Por AFRÂNIO CATANI*
Comentário sobre o texto que é considerado um dos mais profundos pronunciamentos em defesa do meio ambiente
Em 1855, respondendo a proposta do então Presidente dos Estados Unidos da América, Franklin Pierce (1804-1869), que desejava comprar terras pertencentes aos indígenas, o Chefe Indio Seattle escreveu o manifesto Preservação do meio ambiente, editado no Brasil com 20 ilustrações de Vera Rodrigues.
Na apresentação, o editor Sérgio Amad Costa informa que o Manifesto foi traduzido da versão original, localizada na Seattle Historical Society, em Washington. Fica-se sabendo, igualmente, que o “Chefe Seattle nasceu em 1790 e morreu em 1866. Liderou os Duwamish e as tribos Suquamish, Saminish, Skopamish e Stakmish, sendo o primeiro signatário do tratado de Port Elliot, pelo qual estas tribos se submeteram às imposições governamentais dos EUA, recebendo, em troca, uma reserva indígena. Cumpre lembrar, também, que a cidade de Seattle, nos EUA, tem esse nome em homenagem ao chefe dos Duwamish” (p. 5).
Embora escrito há mais de 160 anos, o manifesto é considerado como um dos mais profundos pronunciamentos sobre a defesa do meio ambiente, sendo de uma atualidade indiscutível. Isso porque chama a atenção para a falta de respeito e de cuidado com a terra e, consequentemente, com o equilíbrio ecológico.
Seattle inicia sua resposta ao Presidente Pierce afirmando que o seu povo irá considerar a proposta recebida para vender suas terras, embora se pergunte: “É possível comprar ou vender o céu e o calor da terra? Tal ideia é estranha para nós. Se não possuímos o frescor do ar e o brilho da água, como podem comprá-los? Cada pedaço desta terra é sagrada para o meu povo. Cada ramo brilhante de um pinheiro, cada areia da praia, cada bruma nas densas florestas, cada clareira e cada inseto a zumbir são sagrados na memória do meu povo. A seiva que corre através das árvores carrega as memórias do homem vermelho (…) Somos parte da terra e ela é parte de nós (…). Deste modo, quando o grande Chefe manda dizer que quer comprar nossa terra, ele pede muito de nós (…). Consideraremos sua oferta de comprar nossa terra. Mas não será fácil, pois esta terra é sagrada para nós” (p. 11,13 e 15).
Em sua sabedoria, o Chefe Seattle dá conselhos ao homem branco, lembrando que deve ensinar às crianças que “os rios são nossos irmãos“, que “a terra é nossa mãe“. Assim, “tudo o que ocorrer com a terra ocorrerá aos filhos da terra. Se os homens desprezam o solo, estão desprezando a si mesmos (…). O que ocorrer com a terra recairá sobre os filhos da terra. O homem não teceu a trama da vida; ele é meramente um de seus fios. Tudo o que fizer ao tecido fará a si mesmo” (p. 19, 36 e 39).
Num momento em que assistimos ao desmatamento e queimadas ilegais no país, em que o Ministério do Meio Ambiente é, para dizer o mínimo, completamente inoperante, as palavras do Chefe Seattle nesse belo livro, em que texto, ilustrações e capa se integram com harmonia, não devem ser ignoradas. Caso não se preservem as florestas, os rios, os lagos, os mares, os animais, as montanhas, diz ele, “é o fim da vida e o início de uma subvida“ (p. 45)
*Afrânio Catani é professor aposentado na USP e professor visitante na UFF.
Versão reduzida da resenha publicada na Revista de Administração de Empresas (RAE), São Paulo, EAESP-FGV, vol. 28 no 1, p. 58, janeiro-março, 1988.
Referência
SEATTLE (Chefe Índio). Preservação do meio ambiente – manifesto do Chefe Seattle ao Presidente dos EUA. Tradução: Magda Guimarães Khouri Costa. São Paulo: Babel Cultural.