Herbert Marcuse: a emancipação humana entre dificuldades e possibilidades

Imagem: Meike
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Por ANDERSON ALVES ESTEVES*

O projeto emancipatório pensado por Marcuse significa a superação do princípio de realidade vigente, o princípio de desempenho, pelo de realidade que pacifique a existência, o ethos estético

I – Introdução

Herbert Marcuse, como filósofo preocupado com a práxis, teve a emancipação humana como um de seus grandes objetos/objetivos e, de maneira autoral, renovou os estudos sobre ela ao se recusar a, apenas, replicar os postulados do Idealismo Alemão e do marxismo ortodoxo. O fascismo, o nazismo, o capitalismo de estado, a derrota da Revolução Alemã, o stalinismo, o advento da sociedade de massas, a opulência da sociedade industrial avançada, suas novas formas de controle social e a estrutura psíquica dos átomos sociais exigiram uma profunda análise da situação histórica e não revolucionária para se arvorar a explicitação de possíveis e novas possibilidades de emancipação.

Assim, as torções conceituais empreendidas pelo filósofo frankfurtiano deram origem a uma Teoria Crítica que, de maneira vivaz e calibrada com questões conjunturais e canônicas, observou diferenças materiais e ideológicas entre as fases liberal e monopolista do capitalismo, caracterizou as novas formas de controle social a operarem nas sociedades industriais avançadas e formulou conceitos que inovaram os estudos sobre possibilidades de emancipação, sem desprezar grupos que não eram, necessariamente, pertencentes ao proletariado tradicional, mas que exerceram formas originais de ações políticas e que foram a base social para uma Nova Esquerda realizar a Grande Recusa à sociedade estabelecida.

Esta expunha suas contradições ao se mostrar, de um lado, madura e com potencial para superar seus problemas, de outro, impeditiva da efetivação da emancipação humana ao manter o princípio de desempenho, a mais-repressão e uma série de dessublimações repressivas. Além da política, a arte também expressava a tensão entre controle social e emancipação: com compromissos afirmativos e, ao mesmo tempo, denunciando a realidade estabelecida, a obra de arte tanto promove a catarse dentro dos marcos da atual civilização como reinventa novas regras e situações que, ficcionalmente, realizam-se para além do existente e contribuem, assim, para desmistificá-lo. A negação, estudada por um Autor tão bem versado na dialética hegeliana, mostrava-se em múltiplas facetas – do político, do estético… – a indicarem possibilidades de superação da sociedade vigente e do ardil que esta se esmera a fim de se prolongar, transparecia as contradições entre aparência e essência; estes e outros motivos – negação, razão, emancipação, revolução, história e efetivação das potencialidades humanas –  foram explorados no livro de Marcuse, quando ele já era membro do Instituto de Pesquisa Social de Frankfurt, sobre Hegel, Razão e revolução (1941).

Pulsavam, na Nova Esquerda, novas razão e sensibilidade a engajarem-se na edificação de um princípio de realidade a superar tamanhas contradições, retirando a luta de classes da latência e mediando a obsolescência do mundo em vigência com a sociedade a ser construída, a saber, aquela que foi denominada por Marcuse como civilização não repressiva e libidinal, socialismo integral e ethos estético. A possibilidade de efetivação de tal perspectiva denota a articulação entre teoria e práxis e majora o alcance da felicidade e da realização das necessidades de acordo com o que, historicamente, pode-se alcançar.

II – Dificuldades para a emancipação

Engendrado quando a burguesia alemã, ao mesmo tempo em que projetava uma ordem social compassada aos próprios interesses e que promovia uma inflexão estratégica e tática, uma vez que não gozava de força material para empreender o que ingleses e franceses da mesma classe social já haviam conseguido, o projeto do Idealismo Alemão foi tingido tanto de anseios de transformação social como de manutenção do status quo.

De um lado, mediante o relevo dado ao papel do Eu e da razão autônoma e crítica, o movimento filosófico se caracterizou, tal como em Kant, por um Esclarecimento a propagar a razão de modo a construir sujeitos autônomos com potência para edificar, mediante o alcance de consensos, a república noumênica, regulada pela razão e por leis jurídicas a promoverem a ordem também racional. De sua parte, Hegel, com o mesmo objetivo, narrou a história do espírito até o momento em que este se consolidara de maneira mais crítica para ultrapassar o estabelecido e, pela via da valorização do negativo, alcançar a verdade universal – da certeza sensível à consciência-de-si a razão foi engrandecida e se tornou mais abrangente ao libertar-se do sensível. Para os dois filósofos, a interioridade foi o refúgio da liberdade e da felicidade pretendidas, mas não efetivadas materialmente. 

De outro, elementos autoritários mostravam-se constituintes da razão arvorada no capitalismo liberal à medida que indivíduos foram tomados em igualdade formal, mas em desigualdade concreta, a exemplo do pendor kantiano à subserviência às autoridades vigentes, da disposição hegeliana em situar a monarquia  como o fim da história, da submissão dos indivíduos aos processos controlados pelo alto e com toda a lentidão paulatina usada pelo Estado como controle para, dessa forma, perenizar o que frustrava o próprio projeto do Idealismo Alemão, a saber: a irracionalidade grassada dos conflitos entre indivíduos e Estado, das classes sociais em luta, da dissolução das relações sociais a partir da concorrência infrene, das crises econômicas periódicas, da proletarização e da submissão à cegueira do mercado, das guerras entre as burguesias de diferentes nações em concorrência, da colonização, da concentração e da monopolização de riquezas, do Estado reduzido a palco de interesses privados, da formação de ideologias vincadas de irracionalismo.         

