Por BENICIO VIERO SCHMIDT*
Comentários sobre acontecimentos recentes.
A CPI da Covid-19 continua concentrando as atenções. O depoimento do diretor-geral da Anvisa, o contra-almirante Antonio Barra Torres, confirmou aquilo que se suspeitava, uma tentativa criminosa de alterar a bula de um remédio para incluir indicação no combate ao Covid-19. A médica principal implicada nega a sua colaboração. Mas o diretor-geral da Anvisa foi enfático e, diga-se de passagem, bastante convincente.
Antonio Barra Torres também foi convincente quando disse que não concorda com as medidas protelatórias do governo, encabeçadas pelo presidente Jair M. Bolsonaro – como a postura negacionista, a não aceitação das restrições impostas por prefeitos e governadores, a defesa de aglomerações e a despreocupação com a vacinação em geral. Um excelente depoimento que vai ajudar a CPI a apurar as devidas responsabilidades.
O jornal O Estado de S. Paulo, em uma série de reportagens, continua desvendando o “orçamento secreto” de 3 bilhões de reais usados diretamente por indicação de parlamentares. A maior parte dos recursos foi alocada na Codevasp, uma instituição que cuida do Vale do São Francisco e cujos quadros comissionados foram indicados por deputados do Centrão. Essas verbas – inconstitucionalmente alocadas sem limites por parlamentar – beneficiaram principalmente as lideranças da Câmara e do Senado ou que foram, no caso de Davi Alcolumbre.
Esse tipo de operação dificulta o controle por parte do Tribunal de Contas da União (TCU). Já veio a lume os primeiros indícios de superfaturamento; em tratores comprados para atender projetos clientelistas, no mais puro sentido da palavra, dos congressistas junto ao seu eleitorado. Um problema grave porque – como se trata de um orçamento paralelo – impossibilita a fiscalização imediata.
Nesta quarta-feira a Câmara de deputados aprovou o Projeto de Lei 3729/2004, a lei geral de licenciamento ambiental, na versão modificada pelo relatório do deputado Neri Geller (PP-MT). O deputado propõe a liberação total de licenciamento para dezessete tipos de empreendimentos. Isso significa que a legislação vigente será praticamente anulada depois de muitas lutas e conquistas dos ambientalistas.
Alguns deputados têm chamado atenção para a inconstitucionalidade da proposta do deputado Geller, pois ela fere certas cláusulas pétreas da constituição. De qualquer forma, mais um desgaste do Brasil na área ambiental diante do conjunto das nações que pressionam o país para a adoção de políticas consuetudinárias coerentes com a lei de licenciamento ambiental de 2004.
Cabe destacar, embora tenha ocupado lugar secundário na imprensa nacional, as novas ações de desmonte do Ministério da Educação. Dois fatos a destacar: a nomeação da atual presidente da CAPES, proveniente de um curso que foi aprovado com nota 2 pela própria CAPES na última avaliação e a fraude que está sendo apurada pela Polícia Federal relativa à realização do ENADE de 2019. Trata-se de um desmonte de duas instituições importantes para a educação brasileira construídas devido a décadas de luta visando a independência da avaliação da performance dos cursos e da avaliação dos alunos. Dois acontecimentos graves na gestão do atual ministro da Educação, o pastor presbiteriano Milton Ribeiro.
Na terça-feira, na Câmara de Deputados, aconteceu uma audiência referente à reforma administrativa. Antes da conclusão dos trabalhos, o ministro Paulo Guedes se retirou da reunião, deixando sem respostas as questões da maioria dos parlamentares presentes na reunião. Pergunta-se: o que Paulo Guedes teme? A deputada Maria do Rosário (PT-RS) acusa a atual proposta do Governo Federal para a reforma administrativa de evasiva e negacionista frente aos princípios – cláusulas pétreas – da Constituição, que garantem a imobilidade e a perenidade dos cargos administrativos obtidos por concursos públicos. Tudo leva a crer que a reforma administrativa será ainda palco de muitas polêmicas.
Ainda na terça-feira noticiou-se a suspeição, decorrente do depoimento de “delação premiada” do ex-governador Sérgio Cabral, sobre um possível recebimento de propinas por parte do ministro do STF Dias Toffoli, numa operação que envolveu o escritório de advocacia de sua esposa. Trata-se de uma acusação grave que deverá trazer muita tensão ao STF, ao mundo jurídico e político, de modo geral.
*Benicio Viero Schmidt é professor aposentado de sociologia na UnB. Autor, entre outros livros, de O Estado e a política urbana no Brasil (LP&M).