Por NELSON CARDOSO AMARAL*
Um balanço quantitativo do grau de destruição decorrente de diversas ações governamentais
Passados dois anos de governo de Jair Bolsonaro já é possível examinar as despesas realizadas nos anos de 2019 e 2020, além daquelas previstas na proposta orçamentária para 2021. Iremos avaliar neste artigo como se comportaram os recursos associados às seguintes Funções Orçamentárias: Educação, Saúde, Cultura, Gestão Ambiental, Ciência e Tecnologia, Encargos Especiais: Refinanciamento da Dívida. Encargos Especiais: Juros, Encargos e Amortização da Dívida e Defesa Nacional.
Além dessas Funções, serão examinadas também as evoluções das despesas realizadas com as 69 Universidades Federais (UFs), com os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia (IFs), 38 instituições e dois Centros Federais de Educação Tecnológica (CEFETs), com o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), com o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), com a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e com o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT).
A efetivação das análises se dará com a evolução dos recursos financeiros aplicados no período de 2014-2020 e previstos para o ano de 2021. O recuo ao ano de 2014 se justifica pelo fato de ter sido o ano em que se realizaram eleições presidenciais com a reeleição de Dilma Rousseff e a partir deste fato houve a trama que culminou no impeachment de Dilma Rousseff (2016), comandado pelo Deputado Federal Eduardo Cunha, então presidente da Câmara dos Deputados, na assunção de Michel Temer na presidência (2016), a prisão de Luiz Inácio Lula da Silva (2018-2019), chegando a 2018 com a eleição de Jair Bolsonaro para o mandato de 2019 a 2022. Ressalte-se que em todo esse período, de 17/03/2014 a 01/02/2021 esteve em atividade a Operação Lava Jato que, utilizando-se de ações que contrariaram o Estado Democrático e de Direito, participou de todo o processo, desde o impeachment de Dilma Rousseff até a eleição de Bolsonaro.
Com Michel Temer houve um recrudescimento dos ideais liberais e houve a implantação de um Novo Regime Fiscal (NRF) com a aprovação da Emenda Constitucional No 95 (EC-95) que congelou as despesas primárias (pagamento de salários, água, luz, internet, vigilância, limpeza, terceirizados, aquisição de material de consumo, realizar construções, adquirir equipamentos e mobiliários etc.) por vinte anos (BRASIL.EC-95, 2016), o início da discussão da reforma da Previdência, que se concretizou no ano de 2019, implantação de reformas no setor trabalhista, reforma do Ensino Médio, mudanças na Petrobrás etc.
Com Jair Bolsonaro foi estabelecido como objetivo principal do governo o de desconstruir e desfazer o que foi realizado desde a aprovação da Constituição Federal de 1988 (BRASIL.CF, 1988). Este objetivo está expresso no Programa de Governo, “O Caminho da Prosperidade”, divulgado em 1988 quando afirma que “Nos últimos 30 anos o marxismo cultural e suas derivações com o gramcismo se uniu à oligarquias corruptas para minar os valores da Nação e da família brasileira” (PROGRAMA DE GOVERNO BOLSONARO, 2018) e, a partir deste diagnóstico, em Washington no mês março de 2019 quando Bolsonaro afirmou “Nós temos é que desconstruir muita coisa. Desfazer muita coisa para depois começarmos a fazer. Que eu sirva para que, pelo menos, eu possa ser um ponto de inflexão, já estou muito feliz”, concluindo que “O nosso Brasil caminhava para o socialismo, para o comunismo” (LÁZARO, 2019).
A desconstrução e desfazimento que se apresenta nas ações governamentais estão, portanto, fundamentados nessas premissas governamentais (EDITORIAL E&S, 2021).
Este estudo tem, portanto, o objetivo de examinar qual o nível de desconstrução/desfazimento contido em diversas ações governamentais que foram selecionadas. Entre as ações estão incluídas o refinanciamento da dívida, o pagamento de juros, encargos e amortização da dívida e os recursos aplicados em defesa nacional. Sendo essas ações sensíveis ao projeto ultraneoliberal presente no governo de Bolsonaro (LEHER, 2019), cabe aqui uma pergunta: houve a desconstrução/desfazimento para esses dois campos, o das despesas financeiras e o da defesa nacional?
A seguir, iremos, em primeiro lugar analisar os recursos associados às diversas Funções selecionadas para este estudo para, em seguida, apresentar os recursos financeiros aplicados nas instituições e agências: UFs, IFs, CEFETs, FNDE, Capes, CNPq e FNDCT.
