Minha geração

Whatsapp
Facebook
Twitter
Instagram
Telegram

Por FRANCISCO DE OLIVEIRA BARROS JÚNIOR*

O docente propõe um conjunto de interrogações com o objetivo de construir uma visão ampla e complexa sobre as novas gerações, representadas pelos alunos que participam das disciplinas

Refletir sobre o conceito de geração, a partir de textos musicais e fílmicos, é uma proposta metodológica a ser desenvolvida. Na sala de aula, do ensino fundamental ao superior, professores experimentam relações intergeracionais. Na exposição de um conteúdo, intitulado de “Intergeracionando”, o docente propõe um conjunto de interrogações com o objetivo de construir uma visão ampla e complexa sobre as novas gerações, representadas pelos alunos que participam das nossas disciplinas.

Estamos no campo universitário onde o professor vai projetar em uma tela, imagens e perguntas para serem pensadas. Uma metodologia dialogal, aberta para dar voz aos estudantes que têm, em média, 20 anos. Seguem as fotografias de nomes conhecidos do universo artístico nacional e internacional. Cada imagem vem acompanhada de uma interrogação.

Sigamos o roteiro da exposição: Com os Beatles, indago: “a que geração pertenço?” Estamos no ano de 2023, em tempos paradoxais, ambivalentes e incertos. Progressos e regressões. Em desassossego, propomos um exercício de contextualização histórica da sociedade na qual vive a juventude atual. Os jovens vivendo em riscos, conectados em redes, na cultura consumista das relações mercantilizadas. Companheiros dos avanços e retrocessos, eles fazem história, são de várias tribos e representam a diversidade.

Com os Rolling Stones, vem a seguinte questão: “quais as características da minha geração?” A sociabilidade juvenil encontra novos paradigmas nos espaços digitais ocupados pelos jovens. Munidos de aparelhos eletrônicos, na sociedade telânica, navegam nas redes sociais e constroem as suas cidadanias em movimentações políticas online. Movimentos sociais juvenis agitam o cenário político em um cyberativismo praticado na “sociedade em rede”. Na “era da informação”, sopram ventos sulistas e nortistas de uma mudança social na qual mentes articuladas contestam o poder.

Atitudes contestatórias em um contexto histórico de reinvenção democrática praticada por uma juventude que vive “uma revolução possibilitada pela internet”. “Indignação e esperança” em um mundo transformado, de reformas políticas e emergência de um padrão tecnologizado no modo de promover insurreições e discursos revolucionários (CASTELLS, 2013). No coletivo, indignados e esperançosos empunham a faixa com uma mensagem no plural: “somos a rede social”.

Com Roberto Carlos, pergunto: “que avanços e retrocessos acompanham a minha geração?” Progressos e regressões em um contexto de ambivalências e paradoxos. Longevidade populacional e altos índices de criminalidade. Notícias animadoras e sombrias. Novas barbáries e robótica presentes na sociedade do espetáculo. Inteligência artificial e pobreza dão matérias jornalísticas. Medos medievais são reatualizados. A covid-19 fez um strip-tease revelador das nossas vulnerabilidades e riscos. Como vivemos agora?

Uma jovem de 20 anos, nos dias de hoje, vive em sociedades paradoxais. Os brasis são exemplares. Um país de excluídos curtindo as viralizações das celebridades em suas pornográficas ostentações. “A galáxia da internet” convive com precários estados de bem-estar social. A pergunta antes feita necessita de um exercício de contextualização histórica. Mostrar as múltiplas faces da globalização, do capitalismo parasitário e do neoliberalismo. Quais as suas consequências humanas? Negócios e economia eletrônicos em movimentos milionários e os quadros de exclusão social correndo em paralelo.

Na “vida para consumo” e “a crédito”, “a geração jovem de hoje” conhece “uma sociedade de consumidores”. Nas redes sociais, a juventude é um terreno virginal a ser conquistado e explorado “pelo avanço das tropas consumistas”. “O jovem como lata de lixo da indústria de consumo”. Uma cultura consumista e “agorista”. Inquietos “e em perpétua mudança”, os jovens entram no “culto da novidade”. Em tempos excessivos e de descartabilidade, eles participam da “assombrosa velocidade dos novos objetos que chegam e dos antigos que se vão”. No império do efêmero, em suas curtições internéticas, a juventude navega nas compras virtuais e provoca a curiosidade: quantas horas por dia gasta com smartphones, computadores, telas diversas e outros instrumentos eletrônicos? (BAUMAN, 2013, p.34).

Com Gilberto Gil, indago: “quais os valores que conduzem a minha geração?” De que matrizes procedem? Estão sendo invertidos? No foco, os princípios que norteiam as nossas existências em uma sociedade de mercado, competitiva e violenta. Em termos necropolíticos, injusta, cruel e outros adjetivos desumanos. Um campo de conflitos. O que é valorizado nas relações capitalistas? O nosso pensamento tem sido crítico em relação às ações desumanizadoras observadas no cotidiano? A mercantilização de todas as relações expõe os homens transformados em mercadorias.

Todos os campos, destacando a saúde, a educação, a religião e outras esferas, são atravessadas pela lógica mercadológica, objetiva, calculista e voltada para o máximo de lucratividade. Números, quantidade de viralizações, vendas da bilheteria e audiência numérica são critérios prioritários. A qualidade do que é produzido e promovido está abaixo do objetivo número um: vender. Em termos mais sintonizados com a época atual, viralizar. Noticiário policial, fofocas e ti ti tis envolvendo celebridades, em especial, viralizam e geram milionários negócios.

