Por VÁRIOS AUTORES*
Os (As) que guardam um mínimo de espírito humanista e de civilidade democrática, consideram crime o que o Estado sionista de Israel está a fazer com crianças palestinas
Gaza (ou: eles não podem continuar nascendo)
30 mil mortos.
Essa informação cabe num verso?
Metade dos mortos nessa guerra são crianças…
Gaza:
70% dos corpos identificados são mulheres.
Contando as grávidas.
Move-se uma guerra contra o ventre das mulheres palestinas.
Elas não podem continuar nascendo…
em Gaza…
em Ramallah.
Eles (os palestinos)
não podem continuar nascendo.
Oitenta e quatro anos depois de Auschwitz,
move-se diante dos meus olhos de espanto
uma guerra de extermínio
contra mulheres e crianças…
Escombros nas ruas.
Escombros de corpos.
Escombros nas almas.
Pedro Tierra
Os(As) que guardam um mínimo de espírito humanista e de civilidade democrática, consideram crime o que o Estado sionista de Israel está a fazer com crianças palestinas. Violentá-las é inaceitável, sobretudo, porque são sujeitos com direitos, que “de acordo com os princípios proclamados na Carta das Nações Unidas, a liberdade, a justiça e a paz no mundo fundamentam-se no reconhecimento da dignidade inerente e dos direitos iguais e inalienáveis de todos os membros da família humana”, mas “a infância tem direito a cuidados e assistência especiais” (Convenção dos Direitos das Crianças, 1989), ou seja, as crianças devem ser prioridade em nossas sociedades.
Destaca-se ainda, que vivem um momento singular do continuum processo de tornar-se humano. A singularidade da infância reside nas variadas formas de ser, pensar, agir e de sentir em potência nas crianças, que se manifestam no olhar, nos gestos, no movimento, no balbucio, com raciocínio em articulação, ou no silêncio pensante, no choro ou no riso, na pergunta espantosa ou na resposta surpreendente.
Não se pode mais aceitar que a ideologia sionista, identificada com o racismo e o colonialismo, seja o sustentáculo ideológico-político do Estado de Israel, criado pela Resolução 181 da ONU, em 1948, cuja implantação gerou a Nakba, “catástrofe” em árabe, que resultou em mortes e na violenta expulsão de 750 mil palestinos(as) de suas casas (hoje são 1,5 milhões de palestinos/as deslocados/as!), afetando dramaticamente as crianças.
A propósito, esse violento perfil dos(as) sionistas foi denunciado por Hannah Arendt e Albert Einstein, em 1948, em carta publicada no jornal The New York Times: eles são “[…] muito próximo[s] em organização, métodos, filosofia política e apelo social aos partidos nazistas e fascistas”.
É preciso repudiar a concepção de mundo sionista, pois tem orientado a morte de crianças, na verdade, de uma geração inteira. Mesmo negado pelo Estado sionista de Israel, crianças palestinas têm direito de existirem e de existirem como crianças, e não serem submetidas à nova Nakba.
Como é possível a alguém ficar indiferente frente a uma criança palestina presa por militares, morta, ferida ou amputada pelos bombardeios que o Estado sionista de Israel tem feito em cidades, vilas, escolas, universidades, centros culturais, templos e hospitais? Onde está a humanidade nesse mundo desumano e desumanizador, que faz das crianças objeto de guerras?
Na verdade, não é guerra o que se está a ocorrer na Palestina hoje, porque guerra se faz no combate entre soldados(as) e não entre guerreiros(as) fortemente armados(as) e crianças, como aquelas que ainda resistem, portando brinquedos nas mãos, já que outras os trocaram por algemas. Isso não é guerra, porque o “direito internacional humanitário” tem regras para elas, que dizem o que pode e não pode ser feito.
As “Convenções de Genebra” e seus “Protocolos Adicionais”, as “Convenções de Haia de 1907”, a “Convenção sobre os Direitos das Crianças”, entre outras, rezam que todos(as) os(as) civis devem ser protegidos(as) e respeitados(as). Essa é a norma que o criminoso Estado sionista de Israel insiste em negar desde a criação, suportado pelo imperialismo dos EUA e seus asseclas, e mediante a máquina de combate que dispõe e que é usada e abusada com a covardia reveladora do catastrófico estágio de desumanidade que a humanidade alcançou, porque se fez objeto de um sistema racista e colonialista, que é o sujeito que elimina crianças.
Nunca foi tão fácil entender e sentir a verdade da máxima sartreana “O inferno são os outros”, presente na peça Entre quatro paredes, onde Jean-Paul Sartre relata a vida de Garcin, ex-combatente condenado por deserção. Se o filósofo francês, com essa sentença, aludia ao fato de que a constituição de cada pessoa se dá na alteridade, no encontro com o(a) outro(a), ela tem sido dramaticamente retraduzida no tartárico calvário das crianças palestinas com o outro: o Estado sionista de Israel, que fez inferno para elas a própria casa, um martírio a própria escola e o parque de diversão, tornados espaços de abusos, tortura e morte.
