Por GEDER PARZIANELLO*
Quem consome informação sobre o atual conflito na Palestina precisa ser educado para saber que mídia está consumindo
Os judeus (de Israel) e os árabes (da Palestina) têm estado em conflito há pelo menos sete décadas. Os ataques que estão acontecendo desde o começo de outubro naquela região são agora uma ofensiva do Hamas (Movimento de Resistência Islâmica) e que matou 500 pessoas só nas primeiras horas do confronto. Na prática, o Hamas está reagindo a décadas do que considera humilhação, violência contra os árabes, genocídios e ações terroristas de Israel.
Ambos os lados desse conflito têm sofrido perdas humanas e promovido a violência em diferentes formas de terrorismo. Populações estão sem água, outras perderam terras, sofreram barbáries restritivas como de alimentos e remédios, moradia, escassez do básico. Dificuldades econômicas e falta de infraestrutura numa região já completamente destruída por conflitos anteriores tornam ainda mais difíceis, as possibilidades de paz à região. Crianças, mulheres e idosos sofrem traumas psicológicos. Quem está na região não têm para onde fugir, as fronteiras estão fechadas.
Líderes mundiais fazem pouco quando apenas expressam preocupação ou apoios a um dos lados do conflito. Tem sido assim também em outras guerras globais, como entre a Rússia e a Ucrânia. Organismos internacionais se tornam impotentes frente à ação e reação armadas. No caso deste conflito entre árabes e judeus, a disputa é por um território reivindicado por ambos os lados, seja porque já habitavam o local, seja por questões históricas religiosas posteriores, como argumentam os judeus, baseados na sua Sagrada Escritura.
Mas, o fato é que para ambos os povos, aquela região é uma região sagrada e nenhum dos dois povos quer abrir mão. E desde 1948, com a criação do Estado de Israel, após a Segunda Guerra Mundial, há tensionamentos que tornam inviável a vida harmônica de dois estados como nações naquele território. Os Estados Unidos apoiam econômica e militarmente Israel. O Irã apoia os palestinos.
A Liga Árabe, composta do Egito, da Síria, da Jordânia, do Líbano e Iraque, nunca aceitou a criação do Estado de Israel. O outro lado, porém, não reconhece o Estado da Palestina. O Hamas é um grupo extremista que apoia a causa dos palestinos. Não há equivalência moral, política nem militar nos dois lados. Durante décadas, palestinos foram mortos e oprimidos em suas condições de vida, cercados em uma faixa de terra. Agora, é o Hamas quem ataca o lado israelense. Quando um levante é contra o colonizador, o mundo grita. Quando é contra os colonizados, parece silenciar. Mas a questão é muito mais complexa que isto. O Hamas está usando a linguagem de violência que aprendeu com Israel.
Não existe uma mídia capaz de dar conta dessa pluralidade. Nos Estados Unidos, como no Brasil ou em qualquer lugar do mundo, os meios de comunicação possuem posições ideológicas. Uma cobertura que consiga dar a dimensão da realidade precisa por isso mesmo ser plural, com a mídia que defende um e outra que defende outro ponto de vista. O jornalismo não é neutro, nem isento, como já tanto se construiu na consciência social e na deontologia da profissão. O democrático está na pluralidade de vozes, no que elas, as mídias, no plural e não no singular, constroem de realidades.
O jornalismo constrói realidades. O que é muito diferente de inventar. Quando versões de um fato são escolhidas para reportar o que esteja acontecendo, isso não é manipulação nem mentira. É enquadramento da notícia. Porque simplesmente trabalhamos com a linguagem, e linguagem não é transparente. Nem mesmo quem mostre um lado menos evidente de um acontecimento não estará só por conta disso mais perto da verdade. Há distorções por todos os lados. Ninguém tem exatamente razão, porque numa guerra o juízo racional ou moral não fazem menor sentido.
Quem consome informação precisa ser educado para saber que mídia está consumindo. Não se pode querer que uma imprensa toda cubra do mesmo modo qualquer que seja um fato noticioso. Por isso existe a democracia dos meios, a variedade, a diversidade plural. E há outros aspectos a considerar: nossa dependência de agências de notícia, nossa dificuldade de acesso a outros meios, outras fontes.
O terrorismo está nos dois lados: em quem cerca um povo numa faixa de terra e tenta isolá-lo e quem avança sobre civis, matando e provocando mais destruição. Violência gera violência e em se tratando de guerras com sacrifício de civis, estão todos errados. Nenhum interesse econômico, nacional, político, ou mesmo religioso pode falar mais alto que o respeito à dignidade e às vidas humanas.
*Geder Parzianello é professor de jornalismo na Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA).
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