Glamour, ostentações ao som de funk, badalações e chacinas telanizadas. “A civilização do espetáculo”, seus ópios, tragédias e frivolidades. Janelas indiscretas. Exposição da intimidade e privacidade pessoal desconhecem os limites entre o público e o privado. “Sou visto, logo existo”. Aparecer de qualquer jeito. Os olhos do poder e os seus plantonistas. Vamos ler “1984”, de George Orwell? Nas telas, o “grande irmão” vê o jogo do “vale-tudo”, o time dos que “topam tudo por dinheiro”.

*Francisco de Oliveira Barros Júnior é professor do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal do Piauí (UFPI).

Referência


BAUMAN, Zygmunt. Sobre educação e juventude: conversas com Riccardo Mazzeo. Rio de Janeiro: Zahar, 2013 (https://amzn.to/3OUEk71).

CASTELLS, Manuel. Redes de indignação e esperança: movimentos sociais na era da internet. Rio de Janeiro: Zahar, 2013 (https://amzn.to/3ONHiu1).


A Terra é Redonda existe graças aos nossos leitores e apoiadores.
Ajude-nos a manter esta ideia.
CONTRIBUA

Veja neste link todos artigos de

AUTORES

TEMAS

10 MAIS LIDOS NOS ÚLTIMOS 7 DIAS

Lista aleatória de 160 entre mais de 1.900 autores.
Manchetômetro Marcelo Módolo Lorenzo Vitral Airton Paschoa Luiz Eduardo Soares Ricardo Abramovay Jorge Branco Gabriel Cohn Manuel Domingos Neto Marilena Chauí Julian Rodrigues Fernão Pessoa Ramos Fábio Konder Comparato Elias Jabbour Dennis Oliveira Bruno Fabricio Alcebino da Silva José Raimundo Trindade Denilson Cordeiro José Costa Júnior Jean Marc Von Der Weid Vladimir Safatle Everaldo de Oliveira Andrade Mariarosaria Fabris José Dirceu Berenice Bento Afrânio Catani Alexandre de Oliveira Torres Carrasco Dênis de Moraes Luiz Roberto Alves Leonardo Avritzer Eliziário Andrade Maria Rita Kehl Rafael R. Ioris Remy José Fontana Fernando Nogueira da Costa José Micaelson Lacerda Morais Flávio R. Kothe Henri Acselrad Antonino Infranca Ari Marcelo Solon Daniel Costa Carlos Tautz José Geraldo Couto Jean Pierre Chauvin Walnice Nogueira Galvão Tarso Genro João Carlos Salles Rodrigo de Faria Valerio Arcary Atilio A. Boron Priscila Figueiredo Francisco de Oliveira Barros Júnior Leonardo Sacramento Eleonora Albano Plínio de Arruda Sampaio Jr. Tales Ab'Sáber Gilberto Lopes Thomas Piketty Alysson Leandro Mascaro Bento Prado Jr. Ladislau Dowbor Boaventura de Sousa Santos Ricardo Antunes João Sette Whitaker Ferreira Andrew Korybko Luís Fernando Vitagliano Ronald León Núñez Bruno Machado Bernardo Ricupero João Lanari Bo Tadeu Valadares Matheus Silveira de Souza Marcus Ianoni Eduardo Borges Ronaldo Tadeu de Souza Juarez Guimarães Paulo Capel Narvai Michael Löwy Marjorie C. Marona Antonio Martins Francisco Pereira de Farias Luiz Renato Martins Daniel Brazil Annateresa Fabris Eugênio Trivinho Chico Whitaker Heraldo Campos Paulo Nogueira Batista Jr Luciano Nascimento Alexandre Aragão de Albuquerque Leonardo Boff Luis Felipe Miguel Lucas Fiaschetti Estevez Ricardo Musse Celso Frederico Andrés del Río João Adolfo Hansen Salem Nasser Otaviano Helene Érico Andrade Anselm Jappe Michel Goulart da Silva Marcos Aurélio da Silva Rubens Pinto Lyra Michael Roberts André Singer Igor Felippe Santos Flávio Aguiar Claudio Katz Liszt Vieira Caio Bugiato Milton Pinheiro Slavoj Žižek Antônio Sales Rios Neto João Paulo Ayub Fonseca Luiz Carlos Bresser-Pereira Jorge Luiz Souto Maior Benicio Viero Schmidt Luiz Bernardo Pericás Vanderlei Tenório Carla Teixeira Alexandre de Freitas Barbosa Eleutério F. S. Prado Paulo Sérgio Pinheiro Celso Favaretto Leda Maria Paulani Sandra Bitencourt Alexandre Juliete Rosa Mário Maestri André Márcio Neves Soares Samuel Kilsztajn Renato Dagnino Sergio Amadeu da Silveira Francisco Fernandes Ladeira Yuri Martins-Fontes Marilia Pacheco Fiorillo José Luís Fiori Ricardo Fabbrini Osvaldo Coggiola Gerson Almeida Alexandre de Lima Castro Tranjan Chico Alencar Luiz Marques Luiz Werneck Vianna Paulo Martins Vinício Carrilho Martinez Gilberto Maringoni Eugênio Bucci João Carlos Loebens Daniel Afonso da Silva Marcos Silva Henry Burnett Marcelo Guimarães Lima Armando Boito José Machado Moita Neto Paulo Fernandes Silveira João Feres Júnior Kátia Gerab Baggio Ronald Rocha Lincoln Secco

NOVAS PUBLICAÇÕES