Por ARACY P. S. BALBANI*
O governo do presidente Lula causa chilique em muita gente quando centra na mira pontos nevrálgicos do fascismo: o crime organizado e a corrupção
O futuro próximo da vida política brasileira está nebuloso. Fascistas fazem o que sempre fizeram. Buscam satisfazer suas necessidades e vontades. No percurso, chantageiam o governo federal e ameaçam lideranças progressistas. Nenhuma novidade, portanto.
Já a agenda do governo federal é bem diversificada. Inclui desde a resistência às tentativas de desgaste de ministros e da presidenta da Petrobras até a manutenção, desde o início do mandato, do Ministro Múcio Monteiro na Defesa (ou seria na defensiva?). Até onde sabemos, nenhuma mulher negra conseguiu chegar ao oficialato das Forças Armadas – e olhe que isso nem precisaria começar pela Marinha.
O governo Lula apanha, dentro e fora do País, por restaurar nossa política externa altiva e ativa, e também por defender a paz, o multilateralismo e as medidas contra a fome.
Ao mesmo tempo, inaugura obras, firma acordos comerciais internacionais e recebe intenções de investimentos bilionários benéficos ao Brasil. Trabalha para reverter o legado negacionista antivacina. Atua contra uma epidemia de dengue sem precedentes. Busca a repatriação de pesquisadores para o renascimento da ciência e tecnologia após um período de trevas.
Além disso, o governo federal lidera a assistência para a reconstrução do Rio Grande do Sul. Dá nova largada para a recuperação da nossa indústria naval. Prestigia a cultura. Coloca negros, mulheres, LGBTQs, ambientalistas e representantes de povos originários em cargos de mando.
O governo do presidente Lula causa chilique em muita gente quando centra na mira pontos nevrálgicos do fascismo: o crime organizado e a corrupção. Nem se pode falar que ambos sejam espólios de folclóricos governantes anteriores. Fascistas bem poderosos estão muito vivos entre nós.
Intelectuais já denunciaram que fascismo, organizações criminosas e corrupção estão interligados. O fascismo se enraíza no Estado pelo poder, agasalha a corrupção e se dissemina pela sociedade através do crime. Isso lhe permite oprimir os opositores e eliminar os indesejáveis, seja por meio da imposição da lei do silêncio (omertà), do encarceramento, da tortura ou do extermínio. No fascismo, torna-se quase impossível definir a linha onde terminam os crimes comuns e começa o terrorismo de Estado. Procure a origem do dinheiro que financia ações fascistas e tenha grandes revelações.
No Brasil, não é diferente. Basta acompanhar as investigações da Polícia Federal, com ou sem cooperação do Ministério Público Federal e do Ministério Público do Trabalho. Elas desnudam garimpos ilegais, grilagem de terras, milícias, trabalho escravo; assassinatos de políticos, líderes indígenas e de sem-terras; células neonazistas, ações de hackers, produção de notícias falsas, contratos milionários suspeitos com entes da administração pública. Daria para escrever uma enciclopédia criminal.
Do outro lado da Praça dos Três Poderes, o STF, que já foi atacado pelos extremistas “300 do Brasil” em 2020, e por outros golpistas em 2023, também resiste ao fascismo.
Nem todos os golpes dos extremistas de direita são de Estado. Ao puxar a capivara de um típico fascista brasileiro da classe média, ele pode ser flagrado abiscoitando dinheiro do caixa do próprio condomínio, assediando vizinhas, sonegando impostos ou dando calotes. Faz muitas dessas mutretas alinhado com políticos do baixo clero que lhe passam pano.
Nas ruas do país, a resistência popular antifascista tem sido discreta. Cidadãos antifascistas anônimos e isolados sabem que correm os riscos de demissão do emprego, assassinato de reputação ou outras formas de violência. Mas há, também, bravos militantes organizados. Frequentemente sofrem perseguição judicial, ofensas ou ameaças de morte. Porém, não recuam.
As manifestações públicas de direita foram esvaziadas. Nem Elon Musk foi capaz de mobilizar os extremistas da classe média frustrada. Estes não mais batem panelas nas sacadas dos apartamentos. Após as prisões de arruaceiros miúdos do 08 de janeiro de 2023 – os graúdos ainda estão soltos –, enfiaram as panelas no armário. Ariscos, limitam-se a remediar a solidão proseando com o porteiro do condomínio ou choramingando em grupos de WhatsApp. Melhor amargar a solidão de fascista do que ir parar numa solitária.
Com esse cenário complexo e neste momento, o que podemos prever para quando todas essas turmas saírem de casa e forem votar, em outubro?
Está aí uma pergunta ainda irrespondível.
*Aracy P. S. Balbani é médica otorrinolaringologista. Atua como especialista na área assistencial do SUS.
A Terra é Redonda existe graças aos nossos leitores e apoiadores.
Ajude-nos a manter esta ideia.
CONTRIBUA