A economia no terceiro mandato de Lula

Imagem: Irina Iriser
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Por BRUNO MACHADO*

O que falta para um novo-desenvolvimentismo brasileiro é condições objetivas e materiais para sua implementação prática

Muito se discute como será o terceiro mandato de Lula no ramo da economia. Alguns esperam um Lula 3 parecido com o Lula 1, bastante conservador. Outros, veem na indicação de Haddad para Fazenda um sinal de que o PT pretende colocar em prática suas propostas originais para a economia brasileira. Entretanto, também há a possibilidade de Lula ter quatro anos de liberalismo econômico para eleger um sucessor com uma proposta contra-hegemônica para a economia brasileira.

O desafio do terceiro mandato de Lula no âmbito da economia pode demonstrar-se menos difícil do que o esperado. Após o golpe contra a Dilma Rousseff, o PIB per capita brasileiro vinha crescendo em média 1% ao ano, sofrendo uma grande queda na pandemia. Do golpe à pandemia, o PIB per capita brasileiro nem sequer se recuperou da crise de 2015. O crescimento médio esperado da economia brasileira é de 2% ao ano, em termos de PIB per capita. Um governo com uma política econômica racional, não pautada no fundamentalismo de mercado, consegue esse crescimento sem grandes mudanças estruturais.

Com uma possível nova âncora fiscal, que leve em conta a dívida pública no médio e longo prazo, e que possibilite o acerto das contas públicas tanto por meio do corte de gastos quanto do aumento da arrecadação, boa parte do caminho rumo a um crescimento médio de 2% ao ano já estará traçado. Como também é esperada uma retomada dos investimentos públicos e uma política internacional novamente racional, pode-se ter certo otimismo quanto o crescimento econômico brasileiro dos próximos quatro anos.

O governo Lula 3 deverá vir para reordenar o Estado brasileiro seguindo ditames democráticos, republicanos e científicos e, ao mesmo tempo, recuperar um patamar de PIB per capita equivalente, em poder de paridade de compra, com os números pré-crise de 2015. Com um crescimento econômico lento gradual e seguro, dentro de um governo petista, o Brasil pode retomar a normalidade de país periférico no capitalismo global, mas não superará suas dificuldades de produção e distribuição de riquezas, e muito menos terá condições de oferecer a seu povo boas condições de emprego, moradia, segurança, saúde, educação, cultura e lazer.

Uma verdadeira transformação na vida material do brasileiro médio depende da retomada do rápido crescimento econômico que o Brasil passou do período Vargas até o Golpe de 1964. Somente com um governo desenvolvimentista, que aplique uma política macroeconômica keynesiana acoplada a uma política microeconômica com foco no progresso tecnológico através de políticas industriais, o Brasil poderia esbanjar de um desenvolvimento econômico com crescimento do PIB na faixa dos 6% ao ano, o que nos igualaria a Itália em três ou quatro décadas, em termos de PIB per capita e se a Itália mantivesse sua média atual de crescimento durante esse período.

Que tal pensamento desenvolvimentista está presente no PT, não é segredo para ninguém. O que falta para um novo-desenvolvimentismo brasileiro é condições objetivas e materiais para sua implementação prática. E os impedimentos a essas condições se demonstraram serem de cunho político, não econômico. Com sorte, Lula prepara um primeiro mandato moderado para ganhar confiança do mercado e eleger um sucessor desenvolvimentista que não venha a sofrer boicotes do mercado tão grandes como os sofridos por Lula em 2003, ainda que tais ataques sejam inevitáveis contra qualquer desvio ao neoliberalismo.

Ao contrário do que repetia Ciro Gomes, o maior empecilho ao desenvolvimento econômico brasileiro não é a falta de ideias ou projetos, mas a quase impossibilidade de implementar uma política econômica pró-desenvolvimento econômico sem sofrer com o terrorismo especulativo do mercado financeiro, que controla tanto a mídia quanto o Congresso. Lula, assim como Dilma Rousseff, aprendeu na prática como o tal mercado tem força no Brasil, e demonstra muita cautela na divulgação de cada nova proposta econômica.

A maior contribuição para a construção de um Brasil economicamente desenvolvido que Lula pode realizar é usar sua posição de líder das massas para elevar a politização e consciência de classe dos trabalhadores brasileiros. Pois, somente com a atuação ativa da classe trabalhadora, qualquer governante de esquerda terá poder para fazer transformações estruturais no Brasil.

*Bruno Machado é engenheiro.

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