À beira de um precipício

Imagem: Luiz Armando Bagolin
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Por JOSÉ DIRCEU*

Nunca houve um governo criminoso e irresponsável como o atual.

Lá se foi 2020 e nada mudou. Ao contrário tudo se agravou. Os desafios do Brasil e de nosso povo ficaram ainda maiores. Tragicamente, não temos nenhum plano de vacinação e nem como enfrentar o agravamento da pandemia. Nunca houve um governo criminoso e irresponsável como o atual, na realidade um governo militar, autoritário, de extrema direita, obscurantista e fundamentalista. Um governo corrupto começando pela família do presidente e, também, corruptor ao capturar as instituições – como a Polícia Federal, a Receita Federal, o Coaf, o Ministério Público – e colocá-las a serviço da impunidade para benefício do presidente, sua família e grupo de áulicos, dos policiais e militares agora acima da lei.

O governo de Bolsonaro foi ainda além ao estimular o armamento da população e apoiar as milícias, ao contrapor-se ao isolamento social e à vacinação universal pública e gratuita. Enfim, uma terra arrasada onde grassa a violência e a barbárie, que incluem o desprezo pelo meio ambiente, pela cultura e ciência, pela liberdade e democracia. Temos um governo que simplesmente nega o novo mundo que emerge na crise, com alinhamento total aos Estados Unidos de Donald Trump e hostil à China e à União Europeia. Um governo que abandonou o Mercosul e a integração sul americana, nossa natural e necessária aliança geopolítica, solução e saída para o desenvolvimento nacional.

O ano que não acabou deixa uma herança de estagnação e aumento da pobreza, desemprego e desalento, precarização e sucateamento dos serviços públicos. Só austeridade – menos para as Forças Armadas e seus oficiais –, privatização, mercado, especulação. Sem crescimento e com aumento de desemprego, ainda enfrentamos um cenário de juros reais para o consumidor, as famílias e as pequenas e médias empresas, o que, ao lado da estrutura tributária, expropria a renda nacional e reduz o Brasil a um país de subconsumo, de alta concentração de renda, riqueza e propriedade.

Teto de gastos, regra de ouro, corte de salários e gasto (exceção fica por conta das elites militares e do Judiciário) são apresentados como solução para um dos maiores países do mundo que só cresceu historicamente quando rompeu com essa ortodoxia e se lançou aos desafios e sonhos visionários de seus líderes com Getúlio, JK e Lula. Nossa história nos ensina que só com o Estado e o investimento público, com distribuição de renda e um projeto nacional será possível devolver ao país e seu povo autoestima, orgulho, confiança e coesão social.

Vivemos à beira de um precipício. Nossa democracia, Estado Nacional e de Bem Estar estão em risco de um colapso ou ruptura, de serem capturados de novo por uma ditadura depravada e decadente. É hora de dar um basta e encerrar o ano de 2020 derrotando de uma vez por todas , antes que seja tarde, a camarilha que assaltou o poder em Brasília.

Não há mais dúvidas. Bolsonaro e seu bando não podem e não devem continuar governando o Brasil. É preciso impedir a marcha acelerada do governo em direção ao suicídio nacional.

Não podemos esperar por 2022 para derrotar este desgoverno. Nossa tarefa principal, em 2021, é remover Bolsonaro do cargo de presidente, de forma legal e constitucional, e mobilizar o país para a vacinação e para um plano de emergência que evite uma catástrofe social já às nossas portas com o aumento do desemprego, da pobreza, da inflação e fim do auxilio emergencial.

De imediato, devemos barrar todas suas iniciativas no Parlamento e recorrer ao Judiciário para obrigá-lo a vacinar a população e respeitar a Constituição, impedir que continue aparelhando as instituições e que venha a controlar a mesa das duas casas legislativas. Para isso, é necessário unir todos os democratas, progressistas, nacionalistas na luta contra Bolsonaro e constituir, desde já, uma Frente Popular de esquerda para organizar a resistência popular, lutar pela vacinação pública e gratuita, pelo auxílio emergencial, por um plano de investimentos para criar empregos e renda e para disputar as eleições presidenciais em 2022.

*José Dirceu foi ministro da Casa Civil no primeiro governo Lula. Autor, entre outros livros, de Memórias (Geração editorial).

Publicado originalmente no site Poder360.

 

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