Por ALDO PAVIANI*
Deve-se olhar atentamente para a economia com visão de totalidade
O noticiário da mídia em geral vem informando que o Brasil está quase batendo nos 15 milhões de desempregados. O número chegou a 14,761 milhões ou 14,6% da população economicamente ativa (PEA). Com a crise da pandemia, preocupam os quase 600 mil mortos pela covid-19. O desarranjo da economia produtiva e de serviços vem acumulando problemas sociais não apenas no que se refere à ocupação dos trabalhadores, mas atinge também a tudo o que gira em torno do trabalho humano: habitação, consumo alimentar, circulação, consumo de bens duráveis etc.
No caso do consumo de alimentos, a mídia divulga as estratégias de pessoas pobres para fazer frente à erosão salarial e o aumento dos alimentos básicos – feijão e arroz. Nesse aspecto, o futuro das crianças de hoje fica ameaçado porque a alimentação fraca pode levar à má formação dos ossos e do cérebro comprometendo o desempenho escolar e retardando ou cortando a escolaridade e não favorecendo o harmonioso crescimento físico das crianças. Um problema social e de saúde pública digno de preocupação e de tomada de ações saneadoras.
Por isso, se faz necessário urgentemente, incrementar os ganhos dos trabalhadores e o auxílio para a cesta básica dos que perderam o emprego, brancos ou negros, homens ou mulheres trabalhadoras. Assegurar que as famílias tenham acesso às fontes de proteínas e calorias para que as crianças tenham desenvolvimento físico e mental em condições de chegar ao fim do ensino fundamental e possam ir em frente até, se desejarem completar curso superior. Um país que nega essas possibilidades se destina ao atraso humano – seja ele de ordem coletiva ou individual (mas em montantes que passam a prejudicar o avanço da economia e dos próprios cidadãos, individualmente).
Leva-se em conta a alimentação e o desenvolvimento humano, mas deve-se olhar atentamente para a economia com visão de totalidade, como sugeria o grande geógrafo e humanista Milton Santos. Com visão global evita-se futuras ações parciais ou pontuais que possam deteriorar a saúde e o desempenho dos cidadãos. E, nesse aspecto, é bom lembrar que se o trabalhador não se desenvolveu a contento para produzir, ele terá poucas condições de consumir, o que pode levar ao círculo vicioso que se nota hoje no Brasil: o baixo consumo fez reduzir o PIB nacional.
Os apreciadores do PIB devem estar em alerta para as demais ocorrências factíveis, entre elas o abaixamento da competitividade em âmbito internacional. Isso nos tem levado até à importação de alimentos. Lembre-se que o Brasil foi, em certa época, tido como o “celeiro do mundo”. E essa classificação perdeu o sentido? O fato de importarmos alimentos indicam essa informação como verdadeira. Mas, a devastação da floresta Amazônica para o avanço do agronegócio (criação e gado e lavouras extensivas) como aparecem na mídia diária. Mas, é produção voltada para a exportação. Não para alimentar brasileiros famintos.
Assim, brancos e negros – como produtores/consumidores – devem merecer tratamento idêntico desde a infância para que tenha desenvolvimento físico e mental para se tornaremefetivos na formação da sociedadebrasileira. Esta sociedade será o que cada um dos brasileiros for desde o berço. É por isto que não poderemos esperar que o desemprego atinja, discriminadamente, o negro, como já foi no passado. Na pesquisa do Dieese/Codeplan/Setrab, de junho último mostra que o desemprego, em geral, teve uma taxa de 18,7%, enquanto a dos negros havia tingido 21,4%, (em junho declinando para 19,7% (em julho).
Mas, é sobre os jovens, que procuram o primeiro emprego é que as taxas dão um alerta: em junho, a taxa de desemprego dessa classificação era de 24,3%, elevando-se, em julho para 28,6% de desocupados. Quer-se pensar no futuro dos jovens que não produzem porque não têm ganhos para comprar nem o essencial da vida cotidiana, que acaba impactando na retração da produção de bens e serviços.
Indício de que a economia poderia estar se aquecendo, superando os anos de compasso de espera, é a reduçãodonúmero de desempregados no Distrito Federal: em junho de 2020 eram 327 mil desempregados e, em junho de 2021, 308 mil. São números ainda elevados, mas se paulatinamente for se reduzindo, é de se esperar que esse quadro possa ser mais alentador de 2021 para 2022. A aposta mais otimista é de que a economia volte a se aquecer e, em decorrência, os jovens voltem ao mercado de trabalho ou iniciem a jornada de ganhos salariais e de experiência de trabalho. Voltando a ser ativa, a economia agrega novos formatos de trabalho, embora alguns queiram que se suprimam direitos primordiais. Sem direitos básicos, a superação do marasmo atual da economia não se terá o desenvolvimento esperado para a economia do país. É a previsão possível.
*Aldo Paviani, geógrafo, é Professor Emérito da Universidade de Brasília (UnB).