Sobre a montagem da mente

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Por FLÁVIO R. KOTHE*

A racionalização toma as formas da razão para manter a dominante irracional do discurso ou da ação

Antigas metrópoles europeias se tornaram, após a Segunda Guerra Mundial, colônias de uma antiga colônia inglesa. Com o território ocupado por tropas americanas, não gozam de plena soberania, mas seu orgulho tem impedido de reconhecer o fato, camuflado sob a opinião de que são países democráticos e livres; no Brasil, o intelecto continua tomando o pensamento europeu como se fosse da metrópole. Seus presidentes e primeiros-ministros obedecem às ordens da Comunidade Europeia, que obedeça ao ditado da OTAN, controlada pela cúpula de Washington.

Há uma intensa lavagem cerebral feita pela mídia e pelas séries de televisão, que não é decifrada pelo pensamento autônomo. Faltou a grandes pensadores europeus enfrentar a estrutura teológica da filosofia europeia presente em santos como Agostinho e Aquino. Essas estruturas foram impostas pela Igreja Católica na América Latina e não são desveladas.

É fácil ficar na desconstrução de coisas menores, aplicar conceitos da moda em casos locais como se essa mente colonizada fosse sinônimo de ciência. Difícil é enfrentar as grandes construções que nos dominam. No último ano, estamos enfrentando a lavagem cerebral que a mídia otanista está impondo quanto à guerra na Ucrânia, que é antes uma guerra contra o expansionismo ianque e o crescimento mundial da extrema direita.

Difícil para os arquitetos é, por exemplo, romper com a ideologia do conforto humano como destino da profissão. O pressuposto é que o homem é uma criatura divina, com direito a tomar e usar tudo o que quiser, pois assim quis Deus. Com mais de 7 bilhões de humanos no planeta, será que ele não é o ser mais destrutivo da vida na Terra? Em vez de ser o retro olhar criativo da natureza sobre si mesma, como queriam os românticos alemães, ele já é o retroagir destrutivo da natureza contra si mesma. O cristianismo nega e perturba a relação natural do homem com sua origem. Há pressupostos teológicos onde não se suspeita.

Mesmo Jacques Derrida adotou a noção de que o significado seria oriundo de um jogo de diferenças no plano do significante. Isso provinha da noção de signo em Ferdinand de Saussure, que propunha o signo como algo fechado, separado da coisa significada. Essa concepção de signo tinha, no entanto, escondida a definição do homem como constituído por corpo e alma: significante material e significado espiritual. O que dá significação é a coisa, ela não é apenas significada: ela determina o significado por aquilo que ela é.

Na ironia, o sentido do signo tende a ser, porém, contrário ao significado. Introduz-se então uma terceira dimensão, que seria como que o espírito. Como ficava a relação entre corpo, alma e espírito?

Seria possível pensar, porém, a identidade sígnica apenas como decorrência do jogo de diferenças ou seria preciso ter a identidade como fundamento da própria diferença? Não só no sentido de que ela decorreria de uma diferenciação, mas que ela própria teria uma identidade, que seria a identidade da diferença? Se a ironia é uma duplicidade do discurso – que não é mera ambiguidade –, será que não seria um modo de dizer o outro, diferente do que se diz? Isso levava à noção de alegoria, como dizer o outro: não se entende uma alegoria se não se sabe o que ela significa em suas figuras.

Platão foi um mestre da ironia. Seu protagonista Sócrates nunca diz o que pensa. Alcebíades diz isso claramente no final do Simpósio, como comentário à proposta de Diotima no sentido de que o grande amor não seria mais em relação a uma pessoa e sim ao princípio da beleza. Ora, isso é negar o amor, que é sempre um relacionamento, não apenas uma projeção utópica. No final da República, Sócrates nega a existência do mundo das ideias: ele poderia ser recriado ao se olhar num grande espelho ao se andar com ele pelo campo.