Em seguida, sob o capitalismo monopolista, além da razão autônoma e crítica não ter se efetivado e, em contrapartida, ter cedido espaço para a heteronomia constitutiva a uma massa administrada, o controle social foi intumescido pelo esvaziamento das mediações institucionais erigidas durante o capitalismo concorrencial: Friedrich Pollock e Franz Neumann, a despeito de diferenças de diagnósticos, apontaram que as relações entre economia e política aumentaram, de um lado, a segurança aos monopólios à medida que golpearam e desmantelaram a oposição à ordem, suspendendo as conquistas democráticas dos períodos anteriores, e, de outro, diminuíram os riscos dos investimentos ao organizarem a produção e a distribuição de mercadorias.

Para Marcuse, as implicações para o proletariado foram consideráveis. Marx citara, desde a “Introdução” de a Crítica da Filosofia do Direito de Hegel, e argumentara de modo mais aprofundado e à luz da (crítica da) Economia Política e da teoria feuerbachiana, em os Manuscritos econômico-filosóficos, que o proletariado era a negação do capitalismo e o portador da emancipação humana em virtude de suas condições sociais e materiais; os que vivem do trabalho, e não o Estado como pensado por Hegel, foram diagnosticados como o elemento com interesse universal e a transformar a realidade, tanto em termos de organização societária como antropológica, uma vez que o programa comunista contemplava a superação do trabalho estranhado e da propriedade privada, ambos perniciosos tanto à sociedade, ao serem esteios para uma gigantesca constelação de problemas sociais, quanto à vida humana, por mutilarem a realização das potencialidades individuais. Marcuse, ao se debruçar sobre a classe social em pauta, reunindo um instrumental teórico que contemplava trabalhos do Instituto de Pesquisa Social e pesquisas sociológicas norte-americanas, diagnosticara que o proletariado não mais se opunha, no século XX, à ordem estabelecida como os fundadores do Materialismo Histórico haviam observado na década de 1840. Pesava, no capitalismo monopolista vivido por Herbert Marcuse, além das formas canônicas de dominação, uma constelação de novas formas de controle social e a integração à sociedade estabelecida mediante o consumo de falsas necessidades que dificultavam a percepção da alienação à medida que ela se tornara mais objetiva, velada, palatável e com potência de represar a luta de classes na situação de latência; com efeito, esperar que a razão autônoma ou crítica se realizasse e se universalizasse ou que o proletariado campeasse a revolução comunista e a disseminasse pelo mundo, não parecia encontrar suporte na realidade contrarrevolucionária que efetivara o fascismo, o nazismo e a contenção keynesiana dos movimentos emancipatórios.

O Autor do Instituto de Pesquisa Social de Frankfurt diagnosticou novas formas de controle social que denotavam não apenas aumento quantitativo das maneiras de dominação decorrentes da era liberal, temerários de uma crise final e derradeira, mas contornos qualitativos que garantiam a sobrevida do modo de produção em vigência durante sua fase monopolista, à medida que ofereceram subjacência a  uma administração social de maneira racional, higiênica, eficaz e mais agradável, integrando os setores dominados aos dominantes em uma sociedade unidimensional mediante recursos materialmente ideológicos que também dificultavam a percepção da alienação. O Homem unidimensional, publicação de 1964, selava este diagnóstico e caracterizava o fechamento da possibilidade de emancipação nas sociedades industriais avançadas; em grande medida, o trabalho aprofundou temas de ensaios escritos nas décadas anteriores e que já haviam indicado a correlação de fenômenos corrosivos à razão crítica, à individualidade e à existência de uma oposição à ordem, tanto em sociedades governadas por fascistas e nazistas como nas autodeclaradas democráticas.

