Isenção de impostos na exportação de produtos primários

Imagem: Vlad Chețan
image_pdf

Por JOÃO CARLOS LOEBENS*

Os países ricos, durante sua fase de desenvolvimento tributavam a exportação de produtos primários e semielaborados ou industrializados

Parece um dogma de fé ver como a grande imprensa, renomados economistas e pessoas em geral (que se baseiam nessa imprensa) repetem que não deve incidir imposto sobre a exportação de produtos primários, como no caso do minério de ferro. Digo “dogma de fé” por embasamento em crença, e não no uso da razão e argumentação.

Os países hoje considerados desenvolvidos ou ricos, durante sua fase de desenvolvimento (geração de riqueza), tributavam a exportação de produtos primários e semielaborados ou industrializados. Após atingido o estágio de país desenvolvido, por consequência lógica, esses países passam a exportar principalmente produtos industrializados.

A industrialização gera empregos, renda e riqueza. Os produtos industrializados valem muito mais que os produtos primários, e por isso podem ser exportados sem imposto, porque já geraram emprego, renda e riqueza (para empregados e empresários).

Agora vamos pensar na diferença entre a economia dos países já desenvolvidos/ricos e os países ainda subdesenvolvidos/pobres.

Os países desenvolvidos passam a exportar principalmente produtos industrializados e importar produtos primários, que são a matéria prima da industrialização. Fica fácil de visualizar o interesse dos países industrializados: comprar matéria prima barata, visando manter o lucro o mais elevado possível.

Por isso os países industrializados, a imprensa (paga pela propaganda das grandes empresas) e renomados economistas (empregados de grandes empresas dos países ricos) defendem a “unhas e dentes” que não deve haver tributação na exportação de produtos primários, pois trata-se de uma política pública “dos outros” para obter matéria prima barata “para si” (países ricos), aumentando seus lucros. O livro Chutando a escada, do economista sul-coreano Ha-Joon Chang, pode ser uma boa leitura sobre esse tema.

Já os países subdesenvolvidos ou pobres precisam se industrializar, processo que exige investimentos (aplicação de recursos). A exportação de minério de ferro, por exemplo, deveria ser uma fonte de recursos para industrialização do Brasil, lembrando que somos o terceiro maior produtor de ferro do mundo!

Infelizmente, desde 1996, com a Lei Kandir do governo Fernando Henrique, a exportação de ferro deixou de pagar imposto. Com isso, destruímos a indústria siderúrgica, principalmente em Minas Gerais, e hoje exploramos as jazidas de ferro de Carajás no Pará, produzindo buracos, poluição e pobreza.

Recentemente um empresário gaúcho se queixou dos produtos de aço importados da China, solicitando ajuda do governo federal para preservar o mercado nacional. Que pena que não se deram conta antes da “crença” que embasou a Lei Kandir nos anos 1990, favorecendo os países ricos e prejudicando o Brasil.

A reforma tributária aprovada na Câmara de deputados poderia ter sido uma ótima oportunidade de corrigir esse erro tributário e econômico de décadas da Lei Kandir. Infelizmente não foi … e parece que não será nem no Senado. A Vale do Rio Doce, maior empresa exploradora do minério de ferro no Brasil, é uma das “autoras” da Reforma, através do patrocínio do Centro de Cidadania Fiscal (www.ccif.com.br), e provavelmente uma das maiores beneficiadas com a reforma (recebimento de créditos tributários).

Mas quem sabe, a esperança é a última que morre … exportação de minério de ferro deve pagar imposto!

*João Carlos Loebens é doutorando em economia e auditor-fiscal da Receita Estadual do Rio Grande do Sul.