A mentalidade colonizada se mostra com excessiva frequência na universidade ao se tomar como referência um pensador europeu – se possível francês, talvez alemão – que vai fornecer o âmbito teórico, dentro do qual vão ser enquadrados os dados da pesquisa. Trata-se de um leito de Procusto: espicham-se ou cortam-se os dados até caberem no esquema teórico invocado. Isso faz parte da tradição metafísica que domina a América Latina, cujas cidades foram construídas em torno de um templo católico, mostrando no desenho urbano como deveria ser a cabeça dos habitantes.

No teatro do Siglo de Oro, todos os principais dramaturgos – Lope de Veja, Tirso de Molina, Calderón de la Barca – escreveram peças que tratavam basicamente de um tema: o temor da corte espanhola de que seus enviados à América pudessem se associar aos indígenas, em especial às indígenas, para formar países independentes, dos quais não se poderiam mais extrair os proveitos da estrutura colonial.[i] São peças como Arauco Domado, As amazonas, Nossa Senhora de Copacabana, que não costumam ser lidas nas escolas nem universidades brasileiras, embora sejam sintomáticas da história. O ensino não serve para emancipar e sim para domesticar as mentes.

A Igreja Católica entrou no esquema colonial para ajudar a manter o controle sobre os emissários do rei. Quando estes falhavam, era possível “se queixar ao bispo”. Isso gerou muitos lucros à Igreja. Não por acaso as penínsulas ibérica e itálica abundam de igrejas e mais igrejas, conventos e mais conventos. Assim se manteve lá o controle sobre o modo de pensar.

Na França não foi muito diferente, embora ela não tivesse oficialmente Inquisição, na prática a Faculdade de Teologia da Sorbonne controlava o nihil obstat das publicações, a noite de São Bartolomeu foi um genocídio de “protestantes”, dois ministros do século XVII foram cardeais, a chama humanista que brotou em Port Royal foi violentamente debelada, Descartes teve de fugir do país e acabou envenenado, Voltaire teve de optar pelo exílio. Até hoje os pensadores franceses não costumam enfrentar os fundamentos teológicos da filosofia. Os alemães também não.

A desconstrução que não desvendar e não desvelar a estrutura profunda construída pela tradição metafísica não vai enfrentar o que continua ditando a vida e a maneira de ver de todos. É preciso ver onde ela aflora e daí ter consciência de que seria possível ver as coisas de outro modo. O problema se torna pior onde não queremos ver que somos marionetes de estruturas que nos controlam e cujos meandros não captamos.

Se, por exemplo, tratarmos de desconstruir a mente colonizada porque Jacques Derrida disse para se fazer isso, então vamos continuar a obedecer ao ditado vindo de Paris. Não adianta dizer que ele é argelino. Ele é tão pouco africano quanto Santo Agostinho. Os dois aderiram às estruturas europeias, e isso é que lhes garante repercussão. Os dois fazem parte de esquemas maiores do que eles e do que nós.

Se a questão da “différance” é pensada a partir do jogo entre significantes conforme proposto por Saussure no Cours de Linguistique Générale, é preciso ver se a estrutura do signo proposta como fechada e constituída por significante e significado não reproduz, e não por acaso, a estrutura metafísica e teológica do ser humano como constituído por corpo e alma. Se o signo é visto como fechado em si, sendo o significado gerado pelo jogo de diferenças nos componentes do significante, então se cai novamente no idealismo, em que estruturas mentais geram as coisas. A ironia como figura de linguagem costuma inverter o sentido do termo, fazendo com que não mais coincida com o significado habitual. Se o significante equivale ao corpo e o significado à alma, como se situa o sentido? Ele seria o espírito, uma terceira instância.

O mesmo esquema “do mais material para o mais espiritual” estrutura o sistema das artes de Hegel. Para ele, a arquitetura é a mais grosseira e simplória das linguagens artísticas, mas ela é fundamental, pois abriga todas as demais artes. Ela se torna aí mais artística à medida que se aproxima da escultura. Ambas fazem parte das artes visuais, das artes plásticas. Será que arquitetura é algo que apenas se enxerga? Como ficam os demais sentidos, como a audição, o tato, o olfato? São descartados.