Dentre as novas formas de controle social, Marcuse desenvolve pesquisas profícuas (desde a década de 1930) sobre a tecnologia que, para ele, contém um a priori cujo apanágio é a circunscrição de pessoas e coisas como objetos de controle, estabelece nexos entre poder político e produção de mercadorias à medida que o trabalhador é dominado pelo maquinário que o circunda, administrado racionalmente para empreender uma dominação magistral que, em lugar de brutalizar, convoca-o ao pertencimento de uma suposta comunidade tecnológica, poupando-lhe energia física e inclinando-o a orientar-se pela imanência das coisas – tais considerações, já presentes na obra do Autor, em 1941, anteciparam aquilo que seus colegas de Frankfurt, Adorno e Horkheimer, denominaram de razão instrumental, em 1944. A produção e o açulamento de falsas necessidades entre os membros da sociedade industrial avançada, mediante a distribuição em massa de artigos esquematicamente fabricados para diferentes grupos, a fim de que, concomitantemente, fosse possível garantir alguma gratificação e programar/manipular comportamentos que realizassem os interesses dos grandes conglomerados monopolistas como se fossem os das próprias pessoas, conquistando-as materialmente ao status quo. As peças da indústria cultural, ao circularem como mercadoria, abstém-se de se caracterizar como transcendentes e opostas à ordem constituída para, ao contrário, veiculá-la mediante integração, mobilização, domesticação e administração das consciências ao cimentarem os vínculos societários pela estratégia da diversão e do consumo e sem que a dominação seja superada. As novas estrutura psíquica e sexualidade dos membros da sociedade industrial avançada, marcadas pela opulência, reduziram a divisão tripartite da psique, tal como descrita por Freud, em duas, uma vez que o ego fora encolhido a partir de um processo de socialização a diminuir a autoridade paterna e a majorar a importância das agências extrafamiliares, por uma repressão suplementar (“mais-repressão”, como Marcuse expôs em Eros e civilização) que orientava as pessoas a agirem no sentido dos interesses dos grupos que dominavam a produção e a distribuição de mercadorias, pela gratificação através da liberação da sexualidade genitalizada e que liberava o restante do corpo para a esfera do trabalho. A política própria às sociedades industriais avançadas incluía os partidos autodeclarados de oposição como instituições integradas e integradoras da ordem estabelecida, contribuintes com a unidimensionalidade. O universo da locução adquiriu operacionalidade e funcionalidade mediante unificação de termos antagônicos, hifenização, abreviação de sentenças, eliminação de conteúdos críticos dos substantivos, adjetivação predominantemente positiva, repetição hipnótica, mitigação da tensão entre o aparente e o real; consequentemente, auxiliou a veiculação da ordem estabelecida.

Com efeito, tal vida administrada sob o capitalismo monopolista do século XX, nas sociedades industriais avançadas, expressava o nexo entre as dominações objetiva e subjetiva: a luta de classes foi posta em latência e a emancipação humana retirada do horizonte à medida que as novas formas de controle social integraram o proletariado à ordem estabelecida/ unidimensional e caracterizavam-se por dessublimações repressivas ao proporcionar/aparentar gratificações ao mesmo tempo em que se reproduzia a dominação. Ao proletariado do século XX não mais se aplicava o imperativo de ser a classe que, por não ter nada a perder, restava o mundo a ganhar: ao obter imóveis, eletrodomésticos, automóveis, peças de vestuário e consumir os mesmos itens da indústria cultural que a burguesia também adquiria, ele havia se mimetizado a ela. A era em que se combinavam estado de bem-estar social e estado beligerante ofertava, mediante a acumulação de feição keynesiana e fordista, condições de veiculação do status quo à medida que se ofertavam alguns confortos materiais sob uma vida administrada.   

Sob esta conjuntura e a fim de pesquisar as possibilidades de reabertura da emancipação, Marcuse mobilizou um dos principais traços do Materialismo Histórico e da Teoria Crítica, a saber, o recurso à História, relacionando-a às questões epocais que demandavam, obviamente, novos conceitos e não a mera repetição fetichizada do instrumental teórico edificado nos séculos XIX e início do XX.

III – Possibilidades para a emancipação

Uma vez a História e a práxis dispostas como esteios certificadores da contínua revitalização conceitual, Marcuse observou, a partir da “Conclusão” de O homem unidimensional (1964), que a emancipação poderia ser levada a cabo por aqueles que sentiam as frustrações, os descontentamentos e as agressões empreendidas pela sociedade industrial avançada: no âmago dela, existiam outsiders que contestavam o status quo e que possibilitariam retirar a luta de classes da latência. Tais dissidentes foram pesquisados pelo Autor frankfurtiano em trabalhos posteriores ao livro supracitado, dentre eles, o Ensaio sobre a libertação (1968) e Contrarrevolução e revolta (1972). De modo geral, intelectuais (escritores, técnicos, especialistas e engenheiros – todos com capacidade de desmistificarem as várias formas da ideologia e da manipulação, além de desempenharem o importante papel da educação política, adquiriram educação que os permitiam notar que as forças produtivas poderiam se desenvolver mais e serem melhor distribuídas, sob outro enquadramento societário), estudantes (que estabelecem nexos entre as pautas específicas dos campi e as gerais da sociedade para mostrarem que a reforma educacional será efetivada se a social também for), grupos étnicos (geralmente, nos EUA, compostos de habitantes das áreas de risco de grandes cidades e que contemplam a população negra, a vítima mais frequente da repressão oficial, e que estão naturalmente inclinados a rebeliões que podem, a partir da facilidade geográfica, espargirem-se rapidamente), movimentos de libertação do Terceiro Mundo (que para além das óbvias ações voltadas à libertação e ao desenvolvimento autônomo dos países da periferia do capitalismo, também catalisavam revoltas nas sociedades industriais avançadas à medida que ocorriam movimentos de solidariedade em conjunto com estudantes, intelectuais e pacifistas; ademais, caso uma revolução prosperasse nos países centrais, poderia existir um efeito imediato na periferia em virtude do grau de dependência que as burguesias locais tinham em relação às do centro), pacifistas, feministas (de enorme importância catalisadora por relacionarem-se à denúncia da agressividade que caracteriza o princípio de desempenho, a civilização patriarcal e a sociedade de classes, e por proporem outro princípio de realidade, com Eros desentrelaçado da agressividade, com a reabilitação dos sentidos e da vida em si mesma – em outros termos, trata-se de um movimento que recusava a sociedade estabelecida nos seus âmbitos infra e superestruturais para, desse modo, libertar mulheres e homens), ecologistas (a exemplo do movimento feminista, também se voltavam contra a agressividade e as dimensões infra e superestruturais do status quo, sobretudo às vinculadas ao meio ambiente, vitimado e explorado perdulariamente em virtude do progresso quantitativo, da preponderância de Thanatos sobre Eros e o mantenimento de gratificações socialmente permitidas e agressivas – o movimento ecologista era expoente da insatisfação consciente e inconsciente com a produtividade destrutiva da sociedade vigente e mostrava-se com força para reorientar o progresso com o predomínio de Eros sobre Thanatos, para pacificar a existência exterior e a interior, as instituições e a psique), desempregados e alguns setores privilegiados que perderam poder diante de um capitalismo veementemente monopolizado, que os submetiam a extenuantes jornadas de trabalho, que os manipulavam e que estendera tentacularmente seus domínios a vários âmbitos da vida, convertendo todos em seus dependentes. Em conjunto, os grupos supracitados encontravam motivos (não apenas econômicos) para se revoltar contra a ordem estabelecida e para vislumbrar novos modos de vida a superarem as questões materiais e imateriais que não se resolviam nos marcos da sociedade vigente e sua universalização da forma mercadoria.

