Por CARLA TEIXEIRA*
A campanha antivacina foi deflagrada quando ficou claro que a coronavac chinesa pode ficar pronta e ser distribuída antes da vacina da AstraZeneca
A crise causada pelo novo coronavírus provocou uma corrida mundial em cooperação científica nunca antes vista em busca de uma vacina que pudesse minimizar os efeitos da pandemia. Muitas estão em testes em vários países. No Brasil, temos a vacina desenvolvida pela AstraZeneca, em parceria com a Universidade de Oxford, da Inglaterra, testada pela Fiocruz, no Rio de janeiro. Em São Paulo, temos a chinesa Coronavac, em testes pelo Instituto Butantan. No Paraná, na Bahia e no Maranhão, temos a russa Sputnik V, a primeira vacina aprovada em todo o mundo e que promete 100% de imunização com efeitos colaterais moderados.
No dia 26 de agosto, o governo de São Paulo solicitou junto ao Ministério da Saúde R$ 1,9 bilhão para que fosse possível dobrar a produção de doses inicialmente previstas da vacina Coronavac, viabilizando, assim, a possibilidade de imunização de todos os brasileiros. O valor do aporte é o mesmo recebido pela Fiocruz. De acordo com o secretário estadual de saúde, Jean Gorinchteyn, a Coronavac apresentou imunização de 92,4%, na primeira dose, aumentando para 97%, na segunda dose, mostrando que é uma vacina que se propõe a proteger e imunizar. Os efeitos adversos foram baixos, a maioria relacionados à dor no local da aplicação.
Após o pedido feito pelo governo de João Dória – que depois da campanha Bolso-Dória, nas eleições de 2018, colocou-se na oposição ao governo Federal durante a pandemia – a Secretaria de Comunicação do Governo (SECOM) lançou, em suas redes sociais, no dia 1º de setembro, uma campanha antivacina dizendo que “ninguém pode obrigar ninguém a tomar vacina” e que “o governo brasileiro preza pelas liberdades dos brasileiros” (certamente a propaganda se refere à liberdade de morrer!). Bolsonaro apostou na vacina da AstraZeneca, que promete apenas 50% de eficácia e já conta com dois casos relatados de mielite transversa, uma inflamação na medula espinhal que pode ocasionar fraqueza nos braços e pernas, paralisia, dor, problemas intestinais e de bexiga. De acordo com especialistas, dois casos representam um padrão perigoso. Se um terceiro caso de doença neurológica surgir no grupo submetido ao teste pode ser o fim dessa vacina que, no Brasil, já contou com o investimento de R$ 1,9 bilhão.
Noves fora a saúde dos brasileiros, o que está por trás da campanha antivacina do Governo Federal é a disputa da direita pela eleição presidencial de 2022. Dória é um forte adversário político do atual presidente e busca se carimbar como aquele que trouxe para o Brasil uma vacina eficaz e viabilizou a imunização da população durante a maior crise sanitária dos últimos 100 anos. Bolsonaro, em sua cruzada anti China para agradar Donald Trump, apostou numa vacina que agora apresenta problemas e, vendo que não poderá ter alternativa, cria o caos e a dúvida sobre vacinas para inviabilizar a implementação de uma política nacional de imunização. Polariza diante de questões óbvias, pois seus governo se alimenta do caos provocado pelo coronavírus que, na atual situação de pandemia, impede mobilizações de massa contra o seu (des)governo. É tudo politicamente calculado às custas da nossa saúde.
A campanha antivacina foi deflagrada quando ficou claro que a coronavac chinesa pode ficar pronta e ser distribuída antes da vacina da AstraZeneca que agora corre o risco de sequer ser aprovada. Antes de permitir que outro candidato da direita capitalize em cima do vírus e se projete como nome forte para as eleições presidenciais de 2022, Bolsonaro vai sacrificar a vida de centenas de milhares, milhões de brasileiros, seguir fazendo suas campanhas eleitorais cheias de aglomerações, sem proteção, enquanto a esquerda se mantém paralisada, sem convocar manifestações populares contra os descaminhos do governo, por não querer expor vidas ao perigo da doença. Bolsonaro ganha com o caos da pandemia e fará tudo o que for necessário para satisfazer sua vaidade e alimentar sua ignorante mediocridade.
*Carla Teixeira é doutoranda em História na UFMG.