Amazônia e as contradições do discurso ambiental

Whatsapp
Facebook
Twitter
Instagram
Telegram

Por JOSÉ RAIMUNDO TRINDADE*

A contradição entre o discurso de proteção ambiental e os limites da economia capitalista

Nos últimos anos se reforçou o mais que necessário discurso ambientalista. Muito recentemente se realizaram conferências internacionais que, função da atual disputa política que enfrentamos, colocou o discurso de uma autoridade brasileira em primeiro plano ao nível mundial. O discurso do presidente Lula em Belém, principal cidade amazônica e exemplo das contradições do capitalismo periférico brasileiro, pode ser inicialmente citado neste texto, seja para tratar das dificuldades que temos pela frente, seja pela esperança otimista que esse velho dirigente social nos possibilita.

Para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva a “Amazônia não é e não pode ser tratada como um grande depósito de riquezas. Ela é uma incubadora de conhecimentos e tecnologias que mal começamos a dimensionar”.[i] O discurso do presidente está em tudo correto, o que seria um gigantesco bioma com diversidade e lógica ambiental tão necessários a humanidade dos séculos XXI e XXII não pode se reduzir a um almoxarife de produtos minerais e grãos fornecidos no “delivery Brasil”.

Neste artigo me utilizarei de publicações acadêmicas que desenvolvi que demonstram a contradição entre o discurso de proteção ambiental e os limites da economia capitalista. O discurso da racionalidade capitalista relaciona a possibilidade de continuidade do capitalismo e a atenuação das contradições, inclusive ambientais, algo que passa a ser formulado no em torno dos discursos de “sustentabilidade ambiental” e de “empreendedorismo verde”.

A Amazônia aparece com relevância no cenário econômico nacional como região exportadora de produtos primários, com destaque a produção extrativa mineral (minério de ferro, principalmente), boi vivo, biodiesel do óleo de palma e, na zona fronteiriça com o Centro-Oeste, especialmente a área de contiguidade entre o Mato Grosso e o Pará, ganha relevância a produção de soja e milho. Aspecto chave nisso tudo se refere a contradição entre sustentabilidade econômica e ambiental, claramente visível na relação entre superávits da balança comercial e avanço do desmatamento na Amazônia. Em 2020, as exportações dos dois estados supracitados corresponderam a cerca de 80% de tudo que a Amazônia vendeu ao exterior, assim como representam o grande corredor de desmatamento florestal.

Exportação de produtos primários e a questão ambiental

A balança comercial brasileira apresenta comportamento bastante regular nas últimas duas décadas. Superavitária no começo dos anos 1990 e, de 1995 a 2000, deficitária. A partir daí o que se observa é superávit e crescimento considerável do saldo comercial, com as exportações crescendo em ritmo mais acelerado que as importações. Somente em três anos se observou déficits (2000, 2013 e 2014), chegou ao pico em 2017, com saldo de US$ 56 bilhões, mantidos elevados saldos nos últimos quatro anos. Dos destaques dos produtos básicos, minério de ferro e soja são os principais itens da pauta de exportação, conforme evidenciado na Tabela 1 a seguir com os principais produtos exportados pelo país em 2020.

Tabela 1 – Principais produtos exportados pelo Brasil – 2020

Descrição NCMUS$ (Mil)(%)
Sementes e frutos oleaginosos; grãos, sementes e frutos 29.043.102.27213,9
Minérios, escórias 28.893.262.14113,8
Combustíveis minerais, óleos minerais 24.872.571.55411,9
Carnes e miudezas, comestíveis 15.821.674.2767,6
Açúcares e produtos de confeitaria 8.887.159.1744,2
Ferro fundido, ferro e aço 8.672.768.1784,1
Industriais com agregação de valor 44.021.993.41221,0
Outros 48.967.710.64823,4
Total 209.180.241.655100,0
Fonte: Comex Stat, Ministério da Economia (2021).

Outros produtos primários são combustíveis, carnes e açúcares. A carne bovina é item em franca ascensão. Em 2020, o Brasil exportou US$ 15,8 bilhões em carne bovina (80% sendo in natura), sendo o país é o maior exportador mundial de carne bovina, sendo essa pauta primário exportadora fortemente concentrada na região amazônica, com óbvios elementos de impactos ambientais.

