Robert Eisler

Alberto da Veiga Guignard, Santa Cecília , 1933, óleo sobre tela, 60,4 cm x 50,1 cm
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Por ARI MARCELO SOLON*

Comentário acerca da trajetória intelectual do economista e historiador da arte e da religião

No presente artigo, buscaremos extrair, através do livro Robert Eisler and the Magic of the Combinatory Mind: The Forgotten Life of a 20th-Century Austrian Polymath, de Brian Collins, sobretudo, o esforço teórico de Robert Eisler nos mais variados campos do conhecimento.

No livro elementar, World Cloak and Sky Canopy, Eisler contrapõe as cosmologias da terra redonda e da terra plana. Observamos que há a permanência da concepção hegemônica de que a terra é plana até o helenista ptolomeu adotar a teoria esférica. Nesse sentido: “Eisler argues that two distinct and incompatible cosmological systems spread from the Near East into the Hellenic world, one that pictured the vault of heaven held up over the flat earth by a tree or pillar, and another that pictured the cosmos as a spherical shape, like the Hiraṇyagarbha (“Golden Egg”) described in the Sanskrit Matsya Purāṇa. The first of these systems has been dominant for most of history (and has now apparently regained some popularity among conspiracy theorists on the internet), but was eventually supplanted by the spherical model, which gave rise to a scientific picture of the universe”.

O que ganha destaque é a apresentação de que no oriente ambos os modelos e a Revolução esférica surgem com o sirvanismo. Por outro lado, temos que a ideia do tempo eterno e ilimitado, de um deus transcendental, tal como no Zoroastrismo, na Grécia fez surgir como o “ápeiron” e, na mística judaica, enquanto “ein sof”. Ambas as concepções eram místicas, mas uma originou a cosmologia grega, enquanto a outra uma visão não científica.

Referido esforço teórico parte do historiador da arte, Alois Riegl, que influenciou Walter Benjamin e, também, Ernst Cassirer em relação às formas simbólicas do mito, além de tantos outros pensadores: “In World Cloak and Sky Canopy, Eisler takes on the ideas of a previous generation of major historians of religion like Friedrich Creuzer, William Dupuis, and Karl Otfried Müller. And the method he employs, while indebted to Morelli, Riegl, Cassirer, and Usener, is uniquely his own. Using Henry II’s coronation robe as a starting point, he attempts to “reverse-engineer” the Kunstwollen of successive civilizations from Sassanian Persia to the Holy Roman Empire”.

Além do mais, Brian Collins apresenta a biografia de Eisler, além das mudanças na vida intelectual ocorrida numa Europa do século XX, através da obra Man into Wolf: An Anthropological Interpretation of Sadism, Masochism and Lycanthropy, do mesmo autor, em que há a apresentação da tese de que houve o abandono do vegetarianismo e do poliamor, a fim de que os proto-humanos pudessem sobreviver à Era do Gelo. Com relação a isso, passaram a imitar as estruturas hierárquicas e as práticas de caça das alcateias, de onde incorporaram, no inconsciente, o instinto referente à crueldade.

No capítulo “Ladies’ Coats and Beach Cabanas in Light of the History of Religion”, Collins analisa a primeira obra de Eisler, World Cloak and Sky Canopy, em que há a discussão de duas visões incompatíveis em relação aos sistemas cosmológicos difundidos no Oriente Próximo, um que retratava o cofre do paraíso suspenso sobre a terra plana por uma árvore (ou pilar), outro que via o cosmo como esférico.

O interesse recai, também, sobre a primeira obra em inglês Orpheus the Fisher, em que há a identificação do Orfismo enquanto uma religião pré-helênica fundamentada em um pescador divino ou, ainda, um caçador, que foi suprimido pelos gregos devido aos ritos de sacrifício de sangue. Nessa obra, há o estudo da teoria em que o pão partilhado na Santa Ceia era, na verdade, o “afikoman”, pão passado ao fim da refeição pascal, logo a partilha desse pão significaria um gesto criptografado acerca da revelação de Cristo enquanto Messias.

Observa-se que, a partir dos manuscritos eslavos, do historiador Flavius Josephus, do século I, Eisler, além de estabelecer uma descrição física controversa acerca de Jesus, pontua que ele foi um messias político que desejava expulsar os romanos.

Ademais, Collins traz os planos de Robert Eisler a respeito da criação de um sistema monetário duplo, em que haveria um câmbio para realização de pequenos pagamentos e outro para a unidade em conta. A finalidade era efetivar, por meio de um banco central, juros negativos através da manipulação da taxa de câmbio entre as referidas moedas, e penalizar a acumulação de dinheiro.

Em Eranos, Eisler apresentou a teoria de que o Livro de João consiste na narrativa escrita por Lázaro, suplementada por João de Efeso e pelas interpretações heterodoxas de Marcion.

Por fim, Collins faz referência à decadência de Eisler, em meados de 1940, período em que o intelectual passa a ser visto como um excêntrico, ao invés de um acadêmico de respeito, a despeito de sua vasta produção em diversos campos do conhecimento (Religião, Economia, Filosofia, História da Arte e Filologia)

*Ari Marcelo Solon é professor da Faculdade de Direito da USP. Autor, entre outros, livros, de Caminhos da filosofia e da ciência do direito: conexão alemã no devir da justiça (Prismas).

Referência


Brian Collins. Robert Eisler and the Magic of the Combinatory Mind: The Forgotten Life of a 20th-Century Austrian Polymath. Palgrave Macmillan, 2020, 152 págs.

 

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