Desdobramentos da contraofensiva da Ucrânia

Imagem: Sputnik / Evgeny Biyatov
Whatsapp
Facebook
Twitter
Instagram
Telegram

Por ANDREW KORYBKO*

A contraofensiva ucraniana está sendo desastrosa, e não há qualquer chance de que a Rússia fará em algum momento concessões unilaterais sobre seus interesses objetivos de segurança nacional

A contraofensiva de Kiev apoiada pela OTAN tem sido desastrosa, o que até a mídia tradicional foi obrigada a reconhecer, depois de ficar impossível negar. A CNN revelou que o país já perdeu cerca de 15% de seus veículos de combate de infantaria Bradley durante a primeira semana, enquanto a Forbes noticiou que aproximadamente a mesma percentagem de tanques Leopard alemães foi destruída, assim como metade se seus veículo de assalto “únicos”. Entretanto, o presidente Putin afirmou que 25-30% de todo seu equipamento estrangeiro foi perdido.

A reeleição de Joe Biden depende do êxito da campanha militar mais importante do Ocidente desde a Segunda Guerra Mundial, o que suscita a questão de saber como os EUA reagirão após seu fracasso. O melhor cenário é forçar Kiev a iniciar conversações de cessar-fogo com a Rússia com o objetivo de chegar a um armistício do tipo coreano, mas isso provavelmente só acontecerá quando todas as outras opções estiverem esgotadas. Estas incluem a ampliação do conflito à Bielorrússia, à Moldávia e/ou às fronteiras russas anteriores a 2014 e a aprovação de uma intervenção militar liderada pela Polônia.

Todas estas opções poderiam levar a uma confrontação nuclear temerária com a Rússia provocada pelos americanos, o que já está sendo preparado, como demonstram os maiores exercícios aéreos já realizados pela OTAN, que estão ocorrendo na Alemanha, e os relatos de reforço de suas capacidades nucleares no continente. No entanto, não há qualquer chance desta perigosa aposta ser bem-sucedida e da Rússia capitular à chantagem, uma vez que é mais do que capaz de garantir que o Ocidente seria totalmente destruído caso se atreva a usar armas nucleares primeiro.

Os submarinos russos rondam os oceanos e estão sempre prontos para lançar um ataque nuclear de retaliação se a ordem for dada. No front europeu, Kaliningrado foi transformada numa fortaleza equipada com armas nucleares, enquanto as armas nucleares táticas estão prestes a ser instaladas nas proximidades, na Bielorrússia. Os mísseis hipersônicos russos Kinzhal podem penetrar o chamado “escudo de defesa antimíssil” dos EUA, pelo que não há qualquer esperança de impedir a “destruição mútua assegurada” no caso dos belicistas liberal-globalistas decidirem atacar primeiro.

Estas capacidades puramente defensivas devem ser mais do que suficientes para dissuadir o apocalipse, embora não se possa partir do princípio de que os Estados Unidos reagirão racionalmente após o fracasso de sua contraofensiva por procuração. Há muito em jogo no cenário impossível de Kiev remover completamente a Rússia de todo o território que reivindica como seu para Washington simplesmente aceitar a derrota. E os que tomam as decisões políticas podem, por isso, pensar que devem “escalar para desescalar”, em desespero para conseguir algo que possa ser considerado uma “vitória”.

Não há qualquer chance de que a Rússia fará em algum momento concessões unilaterais sobre seus interesses objetivos de segurança nacional, muito menos diante de uma chantagem nuclear, e é por isso que os belicistas liberal-globalistas dos EUA devem banir esse pensamento antes que ponham em risco a existência da humanidade. Qualquer que seja sua reação ao fracasso da contraofensiva de Kiev, ela deve ser guiada por este fato e, idealmente, desescalar a guerra por procuração entre a OTAN e a Rússia, uma vez que é impossível conseguir alguma coisa com uma escalada adicional deste conflito.

*Andrew Korybko é mestre em Relações Internacionais pelo Instituto Estadual de Relações Internacionais de Moscou. Autor do livro Guerras híbridas:  – das revoluções coloridas aos golpes (Expressão Popular).

Tradução: Fernando Lima das Neves.

Publicado originalmente na newsletter do autor.


A Terra é Redonda existe graças aos nossos leitores e apoiadores.
Ajude-nos a manter esta ideia.
CONTRIBUA

Veja todos artigos de

10 MAIS LIDOS NOS ÚLTIMOS 7 DIAS

Fim do Qualis?
Por RENATO FRANCISCO DOS SANTOS PAULA: A não exigência de critérios de qualidade na editoria dos periódicos vai remeter pesquisadores, sem dó ou piedade, para um submundo perverso que já existe no meio acadêmico: o mundo da competição, agora subsidiado pela subjetividade mercantil
Bolsonarismo – entre o empreendedorismo e o autoritarismo
Por CARLOS OCKÉ: A ligação entre bolsonarismo e neoliberalismo tem laços profundos amarrados nessa figura mitológica do "poupador"
Distorções do grunge
Por HELCIO HERBERT NETO: O desamparo da vida em Seattle ia na direção oposta aos yuppies de Wall Street. E a desilusão não era uma performance vazia
Cinismo e falência da crítica
Por VLADIMIR SAFATLE: Prefácio do autor à segunda edição, recém-publicada
O jogo claro/escuro de Ainda estou aqui
Por FLÁVIO AGUIAR: Considerações sobre o filme dirigido por Walter Salles
A estratégia norte-americana de “destruição inovadora”
Por JOSÉ LUÍS FIORI: Do ponto de vista geopolítico o projeto Trump pode estar apontando na direção de um grande acordo “imperial” tripartite, entre EUA, Rússia e China
O pagador de promessas
Por SOLENI BISCOUTO FRESSATO: Considerações sobre a peça teatral de Dias Gomes e o filme de Anselmo Duarte
Na escola ecomarxista
Por MICHAEL LÖWY: Considerações sobre três livros de Kohei Saito
A força econômica da doença
Por RICARDO ABRAMOVAY: Parcela significativa do boom econômico norte-americano é gerada pela doença. E o que propaga e pereniza a doença é o empenho meticuloso em difundir em larga escala o vício
Ainda estaremos aqui?
Por ANTONIO SIMPLICIO DE ALMEIDA NETO: É preciso, com urgência, considerar a negligência com que temos tratado o conhecimento histórico nas escolas brasileiras, notadamente as públicas
Veja todos artigos de

PESQUISAR

Pesquisar

TEMAS

NOVAS PUBLICAÇÕES