A desinformação na internet

Marcel Duchamp, Milhas de Barbante, 1943
Whatsapp
Facebook
Twitter
Instagram
Telegram

Por VANDERLEI TENÓRIO*

O fenômeno da informação falsa é também um novo indicador de um fenômeno mais antigo

A desinformação na internet cresceu tanto nos últimos anos que se tornou um verdadeiro problema social. As fakes news despertaram temores e indignações, a ponto de se erigirem em verdadeiras ameaças ao debate democrático.

Elas foram acusadas notavelmente de terem influenciado o comportamento dos eleitores durante os referendos sobre o Brexit no Reino Unido e sobre a independência da Catalunha na Espanha, bem como de terem beneficiado o candidato republicano durante as eleições presidenciais americanas de 2016. Com esse novo tipo de ameaça, muitos países, inclusive o Brasil (bem lentamente), estão legislando sobre o assunto para regular com mais firmeza a circulação de informações nas redes sociais e mídias em geral.

De fato, boatos, mentiras, notícias falsas, lavagem cerebral, propaganda, intoxicação e desinformação, não são prerrogativas dos últimos tempos, mas são tão antigas quanto a humanidade. No entanto, a nova realidade se deve à multiplicação dos canais de divulgação da informação, ao surgimento das redes sociais e à disseminação rápida e viral. Ou seja, há uma guerra de informação cibernética em andamento, e as fakes news fazem parte do arsenal dos beligerantes.

Assim, o fenômeno da informação falsa é também um novo indicador de um fenômeno mais antigo, o da crise de confiança política que alimenta um profundo déficit democrático em muitos países ocidentais, e que se expressa em particular por uma rejeição das elites políticas, intelectuais e mídia por uma parcela cada vez maior da população.

Nessa conjuntura, combater efetivamente as fakes news é, portanto, uma tarefa de longo prazo, que articula tanto ações ambiciosas em termos de educação midiática, quanto uma tentativa de recuperar a confiança política. Mas perante os problemas colocados por esta massiva desinformação nas redes sociais, também estão a ser consideradas soluções a curto e médio prazo para tentar travar um fenômeno que muitos observadores consideram preocupante. No entanto, as respostas a essas questões também representam uma série de riscos para o debate democrático.

Afinal, hoje, estamos em uma sociedade onde todos podem dizer ou transmitir o que quiserem no espaço público, incluindo mensagens falsas ou de ódio. Essa possibilidade de ‘expressão ilimitada’ antes era apenas reservada para o espaço privado da família, amigos ou trabalho. No espaço público, era prerrogativa de grupos organizados, partidos políticos, meios de opinião, grupos de pressão diversos, cujos excessos podiam ser mais ou menos controlados por leis e regulamentos ou por adversários.

Contudo, o advento da comunicação de massa transformou a situação: cada indivíduo pode publicar suas opiniões, sem freios e sem limites, por meio de redes sociais e sites. Assim, hoje, o importante não é mais o conteúdo da mensagem, mas a distinção do produtor de signos na multidão.

Nesse sentido, os efeitos das fakes news exemplificam bem os pressupostos da “teoria hipodérmica”. Tal teoria da comunicação linear sugere que as mensagens da mídia são injetadas diretamente no cérebro de uma audiência passiva. Nessa teoria, a mídia é vista como poderosa e capaz de “injetar” ideias em um público que é visto como “fraco” e “passivo” e suscetível a ser influenciado por uma mensagem.

Partindo dessa premissa, hoje, no entanto, os indivíduos parecem oprimidos pela enxurrada de informações que é derramada a cada segundo pelos meios de comunicação de massa. Ademais, é fácil ceder ao caminho mais fácil e beber em cada mensagem sem tentar questionar o que elas querem que acreditemos.

Nisso, assim como pressupõe a teoria hipodérmica, fica fácil para a mídia criar pânicos morais, debates e, acima de tudo, polêmicas e descréditos ao debate democrático – tal questão está sendo experienciada na atual conjuntara do país.

Por fim, diante das atuais circunstâncias, caberá a nós, leitores, ouvintes e telespectadores, ter o reflexo certo e buscar sempre arranhar a superfície da polêmica para revelar a realidade que se esconde abaixo. Também é importante multiplicar nossas fontes, ler vários artigos que tratam do mesmo tema para não nos deixarmos convencer pela falta de objetividade de um comunicador. Não somos receptores passivos, e cabe a nós buscar processar as informações de diferentes ângulos.

