Ciência ou pseudociência?

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Por JULIAN RODRIGUES*

Para surpresa geral o debate epistemológico acerca da validade do conhecimento científico se tornou hype

Quem poderia imaginar que em pleno ano da graça de dois mil e vinte e três, no ambiente da malvada internet, ganharia relevo (em certa bolha, claro) uma treta séria e relevante. O que é racional, cientificamente validado e o que não passa de pensamento mágico fingindo-se de ciência?

As origens do bas-fond nos remetem à pandemia de Covid e ao papel civilizatório que exerceram biólogos, médicos, especialistas de várias áreas no combate ao negacionismo dos governos fascistas. O filme Não olhe para cima sintetiza com humor e ironia o clima preponderante nos últimos anos.

Terraplanistas, antivaxenegacionistas de todo tipo tomaram de assalto as redes sociais. Um tipo de regressão civilizatória que despreza tanto os liberais quanto os socialdemocratas ou socialistas. Estabelecem novos parâmetros regressivos. Uma coisa impressionante.

Quem imaginaria? No ano da graça de 2023 temos de conviver com milhares (ou milhões?) de pessoas em todo mundo que acham que a terra é plana, duvidam até que já pisamos na Lua, são contra vacinas.

Ou pior: adultos optando por tomar cloroquina – remédio contra malária – para tratar Covid?. Não sabiam a diferença entre vírus e protozoários?!

Não que eu tenha qualquer empatia por esses nazifascistas maluquetes negacionistas que não tomaram vacina e se entupiram de cloroquina e sabe-se lá o que mais. Cada um deles e cada uma delas que deixou esse planeta fizeram um favor à humanidade.

O problema é que seguem a fortalecer a extrema-direita “all around the world”!

O grande Drauzio Varella, Sergio Sacani, Pirula, Daniel Gontijo, Atila Iamarino, Natalia Pasternak, Pedro Hallal – fazem um baita trabalho civilizatório nas redes. É como se fossem Voltaires ou Darwins brigando contra o senso comum obscurantista (pena que não tenham referência na tradição marxista).

Retomando o fio da meada: a despeito dos benefícios trazidos pela popularização dos temas científicos o risco de excessivas simplificações é enorme. A lógica das redes sociais pressupõe exageros, escândalos – tudo que possa seduzir o navegante. Como então combinar o imperativo de atrair cliques e simultaneamente conservar o rigor dos conteúdos publicados?

Tomemos como exemplo a recente polêmica sobre psicanálise. Se a teoria/método/prática criada pelo seu Sigmund não pode ser considerada científica – por que a psicologia como um todo mereceria tal status?

Qual ramo da psicologia é o melhor, de fato? A abordagem cognitiva comportamental ou outra qualquer é superior às demais? A mim me soa como ortodoxia behaviorista reciclada e modernizada.

Não deixa de ser irônico. A ofensiva anti-psicanálise protagonizada por alguns psicólogos pode se voltar contra eles próprios rapidinho.

Os psiquiatras devem estar se divertindo – afinal, costumam desprezar solenemente psicólogos. Viva os remedinhos, todo poder à indústria farmacêutica (ou não)! Mas, falando sério: o dilema dessa indústria tem a ver com o modelo econômico – e não com os remédios em si.

Indago, extrapolando: os americanos realmente pisaram na lua? O vírus do Covid não foi criado pelos chineses? Quem me garante que terra não é mesmo oca e Júlio Verne estava certo em 1864?

Na dúvida, recomendo sempre: racionalidade, lógica, ciência baseada em evidências. Nosso paradigma epistemológico deve ser sempre o método científico, a despeito de todos seus limites. Contra a irracionalidade – venha ela da direitona ou da esquerda riponga – até Popper está valendo a essa altura do campeonato!

*Julian Rodrigues, jornalista e professor, é militante do PT e ativista do movimento LGBTI e de Direitos Humanos.


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