Um novo arranjo de forças políticas

Imagem: Marcio Costa
Whatsapp
Facebook
Twitter
Instagram
Telegram

Por ALEXANDRE ARAGÃO DE ALBUQUERQUE*

Um zero à esquerda, eis o que representou a suposta força do bolsonarismo no recente pleito eleitoral

A partir do resultado das eleições municipais, começa no Brasil um novo desenho das forças políticas. Se anteriormente os eleitores brasileiros foram induzidos a uma irresponsável aventura, conduzidos pela articulação midiática, jurídica e institucional golpista, instalada em 2016, elegendo em 2018 como presidente um candidato com explícito teor autoritarista e fundamentalista, demonizador das políticas progressistas de construção do Estado de Bem-estar brasileiro colocadas em prática pelos governos de Partido dos Trabalhadores, de 2003 a 2014, agora em 2020 o resultado eleitoral demonstrou certa acomodação da vontade popular em torno de propostas menos aventureiras, apesar de conservadoras.

Por um lado constata-se uma acachapante derrota daquele episódio de 2018, artificialmente construído. Um zero à esquerda, eis o que representou a suposta força do bolsonarismo no recente pleito. Por outro lado, houve um crescimento muito expressivo da direita em partidos como DEM (conquistou 193 prefeituras a mais), PP (187 prefeituras a mais), PSD (113 prefeituras a mais), Republicanos (105 prefeituras a mais). Os partidos políticos que mais perderam prefeituras foram o PSDB (perdeu 273 prefeituras), MDB (perdeu 261) e o PSB (perdeu 153). O PDT de Ciro Gomes, apesar de toda a sua euforia, perdeu 20 prefeituras em relação a 2016.

Nunca é demais registrar que o pleito de 2018 foi maculado pelo impedimento do exercício dos direitos políticos do presidente Lula em disputar aquela competição, uma vez que o general Eduardo Villas Bôas, então comandante do exército, ameaçou publicamente, por postagem em sua conta do twitter, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) quando da votação do Habeas Corpus favorável ao presidente Lula. Porém agora, com mais um agravante, o das revelações da contratação de Sérgio Moro como sócio-diretor de uma empresa estadunidense, a qual reconhece em seus documentos que o tríplex era de fato da OAS, empresa esta que está vinculada ao processo da Odebrecht na Lava Jato, o STF fica obrigado a declarar nulas as decisões daquele ex-juiz em relação ao presidente Lula naquele processo.

Diante deste fato, em sua conta no twitter, o ex-juiz federal e atual governador do Maranhão, Flávio Dino, declarou: “Se Sérgio Moro juiz fosse julgar Sérgio Moro político, ele não escaparia de uma pena de 20 anos de cadeia, por corrupção, lavagem de dinheiro etc. Sérgio Moro juiz diria que este ato (de Sérgio Moro ser sócio-diretor dessa empresa estadunidense) revelaria pagamento disfarçado de propina”.

Retornando ao tema, o desenho envolvendo o novo arranjo de forças, estabelecido a partir do recorte da relação entre o governo dos estados com as prefeituras das capitais, conforme tabela 1 abaixo, ficou compreendido entre 16 partidos, dos quais 12 estão à frente dos governos estaduais. Alguns deles não conseguiram eleger seus representantes em 2020 nas capitais, como são os casos do PT, PSL, PSC, PC do B e Novo, mesmo que tenham participado de coligações municipais, como ocorreu em Belém – PA, onde o PT compôs a coligação “Novas Ideias”, com o PSOL elegendo seu candidato Edmílson Rodrigues.

Tabela 1

       Fonte: Pesquisa realizada pelo autor no TSE. Não está incluída a votação em Macapá – AP.

Como lembra Guillermo O’Donnel, a democracia não se limita a liberdades formais, apenas como um sistema autorizativo em eleições, desobrigando-se do enfrentamento de obstáculos socialmente determinados impeditivos do gozo da saúde integral por parte dos cidadãos. Há a necessidade de políticas destinadas à equalização de modo que os sujeitos atingidos diretamente pela estrutura de injustiça social possam ter chances reais de exercer seus direitos de fato. Portanto, é hora de prefeitos e governadores trabalharem de verdade. Há muito por fazer.

*Alexandre Aragão de Albuquerque é mestre em Políticas Públicas e Sociedade pela Universidade Estadual do Ceará (UECE).

 

 

 

 

 

Veja neste link todos artigos de

10 MAIS LIDOS NOS ÚLTIMOS 7 DIAS

__________________
  • Um estudo do caso Ailton Krenak1974__Identidade ignorada 21/07/2024 Por MARIA SILVIA CINTRA MARTINS: Prefiro sonhar com Krenak o parentesco com a natureza e com as pedras do que embarcar na naturalização do genocídio
  • Clarice Lispector no cinemacultura a paixão segundo g.h. 22/07/2024 Por LUCIANA MOLINA: Comentário sobre três adaptações cinematográficas da obra de Clarice Lispector
  • O princípio de autodestruiçãoLeonardo Boff 25/07/2024 Por LEONARDO BOFF: Qual ciência é boa para a transformação mundial?
  • Filosofia da práxis como poiésiscultura lenora de barros 24/07/2024 Por GENILDO FERREIRA DA SILVA & JOSÉ CRISÓSTOMO DE SOUZA: Fazer filosofia é, para o Poética, fazer filosofia contemporânea, crítica e temática
  • Que horas são no relógio de guerra da OTAN?José Luís Fiori 17/07/2024 Por JOSÉ LUÍS FIORI: Os ponteiros do “relógio da guerra mundial” estão se movendo de forma cada vez mais acelerada
  • Apagão digitalSergio Amadeu da Silveira 22/07/2024 Por SÉRGIO AMADEU DA SILVEIRA: A catástrofe algorítmica e a nuvem do “apagão”
  • A disputa de Taiwan e a inovação tecnológica na ChinaChina Flag 20/07/2024 Por JOSÉ LUÍS FIORI: A China já é hoje a líder mundial em 37 das 44 tecnologias consideradas mais importantes para o desenvolvimento econômico e militar do futuro
  • A produção ensaística de Ailton Krenakcultura gotas transp 11/07/2024 Por FILIPE DE FREITAS GONÇALVES: Ao radicalizar sua crítica ao capitalismo, Krenak esquece de que o que está levando o mundo a seu fim é o sistema econômico e social em que vivemos e não nossa separação da natureza
  • A radicalidade da vida estéticacultura 04 20/07/2024 Por AMANDA DE ALMEIDA ROMÃO: O sentido da vida para Contardo Calligaris
  • A questão agrária no Brasil — segundo Octávio IanniJose-Raimundo-Trindade2 19/07/2024 Por JOSÉ RAIMUNDO TRINDADE: As contribuições de Ianni podem auxiliar a reformular o debate agrário brasileiro, sendo que as obras do autor nos apontam os eixos para se repensar a estrutura fundiária brasileira

PESQUISAR

TEMAS

NOVAS PUBLICAÇÕES