Clarice Lispector – a ilusão da presença

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Por ANNATERESA FABRIS*

Por meio dos retratos Clarice Lispector pode constatar e fazer constatar a suas correspondentes as transformações que a passagem do tempo imprime nos corpos

Numa carta escrita em Florença às irmãs Elisa e Tania (26 de novembro de 1945), Clarice Lispector refere-se, em dois momentos, à problemática do retrato fotográfico. No primeiro, lamenta que as fotografias feitas no cemitério de Pistóia e perto da igreja de Santa Maria Novella não tenham saído a contento. Tocada pelo “ambiente” do cemitério,[1] “me esqueci de fazer uma cara melhor para vocês. Saí em todas de cabeça baixa ou baixíssima, distraída…”. No retrato tirado perto da igreja florentina, a escritora afirma ter buscado uma pose diferente: “eu sorri para vocês – e acontece que o sorriso não iluminou meu rosto… Eu posso estar rindo por dentro e não aparece por fora”.

Descontente com os resultados obtidos, anota mais adiante estar em dúvida “se mando os retratos para vocês – não quero que vocês se decepcionem”. Essas observações evidenciam que Lispector tem plena consciência do mecanismo da pose, do “teatro do eu” produzido pelo indivíduo diante da câmera fotográfica. Em sua interação com a objetiva, a escritora demonstra estar atenta a duas especificidades da fotografia destacadas por Roland Barthes – a fabricação de “um outro corpo” e a transformação ativa do sujeito em imagem –, o que leva a analisar o desconforto com os retratos tirados na Toscana a partir das considerações desenvolvidas por este em A câmara clara (1980).

Em seu último livro, Roland Barthes expressa o desejo de o retrato fotográfico ser capaz de captar “uma textura moral fina, e não uma mímica”; por isso, decide “‘deixar flutuar’” nos lábios e no olhar “um leve sorriso”, possivelmente “‘indecifrável’”, no qual seja possível dar a ler as qualidades da própria natureza[2] e a “consciência divertida” do cerimonial fotográfico. Se tais considerações se aplicam, de maneira exemplar, às fotografias feitas no cemitério, o descontentamento com o resultado obtido em Florença pode ser explicado pela percepção de que o eu profundo não coincide com a imagem, que o autor define “parada, imóvel, obstinada”.

Se houvesse dúvidas sobre a percepção do vínculo entre retrato e pose, bastaria atentar para a recomendação que Clarice Lispector faz a Elisa numa correspondência escrita em Nápoles, em 24 de julho de 1945: “Minha querida, mande retratos seus. Mande um grande tirado em fotógrafo”. A referência à intermediação de um profissional especializado, que sabe dosar a iluminação, criar um ambiente favorável a uma boa tomada, sugerir uma pose adequada, já tinha aparecido numa carta anterior (Roma, 2 de maio de 1945), na qual se lê: “Vou hoje ou amanhã tirar um retrato aqui, num bom fotógrafo”. A referência ao próprio retrato abre caminho para um pedido direto: “Minha filhinha querida, por que você não faz o mesmo? Eu gostaria tanto, tanto de ter seu retrato. Você diz que tirou e saiu ruim. Mas quantos eu tenho tirado e não prestam. Até que um dia presta”.

Embora seja possível afirmar que Clarice Lispector concordaria com Roland Barthes quanto à natureza profunda da fotografia – ser “um certificado de presença” –, é evidente que discordaria de suas reflexões sobre as iniciativas tomadas pelo fotógrafo para evitar a sensação de morte que emana do retrato fotográfico. Se o crítico se vê como um objeto embalsamado, apesar das “tristes iniciativas” de animação ensaiadas pelo profissional, a escritora, ao contrário, confia na arte deste e em sua capacidade de dar vida ao sujeito que posa para a câmera.

A preocupação com um retrato feito por um “bom fotógrafo” coincide com as sessões de pose das quais ela estava participando no ateliê do pintor Giorgio de Chirico, no começo de maio de 1945. Como lembra na entrevista concedida a Marina Colasanti, Affonso Romano de Sant’Anna e João Salgueiro em 20 de outubro de 1976, a sugestão de ter um retrato pintado por de Chirico foi de um amigo,[3] o pintor interessou-se por seu rosto e compôs o quadro em três sessões.