Ajuda a entender o extermínio de crianças palestinas, mas não o explica completamente, a tese de Hannah Arendt, no livro Eichmann em Jerusalém: um relato sobre a banalidade do mal, pois não se trata de indivíduos que abriram mão da decisão própria em função de, cegamente, cumprir ordens que não questionam, mas de uma maldade que corrompeu os corações e mentes de uma coletividade inteira, que no Brasil e no mundo apoiam o genocídio do povo palestino pelo Estado de Israel.
Isso leva à reflexão de que é difícil saber se o ser humano nasce bom porque a natureza é boa, como dizia a filosofia de Rousseau, mas certamente a ideologia sionista tornou depravados(as) e criminosos(as) os(as) que se deixam por ela guiar. Também faz pensar no foucaultiano conceito de necropolítica, do camaronês Achille Mbembe, já que o que se vê há tempos na Palestina é justamente o deixar morrer, aliado ao fazer morrer corpos e mentes.
Quem poderia, na presença de crianças palestinas, repetir o que afirmou a Ministra da Igualdade Social e Empoderamento Feminino de Israel, May Golan, em 21/02/2024: “Estou orgulhosa das ruínas de Gaza! Que cada bebê – mesmo aos 80 anos – conte aos seus netos o que os judeus fizeram quando assassinaram as suas famílias, violaram-nas e raptaram os seus cidadãos”? Quem enfrentaria o olhar violentado de crianças palestinas e consentiria com Yoav Gallant, Ministro da Defesa de Tel Aviv, que em outubro de 2023, ao justificar o bloqueio de energia, água e alimentos para Gaza, disse: os palestinos são “animais humanos”? Poucos, mas o Primeiro-Ministro, Benjamin Netanyahu, seguramente, é um deles!
É preciso resistir a essa barbárie, não lhe ser indiferente, não ser “peso morto nessa história”, porquanto “viver é tomar partido” (Gramsci), o partido das crianças palestinas. A humanidade não se levantou contra o nazismo porque ele eliminou judeus e judias, mas porque matou milhões de humanos(as). A humanidade não cerrou fileiras contra o apartheid porque os(as) africanos(as) eram negros(as), mas porque eram seres humanos. Muitos(as) não se indignaram com os atentados aos povos indígenas, recentemente feitos pelo governo de Jair Bolsonaro, porque eram indígenas, mas porque eram humanos.
Urge cerrar fileiras na luta contra o genocídio que o Estado de Israel está promovendo contra as humanas crianças palestinas e enfrentar a “pedagogia” do ódio, da violência, da eliminação do(a) outro(a), pois que é um projeto político-militar-pedagógico desumano, que está a desafiar a humanidade hodiernamente.
É isso o que tenta fazer, com este artigo, os(as) integrantes do projeto de pesquisa “Do outro lado da margem: desafios e proposições no enfrentamento das desigualdades sociais das infâncias em pandemia” (PDOLM). Ele foi produzido durante a pandemia de Covid-19, quando do agravamento das condições materiais de vários grupos sociais, repercutindo de forma desigual na vida dos bebês, crianças e seus familiares, o que provocou a necessidade de pesquisar os contextos destas comunidades: indígenas, quilombolas, ribeirinhos, do campo, de centros e periferias urbanas.
O objetivo é construir indicadores referentes às desigualdades sociais vivenciadas de modos distintos em pelo menos três das cinco macrorregiões do país, apontando para a construção de uma agenda de políticas públicas intersetoriais para as crianças e suas famílias. Essa busca de conhecer e propositar sobre tal realidade, integrantes do projeto “Do outro lado da margem…” têm também militado em favor dos direitos dos bebês e das crianças, porque não tem fronteiras lutar pelos direitos das crianças em ter infância.
Por isso, integrantes do PDOLM conclamam as autoridades brasileiras dos três poderes da República a envidarem esforços para: (a) denunciar as violências que o Estado de Israel promove contra crianças palestinas; (b) baseadas no “direito internacional humanitário”, acionar as instâncias estrangeiras de proteção aos direitos humanos e à infância, com vistas a mobilizá-las para tomar medidas pela paz na Palestina e pelo imediato cessar-fogo por parte do Estado sionista de Israel; (c) reivindicar a imediata criação de Estado Palestino, livre e soberano; (d) promover campanhas nacionais e internacionais de apoio material e imaterial às crianças palestinas.
Com vistas a fortalecer essa conclamação, em breve, a coordenação do PDOLM disponibilizará um manifesto com o mesmo conteúdo deste artigo, para que pesquisadores(as) e grupos de estudos e pesquisas sobre as infâncias no Brasil possam a ele aderir e, assim, se mobilizarem também para outras ações em favor de que as crianças palestinas possam existir e existirem como crianças.
Marcos Francisco Martins (UFSCar)
Maria Walburga dos Santos (UFSCar)
Angela Maria Scalabrin Coutinho (UFPR)
Cleonice Maria Tomazzetti (UFSCar)
Emilia Peixoto Vieira (UESC)
Francilene de Aguiar Parente (UFPA)
Fernanda de Lourdes Almeida Leal (UFCG)
Beleni Saléte Grando (UFMT)
Romilson Martins Siqueira (PUC-GO)
Daniele Marques Vieira (UFSCar e UFRGS)
Andréia Regina de Oliveira Camargo (UNIFESP e UFSCar)
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