O setor exportador da Amazônia

Pará e Mato Grosso são os dois maiores exportadores da Amazônia legal, ocupando a primeira e a terceira colocação, respectivamente, em termos de saldo comercial entre os estados brasileiros, conforme dados referentes a 2020, ver tabela abaixo.

Tabela 2 – Saldo da Balança Comercial (Unidades Federativas) – 2020

UF do ProdutoEXP – Valor FOB (US$)IMP – Valor FOB (US$)SALDO – Valor FOB (US$)
Pará 20.611.770.877 1.199.622.71319.412.148.164
Minas Gerais 26.319.148.236 8.252.239.30118.066.908.935
Mato Grosso 18.231.913.879 1.800.033.24116.431.880.638
Rio Grande do Sul 14.059.629.221 7.604.563.3416.455.065.880
Goiás 8.133.811.970 3.319.286.5444.814.525.426
Fonte: Comex Stat, Ministério da Economia (2021).

Minério, gado, madeira e soja: a pauta de exportações do Pará e o rastilho do desmatamento

Na segunda metade do século passado, a economia do estado passou por forte processo de inserção do capital internacional, momento em que foram instaladas na região grandes plantas industriais de extração mineral, os denominados “grandes projetos mineradores”. As décadas de 1970 e 1980 presenciaram o desenvolvimento dos empreendimentos mineiros no Estado do Pará, inseridos na estratégia assumida pelos governos militares, ainda na segunda metade da década de 1970, de buscar relativa complementaridade da base industrial nacional. Esse processo teve início no II Plano Nacional de Desenvolvimento (II PND – 1975/79), durante o governo Geisel, objetivando a implantação de programas que tinham como meta a produção de bens de capital e insumos básicos.

Os interesses do Estado nacional em torno da instalação desses empreendimentos foram entre outras coisas: (i) gerar divisas com vistas ao equacionamento da crise cambial que começava a se delinear e (ii) delinear o papel que a região passaria a desempenhar, ou seja, de fornecedora de bens primários ou semielaborados – para constituir-se no pólo industrial do Centro-Sul.

As exportações paraenses vêm crescendo muito em anos recentes, mantendo a característica superavitária de sua balança comercial. Conforme mostram os dados do MDIC, em 2020 o Pará apresenta o maior saldo exportador entre todas as unidades federativas, como mostra a tabela acima apresentou um saldo de quase 19,5 bilhões de dólares. Seria um cenário interessante e de conforto para o Pará não fossem as características intrínsecas a isso. Uma delas é a composição da pauta de exportação paraense, que é composta em mais de 70% por produtos básicos. O principal produto da pauta de exportação paraense é o minério de ferro, que em 2020 representou mais de 67% de tudo que foi exportado pelo estado (ver Tabela 2) e quase 50% da exportação nacional do produto.

Tabela 3 – Principais produtos exportados pelo Estado do Pará – 2020

Descrição NCM2020 – Valor FOB (US$)%
Minérios de ferro e seus concentrados 13.968.823.34567,8
Outros minérios de cobre e seus concentrados 1.899.904.3699,2
Alumina calcinada 1.212.165.4215,9
Soja, mesmo triturada, exceto para semeadura 759.451.5203,7
Carnes desossadas de bovino, congeladas 406.779.2382,0
Outros 2.364.646.98411,5
Total 20.611.770.877100,0
Fonte: Comex Stat, Ministério da Economia (2021).

Portanto, os setores econômicos mais importantes da economia paraense são a mineração e beneficiamento mineral, bem como, a produção de soja, pecuária e a extração da madeira, os quais acabam alavancando setores como: serviços em geral, a produção de alimentos, vestuário e construção civil, que colocaram o estado numa rota de crescimento econômico nas últimas décadas, porém baseada em um extrativismo destrutivo. Nas últimas duas décadas o período de 1995 a 2007, por exemplo, o crescimento acumulado do PIB paraense foi de 157,16%, o que proporcionou um crescimento médio de 4,76%, e consolidou taxas reais de crescimento da economia paraense bem acima da evolução do PIB acumulado brasileiro, que foi de 139,77%, ou seja, 3,31% em média.

Esse avantajado crescimento econômico, centrado na produção e exportação de bens básicos, estabeleceu, por outro lado, um formato de ocupação do espaço amazônico paraense fortemente degradador do meio ambiente e caracteristicamente expansivo sobre a floresta, o que determinou dois movimentos importantes: o expressivo desmatamento, acompanhado de um forte movimento migratório e de ocupação do “hinterland” amazônico com grande desigualdade social e empobrecimento de sua população.

