Desmilitarizar, desencarcerar, legalizar!

Imagem: Kindel Media
Whatsapp
Facebook
Twitter
Instagram
Telegram

Por JULIAN RODRIGUES*

Nova política de drogas, reforma da segurança pública e reestruturação do sistema prisional: a hora é agora

A mim me intriga muito: por que o campo progressista, a esquerda no geral e o PT em particular, tem tantas dificuldades com a questão da segurança pública?

O senso comum é hegemonizado pelo pensamento neoliberal-conservador e, recentemente, pelo neofascismo. “Bandido bom é bandido morto”– programas estilo Datena pululam por aí.

No Brasil, cerca de seis mil pessoas são executadas, todos os anos, por policiais militares. Trata-se de um problema estrutural, que o PT e a esquerda no geral tem muitas dificuldades para enfrentar.

Desmilitarizar as polícias, legalizar e regular as drogas, cessar o encarceramento em massa de jovens pretos pobres.

Há práticas exitosas sobre políticas de drogas mundo afora – do Uruguai à Portugal – passando pela Califórnia, por exemplo.

Temos 832.295 mil pessoas presas (somando regime fechado, aberto e semiaberto). Cerca de 200 mil são presos provisórios – ou seja, não foram julgados e condenados. 70% são pretos.

É bem complicado mesmo um governo de estado do PT lidar com essas questões. As polícias militares, em especial, se acham uma força à parte que mandam em tudo. Um bando de trabalhadores pobres – mal-formados, com armas na mão e ideologia fascista na cabeça.

Reconhecer o tamanho de desafio não deve nos levar a relativizar os erros dos nossos governos estaduais democráticos. O desempenho do PT nesse tema, no geral, é muito ruim.

Triste Bahia

“Triste Bahia! Ó quão dessemelhante
Estás e estou do nosso antigo estado!
Pobre te vejo a ti, tu a mi empenhado,
Rica te vi eu já, tu a mi abundante.”

Recorro ao gênio Gregório de Matos.

O PT governa a Bahia de todos os santos – e de todos nós – desde o ano da graça de 2007, ininterruptamente.

Qualquer um de nós imaginaria que esta sucessão de administrações progressistas haveria de ter operado alguma transformação na política de segurança pública, pondo algum tipo de freio nas assassinas polícias. Ou ao menos, disputado o senso comum racista.

Em 2015, o hoje ministro da Casa Civil, Rui Costa, na época governador petista da Bahia disse sobre a chacina de doze pessoinhas no bairro soteropolitano Cabul a seguinte “disgraça”:

“É como um artilheiro em frente ao gol que tenta decidir, em alguns segundos, como é que ele vai botar a bola dentro do gol, pra fazer o gol”, comparou. “Depois que a jogada termina, se foi um golaço, todos os torcedores da arquibancada irão bater palmas e a cena vai ser repetida várias vezes na televisão. Se o gol for perdido, o artilheiro vai ser condenado, porque se tivesse chutado daquele jeito ou jogado daquele outro, a bola teria entrado”.

Vanguardista nosso Rui! Antecipou o governador bolsonarista do Rio, aquele Wilson Witzel, que só três anos depois veio a proclamar “a polícia vai mirar na cabecinha e… fogo”.

Poxa, peço escusas (Moro, Sérgio). Mas sou old school. Esquerda não é para mudar algo no mundo? Governos do PT não são um passo em direção à mais igualdade, mais salário? E menos violência estatal contra pobres, pretos, jovens, mulheres? Será que eu perdi algum capítulo da cartilha?

Vamos avançar? Discutir e enfrentar seriamente a pauta das drogas, das pulícias, das cadeias lotadas de pretos?

*Julian Rodrigues, jornalista e professor, é militante do PT e ativista do movimento LGBTI e de Direitos Humanos.


A Terra é Redonda existe graças aos nossos leitores e apoiadores.
Ajude-nos a manter esta ideia.
CONTRIBUA

Veja neste link todos artigos de

10 MAIS LIDOS NOS ÚLTIMOS 7 DIAS

__________________
  • Hans Kelsen e o eros platônicoplatão 16/10/2024 Por ARI MARCELO SOLON & LEONARDO PASSINATO E SILVA: Para Kelsen, a doutrina política platônica está calcada na homossexualidade do filósofo, circunstância que explicaria uma tendência totalitária do projeto filosófico platônico
  • Genocídio sem hesitaçãoemaranhado 17/10/2024 Por ARUNDHATI ROY: Discurso de aceitação do prêmio PEN Pinter 2024, proferido na noite de 10 de outubro de 2024
  • A longa marcha da esquerda brasileiravermelho 371 19/10/2024 Por VALERIO ARCARY: Nos dois extremos estão avaliações de que ou a esquerda “morreu”, ou que ela permanece “intacta”, mas ambos, paradoxalmente, subestimam, por razões diferentes, o perigo bolsonarista
  • Influencer na Universidade públicapexels-mccutcheon-1212407 21/10/2024 Por JOHN KENNEDY FERREIRA: Considerações sobre a performance na Universidade Federal do Maranhão.
  • Forma-livreLuizito 2 20/10/2024 Por LUIZ RENATO MARTINS: O modo brasileiro de abstração ou mal-estar na história
  • Não existe alternativa?lâmpadas 23/06/2023 Por PEDRO PAULO ZAHLUTH BASTOS: Austeridade, política e ideologia do novo arcabouço fiscal
  • Armando de Freitas Filho (1940-2024)armando de freitas filho 27/09/2024 Por MARCOS SISCAR: Em homenagem ao poeta falecido ontem, republicamos a resenha do seu livro “Lar,”
  • A tragédia sem farsaestátua 17/10/2024 Por BARUC CARVALHO MARTINS: Breves comentários sobre a derrota da esquerda na eleição municipal
  • Van Gogh, o pintor que amava as letrasfig1samuel 12/10/2024 Por SAMUEL KILSZTAJN: Van Gogh costumava descrever literalmente seus quadros em detalhes, abusando de adjetivar as cores, tanto antes de pintá-los como depois de prontos
  • O belicismo de Sir Keir Starmer, o trabalhistabélico uk 18/10/2024 Por JOSÉ LUÍS FIORI: Sir Keir Starmer já conseguiu superar o chanceler alemão Olaf Scholz como a liderança mais belicista dentro da Europa, em relação à escalada da Guerra na Ucrânia

PESQUISAR

TEMAS

NOVAS PUBLICAÇÕES