Por AIRTON PASCHOA*
Comentário sobre o livro de Clarice Lispector e o filme de Suzana Amaral
Em tempos de literatura brutalista, hipermimética,[1] escrita e/ou protagonizada por desvalidos de toda sorte, vale a pena revisitar uma experiência estética extraordinária. Último livro de Clarice, publicado em 1977, A Hora da Estrela deve fazer a delícia dos semióticos, daqueles que enxergam só metade… tanta metalinguagem! Convém meditar, porém, sejam elas conscientes ou não, as escolhas mais decisivas da escritora, as quais conferem à exibição dos recursos literários, à aguda consciência do fazer poético etc., etc., seu sentido político mais profundo.
Podemos imaginar quanto podem ter custado a Clarice certas cobranças, ora mais, ora menos veladas, a sua literatura elitista, alienada, psicologista, intimista, metafísica, ou coisa que o valha, encharcada que estava das “inominadas sensações”,[2] comparada à literatura mais militante de 30, de 40, de 50, de 60, de 70, de toda a sua vida literária, enfim. Sua resposta por todos os títulos não poderia ter sido mais exemplar.
Por meio dela como que tocamos os limites da literatura (Literatura? com maiúscula?), daquela atividade, para muita gente boa, definitivamente superada (ai de nós!), pelo menos nos marcos clássicos (conservadores?), não só no Brasil como no mundo (entenda-se: o mundo que culturalmente importa, e exporta, ao país).
Façamos agora, esforcemo-nos, um exercício de regresso no tempo, de imaginação histórica. Estamos em 1977, agoniza a ditadura militar, que estrangulou provavelmente nossa maior possibilidade de virada, mas ainda estamos otimistas, é sempre com esperança que se sai de uma ditadura, ressuscita o movimento estudantil, crescem os movimentos populares, logo, logo entram em cena os trabalhadores; a indústria cultural no país não é propriamente nascente, mas também não deu ainda a medida de seu poder de devastação; Clarice viva, vivos ainda Drummond e Cabral, Bandeira e Rosa mortos há apenas uma década, sobrevive inatacado, por enquanto, o bastião da “alta literatura”.
A pobreza, bem, a pobreza não deu ainda a medida de sua novidade, articulada que está ao horizonte que abre (?!), que rasga a telinha nacional, mas também está longe de ser nova, como se sabe. Todos em alguma medida a conhecemos, dado que conforma nossa sensibilidade histórica mais funda; vivida ou imaginada, temida ou superada, desprezada ou gozada, louvada ou odiada, a maioria convive com ela no dia a dia, seja de passagem, nos faróis da vida, seja na forma da servidão doméstica, entocada em nossa casa como eterno lembrete da cota que nos cabe na iniquidade social generalizada.
É desta pobreza, inofensiva por assim dizer, que vai tratar Clarice. O tema, quando tratado honestamente, nunca foi fácil, e de suas dificuldades tem plena consciência a escritora; autêntico campo minado, não é à toa que faz ela pipocarem por toda parte, em sua investigação temerária do terreno, os incontáveis clarões de (explosão).[3] Testemunho da guerra sem trégua, a ponto de ouvir até o rufar de tambores marcial,[4] é o narrador, palco de uma verdadeira luta de classes literária em sua atormentada aventura por compreender a vida macabéa.
Havia outra pobreza? Claro que havia, ativa, reivindicativa, “cobradora”,[5] e claro que conhecia Clarice a violência e seus encantos literários. Mas a escritora, desconfiada talvez da sedução do sangue, optou por Macabéa, pobrinha, pobrinha, incapaz de matar uma mosca, coitada. Tão indefesa e comovente (irritante?), diga-se de passagem, que comove ver, quase dez anos depois, o belo filme de Suzana Amaral, de 1985, lidando por redimi-la de sua condição desumana, ao acentuar — eliminado o problemático narrador do livro — o processo de formação da identidade de uma Macabéa que não teve tempo de se completar, senão na última cena, hollywoodianamente, como que na imaginação sofrida do espectador, em sintonia com nosso desejo mais íntimo, tão insuportável é o destino da personagem no romance (novela?).
Para compensá-la um pouco talvez, talvez por solidariedade de gênero, o filme perpetrou no fim uma invejável vingança (feminista?), vetando ao futuro deputado Olímpico de Jesus a Glória toda, não só a carnosa amiga, aquele “estardalhaço de existir”,[6] como também seu projeto político, de deputar no estado natal. Deixou-o só no banco público, em cena memorável, sentado e desolado ao lado do cachorrão de pelúcia imprestável… pra largar mão de ser patife, cafajeste, machista, filho-da-puta!