A Terra é Redonda existe graças aos nossos leitores e apoiadores.
Ajude-nos a manter esta ideia.
CONTRIBUA

Veja todos artigos de

MAIS LIDOS NOS ÚLTIMOS 7 DIAS

1
A rede de proteção do banco Master
28 Nov 2025 Por GERSON ALMEIDA: A fraude bilionária do banco Master expõe a rede de proteção nos bastidores do poder: do Banco Central ao Planalto, quem abriu caminho para o colapso?
2
A poesia de Manuel Bandeira
25 Nov 2025 Por ANDRÉ R. FERNANDES: Por trás do poeta da melancolia íntima, um agudo cronista da desigualdade brasileira. A sociologia escondida nos versos simples de Manuel Bandeira
3
O filho de mil homens
26 Nov 2025 Por DANIEL BRAZIL: Considerações sobre o filme de Daniel Rezende, em exibição nos cinemas
4
A arquitetura da dependência
30 Nov 2025 Por JOÃO DOS REIS SILVA JÚNIOR: A "arquitetura da dependência" é uma estrutura total que articula exploração econômica, razão dualista e colonialidade do saber, mostrando como o Estado brasileiro não apenas reproduz, mas administra e legitima essa subordinação histórica em todas as esferas, da economia à universidade
5
A disputa mar e terra pela geopolítica dos dados
01 Dec 2025 Por MARCIO POCHMANN: O novo mapa do poder não está nos continentes ou oceanos, mas nos cabos submarinos e nuvens de dados que redesenham a soberania na sombra
6
Colonização cultural e filosofia brasileira
30 Nov 2025 Por JOHN KARLEY DE SOUSA AQUINO: A filosofia brasileira sofre de uma colonização cultural profunda que a transformou num "departamento francês de ultramar", onde filósofos locais, com complexo de inferioridade, reproduzem ideias europeias como produtos acabados
7
Raduan Nassar, 90 anos
27 Nov 2025 Por SABRINA SEDLMAYER: Muito além de "Lavoura Arcaica": a trajetória de um escritor que fez da ética e da recusa aos pactos fáceis sua maior obra
8
A feitiçaria digital nas próximas eleições
27 Nov 2025 Por EUGÊNIO BUCCI: O maior risco para as eleições de 2026 não está nas alianças políticas tradicionais, mas no poder desregulado das big techs, que, abandonando qualquer pretensão de neutralidade, atuam abertamente como aparelhos de propaganda da extrema-direita global
9
O empreendedorismo e a economia solidária
02 Dec 2025 Por RENATO DAGNINO: Os filhos da classe média tiveram que abandonar seu ambicionado projeto de explorar os integrantes da classe trabalhadora e foram levados a desistir de tentar vender sua própria força de trabalho a empresas que cada vez mais dela prescindem
10
Totalitarismo tecnológico ou digital
27 Nov 2025 Por CLAUDINEI LUIZ CHITOLINA: A servidão voluntária na era digital: como a IA Generativa, a serviço do capital, nos vigia, controla e aliena com nosso próprio consentimento
11
Walter Benjamin, o marxista da nostalgia
21 Nov 2025 Por NICOLÁS GONÇALVES: A nostalgia que o capitalismo vende é anestesia; a que Benjamin propõe é arqueologia militante das ruínas onde dormem os futuros abortados
12
Biopoder e bolha: os dois fluxos inescapáveis da IA
02 Dec 2025 Por PAULO GHIRALDELLI: Se a inteligência artificial é a nova cenoura pendurada na varinha do capital, quem somos nós nessa corrida — o burro, a cenoura, ou apenas o terreno onde ambos pisam?
13
O arquivo György Lukács em Budapeste
27 Nov 2025 Por RÜDIGER DANNEMANN: A luta pela preservação do legado de György Lukács na Hungria de Viktor Orbán, desde o fechamento forçado de seu arquivo pela academia estatal até a recente e esperançosa retomada do apartamento do filósofo pela prefeitura de Budapeste
14
Argentina – a anorexia da oposição
29 Nov 2025 Por EMILIO CAFASSI: Por que nenhum "nós" consegue desafiar Milei? A crise de imaginação política que paralisa a oposição argentina
15
O parto do pós-bolsonarismo
01 Dec 2025 Por JALDES MENESES: Quando a cabeça da hidra cai, seu corpo se reorganiza em formas mais sutis e perigosas. A verdadeira batalha pelo regime político está apenas começando
Veja todos artigos de

PESQUISAR

Pesquisar

TEMAS

NOVAS PUBLICAÇÕES