Ora, isso está ancorado em Platão, para quem havia dois sentidos espirituais – a visão e a audição – e três sentidos corporais. Isso é ignorância, que se mantém como estrutura metafísica. Visão e audição são tão corporais quanto os três outros são espirituais. Nos cursos de artes só se estudam os ofícios relativos à visão e à audição, descartando-se os demais. O tato é menosprezado por Santo Agostinho, pois leva aos prazeres da carne. Quanto maior a tentação, maior precisa ser o exorcismo. Culinária e perfumaria não são ensinadas nem pesquisadas na universidade. Isso decorre de uma imposição metafísica inconsciente.

A noção de desconstrução ou do galicismo deconstrução parte da noção de construção. A negação de construção seria, normalmente, desconstrução, como ocorre em necessário/desnecessário ou autorizar/desautorizar, mas tem sido usado o termo deconstrução, que soa mais próximo ao francês e parece estar de acordo com a tradição latifundiária brasileira, cujos filhos iam estudar na França, que passou a servir de modelo de cultura, civilização, história literária. Optar por desconstrução não é mais nacional, mais brasileira, pois é a troca do senhor francês pelo senhor lusitano. A França já não é mais uma potência colonial. Como seus vizinhos Alemanha, Espanha, Portugal, Itália e outros, tem o seu território tomado por tropas e postos avançados do exército americano.

Depois de os russos terem derrotado o nazismo, a OTAN foi criada para assegurar o domínio americano na Europa, deixar os russos longe e a Alemanha por baixo. A União Europeia obedece ao que é ditado pelos generais da OTAN. A pesquisa nas universidades brasileiras obedece ao ditado das antigas metrópoles europeias. Só assim se pensa: fazendo de conta que se pensa como europeu. Nos Estados Unidos, as melhores universidades são particulares e as anuidades estão acima do que na América Latina poderiam pagar as classes baixas e médias. Assim, o melhor ensino é privativo dos mais ricos: o que este sistema vai produzir tende a estar no âmbito plutocrático que impera na sangrenta história do país.

A relação entre mente e construção arquitetônica já aparece em Platão: a moradia como amostra da mente do proprietário, arquitetura como subjetividade objetivada. Vitrúvio constrói os seus dez livros como se fossem dez edificações: recebe o leitor no átrio, conta-lhe uma agradável história para bem recebê-lo, e depois o leva para o interior, em que se estudam tipos de colunas, cores, salas de concerto etc. Alberti queria que o templo expressasse a grandeza da Igreja e a perfeição divina. Arquitetura era doutrinação, sermão petrificado. A “casa de Deus” é uma contradição evidente: um deus infinito não cabe numa casa, um deus todo poderoso não precisa de um abrigo. Os fieis não querem ver isso, no entanto. O templo é sintoma do seu inconsciente, mas também de sua compreensão do homem: reduzido ao essencial, ele é alma, não se constroem banheiros nos templos católicos.

Santo Agostinho, no livro X, item 8, das Confissões, compara a mente com um palácio: “Chego aos campos e vastos palácios da memória, onde estão tesouros de inumeráveis imagens trazidas por percepções de toda espécie. Aí está também escondido tudo o que pensamos, quer aumentando quer diminuindo ou até variando de qualquer modo os objetos que os sentidos atingiram”.[ii] O modesto santo via em si um palácio interior, não uma simples casa nem choupana. Nesse palácio poderiam ficar também imagens olvidadas. A mente como palácio ou palacete cabia para quem era filho de um rico senhor de escravos, um patriarca que fez da esposa uma serva: a conversão de Agostinho, do maniqueísmo ao catolicismo, foi uma opção pela mãe, que era cristã, e aparentemente contra o pai. De fato, no entanto, transpôs a estrutura escravagista do âmbito social e econômico para o âmbito da crença: Deus se tornou o Senhor; o crente passou a se ver como servo, como escravo da vontade do Senhor. Mesmo o mais humilde sacerdote só aceita um Deus como seu senhor. A noção da mente como uma construção é, no entanto, evidente. Trata-se de um topos literário e filosófico.

