Por TERCIO REDONDO*
Sátira do produtivismo acadêmico.
capes: segunda pessoa do singular do subjuntivo presente de capar
(extrair o órgão reprodutor de um animal, castrar, mutilar).
Não confundir com capis,
no latim, a segunda pessoa do singular do indicativo presente de capio
(tomar, agarrar, conquistar),
até porque este implica
a ideia de um acréscimo
e aquele,
a da subtração.
No que diz respeito ao ser humano, porém,
a ação de capar transcorre geralmente
num plano eminentemente espiritual
e implica um nem sempre fácil processo de convencimento.
Diz ao iniciante o pesquisador laureado:
Não te furtes ao moto-contínuo da produção,
publica regular e copiosamente,
torna-te um dispositivo eficiente.
Serás então recompensado
com verbas, mesmo que ínfimas,
com o reconhecimento de teus pares
e uma meritória pontuação em teu programa.
O mundo gira e
a ciência não pode aguardar dez anos
até que concluas
tua sempre prorrogada investigação.
Além disso, passado esse tempo,
pode ser que não tenhas chegado a conclusão nenhuma!
Uma tradução anotada de Homero?
Fica sabendo que contará apenas
como escrita criativa.
Portanto, em nome
da inovação,
do empreendedorismo,
do programa-nota-máxima,
das patentes que hão de vir,
peço-te encarecidamente que
tenhas juízo
e pontues como todos os demais
e capes,
de uma vez por todas,
os teus pruridos (por mais justos que sejam)
a fim de que,
juntamente conosco,
sobrevivas.
*Tércio Redondo é professor de literatura alemã na USP.
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