Bento XVI

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Por JULIAN RODRIGUES*

O desaparecimento de Joseph Aloisius Ratzinger merece um brinde

Perdoem-me os mais sensíveis, sobretudo os católicos. Mas nenhuma pessoa de boa vontade pode deixar de comemorar a morte do senhor Joseph Aloisius Ratzinger.

Não vou entrar aqui em questões de fé. Meu ateísmo marxista é profundamente respeitoso com as crenças das pessoas. Qualquer papa é um dirigente político internacional. A linha teológica-tática-geopolítica de cada um dos chefes da Igreja Católica tem grande peso (cada vez menor, é verdade) na luta de classes.

Vamos falar de Joseph. O alemão consolidou e reforçou o aggiornamento iniciado pelo polonês Karol Józef Wojtyła. João Paulo II (que reinou de 1978 a 2005) não só interrompeu a fagulha progressista que João XXIII havia aceso, como guinou tudo à direita. Junto com Margaret Tatcher e Ronald Reagan foi um dos artífices da ordem neoliberal. Anticomunista até a medula, Karol perseguiu e puniu os teólogos progressistas em todo o mundo. A história é conhecida: nosso Leonardo Boff – ideólogo da teologia da libertação foi punido com a pena de “silêncio obsequioso” em 1984. Sempre achei muito chic esse castigo –coisa de instituição milenar.

Só lembrei de Karol porque Joseph já mandava muito desde o papado dele. Era o chefe da Congregação da Doutrina da Fé. Não sou especialista, mas consta que esse cargo equivaleria a algo como um Suslov – entendedores entenderão.

Há algo excepcional na biografia de Joseph Aloisius Ratzinger (além de ser islamofóbico, sexista, homofóbico, tradicionalista, autoritário, vaidoso, neoliberal). O sujeito foi deposto sutilmente. Aposentado na marra. Os sábios chegaram à conclusão que aquele alemão mal humorado, chato, com cara de nazi e sapatos vermelhos Prada estava queimando muito o filme da Igreja Católica Apostólica Romana. Aí, elegeram um anti-Ratzinger: Bergoglio. Um papa progressista, simpático, argentino, terceiro-mundista.

Bento XVI agiu sempre como um homofóbico militante: “o conceito de casamento homossexual está em contradição com todas as culturas da humanidade” , escreveu ele.

Jorge Mario Bergoglio, por outro lado, vai avançando quase no limite.: “se um casal homossexual quer levar uma vida em conjunto, os Estados têm a possibilidade de lhes segurança, estabilidade não só para os homossexuais mas para todas as pessoas que se desejem juntar. Mas o casamento é o casamento”. Quanta diferença!

O papado de Joseph Aloisius Ratzinger é indissociável de sua renúncia. Optou por sair de cena em meio a várias crises principalmente àquelas relacionada aos crimes de abuso sexual que vieram à tona. Milhares de vítimas, mundo afora relataram terem sido violentadas por padres católicos. Trata-se de algo quase trivial – inerente à organização da igreja e à formação dos sacerdotes.

Joseph Aloisius Ratzinger foi arrastado para o epicentro dessa crise. Não era mais coisa apenas de malucos padres norte-americanos. Ele próprio foi acusado de ter sido conivente com abusos ocorridos no final dos anos 1970, em Munique, quando era o arcebispo da região.

Nos EUA o negócio é tão grave, que a Igreja topou pagar, num único acordo, 88 milhões de dólares para cerca de 300 vítimas – abusadas entre 1950 e 1980 na Diocese de Camden, em New Jersey. Mas é muito pior: são milhares de padres católicos denunciados, de 10 mil para cima. É uma coisa absurda!

Relembro tudo isso porque Joseph Aloisius Ratzinger nada fez para enfrentar esses escândalos, que, na verdade, apenas expuseram uma prática aparentemente usual. Homens proibidos oficialmente de fazer sexo e gozar – e que, ademais, tem vários privilégios, só pode dar nisso. Quando a Igreja Católica vai revogar o celibato? E ordenar mulheres?

O nojo que a Igreja Católica tem do corpo, do gozo, do prazer é uma fábrica de doenças. Os fiéis fingem que seguem as regrais morais, mas pobre dos padres!

Joseph Aloisius Ratzinger operou apenas retrocessos, na linha de uma Igreja mais ritualista, machista, opressora, homofóbica, elitista, e, claro, muito mais hipócrita. R.I.P, primeiro senhor papa impitimado. Não deixará saudades.

*Julian Rodrigues, jornalista e professor, é ativista do movimento LGBTI e de Direitos Humanos.

 

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