Descartes já havia associado a alma ao mistério da Santíssima Trindade: Cristo seria a paixão, o sentimento, o estado de ânimo; o Espírito Santo seria a inteligência, a intelecção, a organização do entendimento em conceitos; Deus-Pai corresponderia à razão que decide e comanda. Seria possível acrescentar o juízo como mediação entre ideia e conceitos, ou seja, a figura que transformaria ideais em decisões concretas, o que corresponde ao mito da Virgem Maria, que, ao gerar Jesus, teria tornado carne o espírito divino e feito com que ele habitasse entre nós.

Immanuel Kant comparou mais de uma vez a mente a uma construção arquitetônica: Bau. Na Crítica da razão pura, tem-se um sistema em que a imaginação carrega as múltiplas imagens dos sentidos para a mente, o entendimento organiza isso em conceitos e, por cima, impera a razão, que é mediada pela capacidade judicativa. Tem-se, portanto, a organização da mente com a estrutura de um espaço construído, em que a base são os sentidos, o entendimento conceitual forma as paredes das salas, o juízo é o teto e a razão é o telhado.

Caso se queira radicalizar a imagem da casa, como as imagens dos sentidos são múltiplas e caóticas, enquanto as ideias são apenas três, surge a figura da pirâmide como expondo a mente humana. Nietzsche observou, no entanto, que a maior parte do que os sentidos captam não é levado à consciência. Haveria, portanto, uma triagem inconsciente das percepções, para destacar aquelas poucas para as quais a atenção precisa se voltar, dando-lhes nome e avaliação. Então se teriam percepções inconscientes, concepções inconscientes, juízos inconscientes, ou seja, uma pirâmide inversa enterrada no inconsciente, a sustentar a pirâmide consciente.

O que se fala de Kant se baseia na versão que é difundida e não é igual à primeira edição, a qual deu origem, na universidade de Jena, ao idealismo e ao romantismo. Um dos pontos básicos é que Kant havia se perguntado se, no processo de conhecimento, a “alma” humana se transforma, ao amadurecer, ao ajuizar dados, ao se arrepender ou se converter. A alma, sendo mutável, estaria dentro do tempo e, portanto, não poderia ser eterna. Kant não desenvolveu isso, mas a hipótese despertou a ira dos pietistas, luteranos mais radicais. A alma seria mortal. Kant era um luterano e não queria se contrapor aos princípios da religião. Schopenhauer criticou Kant pelas mudanças feitas no texto, Nietzsche o chamou de teólogo.

Essa noção de Bau, espaço construído, da mente como um constructo, foi proposta por Marx para a estruturação da sociedade: a parte fundante, condição de existência da vida, é a produção de bens, o “Unterbau”, que foi traduzido como infraestrutura, perdendo-se aí a noção de que se tratava dos alicerces de uma construção, a condição de sobrevivência, a determinar o que se poderia construir em cima disso na vida social; a parte delimitada por paredes constitui a vida social; a parte do telhado, que recobre e protege a moradia coletiva, seria então o “Überbau”, que foi traduzido por supraestrutura e, pior ainda, por superestrutura, entendida como expressão cultural.

Quando Marx se propôs a estudar o modo de produção capitalista e descobriu como sua chave o Mehrwert, que foi mal traduzido por mais-valia (que veio de plus-value e que deveria ser plus-valeur) e significa valor a mais ou mais-valor, ele fez um longo estudo sobre as diferentes teorias do valor a mais, volume que foi incorporado à edição do O capital, em geral como quarto volume, e que parece que não teve ainda edição em português. Ele desconstrói as teorias precedentes da mais-valia e, dessa distância crítica em relação ao que até então era dito sobre questão, ele constrói o primeiro volume do O capital, que foi o único volume que ele aprontou para ser publicado.

Quando ia sair a segunda edição, ele fez uma desconstrução do seu primeiro volume, no sentido de retirar centenas e centenas de sublinhamentos postos na primeira edição e que comandavam a leitura. Nesse sentido, a segunda edição permitia maior liberdade crítica. O capital é uma obra que ficou incompleta, pela morte do autor. Estava prevista para 20 volumes. Eu traduzi tópicos relativos a questões estéticas no livro Fundamentos da teoria literária (Editora Cajuína).