Na carta endereçada às irmãs em 9 de maio, a escritora demonstra seu entusiasmo com o resultado: o quadro é “pequeno; está ótimo, uma beleza, magnífico, com expressão e tudo”. O retrato, para o qual posou com um vestido de veludo azul da Mayflower, “é só da cabeça, pescoço e um pouquinho de ombros. Tudo diminuído”. Alguns anos depois, Lispector muda de opinião, como demonstra a entrevista concedida a José Augusto Guerra: acha sua expressão “‘meio afetada’” e define de Chirico um “pintor decadente, [que] perdeu o senso artístico”.

Não era a primeira vez que ela posava para um retrato pictórico. Em Nápoles, tinha sido modelo de Zina Aita, como escreve a Elisa em 29 de janeiro de 1945: “Por enquanto nada se pode dizer, é preciso paciência”. O retrato já tinha sido mencionado numa carta a Lúcio Cardoso, na qual Clarice Lispector afirma que a artista achava “com certeza meu rosto ‘característico’, como já me disseram tantas vezes sem me dizer o que característico de quê. Com certeza qualquer coisa feia”.[4]

A incerteza quanto ao resultado da iniciativa de Zina Aita e a reconsideração sobre a obra assinada por de Chirico parecem demonstrar que a autora tinha mais fé na fotografia como registro capaz de dar a ver uma personalidade do que na pintura, a qual poderia sofrer interferências de “um interesse pessoal, obsessivo” do artista, voltado antes para a descoberta de si mesmo do que para a captação da psicologia do sujeito que estava sendo retratado (John Berger).

Essa possibilidade de o retrato pictórico dizer mais do artista do que do modelo tinha sido claramente percebida por ela, como demonstram a carta a Cardoso, em que discute a ideia do seu rosto ter um quê de característico, e a entrevista de 1976, na qual sublinha que o artista italiano desejava vê-la antes para resolver se executaria a obra.

Para Clarice Lispector existe uma aderência profunda entre o sujeito e sua representação fotográfica. Os constantes pedidos de retratos, particularmente à recalcitrante Elisa, demonstram que a ela poderia ser aplicada uma reflexão de Mario Costa sobre a relação de Paul Valéry com a imagem técnica. Fotografia e sujeito são imagens especulares, circulação de uma para o outro, compartilhamento de uma mesma “linfa emocional”, “reabsorção da máquina por parte do sujeito”, que é reconduzida a ele e por ele reassimilada.

É significativo que a questão da câmera tenha sido abordada numa carta escrita em Nápoles, em 21 de novembro de 1944: a compra de uma máquina fotográfica Zeiss Ikon, “em segunda mão, mas muito boa”, é associada à possibilidade de “mandar retratos” e serve de pretexto para solicitar o envio de fotografias de Elisa, que não requerem “trabalho” e proporcionam “muita alegria” à saudosa Clarice.

Para alguém que não deixava de manifestar constantemente um sentimento de solidão e inadequação, que se via como “uma pobre exilada”, saudosa do Brasil e atormentada por “uma verdadeira sede de estar aí com vocês”, a correspondência com as irmãs era uma forma de superar a distância imposta pelo cargo diplomático ocupado pelo marido Maury Gurgel Valente, com quem se casara em 1943. Depois de um período de seis meses passados em Belém, o casal viaja para a Itália, onde Maury ocuparia o cargo de vice-cônsul em Nápoles, entre agosto de 1944 e os primeiros meses de 1946.

É nesse contexto que a escritora procura “tornar-se presente” para as irmãs e, ao mesmo tempo, fazê-las “presentes em sua vida” por meio da troca de missivas. Essa afirmação de Luciana Aparecida Silva pode ganhar um significado maior se for associada aos pedidos constantes de retratos. Para uma Clarice solitária e inadaptada, qualquer imagem poderia servir de consolo. É o que demonstra a carta escrita a Elisa em 3 de janeiro de 1945: “Você está ótima, ótima, apesar do retrato não ser grande coisa e ter escurecido vocês todas. Marcia está vivíssima e com um ar sapeca e inteligente”.

Se o significado da fotografia reside, segundo John Berger, na “lembrança do ausente”, Lispector parece ir além dessa dimensão ao localizar nos retratos das irmãs e da sobrinha Marcia uma espécie de presença física real. Partidária do ilusionismo mimético, a escritora preza tanto o procedimento mecânico que está na base do processo fotográfico quanto seus resultados “naturais”, que lhe permitiam estar na presença dos entes queridos, apesar de uma distância geográfica concreta.