O diagnóstico de Marcuse, em 1972, apontava para o capital como aquilo que dominava todos os âmbitos da vida e que, concomitantemente, arvorava a contrarrevolução (preventiva, em tempos de latência da luta de classes), de um lado, e uma gigantesca massa por ele dominada a se revoltar, de outro. Como expoentes da situação conjuntural, os outsiders reinauguraram a tradição de greves não autorizadas pelas burocracias sindicais; a ocupação de fábricas, universidades e escolas; o absenteísmo; as sabotagens; as marchas e os protestos públicos; o rechaço ao ascetismo… Outrora descrita como unidimensional, a situação política da sociedade industrial avançada estava, dessa vez, vincada pela ambiguidade, uma vez que, de modo imanente, o capitalismo monopolista erigia grupos de pessoas com potência para corroê-lo. O lugar da negação à sociedade – objeto de pesquisa tradicional em Hegel e em Marx – pululava em vários pontos e grupos que poderiam catalisar o proletariado para o seu reengajamento na mudança social qualitativa. A oposição ao status quo se construía com base em múltiplas formas de luta contra a repressão e esta não se limitava às questões materiais e econômicas (a despeito de uma grande parcela do proletariado consumir artigos e se mimetizar ao capitalismo, não escapava de outras formas de repressão): os lugares, os agentes e as formas de luta política estudados por Marcuse revelavam sua preocupação em desenvolver o tema da revolução e não de declará-la arquivada. O marxismo heterodoxo do Autor, ao contrário do que se supõe uma leitura apressada, não substituiu ou anulou o proletariado como classe revolucionária, ao contrário, manteve-o como o elemento indispensável e a ser catalisado; ademais, se o proletariado ganhara a companhia de outros grupos, a força social para a transformação social se alargara. A empresa teórica e prática mostrava-se tão importante quanto difícil: como se desenvolve a subjetividade revolucionária sob uma conjuntura contrarrevolucionária?  

Os outsiders e suas novas formas de luta política davam estofo social – mais abrangente que o proletariado tradicional – à Grande Recusa e à edificação de uma Nova Esquerda, heterodoxa, livre da camisa de força leninista e sua rígida organização partidária, revitalizadora da forma conselho e da democracia direta, capilarizada e aglutinadora de uma série de demandas, não apartada de reivindicações da classe média, que acusava o todo da sociedade e que levantava bandeiras que transcendiam a mera demanda por planificação econômica. Tratava-se, na supracitada Grande Recusa, entre as décadas de 1960 e 1970, de enfrentar as múltiplas formas de repressão, de rechaçar a sociedade estabelecida como um todo, de pautar a transvaloração dos valores, de reivindicar a libertação dos sentidos, da libido, de demandar a formação de uma consciência que escapasse dos limites da política profissional, da linguagem orwelliana e que fosse descolonizada da série de perversões impostas pelas novas formas de controle social, de concatenar as demandas subjetivas às objetivas, a psicologia à política, o particular ao universal, de não separar teoria e prática – a fim de suprassumir a organização societária que veiculava o império do capital monopolista, os novos grupos expressavam suas rebeldias e esperavam catalisar o proletariado para o retorno à luta de classes e, consequentemente, dar encaminhamento à mudança social qualitativa. De acordo com o que Marcuse argumentou em Não bastar destruir – sobre a estratégia da esquerda, a emergência da Nova Esquerda, a “única esperança” (Loureiro, 1999, p. 85) naquele momento, era expoente da crise pela qual passavam as sociedades industriais avançadas e que não podia ser superada sem a supressão do capitalismo monopolista.