A grande lavoura da soja no norte mato-grossense e a BR-163: as exportações do Mato Grosso e o avanço do desmatamento

Como segundo maior exportador da Amazônia legal e terceiro do país em termos de saldo comercial, o Mato Grosso teve saldo comercial em 2020 de US$ 16,4 bilhões, sendo cerca US$ 18,2 bilhões de exportação e quase US$ 1,8 bilhões em importação.

As exportações mato-grossenses são compostas por mais de 90% de produtos básicos, destes a soja é o principal (mais de 40%). Os três primeiros da lista – soja, milho e algodão – somam cerca de 73% da pauta de exportação desta unidade federativa (ver Tabela 3).

Tabela 4 – Principais produtos exportados pelo Estado do Mato Grosso – 2020

Descrição NCM2020 – Valor FOB (US$)%
Soja, mesmo triturada, exceto para semeadura 7.634.204.79241,9
Milho, exceto para semeadura 3.684.322.18020,2
Algodão, não cardado nem penteado 2.114.977.36211,6
Tortas e outros resíduos sólidos da extração do óleo de soja 2.044.946.08211,2
Carnes de bovino, desossadas, congeladas 1.439.834.9087,9
Outros 1.313.628.5557,2
Total 18.231.913.879100,0
Fonte: Comex Stat, Ministério da Economia (2021).

O comportamento do setor exportador em Mato Grosso apresenta rápida evolução nos anos recentes. De 2000 a 2020, as exportações crescem ano após ano. Enquanto no primeiro ano do século o estado exportou US$ 1,03 bilhão, o valor em 2020 atingiu US$ 18,2 bilhões, o que dá mais de 1700% de variação. A cadeia produtiva da soja participa por volta de 20% do PIB do agronegócio nacional, correspondendo a mais de US$ 35 bilhões no ano de 2004, sendo que quase 50% da colheita nacional estão nos estados do Mato Grosso e Paraná, que produziram respectivamente 14,5 e 10,2 milhões de toneladas no referido ano. Essa “commodité” tem apresentado nas últimas duas décadas grande expansão em sua demanda internacional, refletindo-se em um comportamento do preço internacional extremamente regular a despeito de uma crescente oferta dos produtores de três países chaves: Brasil, EUA e Argentina.

O rastilho que acompanha a expansão da soja caracteriza-se pela racionalidade que comanda esse tipo de produção, uma “tendência à concentração fundiária a níveis de tamanho médio e grande, inferiores aos dos grandes latifúndios pecuaristas”, propriedades situadas entre “200 e 2000 ha”, muito mecanizadas e utilizando somente sazonalmente força de trabalho. Em função dessas características a expansão da lavoura de soja se dá com certo “despovoamento” do campo, contribuindo para o aumento da população urbana dos municípios da área de abrangência do “corredor da soja”, ao mesmo tempo que a área desmatada cresce exponencialmente, como se verá a seguir.

O aumento do preço da soja no mercado internacional desencadeou a concentração de terras também no meio oeste mato-grossense e estimulou a penetração dessa cultura no norte daquele estado e se expandindo para o estado do Pará. Vale notar que a soja se proliferou em todo país, sendo que no caso amazônico todos os estados já possuem culturas de soja, algo vinculado ao padrão de especialização primário-exportador do atual ciclo econômico brasileiro. A elevada taxa de crescimento da produção de soja pode ser visualizada no Gráfico abaixo.

Gráfico 1 – Quantidade produzida de soja (tonelada) (2000/2020)

Fonte: IBGE/PAM (2021).

O norte mato-grossense consolidou como maior área de produção de soja do país, segundo dados da PAM (Produção Agrícola Municipal), divulgada pelo IBGE, a área total destinada a esse cultivo passa de cerca de 1,8 milhões de hectares em 2000, para algo em torno de 6,3 milhões de hectares plantados em 2020, uma taxa média de crescimento geométrica de 6,7% anual.

Aspecto importante a ser observado da expansão agrícola nessa região é que a mesma se trata, em grande medida, de uma estrutura bastante capitalizada, vinculada, inclusive, a “tradings” exportadoras, como a Cargill e a ADM, baseada em médios e grandes produtores, com um grau de produtividade e os menores custos de produção nacionais.

