Antero Greco (1956-2024)

Whatsapp
Facebook
Twitter
Instagram
Telegram

Por ERIK CHICONELLI GOMES*

Antero nos deixou um exemplo claro de como a prática jornalística pode e deve estar alinhada com os valores de justiça social e compromisso democrático

Antero Greco, um dos grandes nomes do jornalismo esportivo brasileiro, nos deixou recentemente, vítima de um câncer. Em sua trajetória, Antero Greco não apenas cobriu eventos esportivos com uma competência inquestionável, mas também trouxe para o jornalismo uma consciência histórica e sociológica rara em sua área. Este texto busca homenagear seu legado, ressaltando sua importância não apenas como jornalista, mas como intelectual comprometido com as lutas democráticas.

Antero Greco iniciou sua carreira jornalística em um momento conturbado da história brasileira, durante os anos de ditadura militar. Seu trabalho sempre foi pautado pela busca incessante pela verdade e pela justiça, qualidades que o tornaram uma referência não só no jornalismo esportivo, mas também no jornalismo como um todo. Antero Greco era conhecido por sua capacidade de contextualizar eventos esportivos dentro de uma narrativa maior, reconhecendo e expondo as relações intrínsecas entre esporte, política e sociedade.

Em seus textos e comentários, Antero Greco frequentemente abordava temas como racismo, desigualdade social e a luta pela democracia. Ele compreendia que o esporte não está isolado das dinâmicas sociais e econômicas que moldam a realidade. Suas análises iam além das quatro linhas do campo, envolvendo discussões sobre os impactos sociais dos grandes eventos esportivos e as políticas públicas relacionadas ao esporte. Essa abordagem crítica e engajada fez com que ele se destacasse em um meio muitas vezes dominado por análises superficiais e despolitizadas.

Antero Greco trabalhou por muitos anos no jornal O Estado de S. Paulo e na ESPN Brasil, onde se consolidou como um dos principais nomes do jornalismo esportivo. Sua relação com outras personalidades críticas do jornalismo, como José Trajano e Juca Kfouri, foi marcada por uma parceria que transcendeu o âmbito profissional, unidos por uma visão de mundo que sempre privilegiou a justiça social e a defesa da democracia. Esses laços fortaleciam suas vozes em um cenário muitas vezes adverso.

Sua paixão pela Itália, país de origem de sua família, era notável e influenciou muitos aspectos de sua vida pessoal e profissional. Antero não só era um grande conhecedor da cultura e do futebol italiano, mas também mantinha uma vasta biblioteca de livros, refletindo seu amor pela leitura e pelo conhecimento. Essa erudição transparecia em seus textos, onde frequentemente citava obras e autores relevantes, oferecendo uma profundidade rara em suas análises.

Antero Greco também foi um defensor fervoroso das lutas democráticas no Brasil. Ele não se furtava a criticar arbitrariedades e abusos de poder, seja no campo esportivo ou na esfera política mais ampla. Sua postura firme e ética serviu de inspiração para muitos jovens jornalistas, que viam nele um exemplo a ser seguido. Sua voz se destacou em momentos cruciais da história recente do país, sempre em defesa da liberdade de expressão e dos direitos humanos.

Infelizmente, a batalha contra o câncer nos privou precocemente de um jornalista que ainda tinha muito a contribuir. No entanto, o legado de Antero Greco permanece vivo. Seu trabalho continua a influenciar e inspirar aqueles que acreditam que o jornalismo tem um papel fundamental na construção de uma sociedade mais justa e igualitária. Antero Greco nos deixou um exemplo claro de como a prática jornalística pode e deve estar alinhada com os valores de justiça social e compromisso democrático.

A morte de Antero Greco é uma perda imensa para o jornalismo brasileiro e para todos aqueles que acreditam no poder transformador da informação. Seu legado, entretanto, continua vivo, nos lembrando diariamente da importância de um jornalismo comprometido com a verdade, a justiça e a democracia. Que sua memória nos inspire a continuar lutando por um mundo melhor, onde a informação seja um instrumento de transformação social.

*Erik Chiconelli Gomes é pós-doutorando na Faculdade de Direito na USP.


A Terra é Redonda existe graças aos nossos leitores e apoiadores.
Ajude-nos a manter esta ideia.
CONTRIBUA

Veja neste link todos artigos de

10 MAIS LIDOS NOS ÚLTIMOS 7 DIAS

__________________
  • João Cândido e a Revolta da Chibatarevolta da chibata 23/06/2024 Por PETRÔNIO DOMINGUES: No atual contexto, em que tanto se discute reparações do Estado à população negra, o nome de João Cândido não pode ser esquecido
  • O medo e a esperançaJoao_Carlos_Salles 24/06/2024 Por JOÃO CARLOS SALLES: Contra a destruição da universidade pública
  • O colapso do sionismopalestina livre 80 23/06/2024 Por ILAN PAPPÉ: Quer as pessoas acolham a ideia ou a temam, o colapso de Israel tornou-se previsível. Esta possibilidade deve informar a conversa de longo prazo sobre o futuro da região
  • Um olhar sobre a greve das federais de 2024lula haddad 20/06/2024 Por IAEL DE SOUZA: Com alguns meses de governo, comprovou-se o estelionato eleitoral de Lula, acompanhado do seu “fiel escudeiro”, o Ministro da Fazenda, Fernando Haddad
  • Retomar o caminho da esperançafim de tarde 21/06/2024 Por JUAREZ GUIMARÃES & MARILANE TEIXEIRA: Cinco iniciativas que podem permitir às esquerdas e centro-esquerdas brasileiras retomarem o diálogo com a esperança majoritária dos brasileiros
  • Manual teológico do neopentecostalismo neoliberaljesus salva 22/06/2024 Por LEONARDO SACRAMENTO: A teologia transformou-se em coaching ou fomentador da disputa entre trabalhadores no mundo do trabalho
  • Por que estamos em greve?estátua 50g 20/06/2024 Por SERGIO STOCO: Chegamos a uma situação de penúria das instituições de ensino federal
  • Franz Kafka, espírito libertárioFranz Kafka, espírito libertário 13/06/2024 Por MICHAEL LÖWY: Notas por ocasião do centenário da morte do escritor tcheco
  • Sobre a ignorância artificialEugenio Bucci 15/06/2024 Por EUGÊNIO BUCCI: Hoje, a ignorância não é uma casa inabitada, desprovida de ideias, mas uma edificação repleta de baboseiras desarticuladas, uma gosma de densidade pesada que ocupa todos os espaços
  • A sociedade da história mortasala de aula parecida com a da história usp 16/06/2024 Por ANTONIO SIMPLICIO DE ALMEIDA NETO: A disciplina de história foi inserida numa área genérica chamada de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas e, por fim, desapareceu no ralo curricular

AUTORES

TEMAS

NOVAS PUBLICAÇÕES