Por LUCIO GREGORI*
Além da eleição majoritária é fundamental o campo progressista dar a mesma importância para o debate público eleitoral legislativo
Abro jornais e assisto na TV mais uma pesquisa sobre a eleição presidencial de 2022. Deve ser a vigésima, ou mais que isso, pesquisa que vejo sobre a eleição do poder executivo, seguida dos comentários de quanto Lula aumentou ou diminuiu a vantagem sobre Bolsonaro, quais as possibilidades de vitória no primeiro turno, quem será o terceiro colocado e mais recentemente, como variou o percentual de Moro e assim por diante.
Fora essa enxurrada de pesquisas sobre a eleição majoritária, vejo inúmeras notícias sobre declarações de Lula e outros candidatos à presidência sobre diversos temas eleitorais e vejo também, inúmeras análises sobre como caminham os candidatos.
Sem se falar na enxurrada de notícias sobre quem será o vice de Lula com muitas análises sobre a figura de Alckmin e as variadas reações à sua provável candidatura a vice de Lula. Vejo também várias notícias sobre encontros mantidos pelos candidatos à presidência e vice.
Além do noticiário vejo também, que as militâncias dos vários partidos e em especial as ditas de esquerda, se manifestam a propósito da disputa presidencial, como respectivos temas de campanha e prováveis candidatos a vice.
Concluo a partir disso tudo, que o que acontecerá no país dependerá praticamente, do resultado da eleição majoritária. Acontece que isso é uma enorme inverdade, pois o poder legislativo é absolutamente fundamental para as diretrizes das políticas nacionais que deverão ser seguidas pelo poder executivo.
Mais do que fundamental, eu diria que quem dá as diretrizes da política nacional é o poder legislativo, ou seja, a Câmara Federal e o Senado. E mais, que o Congresso fiscaliza o poder executivo presidencial.
Este texto pretende abrir um debate sobre o assunto e certamente não esgota os múltiplos aspectos da questão focada e não aborda o Poder Judiciário, o que é uma outra questão fundamental, mas que não está envolta na questão eleitoral por enquanto.
Através de pesquisa, verifico que auxílio emergencial, reforma eleitoral, Improbidade Administrativa, pagamento de precatórios, teto de gastos, reforma trabalhista, reforma tributária e Orçamento da União, para citar alguns exemplos, dependem de lei a ser aprovada e regulada pelo Congresso Nacional.
De modo geral, a lei complementar aborda as matérias que estão previstas pela Constituição Federal, as leis ordinárias podem abordar quaisquer matérias, desde que estas não estejam reservadas à lei complementar, aos decretos legislativos às resoluções. O decreto legislativo tem como objeto matérias apontadas como de competência exclusiva do Congresso Nacional, por exemplo: as relações jurídicas decorrentes de medida provisória não convertida em lei; resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais.
Em resumo, quem diz quais as diretrizes políticas do país, é o Congresso Nacional.
Pesquisando um pouco mais sobre as atribuições dos diferentes poderes, verifico que não é sem razão que o poder presidencial denomina-se Poder Executivo. Então o poder do presidente é executivo, isto é, um poder de execução daquilo que está legislado e autorizado pelo Congresso. Salvo a medida provisória, o poder executivo não legisla e não estabelece como regra as grandes diretrizes políticas que serão seguidas no país. Pode quando muito, as propor e criar um clima a respeito de certos temas e suas soluções e influenciar nas diretrizes políticas através do orçamento autorizativo. Além disso, as medidas provisórias, as únicas que o Presidente, digamos, pode legislar, dependem de aprovação ou não pelo Congresso e tem validade máxima de 120 dias sem tal aprovação, podendo ser rejeitada pelo poder legislativo, a qualquer momento nesse período. E os decretos, de competência do Executivo são atividade administrativa e devem seguir o previsto nas leis, ainda que possam se parecer com uma lei.
A iniciativa popular para leis é mínima, quase nenhuma no país. Não por outra razão vejo que em quase 30 anos, o Congresso Nacional aprovou quatro projetos de iniciativa popular, entre eles a Lei da Ficha Limpa, mas nenhum deles foi tratado formalmente como sendo de autoria da população.
De 1985 a 2005 foram apresentados 5540 projetos pelos senadores e 21.447 Proposições legislativas iniciaram tramitação na Câmara, Senado e Congresso Nacional entre 1999 e 2006, para se ter uma ideia do volume de textos legais que andam pelo Congresso. Desde 1943 são cerca de 123 mil projetos, embora apenas 11.193 se transformaram em lei.
Concluo que eleger deputados e senadores, de fato é indispensável para estabelecer as condições de quais são as grandes diretrizes políticas do país. O poder executivo também poderá agitar e influenciar quais as questões a serem discutidas pelo Congresso, através do orçamento autorizativo, de propostas de legislação e debates políticos e através das informações que tem com a gestão da coisa pública. Mas no limite, só o Congresso vai definir de fato, quais as grandes diretrizes políticas que regerão o país.
Por essa razão fico pasmo, para não dizer indignado, diante da postura dos chamados partidos e políticos ditos progressistas ou de esquerda em relação às eleições proporcionais, ou seja, de deputados e senadores. Só vejo quase que exclusivamente debate sobre a eleição majoritária, acordos ou não para apoiar ou não Lula, ter ou não candidatura própria, quais as exigências ou acordos para apoiar ou não este ou aquele candidato aos executivos estaduais e assim por diante.
Nenhuma ou quase nenhuma postura de debate e campanha em torno de eleições proporcionais, nomes e propaganda dos candidatos, proposição de quais leis e respectivo conteúdo básico deverão ser propostas e aprovadas pelo Congresso e, portanto, devem ser consideradas quando do voto proporcional, etc., etc.
E principalmente através das campanhas eleitorais fortemente focadas nas eleições proporcionais, evidenciar para os eleitores em geral e para filiados, simpatizantes e ativistas do chamado campo progressista, a importância do poder legislativo e de nele se ter maioria para, de fato, mudar substantivamente a política do país.
O setor de direita/conservador em seu amplo espectro bem como a mídia em geral, sabem muito bem disso tudo, e agem de acordo a manter o debate público eleitoral legislativo à margem e centra-lo na disputa do executivo.
Por conta do que estamos discutindo, responda de imediato o leitor, qual seu voto em deputado federal, senador e deputado estadual. Desculpem uma vez mais os leitores, mas com meus 85 anos já é hora de ver fazer política bem consequente, no dito campo progressista e de esquerda do país. Congresso Nacional lá!
*Lucio Gregori, engenheiro pela USP, foi secretário municipal de transportes no governo de Luiza Erundina.