Kant, no final do segundo prefácio à Crítica do juízo, faz uma observação que se tornou histórica: diz que, quando as nossas percepções estão adequadas ao que é nossa vontade, tendemos a considerá-las verdadeiras. Ele não disse que eram verdadeiras: apenas nos pareciam ser. Na primeira edição da Crítica da razão pura havia discutido diversas formas de paralogismos, argumentos que parecem ser verdadeiros, mas não são. Esses argumentos críticos evaporaram nas outras edições correntes, em que ao descrever a máquina da mente como que faz um projeto para a maquinaria do Estado: para isso, teve de tornar menos relevante a imaginação. O que levou o pensador a mudar mais de cem páginas do seu texto foi, provavelmente, a morte do seu protetor Frederico, o Grande, e a ascensão da repressão ideológica no sucessor.

Schopenhauer criticou acerbamente essas modificações. Sua obra mais extensa, O mundo como vontade e representação, tem sido lida como exaltação à vontade, sendo o mundo uma representação dela. Talvez chegue ainda a hora em que se vai ler isso pelo avesso: a denúncia de que o mundo seja uma imposição da vontade humana, a condicionar os modos de representá-lo. Nesse sentido, sua obra tem uma desconstrução em si.

Nietzsche reforçou essa leitura ao dizer que não se trata simplesmente de uma vontade singela e inocente, mas uma vontade direcionada ao poder: Wille zur Macht. É uma vontade de dominar, de exercer domínio sobre o outro. Não é apenas um desejo de potência, como tem sido traduzido e entendido. Embora sirva de clichê para rotular Nietzsche, ele, no fim de sua vida lúcida, registrou que, examinando o conceito mais de perto, percebia que nessa “vontade” convergiam tendências e mobilizações muito diversas, de maneira que o conceito deveria ser abandonado por ser uma simplificação.

O próprio sujeito é formado por forças contraditórias, de maneira que a vontade é apenas uma resultante provisória do que num momento se mostra dominante. Nesse sentido, ele havia criticado a noção kantiana de imperativo categórico, que é decretado por um sujeito em nome de sua liberdade interior, diferente da vontade do Estado ou das instituições, mas interferindo na liberdade alheia.

Quando Freud traduz e reduz o conceito de vontade (Wille) para Wunsch (desejo), ele como que amaina o ímpeto da vontade de dominar e da ânsia de poder, mas lhe dá novo furor ao concentrar no desejo como sexualidade. Nietzsche tinha consciência da repressão ideológica e política do seu tempo, mas não colocou essa dimensão no próprio impulso da vontade pessoal no sentido de se contrapor a uma vontade dominante. Em Freud está presente, junto com as pulsões do desejo, também a força contrária da repressão. O próprio desejo fica deslocado, deformado e tresloucado em sua “pureza” por forças que o consideram impuro. Não haveria mais “razão pura”, mera forma sem conteúdo, sem materialidade, cópia humana da mente divina como entendida por Aquino e a escolástica.

Nietzsche dizia que não há “indivíduo”, como se o sujeito não fosse dividido. Ele foi o filósofo que mais insistiu na noção de inconsciente, noção que já havia em Fichte e Leibniz: a razão consciente não esgota a mente. A mente é, para ele, palco de forças contraditórias. Viu a mente como palco de forças contraditórias, povoada de fantasias e armadilhas, em que o correto segundo certos padrões considerados certos impede que se veja o que fica além. A racionalização toma as formas da razão para manter a dominante irracional do discurso ou da ação.

*Flávio R. Kothe é professor titular aposentado de estética na Universidade de Brasília (UnB). Autor, entre outros livros, de Benjamin e Adorno: confrontos (Ática).

Notas


[i] KOTHE, Flávio R. “História como ideologia: a conquista da América no teatro do Siglo de Oro”, ensaio, in Signótica, Goiânia, vol. 1, nº 1, 1987.

[ii] AGOSTINHO, Santo. Confissões na coleção Os Pensadores, São Paulo, Editora Abril Cultural, 1979, p. 176.

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