*Vanderlei Tenório é jornalista e bacharelando em geografia na Universidade Federal de Alagoas (UFAL).

Veja neste link todos artigos de

AUTORES

TEMAS

10 MAIS LIDOS NOS ÚLTIMOS 7 DIAS

Lista aleatória de 160 entre mais de 1.900 autores.
Marilia Pacheco Fiorillo Mariarosaria Fabris Airton Paschoa Francisco Fernandes Ladeira Bruno Fabricio Alcebino da Silva Alexandre de Freitas Barbosa João Feres Júnior Paulo Fernandes Silveira Henri Acselrad Daniel Brazil José Costa Júnior Francisco Pereira de Farias João Paulo Ayub Fonseca Manchetômetro Samuel Kilsztajn Ricardo Fabbrini Maria Rita Kehl Bruno Machado Tales Ab'Sáber Andrés del Río Remy José Fontana Paulo Capel Narvai Slavoj Žižek Jorge Branco Tadeu Valadares Benicio Viero Schmidt Érico Andrade Thomas Piketty José Machado Moita Neto Flávio R. Kothe Lucas Fiaschetti Estevez Antônio Sales Rios Neto Francisco de Oliveira Barros Júnior Eugênio Bucci Valerio Arcary Rafael R. Ioris Otaviano Helene Luiz Carlos Bresser-Pereira Ronald Rocha Carlos Tautz Michael Roberts Paulo Martins Andrew Korybko Eliziário Andrade Elias Jabbour Vinício Carrilho Martinez Chico Whitaker Ronald León Núñez Alysson Leandro Mascaro Berenice Bento Marjorie C. Marona Marcos Silva Tarso Genro Atilio A. Boron Matheus Silveira de Souza Milton Pinheiro Gilberto Lopes Bento Prado Jr. Eduardo Borges Alexandre de Lima Castro Tranjan Plínio de Arruda Sampaio Jr. Everaldo de Oliveira Andrade Michael Löwy Leonardo Sacramento Leonardo Boff Luiz Werneck Vianna Luiz Eduardo Soares João Carlos Loebens Ari Marcelo Solon Luiz Marques Kátia Gerab Baggio Igor Felippe Santos Dênis de Moraes Valerio Arcary João Sette Whitaker Ferreira Fábio Konder Comparato André Singer André Márcio Neves Soares Ronaldo Tadeu de Souza João Adolfo Hansen Alexandre de Oliveira Torres Carrasco Julian Rodrigues Jorge Luiz Souto Maior Celso Frederico Fernando Nogueira da Costa Vladimir Safatle Yuri Martins-Fontes Jean Pierre Chauvin João Carlos Salles Anselm Jappe Alexandre Aragão de Albuquerque Marcus Ianoni Liszt Vieira Flávio Aguiar Sergio Amadeu da Silveira Antonino Infranca Mário Maestri Ricardo Antunes Ricardo Musse Bernardo Ricupero Juarez Guimarães Luciano Nascimento Luis Felipe Miguel José Dirceu José Geraldo Couto Jean Marc Von Der Weid Rubens Pinto Lyra José Micaelson Lacerda Morais Rodrigo de Faria José Luís Fiori Dennis Oliveira Eugênio Trivinho Gilberto Maringoni Fernão Pessoa Ramos Lorenzo Vitral Antonio Martins Gerson Almeida Salem Nasser Eleonora Albano Sandra Bitencourt Celso Favaretto Michel Goulart da Silva Paulo Nogueira Batista Jr Heraldo Campos Denilson Cordeiro Ladislau Dowbor Annateresa Fabris Chico Alencar Caio Bugiato Armando Boito Claudio Katz Marcelo Módolo Daniel Costa Eleutério F. S. Prado Manuel Domingos Neto Marcelo Guimarães Lima Renato Dagnino Leonardo Avritzer Marilena Chauí Gabriel Cohn Daniel Afonso da Silva Priscila Figueiredo Luís Fernando Vitagliano José Raimundo Trindade Afrânio Catani Paulo Sérgio Pinheiro Marcos Aurélio da Silva Vanderlei Tenório Luiz Roberto Alves Luiz Bernardo Pericás Boaventura de Sousa Santos Ricardo Abramovay João Lanari Bo Lincoln Secco Luiz Renato Martins Henry Burnett Osvaldo Coggiola Leda Maria Paulani Carla Teixeira Walnice Nogueira Galvão

NOVAS PUBLICAÇÕES