Isto não quer dizer, claro, que não haja violência no livro. Haveria morte mais violenta que a de Maca? É a hora da morte sua hora de estrelato, quando estreia seu único e último instante de atenção pública, atropelada que foi, suprema ironia, pela estrela da Mercedes. Haveria então vida mais violenta, violentada que a de Macabéa?
O que fez a escritora foi escapar da relação imediata entre marginalidade e violência, a qual, no fim das contas, podemos acabar deplorando e lastimando, mas que fazer? Pode ser caso de segurança pública, à direita, ou de distribuição de renda, à esquerda (ou vice-versa, sabe Deus, que agora professamos todos sob a mesma Ordem, paladinos que somos da racionalidade da irracionalidade econômica). A escolha de Clarice não só permitiu fugir à violência, como levou sobretudo a situá-la na ordem mesma do dia a dia, da normalidade nacional. Numa palavra, a violência que devia convocar à indignação, à revolta pública (popular?), era, nem mais nem menos, senão a própria vida macabéa. E a figura de Marcélia Cartaxo, interpretando a personagem, é simplesmente imperecível.
Mas objetarão com razão os refinados que não se pode falar oh em vida! que Macabéa não existe, é personagem de ficção… Aliás a escritora faz questão de franquear o processo de formação do livro, as idas e vindas, as decisões e indecisões na elaboração de uma obra literária, e o faz tão às escâncaras que… Exibicionismo? Virtuose esclerosada?
Inventa-se de tudo ali, do fim ao princípio, a começar do título. Conhecido embora por um, que nem sequer é o primeiro, a escritora elenca mais doze outros, a gosto do freguês: “a culpa é minha ou a hora da estrela ou ela que se arranje ou o direito ao grito ou quanto ao futuro ou lamento de um blue ou ela não sabe gritar ou uma sensação de perda ou assovio no vento escuro ou eu não posso fazer nada ou registro dos fatos antecedentes ou história lacrimogênica de cordel ou saída discreta pela porta dos fundos”. Quanto ao futuro, igual indecisão, que muito se cogita, suspeita, mas não se desenha em definitivo o desenlace, embora fique meio a pairar, estrela sombria, sobre a cabeça de Maca.
Em livro tão desabridamente inventado, evidentemente podiam passar certas coisas… Por que inventar, por exemplo, uma ocupação tão inverossímil (pela duração, no mínimo) com a própria caracterização da personagem? Datilógrafa, convenhamos, se todos sabemos que Macabéa, como se diz, dava no máximo pra doméstica! Por que inventar um narrador masculino tão pouco diferenciado de seus similares femininos? Rodrigo S. M. (Sua Majestade?) é tão clariciano enquanto narrador que poderíamos ficar sem atinar com a razão precisa de escolha tão ex machina. Como entender então certas “falhas” da grande escritora?
Para desencanto dos formalistas, o desnudamento dos procedimentos literários, de cabo a rabo, começando com as alternativas do nome do livro, sem contar os dos personagens, tão alegóricos, simbólicos e apostólicos! passando pela criação de um narrador… masculino (distante da autora, em tese, de sua persona literária, mas cuja artificialidade ajuda a escancarar o sentido político da abertura literária), passando pela criação de uma personagem que se vai adivinhando, tateando no escuro, como que se modelando da lama que amassamos, passando pela criação precária de um enredo mínimo, ou melhor talvez, pela criação mínima de um enredo precário, até chegar a um final cuja ironia, suprema, dá a medida de seu acerto, — a exibição descarada do fazer literário, em suma, tem um nome, sim, e não é metalinguagem, não, nem congêneres.
Seu nome é simples: honestidade. Pessoal? narrativa? literária? política? ideológica? Absoluta. Honestidade tão exemplar, que faz tremer na base ou na tumba os mais bem-intencionados e dotados escritores de esquerda. E não só por tematizar a pobreza da gente brasileira, senão por abordar, na condição de narrador de classe privilegiada, as aporias de quem se propõe honestamente a empreitada, pois como honestamente fazê-lo, sendo de outra classe, outra cultura, outra vida, outra tudo? Nada tem que ver, portanto, com técnica de suspense literária o demorar do narrador, o demorar em começar, o demorar em continuar, o demorar em finalizar, senão com incorporar todos os constrangimentos envolvidos na criação de um mundo ao seu estranho.
