Por JORGE BRANCO*
A tentativa golpista de Jair Bolsonaro ainda não foi vencida
O fato do ministro Alexandre de Moraes ter levantado o sigilo sobre os depoimentos dos investigados na Operação Tempus Veritatis,[i] sobre a tentativa de golpe de Estado, foi decisivo para jogar mais luzes na compreensão do que estava e do que continua em curso no Brasil. A partir da publicização dos depoimentos e de eventuais testemunhas, passamos ter uma noção mais precisa sobre até onde pretendia ir a cúpula do governo de Jair Bolsonaro.
O conjunto das declarações, inclusive dos comandantes das Forças Armadas de Jair Bolsonaro, demonstram que a tentativa de golpe chegou efetivamente muito perto de se consumar. Ainda será preciso conhecer e compreender outros aspectos que intervieram para que a intentona reacionária, como as relações internacionais e o peso da posição do governo Joe Biden e das Forças Armadas dos EUA, não fosse a cabo. Contudo, não pode mais haver qualquer dúvida sobre a disposição para executar o plano golpista.
A negativa de dois dos três comandantes, apenas o almirante Almir Garnier Santos da Marinha teria consentido com a manobra golpista, efetivamente impediu o desfecho golpista, mas não ilide a pequena distância que separa entre executar ou não o golpe. Grande parte das lideranças militares compartilhou o desejo golpista e esteve engajada na sua preparação. Entre tantos generais envolvidos até o pescoço, o consentimento de Garnier Santos e as ligações diretas do general Estevam Theophilo, ex-chefe do Comando de Operações Terrestres, com Jair Bolsonaro revelam uma realidade complexa e fragmentada dentro das Forças Armadas.
Além da quebra de hierarquia, os encontros de Jair Bolsonaro com o comandante operacional do Exército, que controla efetivamente a mobilização de tropas, demonstram que havia efetiva preparação para o acionamento de efetivos dispostos, tais como a Brigada de Operações Especiais do Exército e o Corpo de Fuzileiros Navais da Marinha, para a conspiração. O que, se posto em prática poderia funcionar como uma espécie de fagulha no processo golpista.
Dentro os erros que se pode cometer, um dos mais nefastos seria menosprezar a disposição golpista nas Forças Armadas. Simplificar a interpretação sobre os fatos e considerar que não passaram de episódios circunscritos a si mesmo e superados, seriam os outros erros mortais.
O projeto de golpe, não parece ainda totalmente sepultado. A extrema direita e o próprio Jair Bolsonaro não deixaram de agir no sentido de buscar construir as condições suficientes para um golpe. Jair Bolsonaro e seus seguidores continuam questionando a Constituição Federal e o sistema institucional. Suas ações e declarações tem o sentido de aglutinar uma base social favorável a qualquer propósito para inviabilizar a democracia no país. A retórica antilulista, anticomunista e a difusão de valores retrógrados vão movimentando uma base social disposta a dar audiência ao que há de mais conservador na cultura política das elites e de parcela da sociedade brasileira.
Igualmente o cenário internacional, de crescimento da extrema direita, vai naturalizando a xenofobia, o racismo, o ódio, a violência e a rejeição à democracia. Da extrema direita europeia à sionista, passando pelo ressurgimento de Donald Trump nos EUA, a retórica antidemocrática e anti-igualitarista alimenta a crença na interrupção da democracia e na deposição de qualquer governo de esquerda.
O bolsonarismo está circulando no país e buscando canais internacionais para dar continuidade ao golpismo de 08 de janeiro, que ainda não foi efetivamente derrotado. Assim como não foi totalmente superado o saudosismo da própria ditadura de 1964, viva na patética figura do general Augusto Heleno, o assistente do general Frota.
*Jorge Branco é doutorando em ciência política na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
[i] https://www.brasildefato.com.br/2024/02/08/operacao-expoe-plano-para-unir-militares-prender-pacheco-e-ministros-do-stf-e-incitar-golpe
https://www.cartacapital.com.br/tag/operacao-tempus-veritatis/
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