Por LEONARDO SACRAMENTO*
Quem aposta unicamente em 2022 pode estar fazendo o jogo de Bolsonaro e do bolsonarismo
A diferença da intenção de votos entre Lula e Bolsonaro caiu para o primeiro e para o segundo turno. Foram 7 pontos para o segundo turno na pesquisa Poder 360. Não dá para jogar para a margem de erro. Bolsonaro chegou em um teto de rejeição e Lula chegou em um teto de intenção de votos. Quem aposta unicamente em 2022 pode estar fazendo o jogo de Bolsonaro e do bolsonarismo. Aliás, hoje é a sua única alternativa.
O erro de quem faz essa aposta é a visão otimista que superestima pesquisas eleitorais temporalmente tão distantes da eleição, um ano para ser preciso. As pesquisas eleitorais, com um tempo tão dilatado, devem ser vistas como tendências, e não como dados determinantes, como se a eleição fosse daqui a um mês. A visão otimista é semelhante da verificada na eleição de 2018, quando militantes acreditavam que Bolsonaro seria o candidato ideal para o segundo turno.
Como tendência, os dados são piores para Lula. Sua intenção de votos está, predominantemente, no eleitorado mais pobre, onde Bolsonaro aponta os seus canhões com o Auxílio-Brasil, que, assim como o Bolsa-Família, tende a ser limitado sobre a quantidade de atendidos. O eleitorado imerso na miserabilidade está fora de qualquer sistema, como provou o Auxílio-Emergencial. Quem está na miséria tende historicamente a não votar. Portanto, é muito provável, com o espraiamento da miséria, que os votos em Lula diminuam, destoando quantitativamente da intenção de votos das pesquisas. Por outro lado, o Auxílio Brasil, focado em famílias com renda próxima a um salário e dois salários-mínimos, tende a produzir algum resultado positivo para Bolsonaro. Qual é difícil de mensurar, mas é improvável que não produza algo.
Quem está na miserabilidade não vota basicamente por falta de perspectiva. Miserável tende a engrossar a abstenção, e não duvido que Bolsonaro, nesse momento, esteja apostando na miséria como fator producente, uma vez que as pesquisas vêm demonstrando que o fator economia, com os condicionantes de hoje, chegaram, possivelmente, ao seu limite. Lógico que os condicionantes podem mudar, com tendência de piora (crise energética, inflação e diminuição de renda). Mas também podem melhorar para quem está há dois, três ou cinco anos sem nada, como a diminuição do desemprego por meio do trabalho informal, conforme o Pnad, publicado pelo em setembro pelo IBGE. É informal, mas é alguma coisa.
Segundo a pesquisa, em cenário com Moro, Bolsonaro literalmente herda os seus votos para o segundo turno, o que indica que há espaço para uma aliança, ainda que implícita, entre bolsonaristas e lavajatistas, como ocorreu em 2018. Com uma campanha bem-feita, o antipetismo pode induzir a classe média a se engajar nas campanhas eleitorais, propiciando uma aliança com a “terceira via” no segundo turno, ou uma divisão satisfatória para Bolsonaro. Esse cenário, por seu turno, ressuscita a “terceira via”, não eleitoralmente, mas politicamente, uma vez que induz o já centrista Lula a abrir mais negociações regionais e nacionais, permitindo que ela consiga negociar e impor continuidades na política econômica. Afinal, não há almoço grátis. Se Bolsonaro ganhar, a política econômica continua. Para a “terceira via”, é uma aposta razoável contribuir para a melhora eleitoral de Bolsonaro e/ou a piora de Lula, pois a coloca no jogo com maior capacidade de negociação.
O eleitoralismo é tão reduzido politicamente que não percebe que, sem Frente contra Bolsonaro, mesmo que por um impeachment que não virá, não há ninguém que paute a sua rejeição. E sem algo que a paute, ela tende a estagnar ou diminuir. Quem, nesse momento, está pautando a rejeição de Bolsonaro?
*Leonardo Sacramento é doutor em Educação pela UFSCar e presidente da Associação dos Profissionais de Ensino de Ribeirão Preto. Autor do livro A universidade mercantil: um estudo sobre a universidade pública e o capital privado (Appris).