Expressiva da dialética entre indivíduo e sociedade, em lugar da subsunção de um(a) por outro(a), a Nova Esquerda constituía-se de ativistas com uma nova sensibilidade forjada pelas transformações imanentes à produção social do século XX, dentro das sociedades industriais avançadas: a opulência delas relacionava-se à economia libidinal que, ontogênica e filogeneticamente, alterava a hipótese descrita na primeira metade daquele século, por Freud. Escritos de Marcuse da década de 1940 e, notadamente, da década seguinte, como Eros e civilização (1955)e outros trabalhos que aproveitavam e empreendiam uma releitura da obra do psicanalista vienense, analisaram fenômenos a exemplo dos da perda da força da família como agência monopolizadora da socialização primária, da identidade das pessoas (desde a infância) com as instituições do capitalismo monopolista, da disponibilização em massa de mercadorias que facilitou a diminuição da importância do pai primevo (repressão) e o aumento da do consumo (permissividade), da escolarização, da indústria cultural como cimento dos vínculos societários e o intumescimento da infantilização, das associações,  de clubes, de grupos de jovens etc. – todos colaboravam para bloquear a formação de indivíduos (com ego autônomo, crítico e com o psiquismo dividido em três partes) à medida que convocavam pessoas com ego não formado, ou em erosão, para a sociedade estabelecida. Trata-se da transubstanciação do indivíduo em átomo social, da sublimação em dessublimação repressiva, da perspectiva da emancipação humana em perenidade da repressão (higiênica e palatável).  

A despeito de tal enquadramento psicossocial, os ativistas da Nova Esquerda expressavam a possibilidade da efetivação da emancipação humana: a opulência da sociedade industrial avançada tornava, a partir do contraste com o que ela facilitava perceber, insuportáveis o ascetismo, a frustração e a continuação da repressão às pulsões que ainda se faziam presentes na enorme parcela da população – dos estratos mais vulneráveis à classe média. Na perspectiva marcusiana, alcançava-se, historicamente, a conjuntura na qual a existência da civilização não mais demandava, obrigatoriamente, repressão: o amadurecimento, que se expressava em fenômenos como os da automação a ofertar uma produtividade sem igual, poderia inaugurar uma era na qual se reerotizaria pessoas e instituições, uma vez que as sublimações haviam sido colocadas em obsolescência e vislumbraria a hipótese de efetivação de uma civilização libidinal, na qual Eros não precisaria de tamanha sublimação, sem que fosse necessário reprimir aquilo que foi, até o momento, postergado, colocado no fundo da cena social, proibido ou hierarquicamente submetido como inferior nas esferas da fantasia, da memória, da imaginação, da sensualidade, do jogo, da receptividade, da contemplação, do repouso, do sonho. Se, a partir da práxis, a Nova Esquerda apresentasse e efetivasse a inversão do progresso quantitativo em qualitativo, edificasse outras instituições, outras racionalidade, moral e sexualidade, a civilização libidinal poderia se materializar como expressão da pulsão de vida que já não estava mais agrilhoada pelas pulsões de morte dentre aqueles que estavam engajados nos movimentos supracitados. Em outros termos, uma nova sensibilidade estaria mediando um projeto a superar a sociedade vigente e a construir um novo princípio de realidade. A partir dessa argumentação, George Katsiaficas citou o “efeito Eros” (2021, p. 84) em levantes que continham o poder de aglutinar e espargir, internacionalmente, movimentos catalisadores da Grande Recusa: aquilo que Marcuse pensou sobre o Maio de 1968, continuaria válido para explicar o que ocorre com o Occupy, a Primavera Árabe, o Black Lives Matter e outras revoltas e diversas formas de luta, de outrora e de hoje.

Pensando-se a obra de Marcuse sob um arco mais amplo, aquela crítica à razão hegeliana, que aos poucos se efetivaria na história, foi apontada como idealista e insuficiente para a edificação da emancipação. Com o Materialismo Histórico, o Autor mobilizou a práxis proletária como mediação material ao racional e o universal para a realização do projeto. Contudo, a integração do proletariado, no centro do capitalismo, movimentou a reflexão sobre a possibilidade da emancipação à pesquisa sobre agentes desse programa e, à medida que a concomitância entre opulência e repressão marcou a conjuntura das sociedades do século XX, materialmente, ofereceu-se a oportunidade do florescimento de novas razão, sensibilidade, agentes e projeto emancipatório – uma razão libidinal, voltada à gratificação, à efetivação das potencialidades humanas historicamente realizáveis, mas bloqueadas pela sociedade vigente, pulsa nos outsiders e pode catalisar o proletariado tradicional para a reinauguração da luta pela sua própria emancipação. Neste sentido, Eros e civilização foi a base para a crítica minuciosa da sociedade industrial avançada, realizada em O homem unidimensional, e para a exploração daquelas frestas deixadas pela civilização repressiva e que permitem a efetivação da utopia concreta, tal como se argumentou em Ensaio sobre a libertação e em Contrarrevolução e revolta. O livro de 1955 foi, outrossim, a continuidade da pesquisa acerca da negação: ao mesmo tempo em que respeitou os cânones hegeliano e marxiano, renovou-os à luz dos novos saberes psicanalíticos.

