Por PEDRO HENRIQUE MAURÍCIO ANICETO*
A história das privatizações no Brasil expõe inúmeros casos de empresas alienadas a preços aviltantes, cujos serviços declinaram acentuadamente após a transição para o setor privado
O processo de privatização das empresas estatais em Minas Gerais, sob a dantesca liderança do governador Romeu Zema, suscita uma série de debates e controvérsias de natureza complexa e, certamente, multifacetada. A proposta de desestatização, que abrange entidades de grande relevância como a Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa), a Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) e a Companhia de Gás de Minas Gerais (Gasmig), não apenas levanta questões de cunho econômico, mas também questiona profundamente os princípios democráticos e a legitimidade do processo decisório em uma sociedade pluralista.
Uma crítica primordial ao posicionamento do governo de Romeu Zema reside na aparente ausência de um diálogo substantivo e na aversão ao exercício democrático. O governador tem manifestado publicamente sua intenção de suprimir da Carta Magna mineira a obrigatoriedade da realização de referendos populares para as privatizações na forma da Proposta de Emenda Constitucional Nº24/2023, argumentando que tais consultas são inviáveis em termos operacionais.
Tal postura autoritária e desatenta ao imperativo da discussão democrática emerge como um aspecto inquietante, particularmente quando se considera que as pesquisas de opinião indicam uma inequívoca resistência da população mineira à privatização das referidas estatais, segundo pesquisa realizada pela DataTempo em agosto de 2022.
A pesquisa revela uma clara tendência de oposição à privatização das empresas estatais em Minas Gerais por parte da maioria dos eleitores, refletindo uma posição de valorização do papel do Estado na gestão de serviços essenciais como energia elétrica, saneamento básico e distribuição de gás natural. Especificamente, a Cemig emerge como a empresa que détem mais resistência à privatização, com 65,3% dos entrevistados se manifestando contra essa possibilidade, seguida pela Copasa, com 59,6%, e pela Gasmig, com 53,9%. A relevância dessas opiniões se destaca diante da importância estratégica dessas empresas na vida cotidiana e no desenvolvimento socioeconômico do estado.
A justificativa governamental para a privatização assenta-se na suposta necessidade de incremento da eficiência e da gestão das empresas, bem como na atração de investimentos privados visando catalisar o desenvolvimento econômico estadual. Todavia, tal argumentação, apesar de superficialmente persuasiva, desconsidera uma gama de fatores complexos e substanciais. Em primeiro plano, ressalta-se que as empresas estatais em escrutínio têm demonstrado lucratividade considerável, o que suscita questionamentos quanto à urgência e à pertinência da privatização como panaceia para as mazelas financeiras do estado. Ademais, a história das privatizações no Brasil expõe inúmeros casos de empresas alienadas a preços aviltantes, cujos serviços declinaram acentuadamente após a transição para o setor privado, prejudicando a coletividade e comprometendo o bem-estar social.
Outra contenda premente refere-se ao impacto social da privatização, sobretudo para os trabalhadores das estatais e para as comunidades que dependem dos serviços por elas ofertados. A privatização pode redundar em desemprego em larga escala, precarização das relações laborais e majoração das tarifas para os consumidores, acirrando as disparidades sociais e econômicas no seio da sociedade. Além disso, a escassez de transparência e de participação popular no processo de privatização pode minar a confiança pública nas instituições democráticas e facultar ações discricionárias e antiéticas por parte do governo.
Dessa forma, é imprescindível que a sociedade mineira mobilize-se e exerça pressão sobre as instâncias governamentais e legislativas, de modo a assegurar que o processo de análise e discussão de privatização das estatais seja conduzido de maneira transparente, democrática e responsável. A participação ativa da população é fulcral para salvaguardar os interesses coletivos e garantir que as decisões políticas estejam sintonizadas com as necessidades e anseios do povo de Minas Gerais.
A preservação do patrimônio público e dos fundamentos democráticos erige-se como incumbência de todos os cidadãos e como elemento basilar na construção de uma sociedade mais justa, equitativa e democrática.
*Pedro Henrique Maurício Aniceto é graduando em ciências econômicas na Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF).
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