira da Quarta Internacional de Trotsky, trazendo uma voz marxista internacionalista em meio a um cenário de revistas acadêmicas
7
O filho de mil homens
26 Nov 2025 Por DANIEL BRAZIL: Considerações sobre o filme de Daniel Rezende, em exibição nos cinemas
8
Raymond Williams & educação
10 Dec 2025 Por DÉBORA MAZZA: Comentário sobre o livro recém-lançado de Alexandro Henrique Paixão
9
Considerações sobre o marxismo ocidental
07 Dec 2025 Por RICARDO MUSSE: Breves considerações sobre o livro de Perry Anderson
10
O agente secreto
07 Dec 2025 Por LINDBERG CAMPOS: Considerações sobre o filme de Kleber Mendonça Filho, em exibição nos cinemas
11
Impactos sociais da pílula anticoncepcional
08 Dec 2025 Por FERNANDO NOGUEIRA DA COSTA: A pílula anticoncepcional não foi apenas um medicamento, mas a chave que redefiniu a demografia, a economia e o próprio lugar da mulher na sociedade brasileira
12
Insurreições negras no Brasil
08 Dec 2025 Por MÁRIO MAESTRI: Um pequeno clássico esquecido da historiografia marxista brasileira
13
A armadilha da austeridade permanente
10 Dec 2025 Por PEDRO PAULO ZAHLUTH BASTOS: Enquanto o Brasil se debate nos limites do arcabouço fiscal, a rivalidade sino-americana abre uma janela histórica para a reindustrialização – que não poderemos atravessar sem reformar as amarras da austeridade
14
As lágrimas amargas de Michelle Bolsonaro
07 Dec 2025 Por CAIO VASCONCELLOS: Estetização da política e melodrama: A performance política de Michelle como contraponto emocional e religioso ao estilo agressivo de Jair Bolsonaro
15
O empreendedorismo e a economia solidária – parte 2
08 Dec 2025 Por RENATO DAGNINO: Quando a lógica do empreendedorismo contamina a Economia Solidária, o projeto que prometia um futuro pós-capitalista pode estar reproduzindo os mesmos circuitos que deseja superar
Veja todos artigos de

PESQUISAR

Pesquisar

TEMAS

NOVAS PUBLICAÇÕES