Por CAIO BUGIATO*
A ofensiva geral da OTAN contra a Rússia acontece há muito tempo, com o avanço da organização militar na Europa em direção às fronteiras do Estado russo
A vitória russa em Bakhmut
O grupo mercenário Wagner e o governo Putin anunciaram a completa tomada da cidade de Bakhmut. A batalha na cidade durou cerca de nove meses, destruiu a cidade, ceifou centenas de milhares de vidas e é considerada a maior da guerra na Ucrânia e em solo europeu desde a Segunda Guerra Mundial.
A vitória russa tem um duplo significado. Primeiro, abre caminho em direção a cidades mais estratégicas para a tomada da região do Donbass, inclusive em direção ao interior ucraniano e a Kiev. Segundo, é uma vitória política do governo de Vladimir Putin, que não tinha um triunfo significativo na guerra desde o começo de 2023, elevando o moral da tropa e fortalecendo suas posições na política interna russa. Bakhmut era considerada e propagandeada pelo governo Zelensky como a grande resistência ucraniana, que agora não mais se sustenta.
Certamente as operações militares ucranianas em Bakhmut foram patrocinadas pelo Ocidente, cujas armas tornaram possível a defesa da cidade. O apoio da OTAN à Ucrânia escancara que a guerra vai muito além de um confronto entre dois Estados nacionais, como avalia o próprio governo Putin. Tal apoio repercutiu na Rússia em meio às comemorações da vitória na Grande Guerra Patriótica (Segunda Guerra Mundial), quando os soviéticos derrubaram a máquina de guerra nazista e conquistaram Berlim.
O envio de tanques alemães Leopard II pela coalizão dos Estados ocidentais motivou notícias e discursos em jornais russos como “O quarto Reich declarou guerra à Rússia” e “Os tanques alemães estão em solo russo novamente”. Não é possível saber se Bakhmut será um ponto de virada na guerra como foi Stalingrado, mas é provável que os apoiadores de Kiev no Ocidente estejam refletindo sobre o uso de todos os recursos militares e financeiros enviados aos ucranianos.
Nova ofensiva da OTAN?
A ofensiva geral da OTAN contra a Rússia acontece há muito tempo, com o avanço da organização militar na Europa em direção às fronteiras do Estado russo. A ofensiva militar aconteceu quando as forças militares ucranianas patrocinadas pelo ocidente repeliram os avanços russos depois de seis meses de guerra. Assim, a conquista territorial da Rússia se estende atualmente da província de Criméia ao longo de todo o leste do país até a província de Luhansky. Em meio à derrota em Bakhmut e às preocupações ocidentais, a OTAN pretende lançar sua terceira ofensiva, anunciada pelas forças militares ucranianas como a operação para restabelecer suas fronteiras de 2014.
Obviamente os detalhes da operação estão mantidos em segredo. Porém documentos vazados há algumas semanas indicam que a OTAN está treinando as forças armadas de Kiev em solo ucraniano. Em recente comunicado o secretário-geral da organização militar Jens Stoltenberg destacou o provimento de bilhões de euros de apoio à Ucrânia desde o início da guerra em fevereiro de 2022. Ainda reafirmou que os países da OTAN treinaram milhares de soldados ucranianos e estão fornecendo mais jatos, tanques e veículos blindados para os ucranianos, a medida que estes se organizam para uma contraofensiva. Além disso, Jens Stoltenberg enfatizou que o lugar da Ucrânia é na OTAN e que a aliança militar está com a Ucrânia para auxiliá-la a obter os padrões da OTAN e confirmar seu ingresso na organização.
Autoridades da Ucrânia ecoam as afirmações da OTAN, como o secretário do Conselho Nacional de Segurança e Defesa da Ucrânia, Oleksiy Danilov. O secretário disse estar pronto para dar início à operação quando os comandantes calcularem que “podemos ter o melhor resultado naquele ponto da guerra”. Afirmou ainda: “temos que entender que essa oportunidade histórica que nos é dada – por Deus – ao nosso país não podemos perder, para que possamos nos tornar verdadeiramente um grande país europeu independente”. “Pode acontecer amanhã, depois de amanhã ou em uma semana”. Volodymyr Zelensky, inclusive, propôs uma coalização de caças ao Ocidente, similar à coalizão de tanques.
No lado russo, ciente da possível nova ofensiva, já ocorreu mobilização e treinamento de trezentos mil reservistas, além da aceleração da produção de armamentos e organização quantidades significativas de equipamento e munições. Tropas russas estão posicionadas no leste da Ucrânia e começaram a avançar para diversas regiões ao longo de uma frente de 724 quilômetros.
A derrota ucraniana em Bakhmut e a possível ofensiva da OTAN sugerem a intensificação do confronto neste momento e nas próximas semanas, mas avanços e retrocessos de ambos os lados são difíceis de prever. O que parece estar em jogo agora é que governo de Volodymyr Zelensky precisa mostrar aos cidadãos, às forças armadas da Ucrânia e aos aliados ocidentais que é capaz romper as linhas russas e justificar seu papel de fantoche do Ocidente. Logo, o malogro da terceira ofensiva pode sim trazer novos rumos para a guerra.
*Caio Bugiato é professor de ciência política e relações internacionais da UFRRJ e do programa de pós-graduação em relações internacionais da UFABC.
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