Os portadores da nova sensibilidade eram vistos por Marcuse como precursores da nova sociedade: constituídos da pulsão de vida desagrilhoada da de morte, demandavam meios ambiente e social livres de maneira que a política não se apartasse da moral, estariam socializados com um a priori vincado pela contenção da agressividade e majoração da liberdade e da solidariedade que, espiritual e somaticamente, não tolerariam a dessublimação repressiva da sociedade industrial avançada, seu princípio de desempenho e sua mais-repressão. Assim, a nova sensibilidade que destravaria a luta de classes, o a priori que exige o embelezamento das relações sociais e do meio ambiente, também possui nexos com a estética: imaginação, fantasia, poesia, sensibilidade e jogo também seriam força produtiva; razão, ciência, trabalho e esprit de sérieux não se divorciariam do belo e do bem-estar. Floresce, concomitantemente, um novo homem (novas faculdades cognitivas e sensoriais, não opostas – nova antropologia) e um novo princípio de realidade (nova sociedade): o ethos estético seria a superação do princípio de desempenho e possibilitaria mais e melhores gratificações, pacificação da existência. Presente e futuro se articulam na práxis dos outsiders e expressam a possibilidade dos reinos da liberdade e da necessidade se entrelaçarem, uma vez que engajamento e nova sensibilidade ocorrem ainda sob o princípio de desempenho, mas que se antagonizam a ele e prenunciam uma nova formação social, o ethos estético, como uma utopia concreta. Em lugar, portanto, da canônica tese de oposição entre os reinos da necessidade e da liberdade, tal como exposta em A Ideologia alemã, de Marx e Engels, a articulação marcusiana entre os reinos elenca, ainda sob a civilização repressiva, os elementos que dela nascem e antecipam sua superação. Historicamente, estão dadas as condições (técnicas, grupos ativistas que reivindicam outra ordem social e que não se divorciam da nova sensibilidade, de efetivação de uma utopia concreta) que podem encetar o novo princípio de realidade não mais reduzido ao progresso quantitativo que submete o homem a instituições e à economia psíquica mutiladoras.

A liberdade pulsa entre os ativistas da Nova Esquerda e, para o sucesso da efetivação do projeto emancipatório, eles precisam somar forças com todos aqueles que foram dominados pelo capitalismo monopolista e que se encontram frustrados, dos trabalhadores especializados aos estratos mais subjacentes. Tratava-se de unir razão e sensibilidade no engajamento e na educação políticas, de unir os vários grupos em uma Frente Única a catalisar os protestos e alçá-los ao nível da transformação social, de campear a longa marcha mediante as instituições no sentido do acúmulo de força, de erigir conselhos não discriminadores das ações espontâneas: a conjuntura da época de Contrarrevolução e revolta demandava aglutinar grupos que iam além do proletariado tradicional para vencer a reveiculação da carência e arvorar a superação do princípio de realidade estabelecido, eivando a civilização libidinal com novas necessidades (dentre elas, a solidariedade, o respeito ao indivíduo, a satisfação erótica e estética, a dimensão da arte não reduzida à esfera da imaginação e dos museus e elevada à força produtiva ao mesmo tempo em que preserva sua autonomia, a igualdade de gênero, a intolerância ao racismo e ao desagravo às esferas dos direitos, o respeito ao meio ambiente…) impossíveis de serem gratificadas sob a sociedade vigente. Como parte desse projeto de destravamento da luta de classes e de edificação do ethos estético como o novo princípio de realidade, Marcuse não aparta arte e racionalidade técnica e pensa-as entrelaçadas e comprometidas com a pacificação da existência – derrotar a escassez, lançando mão das forças produtivas já construídas, derrete a legitimação da mais-repressão e da miríade de dessublimações repressivas vigentes. Assim, a vida torna-se obra de arte a partir da metamorfose das metas e do tipo do progresso a ser erigido, do não divórcio entre razão e sentidos e da nova economia libidinal a se formar.

Percebe-se, portanto, que a sociedade como obra de arte, a civilização libidinal, é a utopia concreta – expressão que Marcuse toma emprestada de Ernst Bloch – que efetiva uma redução estética: a beleza, para se materializar, demanda superação do status quo por este ser o obstáculo maior à liberdade, à emancipação e ao belo, uma vez que prioriza a reprodução de capital e a agressão aos meios ambiente e social. Ademais, desde os gregos, arte e causa final não são necessariamente conflitantes; a Antiguidade experimentou algo que valia tanto para a arte como para a técnica, enquanto causa final e, na Modernidade, se resolvidas suas contradições, poder-se-ia, além de reentrelaçar tais domínios, também reagrupar razão, sensação, imaginação e fantasia para convergirem e caminharem em direção à pacificação da existência. Arte e técnica de tal forma concatenadas e reprogramadas, denotam possibilidades embelezadoras da existência e do mundo, elevam a dimensão estética para além dos museus e da promesse de bonheur, prenunciam e subjazem a hipótese de uma civilização não repressiva (o próprio pensamento de Marcuse pode ser considerado tal prenúncio, bem como as ações e o ideário da Nova Esquerda) e vincada de apanágios diferentes dos positivados sob o capitalismo monopolista, mantém a imagem da liberdade em pauta e afronta o princípio de realidade que a impede, contribuindo para pavimentar a efetivação de algumas verdades: reconstrução do maquinário para que ele deixe de operar instrumentalmente; redução do trabalho social necessário em compasso com o amadurecimento das forças produtivas; desagrilhoamento da ciência e do conhecimento em relação às irracionalidades e interesses particulares; razão caracterizada por Marcuse como pós-tecnológica e não mais voltada à repressão; emergência de novas necessidades impossíveis de serem gratificadas na sociedade estabelecida; estrutura psíquica re-erotizada; fim do império de Thanatos sobre Eros; formação de subjetividades não mais marcadas pela autorrepressão, a renúncia e o tabu; não rebaixamento dos sentidos em relação à razão; não menosprezo pela moral em ações políticas.