A estrutura fundiária tem se alterado na última década e as principais cidades da região concentram-se nas proximidades da BR-163, constituindo-se na sua maior parte núcleos extremamente recentes; claro sinal do expressivo movimento migratório ocorrido na região, ao lado da característica já observada em outras áreas, do declínio da densidade demográfica no meio não urbano, desempenhando essas pequenas cidades o papel de pontos de apoio logístico e de disponibilidade de força de trabalho para a grande lavoura da soja.

A explicação mais óbvia para expansão da soja em Mato Grosso e no restante do país, especialmente na fronteira amazônica, encontra-se no preço da terra e no longo ciclo de crescimento da demanda da soja, que tem proporcionado uma grande regularidade nos seus preços internacionais, constituindo o principal segmento produtivo característico do atual ciclo agrário-exportador brasileiro.

O processo de expansão produtiva do agronegócio consolida um quadro de avançada substituição da floresta (e do cerrado) pela “plantation”, sendo que a frente de expansão mais recente é a que se forma nas bordas dos dois estados (Mato Grosso e Pará), e parece configurar o principal fator a ser analisado de modificações no curto e médio prazo para a região do entorno da BR-163 até o município de Santarém e se aprofundando ao longo da BR-316, até o município de Paragominas, ambos no estado do Pará, como mostram os dados de crescimento da produção de soja nesta unidade amazônica.

A questão ambiental e o desmatamento amazônico

O destaque que se faz aqui diz respeito basicamente a questão do desmatamento na Amazônia. Não é intenção adentrar nos detalhes, mas enfatizar alguns pontos relacionados com o setor exportador. A literatura sobre o assunto traz como informação básica que a pecuária é a principal responsável direta pelo desmatamento na região amazônica. Além da referida atividade, há também destaque para outras variáveis, como a abertura das estradas nos anos 1970/80 (como determinante para os futuros padrões de desmatamento) e, em período mais recente, o crescimento considerável da plantação de soja.

A Tabela 5 abaixo mostra o desmatamento anual por estado amazônico. Pará e Mato Grosso foram os que mais desmataram entre os anos 2004-2020, somando 112,8 mil Km² de florestas derrubadas no período (de todos os estados foram quase 171,5 mil Km²). Tal área desmatada pelos dois estados é maior do que o somatório das extensões territoriais da Paraíba, Rio Grande no Norte e Sergipe.

Tabela 5 – Taxa de desmatamento anual na Amazônia (km²/ano), 2004-2020

Ano/EstadosACAMAPMAMTPARORRTOAMZ LEGAL
2004 728 1.232 46 755 11.814 8.870 3.858 311 158 27.772
2005 592 775 33 922 7.145 5.899 3.244 133 271 19.014
2006 398 788 30 674 4.333 5.659 2.049 231 124 14.286
2007 184 610 39 631 2.678 5.526 1.611 309 63 11.651
2008 254 604 100 1.271 3.258 5.607 1.136 574 107 12.911
2009 167 405 70 828 1.049 4.281 482 121 61 7.464
2010 259 595 53 712 871 3.770 435 256 49 7.000
2011 280 502 66 396 1.120 3.008 865 141 40 6.418
2012 305 523 27 269 757 1.741 773 124 52 4.571
2013 221 583 23 403 1.139 2.346 932 170 74 5.891
2014 309 500 31 257 1.075 1.887 684 219 50 5.012
2015 264 712 25 209 1.601 2.153 1.030 156 57 6.207
2016 372 1.129 17 258 1.489 2.992 1.376 202 58 7.893
2017 257 1.001 24 265 1.561 2.433 1.243 132 31 6.947
2018 444 1.045 24 253 1.490 2.744 1.316 195 25 7.536
2019 682 1.434 32 237 1.702 4.172 1.257 590 23 10.129
2020* 706 1.512 24 336 1.779 4.899 1.273 297 25 10.851
Var. 2020-2019*4%5%-25%42%5%17%1%-50%9%7%
Fonte: PRODES (2021).

