Olney São Paulo por ele mesmo

Imagem: Ester Partegàs
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Por YVES SÃO PAULO*

Trecho do prefácio da coletânea recém-publicada de escritos do cineasta baiano

Certamente, o leitor que tem em mãos este volume conhece melhor a obra cinematográfica de Olney São Paulo que a sua produção para a imprensa. Assim ele desejaria, visto que todo seu esforço de vida foi em constituir uma filmografia pessoal e seu trabalho junto à imprensa foi um meio de lançar luzes sobre estes esforços. Com o auxílio da biografia escrita por Ângela José, Olney São Paulo e a peleja do cinema sertanejo (Quartet, 1999), descobrimos uma nova faceta desse cineasta. Logo em seus primeiros passos pelo mundo cultural, ainda na cidade de Feira de Santana, encontramos o estudante secundarista Olney a escrever para o jornal montado dentro das dependências do colégio Santanópolis e demonstrando desde já sua inclinação para a arte pela qual será conhecido mais tarde.

O trabalho feito junto à imprensa nos auxilia a pintar, de forma mais ampla, este quadro panorâmico da personalidade de um cineasta que nos deixou muito cedo. Os textos que conseguimos compilar ao longo das páginas seguintes reúnem toda uma vida de esforços pensando cinema, respirando cinema e observando cinematograficamente a sociedade. Será uma característica marcante dos textos de Olney São Paulo, – mesmo aqueles que não trazem o cinema como tema – a inclinação formal de se assemelhar com a arte das imagens em movimento. O estilo de sua escrita é cinematográfico.

Descobrimos, nas linhas dedicadas à escrita jornalística, os filmes assistidos pelo cineasta ainda em seu período de formação; os anos de passagem da adolescência à vida adulta. Especialmente nas duas colunas que compõem as primeiras seções deste livro, encontramos um jovem cinéfilo a constantemente citar filmes, comentando-os de diversas maneiras; seja diretamente por meio de uma crítica, seja indiretamente ao mencioná-lo acompanhando um cenário de observação social.

Surge um interesse ainda específico de observar a movimentação cultural que se dava na cidade de Feira de Santana durante os anos 1950. Suas variadas salas de cinema foram palco para que o jovem, aspirante a cineasta, descobrisse uma variedade impressionante de títulos – não somente obras hollywoodianas, como é praxe do circuito exibidor comercial atual, como também filmes de outras nacionalidades. Notar-se-á a diferença de perfil, entre os diferentes cinemas da cidade, nas rápidas menções feitas a respeito de cada um.

Para conseguirmos abarcar a amplitude de três décadas de produção, pensamento e dedicação ao cinema, nos deslocamos a diversos sítios, pesquisando em jornais e revistas, os artigos, crônicas e entrevistas que compõem o acervo que apresentamos. Esta pesquisa pôde ser realizada graças a uma bolsa de pesquisa de Pós-Doutorado, concedida pela Capes, junto à Universidade Estadual de Feira de Santana. Foi no espaço do campus da UEFS onde a pesquisa começou, mais precisamente na Biblioteca Monsenhor Galvão, no Museu Casa do Sertão. Ali, encontramos os jornais Santanópolis, O Coruja e Folha do Norte, que nos auxiliaram a identificar grande parte da produção de Olney São Paulo durante seus anos de formação, antecedendo a produção de seu primeiro longa-metragem, Grito da terra, em 1965. Para a produção posterior ao seu debute cinematográfico profissional, buscamos a Biblioteca Nacional, onde encontramos entrevistas concedidas a jornais de diferentes estados no país. Junto à Biblioteca Central do Estado da Bahia, encontramos os jornais publicados na Bahia. Infelizmente, neste acervo, não pudemos ter acesso ao jornal A Tarde, assim como não conseguimos contato com o jornal para saber como acessar seu acervo, apesar de alguns contatos feitos sem retorno. Assim, apresento estes dados para demonstrar como este livro é uma obra passível de sofrer novas intervenções futuras para acréscimo de novos textos encontrados.

Procurei intervir o menos possível com notas para que este livro não se transformasse numa obra do organizador em vez do que de fato ela é, uma obra de Olney São Paulo; pelo que meu papel se insere como responsável por reunir e editar os textos que seguem. Alguns dos exemplares a que tivemos acesso possuíam trechos ilegíveis ou rasgados, dificultando a leitura de certas passagens, o que será assinalado durante o texto – mas foram poucos os casos de jornais com estas características.

Especialmente no que concerne às duas colunas que compõem o período de juventude de Olney São Paulo, Causerie e Cineópolis, fizemos correções gramaticais de erros que se mostravam comuns ao longo da redação. Apresento esse dado como medida de transparência ao leitor deste volume. As passagens corrigidas serão sinalizadas no próprio corpo do texto, ainda que a sua grafia tenha sido modificada. Conjecturamos que os erros encontrados não se davam por recurso estilístico do autor, mas pela pressa da produção jornalística, podendo, inclusive, passar por um erro na gráfica. Sinalizamos essa mudança ainda para manter a conjectura de se tratar de uma escrita de juventude, pois os erros encontrados durante a redação, assim como seus vícios estilísticos, se dão em grande parte ao caráter formativo de quem se propõe a produzir ainda antes de seu pico de maturidade. A urgência da produção será uma marca da geração de cineastas que formarão o Ciclo de Cinema Baiano dos anos 1960, e essa característica poderá ser notada nos escritos de juventude de Olney São Paulo.

Dividimos o livro em quatro seções, são elas: Causerie, Cineópolis, Diversos, Entrevistas. As duas primeiras seções correspondem ao período de mais intensa produção midiática de Olney São Paulo, quando ele se dedicou à escrita para os jornais Santanópolis e O Coruja. Neles, foi-lhe concedido o espaço para a criação destas duas colunas que apareceram com recorrência. Surgem como duas seções separadas dada a prolixidade com que foram escritas. A seção Diversos apresenta artigos e crônicas escritas nos mais variados períodos da vida do cineasta, mais especificamente se apresentando entre o período de fechamento do jornal O Coruja e o lançamento de Grito da terra, quando o cineasta permanece sem espaço fixo nos jornais locais, mantendo a enérgica busca pela produção cinematográfica. Por fim, a seção Entrevistas marca o período de maturidade, quando sua obra passa a ser reconhecida pela imprensa a ponto de o cineasta ser buscado para dar relatos sobre seus filmes, sobre a situação do cinema brasileiro, além de apontar caminhos para a indústria que tentava caminhar à sombra da Embrafilme e do poderio estadunidense dominando o mercado nacional. Por meio da divisão entre estas seções, marcam-se os diferentes períodos e preocupações que ebuliram da mente deste realizador de cinema.

Ao todo, digitamos 62 peças textuais que serviram como base para a pesquisa de acervo que compõe esse volume. Destas, apenas duas foram observadas como não sendo de autoria direta de Olney São Paulo e, portanto, não se encaixando dentro do programa do livro. A coluna Causerie é a que traz maior número de contribuições, totalizando 21. A coluna Cineópolis possui 14 textos. A seção Diversos vem com 16 escritos. Por fim, as Entrevistas são 9.

Olney São Paulo por ele mesmo pode ser baixado gratuitamente no site da Editora Fi, na versão PDF. A versão física está disponível, sob encomenda, na Amazon.

*Yves São Paulo é doutor em filosofia na UFBA. Autor do livro A metafísica da cinefilia (Editora Fi).

Referência


Olney São Paulo. Olney São Paulo por ele mesmo. Ed. Fi, 2024, 213 págs. [https://amzn.to/3ZkBtuH]


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