Mostrar aqui que um livro é um livro, que pode ter um título, vários, uma dúzia deles, que tem um narrador visivelmente construído, que tem uma protagonista visivelmente construída, que tem decisões e indecisões de ponta a ponta, — mostrar um livro em elaboração, mostrá-lo paulatinamente se fazendo à nossa vista, traz lição das mais fecundas. Se o propósito da escritora, velado ou não, era responder às cobranças de seus pares mais progressistas, sua resposta não poderia ter sido mais cabal — um livro é um livro.
A conclusão, por óbvia, dá o que pensar. Pois revelá-lo com tal honestidade — no sentido mais elevado da palavra, toca os limites da própria atividade literária, cuja força e cuja fraqueza estão aqui até a fratura expostas. Vale dizer, Macabéa não existe, mas desde então passaram a existir muitas macabéas, como já existiram e existem tantos severinos. É inegável a força da literatura. Sua força porém não oculta a fraqueza. Por mais obra-prima que seja, não pode um livro mudar nossa realidade histórica. A palavra é de quem passou a vida com a máquina de escrever no colo, datilografando, sujando o papel com suas impressões… como Maca.
“Datilógrafas” ambas? e ambas marginais? Demagogia de Clarice a aproximação? Não. Desconfortável embora, sabia a escritora que, conforme o grau de privação, varia o conforto na periferia da periferia, que há tanto margens mais desfrutáveis quanto margens absurdamente estreitas, sem prejuízo no entanto de serem umas e outras facilmente descartáveis numa ordem de mundo de todo alheia à vontade humana.
Mas a “alta literatura” teria mesmo algo que ensinar — hoje em dia! com essa vida macabéa, tão inodora, tão insípida, tão sem graça, sem embargo do muito que se ri de Maca e suas beatices?
Alguns, mais refinados ainda, podem me objetar com razão que não foi a literatura que mudou, foi a pobreza,[7] e foi o país, e foi o capitalismo, cientes que literatura e sociedade se engalfinham até a morte. Que foi a literatura enfim que foi mudada… Ah, bons tempos em que havia macabéas! bons tempos em que o pobre mais ou menos comia o que comia o rico, em que o pobre mais ou menos vestia o que vestia o rico! Bons tempos em que o pobre mais ou menos assimilava o rico!
Desintegrado hoje o país com a internacionalização acelerada do capital, interrompido o lento processo de construção e integração nacional, como diria Celso Furtado, o pobre, tão distante dos abastados, e o rico, tão expatriado hoje em dia, cosmopolizado que está à custa do alto consumo, — o novo pobre como o novo rico não podem mais se reconhecer, inteiramente desconhecidos que são um em face do outro. Em casos tais, de desconhecimento mútuo, como estranhar que a empregada venha a degolar a patroa, como quase acontece em sequência do Cronicamente Inviável, o filme dirigido por Sérgio Bianchi?[8] Pela impossibilidade quase de mínimo reconhecimento humano, fica plenamente justificada a violência em curso no país.
É como se ao novo pobre, em contraste com o ancestral (extinto?) dos nossos românticos, dos nossos modernistas, dos nossos comunistas, dos nossos populistas, não restasse senão a expropriação violenta dos bens de consumo, inatingíveis em que pese o bombardeio da mídia, com que lhe acena hipocritamente, sadicamente a sociedade contemporânea.
Isso posto, também não restaria à literatura consequente senão acompanhar a mudança, — mudança aliás de tal magnitude que leva o crítico José Antônio Pasta a falar, em vez de forma, em “formatividade”,[9] na tentativa de dar conta das experiências literárias mais representativas em andamento no país, sob o império da indústria cultural. O conceito (plástico?), notável por vários aspectos, busca elucidar, por exemplo, como Cidade de Deus, de Paulo Lins, pode se reformatar ou performatar, sem desdouro nenhum, em nova versão, revista e diminuída… para horror dos jovens conservadores.
Verdade à parte, e a narcomídia ilumina com nitidez de cegar a imagem e a miragem dos novos pobres, infensos a qualquer romantismo ou folclorismo resistente, creio que A hora da estrela ainda nos dá nova lição. O tema de fato do livro não é a pobreza, ou o pobre. O tema, como se sabe, está na relação, complicadíssima, conforme testemunha o narrador, que mantemos com nossa secular miséria, mais precisamente — na reação da literatura, e toda a sua tradição humanizadora (de ensinar como ensina a vida, com sua luz e suas trevas, nas palavras do Crítico),[10] na reação mesma da “alta literatura” em face da mais baixa condição a que se pode sujeitar o homem.
