O fascismo e o desejo

Josef Albers, The Command All-Stars with Josef Albers Persuasive Percussion, Volume 3, 1960
Whatsapp
Facebook
Twitter
Instagram
Telegram

Por TALES AB’SÁBER

A natureza psíquica do fascismo e o genocídio no Brasil

Quem leu Freud pensando sobre grupos sabe como o líder, que está no lugar do “ideal do eu”, uma das dimensões do “superego”, tem poder de hipnotismo sobre o grupo massivo que domina. Se o líder diz exterminem os judeus como baratas, por não serem humanos, o grupo produzirá câmaras de gás para matar pessoas. Se o líder diz tomem um remédio ineficaz, que pode matá-los, o grupo toma feliz a cloroquina ineficaz que pode matá-lo. Se o líder diz, não usem máscara que ela significa a sua opressão, o grupo se revolta contra a máscara. Se o líder diz, sigam a vida sobre a peste como se nada estivesse acontecendo, o grupo vai pra rua, pro boteco e pra balada, como se nada estivesse acontecendo.

Freud é odiado por cientistas políticos convencionais, que desdenham da natureza psíquica do fascismo, por ter mostrado que o fascismo é uma subjetivação desejante, uma estrutura irracional humana de desejo do poder e submissão, uma modalidade política gerenciada técnica e historicamente de sadomasoquismo.

O fascismo é o ultrapassamento, pelo desejo do poder concentrado em um e guerra aberta contra outros, de todo compromisso de racionalidade na política. E Freud foi o primeiro a dizer isso, e não o seu discípulo Reich, que deu continuidade a análise do fascismo, destacado por Deleuze e Guattari, que queriam ultrapassar Freud, como aquele que teria dito que o fascismo foi desejado. Foi Freud quem demonstrou que o fascismo é desejo.

Bolsonaro, como grande fascista que é, necessita da morte e do extermínio do outro como contraponto e como ponto de fuga de sua política. Não existe fascismo sem assassinato em massa. O que foi feito no Brasil é que as imensas pulsões destrutivas do bolsonarismo, não podendo destruir inteiramente o que desejavam – a esquerda, as representações minoritárias, as universidades, os artistas – transbordaram para destruir toda a sociedade.

Bolsonaro ordenou claramente as pessoas a não usarem máscaras, a tomarem remédios falsos e a se exporem com satisfação ao vírus. Fez campanha política aberta contra a vacina, entendida como “arma do inimigo”. Condenou à morte milhares de brasileiros, que apaixonados por ele, ou inconscientes do seu vínculo amoroso com ele, fizeram a política suicida que ele necessita. A morte de um povo por amor, sem pensamento, ao seu líder fascista.

*Tales Ab’Sáber é professor de filosofia da psicanálise na Unifesp. Autor, entre outros livros, de O Sonhar Restaurado: Formas do Sonhar em Bion, Winnicott e Freud (Ed. 34).

Publicado originalmente no Jornal GGN.

Veja neste link todos artigos de

AUTORES

TEMAS

10 MAIS LIDOS NOS ÚLTIMOS 7 DIAS

Lista aleatória de 160 entre mais de 1.900 autores.
Eleutério F. S. Prado Renato Dagnino Chico Whitaker Otaviano Helene Henry Burnett Luiz Marques Valerio Arcary Daniel Costa Celso Frederico Gerson Almeida Jean Pierre Chauvin Ricardo Abramovay Leda Maria Paulani José Geraldo Couto Maria Rita Kehl Bernardo Ricupero Dennis Oliveira Francisco Pereira de Farias Thomas Piketty José Costa Júnior Jorge Branco Afrânio Catani Vladimir Safatle José Dirceu Paulo Nogueira Batista Jr Gabriel Cohn Paulo Martins Antônio Sales Rios Neto Marcelo Guimarães Lima Luiz Carlos Bresser-Pereira Mariarosaria Fabris Rafael R. Ioris Juarez Guimarães Daniel Afonso da Silva Bruno Fabricio Alcebino da Silva Fernão Pessoa Ramos Milton Pinheiro Ricardo Fabbrini Ricardo Antunes André Márcio Neves Soares Rodrigo de Faria Sergio Amadeu da Silveira Luis Felipe Miguel José Machado Moita Neto Ronald León Núñez Bruno Machado Alexandre Aragão de Albuquerque Leonardo Sacramento João Lanari Bo Michel Goulart da Silva Salem Nasser Tarso Genro Andrés del Río Leonardo Boff Priscila Figueiredo Eugênio Trivinho Paulo Sérgio Pinheiro Marilena Chauí Armando Boito Claudio Katz Marcus Ianoni Fábio Konder Comparato Marjorie C. Marona Kátia Gerab Baggio Luiz Werneck Vianna Lincoln Secco Tadeu Valadares José Micaelson Lacerda Morais Boaventura de Sousa Santos Francisco Fernandes Ladeira Berenice Bento Mário Maestri Lorenzo Vitral Valerio Arcary Benicio Viero Schmidt Antonio Martins Luiz Eduardo Soares Andrew Korybko Vinício Carrilho Martinez Paulo Fernandes Silveira Michael Löwy Rubens Pinto Lyra João Paulo Ayub Fonseca Marilia Pacheco Fiorillo Julian Rodrigues Sandra Bitencourt Everaldo de Oliveira Andrade Gilberto Maringoni Remy José Fontana Érico Andrade Eliziário Andrade João Adolfo Hansen Slavoj Žižek Jean Marc Von Der Weid Manchetômetro Ronald Rocha João Sette Whitaker Ferreira Marcelo Módolo Michael Roberts Osvaldo Coggiola Ricardo Musse Paulo Capel Narvai Marcos Silva Marcos Aurélio da Silva Plínio de Arruda Sampaio Jr. Flávio Aguiar Yuri Martins-Fontes Leonardo Avritzer Gilberto Lopes Denilson Cordeiro Vanderlei Tenório Luiz Bernardo Pericás Lucas Fiaschetti Estevez Chico Alencar Heraldo Campos Tales Ab'Sáber Luiz Renato Martins Airton Paschoa João Carlos Loebens Liszt Vieira Anselm Jappe Bento Prado Jr. Jorge Luiz Souto Maior João Carlos Salles Walnice Nogueira Galvão Flávio R. Kothe José Raimundo Trindade João Feres Júnior Ari Marcelo Solon Alexandre de Freitas Barbosa Matheus Silveira de Souza Luiz Roberto Alves José Luís Fiori Luciano Nascimento Ladislau Dowbor Manuel Domingos Neto Alexandre de Lima Castro Tranjan Eduardo Borges Elias Jabbour Alexandre de Oliveira Torres Carrasco Daniel Brazil Fernando Nogueira da Costa Henri Acselrad Annateresa Fabris Igor Felippe Santos Celso Favaretto Eleonora Albano Eugênio Bucci Francisco de Oliveira Barros Júnior Samuel Kilsztajn Antonino Infranca André Singer Luís Fernando Vitagliano Atilio A. Boron Carlos Tautz Carla Teixeira Dênis de Moraes Alysson Leandro Mascaro Caio Bugiato Ronaldo Tadeu de Souza

NOVAS PUBLICAÇÕES