A referência à natureza mecânica do processo não se limita à carta de 21 de novembro de 1944. Ela já tinha aparecido numa missiva anterior (13 de novembro), destinada à irmã mais velha: “Elisa, peço-lhe seriamente que me mande um retrato seu recente. Não custa nada o trabalho, e a mim dará enorme prazer”. Essa presentificação do ausente como maneira de superar a barreira física imposta pela distância geográfica é um verdadeiro leit-motiv nas cartas escritas da Itália.

A relutante Elisa recebe uma reprimenda em 19 de março de 1945: “Fiquei aborrecida porque você não me mandou retratos seus. Sei que você não ‘adora’ tirar retratos, mas para mim você deveria tirar. Se você vir que Tania insiste muito para que você seja fotografada, não se zangue com ela, zangue-se comigo que pedi a ela para insistir”.

Seis dias mais tarde, a escritora volta à carga com algumas considerações inusitadas: “Não tenho lhe falado de você vir para cá porque me parece absurdo por enquanto, uma vez que tudo aqui está convulsionado e difícil. […] Eu acho que ficaria maluca de alegria em receber você no cais ou no aeroporto… Prefiro no cais. Passaria dois dias pelo menos sem deixar você ver nada, só olhando e conversando, tão bestinha eu sou. Mas afinal neta é neta.[5] Por falar em neta me lembro de Marcia, me lembrando de Marcia me lembro das fotografias dela, me lembrando das fotografias dela me lembro de fotografias em geral e finalmente chego à varinha de condão que é fotografia sua. Por que não recebi retrato seu? Por que, oh por quê? (não lhe impressiona meu ar de ópera italiana?). Falando sério, eu lhe peço que faça o sacrifício de tirar retratos e me mandá-los. Velhinha como sou, meu consolo são exatamente as netas. E não há nada igual a um retratinho netal. Não esqueça, por favor. E me escreva, escreva, escreva. Diga tudo, conte suas novidades, escreva aquelas cartinhas tão lindas”.

Por meio dos retratos Clarice Lispector pode constatar e fazer constatar a suas correspondentes as transformações que a passagem do tempo imprime nos corpos. Na carta em que comenta estar posando para Zina Aita, pergunta a Elisa se chegaram os “retratinhos levados pelo correspondente de guerra” e se refere a seu aspecto físico: “Estou mais gorda, em breve serei matrona romana, ou melhor, napolitana”.[6] Na de 19 de março de 1945, constata que, pelas fotografias recebidas, Marcia está “formidável e gordinha” e Tania está “ótima”. A capacidade de a fotografia elidir uma ausência é lembrada numa carta às duas irmãs, na qual a escritora solicita o envio de um retrato do pai e outro da mãe com uma justificativa singela: “Às vezes quero ver e não tenho” (23 de agosto de 1945).

A necessidade de estar em contato constante com as imagens das irmãs e da sobrinha assume contornos dramáticos na carta escrita em Florença, em 26 de novembro de 1945: “Mandem retratos. Houve uns dias de desespero para mim porque eu não achei o envelope com todos os retratos que vocês me mandaram. A culpa era minha que os levava para Roma e andava com eles na bolsa… Até hoje não os achei mas continuo a procurar por toda a casa em Nápoles. Me mandem novos, pelo menos”.

Não se sabe se o envelope extraviado foi encontrado, mas as duas últimas missivas escritas da Itália e destinadas, dessa vez, a Tania, ainda trazem referências a retratos. Na primeira, datada de 3 de dezembro de 1945, Lispector demonstra-se ansiosa com a chegada da sogra, que “traz cartas para mim e retratos…”. Em 2 de janeiro de 1946, informa que voltará a Nápoles dentro de dois dias, “sem ter visto as coisas que virão para nós, as milhares de coisas que vêm para mim, nem os retratos. É que as bagagens estão em Milão, a caminho daqui e nós não podemos esperar mais. Porém quando eles vierem para Roma, seguirão para Nápoles pelo portador de maior confiança. Espero que a senhora tenha se lembrado de mandar retratos seus para mim e isso constituirá meu melhor presente”.

Levar os retratos das irmãs e da sobrinha num envelope colocado na bolsa equivale a criar um álbum de família portátil, centrado num passado próximo e no presente, ao qual a saudosa Clarice pode recorrer nos momentos de desamparo e solidão. Distante da família, ela tenta reconstruir, graças à contemplação das fotografias, lembranças comuns, ativar a memória afetiva, recompor o núcleo inicial (como demonstra o pedido de retratos dos pais), elaborar uma narrativa capaz de colocar entre parênteses a sensação de exílio que a acompanha na temporada italiana.