Complicadíssima a relação, porque, afinal, Deus nos livre e guarde, poderíamos ter nascido macabéa…[11] Assim, havemos de conceder que ela está longe, em sua condição humana, desumana, subumana, o que for, dos letrados, e ao mesmo tempo perto, tão perto, como indica exemplarmente o livro, que podemos estudá-la… em nós, como boa criação literária que é, verossímil até o último fio de cabelo do púbis, não?
Não é preciso dizer que somos nós outros, que é a literatura quem a humaniza (até certo ponto, claro, que não somos loucos de a conceber inteiramente à nossa imagem e semelhança), ao reconhecer nela um sinal humano inconfundível, “a única marca veemente de sua existência”, “o sexo miúdo mas inesperadamente coberto de grossos e abundantes pelos negros”.[12] A outra estrela, cuja hora ainda não soou,[13] ali permanecia, a quem soubesse ver e ouvir, não a pedir, desde seu centro famélico, mas a “exigir”… Complemento, precisa? Num só raio passamos do baixo ao alto reconhecimento. Auto? Macabéas todos nós? Nova demagogia? Não. Talvez apenas advertia a escritora que, sendo a carência humana uma questão de grau, o sol não só não brilha para todos, como ainda está longe de brilhar em todo o esplendor mesmo para a minoria feliz.
De certo modo, descontado o provável idealismo nosso, é o que leva Roberto Schwarz a defender incondicionalmente, sem entrar no mérito da qualidade literária, a presença do lirismo em Cidade de Deus.[14] Nesse “lirismo improvável”, capaz de deslocar o pesado discurso de classe da enquete social que está nas origens do romance, esplende de algum modo a humanidade irredutível que nos irmana a todos naquela corrente subterrânea coletiva de que fala o filósofo.[15]
Mesmo o filme, — independentemente da eventual eficácia estética do expediente, o qual busca traduzir a sua maneira a insolência poética do livro, — mesmo ele ambiciona pela introdução de um narrador boa-praça um elo de comunhão com a humanidade dos “bichos-soltos”. Nada como alguém com os pés em dois mundos pra servir de ponte, que quanto mais pênsil, mais humana, como prova o simpático e irrequieto Busca-Pé.
O tema — literário, cumpre repetir, não obnubila a barbárie. Antes a acentua, ao ostentar a literatura como ela é, sem disfarces: documento de cultura e de culpa original. Não houvesse semelhante profissão de fé estética, parece insinuar o livro, a apostar nos vasos comunicantes, por mais intocáveis que sejam quase, estaríamos condenados — se me é lícito atualizar a discussão — a patinhar em mundos cada vez mais díspares, trombar em pilhas e mais pilhas de ilhas, e terminar admitindo o multiculturalismo como expressão máxima do tempo, com cada um falando de sua ilhota, ou se calando, e estamos conversados.
Pode ser, decerto é, que o tempo da “alta literatura” já se tenha passado e há muito mais tempo do que pensamos, e que estas palavras são cunhadas ironicamente in memoriam meam. Atropelado pela história, que a Literatura me seja leve, estertoro em praça pública… Mas, como bom moribundo, não poderia evitar as últimas palavras.
Um grande livro, A hora da estrela, cheio de lições, e a maior lição, que é um livro, um grande livro, a mais simples, um livro, a mais alta, um grande livro, um livro.
Quer dizer então, podem me objetar os grosseirões, que é só isto a literatura? que não passa de livros, meros livros, e livros à margem, o veio mais precioso do patrimônio cultural da Humanidade?
Bem, enquanto tivermos uma esquerda acometida de estupidez parlamentar, ou de onipotência executiva (o estádio superior do parlamentarismo), que no fundo é a memamé (i.e., a mesma merda); enquanto a esquerda (esquerda?!) for incapaz de articular seriamente cultura e política, de não a reduzir meramente a xous de MPB, forró, ou qualquer coisa afim; enquanto não usar descaradamente a produção cultural do homem, como o faz a direita com sua canonização estrumental; enquanto não a instrumentalizarmos contra a barbárie (coisa bem diversa de arte instrumental, que, se é papel do artista autêntico fazer livremente arte, o da esquerda autêntica é necessariamente politizá-la); enquanto a esquerda não socializar toda a literatura universal, de Homero ao mais feérico poeta contemporâneo; enquanto a esquerda não entender que política revolucionária se faz com cultura vivida no dia a dia, regada e arraigada dia a dia, único meio de produzir uma cultura verdadeiramente revolucionária, na tentativa de superar a catástrofe globalizada; enquanto prevalecer, de pluma ou de macacão, a social-medocracia brasileira, — caberá à grande escritora a palavra final.