Os primeiros anos da década passada foram críticos em termos de devastação florestal na Amazônia, chegando em 2004 com 27,7 mil Km² de área desmatada. Naquele ano, só o Estado do Mato Grosso foi responsável por mais de 40% do desmatamento total, seguido pelo Pará (32%). A partir desse pico a área desmatada diminuiu gradativamente, alcançando 4,5 mil Km² de área desmatada em 2012, voltando a se elevar e acelerando o desmatamento após o golpe de Estado de 2016 e aumentando muito fortemente com o governo Bolsonaro e com o desmanche do IBAMA e ICM-Bio.

Preocupa a observação que os produtos responsáveis pelo desmatamento são justamente os que estão em maior ascensão na pauta exportadora. A Amazônia fornece boa parte deles, com destaque a pecuária bovina (carne e até boi vivo), soja e minério de ferro.

Especificamente no caso da soja, o acompanhamento geoespacial feito pelo INPE há muito demonstrou a forte correlação entre as frentes de expansão produtiva e o forte incremento da floresta desmatada, em geral a soja aparece enquanto segunda geração de ocupação e alteração entrópica, após a expansão pecuária e a exploração madeireira.

A geração de divisas via balança comercial em anos recentes está pautada principalmente na comercialização de produtos básicos. Mais ainda, a balança comercial no país deve e muito sua situação superavitária aos estados da Amazônia, principalmente Pará e Mato Grosso. Tem-se, então, a Amazônia como importante região exportadora para o Brasil, porém a um enorme custo social e ambiental.

Mantendo a tendência observada de ser somente fornecedor de produtos básicos, a região: (i) perde por não agregar valor ao processo produtivo; (ii) aumenta sua fragilidade frente possíveis crises no mercado externo (ou queda nos preços por algum outro motivo), uma vez da ênfase na exportação de commodities, como já mostrou em anos recentes (2013 e 2014); (iii) aumenta o gap no processo de desenvolvimento regional em relação às outras regiões do país, que se voltam mais para a produção industrial, porém, também sustenta a condição nacional de um padrão primário-exportador com graves consequências no médio prazo, inclusive pela complexidade urbana brasileira e os limites de um padrão que não gera estímulos de emprego e renda necessários; (iv) perde também por apresentar maior concentração de capital (e renda) no setor primário-exportador, que não proporciona efeito transbordamento na economia; (v) em termos ambientais, o prejuízo é muito expressivo, pois as atividades tidas como principais causadoras do desmatamento (mineração, pecuária e soja) estão na cesta de exportação crescente dos produtos primários.

Assim, o trade-off geração de divisas versus recrudescimento da desigualdade produtiva regional deve ser repensado, seja pela necessária melhoria da qualidade de vida da população da região amazônica, seja pela introdução de um modelo de desenvolvimento que supere o atual padrão de mero celeiro de produtos básicos, com efeitos deletérios crescentes sobre o meio ambiente e com baixo retorno social, basta conferir os indicadores de desenvolvimento humano da região e especialmente dos dois estados em foco.

Por tudo que foi exposto ao longo do texto fica bastante evidente a complexa questão envolvida: se de um lado o discurso ambientalista sufraga a necessidade de um “novo modelo”, por outro a dura crueza do balanço de pagamentos e das necessidades de geração de divisas impõem a continuidade e expansão do velho modelo primário-exportador e, em termos bastante agudos, muito pouco preocupado com a preservação de biomas ou de elevação da qualidade de vida das populações autóctones amazônicas.

*José Raimundo Trindade é professor do Instituto de Ciências Sociais Aplicadas da UFPA. Autor, entre outros livros, de Agenda de debates e desafios teóricos: a trajetória da dependência e os limites do capitalismo periférico brasileiro e seus condicionantes regionais (Paka-Tatu).

Referências


TRINDADE, J. R. B & OLIVEIRA, W. P. de. Especialização produtiva primário-exportadora e degradação ambiental na Amazônia. Revista Novos Cadernos do NAEA (2013).

Trindade, J. R. B., & Borges, G. T. do N. (2023). O mercado de trabalho no Pará: Economia primário-exportadora e desigualdade social. RBEST Revista Brasileira De Economia Social E Do Trabalho, 5(00), e023007.

Nota


[i] Ver: https://www.gov.br/planalto/pt-br/acompanhe-o-planalto/discursos-e-pronunciamentos/2023/discurso-do-presidente-luiz-inacio-lula-da-silva-durante-a-cupula-dos-paises-amazonicos-em-belem-pa).