Considerada a característica histórica das faculdades humanas, o socialismo integral de Herbert Marcuse coloca em relevo as necessidades e satisfações compassadas ao ethos estético que, constituindo-se como um a priori da nova sociedade, não opõe a vida material e a intelectiva, não rebaixa instrumentalmente os meios ambiente e social e que, em sentido oposto, embeleza e pacifica a existência, conforme exposto em Contrarrevolução e revolta. A interessante mobilização e interpretação do Marx da década de 1840, de Kant, de Hegel, de Schiller, de Nietzsche e de Freud ultrapassou a tradicional oposição ocidental entre razão, sentidos e imaginação para indicar a possibilidade de uma razão que se sensibiliza e de sentidos que não se limitam ao âmbito da recepção; o mesmo ocorre para reconectar liberdade e necessidade, particular e geral, homem e natureza, meio e fim, análise e fantasia, arte e política – os âmbitos ético, estético e político não mais estão compartimentados para, assim, enveredarem pela união entre Prometeu e Orfeu, trabalho e canto, tal como Marcuse expôs em Eros e civilização.

Ethos estético, socialismo integral, civilização não repressiva e libidinal são, portanto, e ao mesmo tempo, a beleza alcançando o estatuto de força produtiva e a racionalidade emancipando-se de sua dimensão tecnológica e instrumental: com o princípio de desempenho e mais-repressão superados pela práxis, a civilização atinge a característica de não repressiva, adquire a Forma, como Marcuse destaca no Ensaio sobre a libertação, de uma organização societária voltada à pacificação da existência – a racionalidade caracteriza-se como pós-tecnológica e o belo se efetiva para além das páginas dos livros ou, em outros termos, a realidade materializa-se como obra de arte à medida que a existência se pacifica e orienta-se segundo um fim em si mesmo e sem se rebaixar a meio para outrem.

Contudo, o engajamento artístico na edificação desse projeto, não palmilha no sentido da colonização da arte pela política, mas no da permanência do hiato entre os dois âmbitos: a harmonia, o ritmo, o contraste, a proporção, a simetria, a métrica etc. constroem uma ordem própria, uma forma estética (ästhetischen Form), como Marcuse argumenta em o Ensaio sobre a libertação, que não se move meramente pela imanência do conteúdo e que presta contas apenas com as regras do próprio construto estético (alienação artística); ao contrário, ela transforma o que está dado, negando-o e penetrando-o com dimensões descartadas pelo princípio de realidade estabelecido, introduzindo a imaginação no mundo objetal, inventando outro com o recurso ficcional e denunciando as contradições e mistificações da sociedade estabelecida. Em outros termos, a arte mantém-se alienada em relação à práxis e somente continua denunciando a realidade se não for subsumida por ela, pela infraestrutura, pelas classes sociais, por este ou aquele estilo considerado mais engajado e revolucionário que outros; dessa forma, não perde a radicalidade e a tensão constituintes ao construto estético, continua valorizando a liberdade, a consciência, as novas sensibilidade e a economia libidinal com a preponderância de Eros, enfraquecendo as raízes do capitalismo nos indivíduos a partir dos recursos da memória, da imaginação, da fantasia e de uma nova cognição. A perspectiva marcusiana de preservar a autonomia da arte não trata, porém, de opor forma e conteúdo: a arte é parte da realidade e a sua forma se torna conteúdo, concomitantemente, ela está na realidade e a transcende imaginariamente, resguardando a possibilidade do ethos estético – alcança-se uma mimese crítica que remonta estilisticamente a matéria com o poder de desmistificar o dado, partindo-se dele e o reordenando. Não envereda, outrossim, pela qualificação como essencialmente afirmativa ou subversiva, mas por colocar em relevo, dialética e ambiguamente, os compromissos da arte com a ordem (expostos desde a década de 1930, em O caráter afirmativo da cultura) e com a crítica à ordem estabelecida à medida que explicita suas contradições: a catarse promovida pela obra de arte tanto dá ensejo à fruição no mundo estabelecido como o desmistifica e o denuncia como detrator das potencialidades individuais e sociais. Eis uma concepção, portanto, dialética, que lida com a afirmação e a negação, que marca a beleza tanto vinculada com a reconciliação como com a dissidência em relação ao status quo, a exemplo dos casos de Shakespeare, Baudelaire e Flaubert.