Essa questão, que permeia toda a correspondência familiar, é explicitada francamente na carta escrita à poeta portuguesa Natércia Freire, em 27 de agosto de 1945: “Eu aqui morro de saudade de casa e do Brasil. Essa vida de ‘casada com diplomata’ é o primeiro destino que eu tenho. Isso não se chama viajar: viajar é ir e voltar quando se quer, é poder andar. Mas viajar como eu viajarei é ruim: é cumprir pena em vários lugares. As impressões, depois de um ano num lugar terminam matando as primeiras impressões. No fim a pessoa fica ‘culta’. Mas não é o meu gênero. A ignorância nunca me fez mal. E as impressões rápidas são para mim mais importantes que as prolongadas”.[7]

O papel do álbum de família[8], dotado de uma função ritual que reforça a consciência da unidade do grupo familiar (Pierre Bourdieu), parece ter sido condensado pela escritora no envelope sempre à mão. Será que ela tinha um ritual diário, que consistia em olhar para as imagens e conversar com elas em voz alta, fazendo confidências e expressando pensamentos que não ousava deitar no papel? Essa indagação parece ser legítima porque, antes da transferência para a Itália, Lispector tinha uma relação convencional com o retrato fotográfico.

Embora fale numa “urgência enorme de ver a criança da família, a holandesinha” e inste Tania a tirar “um retratinho dela fantasiada”, na carta de 16 de fevereiro de 1944, tal pedido pode ser visto como uma manifestação de saudade de uma tia amorosa, que não vê a sobrinha há meses. A construção de uma memória familiar comum parece estar na base do seguinte trecho da mensagem escrita em Lisboa, no mês de agosto: “Eu esqueci, com a afobação da viagem, no meio de cartas e papéis, do retrato de você, Tania, e de Marcia. Elisa querida, por favor, me mande um retratinho seu; e você, Tania, me devolva seu retrato. Em breve, quando chegar enfim a Nápoles, tirarei um bem bom com Maury e mandarei”.

As palavras pareciam insuficientes para preencher o vazio criado pela ausência de Elisa, Tania e Marcia. Suas imagens fotográficas, vistas como análogos do real, despertam em Lispector a ilusão de uma presença física tangível e concreta. Embora tenha consciência do mecanismo da pose e da fabricação de um corpo para a objetiva, ela acredita no poder da imagem “aqueiropoieta”, isto é, criada sem a intervenção da mão do artista, fruto da adesão do referente na imagem graças à luz (Philippe Dubois).

A autenticidade que a escritora detecta nos retratos fotográficos não deixa de ter uma conotação fetichista, mas é esse fetiche que a ajuda a suportar a saudade e o vazio gerados pela distância geográfica. A sensação de presença proporcionada pelos retratos encontra uma base sólida numa afirmação de agosto de 1944: “O mundo todo é ligeiramente chato, parece. Gostaria de estar aí com vocês ou com Maury. O que importa na vida é estar junto de quem se gosta. Isso é a maior verdade do mundo. E se existe um lugar especialmente simpático é o Brasil”.

Trata-se de uma ilusão, sem dúvida, mas ela é fundamental para a sobrevivência de Clarice no exílio, atestando a força da imagem fotográfica como confirmação de uma existência e apontando para sua relação ineludível com a memória e com a construção de vínculos familiares sólidos.

*Annateresa Fabris é professora aposentada do Departamento de Artes Plásticas da ECA-USP. É autora, entre outros livros, de Realidade e ficção na fotografia latino-americana (Editora da UFRGS). [https://amzn.to/3ZvsrJn]

Referências


BARTHES, Roland. A câmara clara: nota sobre a fotografia; trad. Júlio Castañon Guimarães. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2012 (https://amzn.to/3PtVkRU).

BERGER, John, Sobre las propiedades del retrato fotográfico. Barcelona: Gustavo Gili, 2007 (https://amzn.to/3LC8qeu).

BOURDIEU, Pierre. “Culto a la unidad y diferencias cultivadas”. In: ______ (org.). La fotografía: un arte intermedio. México: Editorial Nueva Imagen, 1979 (https://amzn.to/3rzkXbM).

COLASANTI, Marina; SANT’ANNA, Affonso Romano de; SALGUEIRO, João. “Entrevista entre amigos”. Quatro Cinco Um, São Paulo, ano 7, n. 72, p. 26-32, ago. 2023.

CORTIZ, Diogo. “A Inteligência Artificial pode representar as emoções humanas?”. Cult, São Paulo, ano 26, n. 297, p. 17-19, set. 2023.

