Por CAIO BUGIATO*
A dinâmica da guerra após um ano de conflito armado
A guerra na Ucrânia completa um ano neste mês de fevereiro de 2023. O confronto, que aparentemente opõe apenas dois Estados, durante este período pode ser dividido em duas fases: a contraofensiva russa e a reação da OTAN. Mas antes de tratar destas fases, é necessário entender por que damos a elas tais nomenclaturas. Primeiro, como argumentamos no artigo publicado no site A Terra é Redonda “Guerra na Ucrânia: antecedentes e caráter do conflito” o governo de Vladimir Putin trava uma guerra anti-imperialista defensiva contra a ofensiva da OTAN.
Uma vez que esta organização e os Estados capitalistas que ela representa não admitem a não integração ou não subordinação do Estado russo ao capitalismo ocidental. O governo de Vladimir Putin tem um projeto de capitalismo autônomo na Rússia e a OTAN o vem cercando e intimidando com sua expansão.
Segundo, uma mobilização ocidental a favor dos ucranianos resulta, ainda que informalmente, em uma coalizão de apoio que reúne as potências capitalistas do ocidente. É contra esta coalizão que lutam as forças russas. Vejamos os dados do Ukraine Support Tracker, do Instituto Kiel da Alemanha. Os dados compreendem o período de 24 de janeiro a 20 de novembro de 2022.
Os Estados Unidos encabeçam a lista com 22,9 bilhões de Euros em ajuda militar; 9,9 bilhões em ajuda humanitária e 15,1 bilhões em ajuda financeira. A União Europeia vem logo a seguir, com 3,3 bilhões em ajuda militar; 1,57 bilhões em ajuda humanitária e uma ajuda financeira que ultrapassa a dos estadunidenses, de 30,3 bilhões de Euros. Em terceiro e quarto lugares Reino Unido e Alemanha, dois países da União Europeia que contribuem individualmente. Reino Unido: ajuda militar de 4,1 bilhões de Euros; ajuda humanitária de 0,4 bilhões e ajuda financeira de 2,55 bilhões. Alemanha: 2,94 bilhões em ajuda militar; 1,95 bilhões em ajuda humanitária e 1,15 bilhões em ajuda financeira. Em quinto lugar outro país do G7, o Canadá com 1,36 bilhões em ajuda militar; 0,29 bilhões em ajuda humanitária e 2,14 bilhões em ajuda financeira.
Dos 11 países listados (excluindo, portanto, a União Europeia), 10 fazem parte da OTAN e um, a Suécia, está em processo de adesão. As potências capitalistas ocidentais têm todo interesse em formar essa coalizão, como mostram os dados, independente do tour de caixeiro-viajante do presidente ucraniano e dos casos de corrupção no seu governo. Por outro lado, os russos parecem lutar sozinhos.
A dinâmica da guerra
A primeira fase da guerra foi marcada pelo avanço russo, como mostra o mapa de 08 de março abaixo.
Nas primeiras semanas da guerra os russos avançaram pelo Leste, pelo Sul e pelo Norte. Chegaram às portas de Kiev, que não foi tomada. Contudo tomaram a importante cidade de Kherson ao sul, capital da província homônima. A região de Kherson possui 28,5 mil quilômetros quadrados, uma área quase do tamanho da Bélgica, e saída para os mares Azov e Negro. O mais importante é ser conexão por terra com o Criméia, território russo antes mesmo da guerra. A tomada desta região, que está na foz do rio Dnipro, poderia resolver o problema de abastecimento de agua da Criméia, além de boquear o acesso ucraniano ao Mar Negro.
A retomada de territórios pelos ucranianos marca a segunda fase da guerra. Cerca de seis meses após o início do confronto, isto é, o tempo da ajuda militar e financeira da OTAN se transformar em aparato operacional de guerra, os russos recuaram, como mostra o mapa de 21 de agosto abaixo.
Em agosto de 2022 os russos já não controlavam o norte da Ucrânia, mas ocupavam uma faixa territorial que se estendia da região de Kherson, passando pela região de Zaporizhzhia (entre Kherson e Donetsk), até as províncias separatistas de Donetsk e Luhansk. Em 30 de setembro de 2022 o presidente russo Vladmir Putin anunciou a incorporação destas quatro províncias, que representam cerca de 15% do território ucraniano.
Em janeiro de 2023, quase um ano após o início da guerra, de acordo com o Institute for Study of War a situação é a seguinte:
Os russos perderam o controle de parte da região de Kherson, inclusive a capital. Com a reação da OTAN já haviam perdido a cidade de Kharkiv (segunda maior cidade ucraniana) e sua província homônima, a noroeste de Luhansk, situação que se manteve. Entretanto, mantêm o controle sobre uma grande extensão territorial que liga a Criméia às províncias separatista de Donetsk e Luhansk. Ressalta-se que, apesar a incorporação das quatro províncias citadas, seus territórios não são totalmente controlados pelas forças russas.
Em 13 de janeiro de 2023 o Ministério da Defesa da Rússia anunciou a conquista da cidade de Soledar, na província de Donetsk. Seria a primeira cidade tomada na região desde meados do ano passado. A conquista abriria rotas para o oeste, especialmente para Bakhmut, centro administrativo da província, e para retomar Kharkiv. Por outro lado, os Estados da OTAN e seus aliados formaram uma coligação de tanques: EUA, Reino Unido, Alemanha, França, Países Baixos, Espanha, Noruega, Finlândia e Polônia vão enviar cerca de 80 tanques da guerra à Ucrânia nos próximos dias, o que poderia escalar a guerra para uma nova fase.
*Caio Bugiato é professor de ciência política e relações internacionais da UFRRJ e do programa de pós-graduação em relações internacionais da UFABC.
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