IV – Considerações finais

O projeto emancipatório pensado por Marcuse significa a superação do princípio de realidade vigente, o princípio de desempenho, pelo princípio de realidade que pacifique a existência, o ethos estético. O vigor da argumentação do Autor não está, apenas, na categorização da possível passagem entre tais princípios de realidade, não somente em mostrar as diferenças entre repressão e mais-repressão, entre sublimação e dessublimação repressiva, entre razão tecnológica/instrumental e razão pós-tecnológica, entre falsas necessidades e demanda por novas necessidades, entre indústria cultural e arte, entre velha e Nova Esquerda; em verdade, a riqueza com que executa o espírito e o método da Teoria Crítica e do Materialismo Histórico, muitas vezes para mostrar a petrificação do próprio marxismo em sua vertente ortodoxa, oferece a abertura e a necessidade de [re]fazer a teoria e manter sua relação com a práxis perenemente, a fim de vencer a crise da sociedade estabelecida e do pensamento dela expoente.

Tais preocupações ocuparam a produção marcusiana desde o seu início: por um curto período, antes de sua entrada do Instituto de Pesquisa Social, Marcuse procurou nexos entre Marx e Heidegger para, assim, evitar a hierarquização da sociedade e do indivíduo, do objeto e do subjetivo; contudo, a vereda foi interrompida em virtude do Autor notar que a historicidade do ser, na perspectiva heideggeriana, volta-se ao passado em lugar de ao futuro, pela redução fenomenológica nivelar tudo – consciência, fatos, percepção, fantasia – a um mesmo plano e configurar-se como destituída de crítica e por Marcuse ter recebido muito bem os Manuscritos econômico-filosóficos, de Marx, que permitiam tratar das questões ontológicas e individuais de acordo com documentos do próprio marxismo e sem cair no objetivismo dos partidos oficiais. As pistas deixadas por Nietzsche e, principalmente, o aprofundamento posterior da questão indivíduo-sociedade, à luz da Psicanálise freudiana, permitiram a Marcuse a autoria de uma perspectiva que amalgamava história, práxis, razão e sensibilidade para se pensar como as potencialidades de gratificação e de avanço das faculdades humanas poderiam se efetivar, bem como a demanda de transformação das organizações societárias em vigência. Marcuse incorporou, à tradição da pesquisa de elementos negativos que nascem na e da sociedade positivada, novas formas de revoltas contra a repressão; estas (além da imaginação e da fantasia), efetivadas pelos diferentes outsiders, desvelavam o retorno do reprimido e a oportunidade da superação dos problemas em vigência. 

Imaginava-se, entre o final do século XIX e o início do século XX, que o capitalismo alcançaria sua crise derradeira e entraria em colapso, hipótese refutada pela continuidade do modo de produção e de estratégias que garantiram sua sobrevida (imperialismo, várias formas de autoritarismos, capitalismo de estado etc.); contudo, em lugar de reproduzir os conceitos e de petrificá-los, colocando o próprio pensamento em crise, Marcuse oxigenou e reconstruiu a teoria, usando o espírito do Materialismo Histórico contra sua própria ossificação, contra o dogmatismo dos partidos que se declaravam marxistas: o Autor rompeu as fronteiras teóricas limitadoras do pensamento e abriu o diálogo crítico do Materialismo Histórico com a fenomenologia, a Psicanálise, a Antropologia, a Sociologia, a Linguística (mas não à guisa de um materialismo interdisciplinar e enciclopédico, uma vez que denunciou a dimensão instrumental e tecnológica das disciplinas e do conhecimento), as produções filosóficas de Kant, Hegel, Schiller, Nietzsche, não se entregou ao determinismo econômico e científico, nunca negligenciou a importância do indivíduo nem apartou a produção teórica da práxis. O Autor desenvolveu a tradição de pesquisa acerca da emancipação e nos convida a atualizá-la à medida que o espírito do Materialismo Histórico, da Teoria Crítica, além da própria realidade, estão abertos ao debate.

Não se pode pensar, por exemplo, que as condições para a emancipação são hoje, sob o neoliberalismo, idênticas aos do período em que preponderavam políticas keynesianas: qual é estatuto dos trabalhadores precarizados, dos trabalhadores superexplorados da periferia do capitalismo como agentes da transformação social qualitativa, dos movimentos das populações atingidas pelo austericídio nos países em que o estado de bem-estar foi desmontado, do movimento LGBTQIAPN+, das lutas antirracistas, das novas ondas do movimento feminista e suas formas de contribuição para a emancipação, de movimentos que demandam mais qualidade de vida em termos sociais e ambientais, a exemplo de pessoas que se organizam por estarem atingidas por barragens e de cicloativistas que sofrem com a violência viária das grandes cidades? Como concatenar as pautas específicas das demandas atuais à emancipação humana e como evitar que grupos tradicionalmente excluídos, ao alcançarem inserção nas instituições sociais, sejam alvos da dessublimação repressiva?

* Anderson Alves Esteves é professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo (IFSP), doutor em Filosofia pela PUC-SP e membro dos grupos de pesquisa GPFPC (PUC-SP/CNPq) e GPEPS (IFSP/CNPq).

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