A Terra é Redonda existe graças aos nossos leitores e apoiadores.
Ajude-nos a manter esta ideia.
CONTRIBUA

Veja neste link todos artigos de

AUTORES

TEMAS

10 MAIS LIDOS NOS ÚLTIMOS 7 DIAS

Lista aleatória de 160 entre mais de 1.900 autores.
Daniel Afonso da Silva Eliziário Andrade Osvaldo Coggiola Afrânio Catani Luiz Renato Martins José Machado Moita Neto Annateresa Fabris Paulo Sérgio Pinheiro Ronald León Núñez Érico Andrade José Luís Fiori Plínio de Arruda Sampaio Jr. Marcelo Módolo Jean Marc Von Der Weid Leonardo Avritzer João Sette Whitaker Ferreira Marcos Aurélio da Silva Valerio Arcary Igor Felippe Santos Manchetômetro Luís Fernando Vitagliano Fernão Pessoa Ramos José Geraldo Couto Jorge Luiz Souto Maior Leda Maria Paulani Tadeu Valadares Remy José Fontana Valerio Arcary Carlos Tautz Berenice Bento Gabriel Cohn Chico Whitaker Vinício Carrilho Martinez João Lanari Bo Mariarosaria Fabris Marjorie C. Marona Sandra Bitencourt Luciano Nascimento Marcos Silva Marilia Pacheco Fiorillo Juarez Guimarães Maria Rita Kehl Renato Dagnino Lorenzo Vitral Tarso Genro Leonardo Boff Caio Bugiato Armando Boito Luiz Carlos Bresser-Pereira Alexandre de Lima Castro Tranjan Alexandre de Freitas Barbosa Fernando Nogueira da Costa Benicio Viero Schmidt Leonardo Sacramento Ari Marcelo Solon Alysson Leandro Mascaro Ricardo Antunes Everaldo de Oliveira Andrade João Paulo Ayub Fonseca Luis Felipe Miguel Bernardo Ricupero Henry Burnett Paulo Capel Narvai João Carlos Salles Otaviano Helene Daniel Costa Luiz Bernardo Pericás Antônio Sales Rios Neto Ronald Rocha Ricardo Fabbrini Bruno Machado Ladislau Dowbor Mário Maestri Claudio Katz Luiz Eduardo Soares Michael Löwy Francisco Fernandes Ladeira André Singer Luiz Roberto Alves Marcelo Guimarães Lima João Carlos Loebens Rodrigo de Faria Gilberto Maringoni Andrés del Río Daniel Brazil Rubens Pinto Lyra Priscila Figueiredo Eleutério F. S. Prado Milton Pinheiro Rafael R. Ioris Ronaldo Tadeu de Souza Jorge Branco Ricardo Musse Paulo Fernandes Silveira Sergio Amadeu da Silveira Paulo Nogueira Batista Jr Alexandre Aragão de Albuquerque Atilio A. Boron Liszt Vieira Luiz Werneck Vianna Gilberto Lopes Salem Nasser Yuri Martins-Fontes Fábio Konder Comparato Bento Prado Jr. Thomas Piketty Marcus Ianoni Heraldo Campos Marilena Chauí Francisco de Oliveira Barros Júnior Gerson Almeida Luiz Marques Vladimir Safatle Celso Favaretto Lucas Fiaschetti Estevez Flávio R. Kothe Dennis Oliveira Henri Acselrad Matheus Silveira de Souza Bruno Fabricio Alcebino da Silva Alexandre de Oliveira Torres Carrasco Julian Rodrigues João Feres Júnior Denilson Cordeiro Celso Frederico Jean Pierre Chauvin Eleonora Albano Michael Roberts Walnice Nogueira Galvão Eugênio Trivinho José Raimundo Trindade João Adolfo Hansen Lincoln Secco Airton Paschoa Antonio Martins Antonino Infranca Slavoj Žižek José Dirceu Eduardo Borges Paulo Martins Chico Alencar Carla Teixeira Dênis de Moraes Ricardo Abramovay José Costa Júnior Flávio Aguiar Eugênio Bucci Kátia Gerab Baggio Elias Jabbour José Micaelson Lacerda Morais Anselm Jappe Vanderlei Tenório Francisco Pereira de Farias Tales Ab'Sáber André Márcio Neves Soares Samuel Kilsztajn Michel Goulart da Silva Manuel Domingos Neto Andrew Korybko Boaventura de Sousa Santos

NOVAS PUBLICAÇÕES