Por mais poderoso, um livro é um livro (explosão), como aliás uma revista, um artigo… artigos enfim de consumo conspícuo.
*Airton Paschoa é escritor, autor, entre outros livros, de A vida dos pinguins (Nankin, 2014)
Publicado na revista rodapé — crítica de literatura brasileira contemporânea, em 2004, sob o título “A Hora (e as pontas) da Estrela”.
Notas
[1] Ver, de Alfredo Bosi, “Os estudos literários na Era dos Extremos”, rodapé n.º 1, nov./2001. No outro “extremo” despontaria a literatura maneirista, amaneirada, pós-moderna, hipermediada, a literatura literária, numa palavra, fiel depositária de intertextos.
[2] A Hora da Estrela, RJ, Rocco, 1998, p. 47.
[3] Giram em torno de 19, se não me falta a aritmética, as “incontáveis” explosões espalhadas pelo minado livro: p. 24, 28, 42, 43, 58, 60, 61, 62 (pequena), 66 (duas, uma delas pequena), 71, 75, 76, 77 (três), 78 (duas) e 79, — num crescendo, como se ouve, à medida que se aproximava… da morte? da vida? da verdade? da sua hora.
[4] Id., p. 22.
[5] O conto de Rubem Fonseca que tomamos por contraparadigmático, “O cobrador”, integra coleção homônima que saiu mais ou menos pela mesma época, 1979.
[6] Id., p. 61.
[7] Traduzo, espero que sem trair em demasia, a argumentação de Paulo Arantes na Cinemateca Brasileira em meados do ano passado, por ocasião da “Semana Paulo Emílio”. Tal é o desastre do país, o objeto de estudo maior do nosso maior crítico de cinema, que, redivivo, — provoca Paulo Arantes, — o mestre abandonaria decerto o cinema e se dedicaria à crítica de televisão, veículo hoje capaz de dar a medida inteira, a desmedida mesma (hipermimese?) do estado de decomposição nacional.
[8] A respeito do filme, ver ensaio nosso, “A classe média vai ao inferno”, Revista USP n.º 49, mar/abr/mai 2001 [republicado em Estudos de Cinema 2000 — Socine (Sociedade Brasileira de Estudos de Cinema), organizado por Fernão Pessoa Ramos et. al., Porto Alegre, Editora Sulina, 2001].
[9] O debate, “Crítica de intervenção”, foi promovido por três revistas literárias, rodapé, Sebastião e Cacto, e teve lugar em São Paulo no final do ano passado. Mediado por Iumna Maria Simon, contou ainda com a presença de Iná Camargo Costa, Paulo Arantes e Roberto Schwarz.
[10] De Antonio Candido, a lição, explícita e implícita, se encontra por toda parte.
[11] “(…) (Quando penso que eu podia ter nascido ela — e por que não? — estremeço. E parece-me covarde fuga de eu não ser, sinto culpa como disse num dos títulos.)” (A Hora da Estrela, op. cit., p. 38).
[12] “(…) Penso no sexo de Macabéa, miúdo mas inesperadamente coberto de grossos e abundantes pelos negros — seu sexo era a única marca veemente de sua existência.// Ela nada pedia, mas seu sexo exigia, como um nascido girassol num túmulo (…)” (id., op. cit., p. 70).
[13] Ou soou na hora da morte, como prenúncio: “(…) E da cabeça um fio de sangue inesperadamente vermelho e rico. O que queria dizer que apesar de tudo ela pertencia a uma resistente raça anã teimosa que um dia vai talvez reivindicar o direito ao grito” (id., p. 80).
[14] “Cidade de Deus”, Sequências Brasileiras, SP, Cia. das Letras, 1999.
[15] Theodor Adorno, “Lírica e sociedade” (tradução de Rubens Rodrigues Torres Filho, com assessoria de Roberto Schwarz), Benjamin, Adorno, Horkheimer, Habermas (Os Pensadores), SP, Abril Cultural, 1980.