COSTA, Mario. Della fotografia senza soggetto: per una teoria dell’oggetto tecnologico. Genova/Milano: Costa & Nolan, 1997 (https://amzn.to/45ULLSV).

DUBOIS, Philippe. O ato fotográfico e outros ensaios; trad. Marina Appenzeller. Campinas: Papirus, 1993 (https://amzn.to/3t7TzCp).

GUERRA, José Augusto. “Uma hora com Clarice Lispector. Talvez da Europa venha a renovação”. O Jornal, Rio de Janeiro, , p. 3, 28 ago. 1949 (supl. Revista).

LISPECTOR, Clarice. Todas as cartas. Rio de Janeiro: Rocco, 2020 (https://amzn.to/3t87w3d).

SILVA, Luciana Aparecida. A epistolografia das irmãs Lispector: nos intermúndios literários de Clarice. 154 f. Dissertação (Mestrado em Estudos Literários). Uberlândia: Universidade Federal de Uberlândia, 2016. Veja neste link.

Notas


[1] Lispector estava visitando o Cemitério Militar Brasileiro de Pistóia, fundado em 1944, para receber os 462 corpos de membros da Força Expedicionária Brasileira e do 1º Grupo de Aviação de Caça, caídos em ação durante a Segunda Guerra Mundial. Em 1960, os despojos foram transladados para o Monumento Nacional aos Mortos da Segunda Guerra Mundial, localizado no Rio de Janeiro.

[2] De acordo com Diogo Cortiz, estudos em neurociência e psicologia têm demonstrado que “inferir os estados mentais de alguém apenas com base na expressão facial é uma abordagem frágil. Isso acontece devido à falta de uma conexão direta entre os movimentos musculares e as emoções, que também varia de pessoa para pessoa e de acordo com a cultura em que estão inseridas”.

[3] Trata-se do diplomata Landulpho Borges da Fonseca.

[4] Não datada, a carta a Cardoso é posterior a 21 de novembro de 1944. Naquele dia, a escritora comenta numa carta a Elisa que tinha conhecido num chá “ligeiramente chato”, em comemoração ao 15 de novembro, “uma senhora que se criou no Brasil e é professora. A irmã dela, que eu ainda não conheço, é pintora e trabalha em cerâmica. São Giovana e Zina Aita, esta brasileira. A professora veio ontem aqui e eu vou um dia à casa delas”.

[5] É possível que a ideia de “neta” esteja associada ao emprego dos termos “filhinha” e “filhinhas” para designar a(s) irmã(s), em algumas cartas, como as de 18 de março de 1944, 7 de agosto de 1944 e 2 de maio de 1945, por exemplo.

[6] Numa carta anterior, datada de 7 de janeiro, Lispector tinha comentado o próprio aspecto físico: “Parece-me que estou pesando 62 quilos, mas não parece propriamente e embora eu não esteja magra não dou a impressão de gorda. Também com esse regime de vida besta em que eu não faço nada. Só emagrecerei se começar a me desesperar por exatamente essa vida besta, o que eu não creio que aconteça porque estou excessivamente mergulhada nela para poder me desesperar”.

[7] Na carta escrita em Florença, Lispector demonstra um sentimento ambivalente em relação ao contato com uma profusão de artistas e obras do passado. De um lado, aprecia a visão de “coisas de Michelangelo, de Botticelli, de Rafael, de Benvenuto Cellini, de Bruneleschi, de Donatelo que eu gosto + do que Michelangelo” De outro, confessa às irmãs: “Tudo isso abafa muito e eu chegava a ter uma impressão de alívio quando sabia que uma certa galeria estava ainda fechada por causa da guerra porque isso me impedia de ver”. Essa confissão sugere que, talvez, a escritora teve um princípio de “síndrome de Stendhal”.

[8] Como demonstra o livro Retratos antigos (esboços a serem ampliados), publicado em 2012 pela Editora da Universidade Federal de Minas Gerais, caberá à relutante Elisa o papel de guardiã da memória familiar. Por meio de fotografias que retratam a família ampliada (avós, tios, primos) e o núcleo que se transferiu para o Brasil, e de relatos orais, a filha mais velha do casal Lispector rememora pessoas, rituais, hábitos, traumas (emblemados nos pogroms) e migrações. Num contexto de dispersão familiar, o álbum fotográfico adquire o papel de arquivo de uma memória que deve ser passada adiante para não se perder.


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