Os recursos financeiros aplicados em Funções Orçamentárias selecionadas
As Funções Orçamentárias, num quantitativo de 28 funções, fazem a “agregação das diversas áreas de despesa que competem ao setor público” (BRASIL. PORTARIA No 42, §1º, Art. 1º, 1999), se classificam nas seguintes áreas de despesa: Legislativa, Judiciária, Essenciais à Justiça, Administração, Defesa Nacional, Segurança Pública, Relações Exteriores, Assistência Social, Previdência Social, Saúde, Trabalho, Educação, Cultura, Direitos da Cidadania, Urbanismo, Habitação, Saneamento, Gestão Ambiental, Ciência e Tecnologia, Agricultura, Organização Agrária, Indústria, Comércio e Serviços, Comunicações, Energia, Transporte, Desporto e Lazer, e Encargos Especiais. (BRASIL. PORTARIA No 42, Anexo, 1999).
O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) separa essas funções em duas grandes vertentes, as associadas às áreas classificadas pelo INEP como sociais e às áreas classificadas como não sociais. As classificadas como pertencentes às áreas sociais, num montante de 13 Funções, são as seguintes: Desporto e Lazer, Organização Agrária, Habitação, Urbanismo, Direitos da Cidadania, Trabalho, Educação, Saúde, Cultura, Saneamento, Previdência Social, Segurança Pública, Assistência Social. (BRASIL.INEP, 2021). As demais 15 funções são classificadas como pertencentes aos setores orçamentários que não se relacionam aos setores sociais.
Explicitaremos a seguir a evolução das despesas liquidadas no período 2014-2021, sendo que o valor de 2021 é o provável valor a ser liquidado, considerando-se a relação despesa liquidada/despesa autorizada na Lei Orçamentária Anual (LOA), valor médio de 2014 a 2020. O processo de efetivação de uma despesa pública possui, dentre outras, as etapas de empenho, liquidação e pagamento. A etapa de liquidação – considerada aqui – se efetiva quando o objeto da despesa já se realizou; por exemplo, isto ocorre quando ao adquirir carteiras para as salas de aulas elas já foram entregues e estão disponíveis para serem utilizadas. A próxima etapa é o pagamento à empresa que fabricou e entregou as carteiras.
Os valores apresentados estão em R$, corrigidos para janeiro de 2021, Pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Os valores relativos ao período 2014-2020 foram obtidos da Execução Orçamentária da União (BRASIL.CAMARA DOS DEPUTADOS, 2021) e a proposta de 2021 são as estabelecidas no Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) (BRASIL.CAMARA DOS DEPUTADOS, 2021).
Selecionamos para este estudo a apresentação das evoluções no período 2014-2021 das seguintes Funções: Educação, Saúde, Cultura, Gestão Ambiental, Ciência e Tecnologia, Encargos Especiais: Refinanciamento da Dívida, Encargos Especiais: Juros, Encargos e Amortização da Dívida, e Defesa Nacional.
A Função Educação
O comportamento dos recursos financeiros associados à Função Educação no período 2014-2021 pode ser examinado no gráfico 1.
Gráfico 1 – FUNÇÃO EDUCAÇÃO: os recursos financeiros no período 2014-2021.
Nota-se uma queda persistente no período em análise, saindo do patamar de R$ 130,0 bilhões para o valor entre R$ 90,0 bilhões e R$ 100,0 bilhões, sendo que a variação de 2014 a 2020 – o maior valor e o menor valor da série – foi de R$ (-37,7) bilhões. Esta queda significa uma redução de 28,5% nos recursos da Função Educação.
A Função Saúde
Os recursos associados á Função Saúde estão mostrados no gráfico 2.
Gráfico 2 – FUNÇÃO SAÚDE: os recursos financeiros no período 2014-2021.
Neste caso os valores saíram de um valor um pouco maior que R$ 130,0 bilhões em 2014 para o patamar de R$ 120,0 bilhões entre 2015 e 2019 e uma previsão para 2021 de pouco mais de R$ 100,0 bilhões. O ano de 2020 se comportou de forma atípica pela liberação de recursos especiais para o atendimento à Pandemia causada pelo coronavírus (SARS-CoV-2), que resultou na Covid-19. A queda dos valores de 2014 para 2021 são da monta de R$ (-28,7) bilhões, o que representa uma queda de 21,6% em 2021, em relação a 2014.
A Função Cultura
A Função Cultura teve a evolução de seus recursos financeiros como mostrado no gráfico 3.
Gráfico 3 – FUNÇÃO CULTURA: os recursos financeiros no período 2014-2021.
Houve, portanto, nesta Função uma queda drástica de 2014 a 2020, saindo de valores um pouco superiores a R$ 2,5 bilhões para valores muito pequenos, da ordem de R$ 200 milhões; uma redução de R$ (-2,3) bilhões nesse período. Esta redução significou uma queda de 90,2% nos valores de 2020 em relação a 2014. Há uma recuperação na proposta orçamentária para 2020, para R$ 703,0 milhões, valor ainda muito distante daquele de 2014.
A Função Gestão Ambiental
A Função Gestão Ambiental sofrerá, de 2014 a 2021, uma redução de R$ (-7,1) bilhões, como mostrado no gráfico 4.
Gráfico 4 – FUNÇÃO GESTÃO AMBIENTAL: os recursos financeiros no período 2014-2021.
Os valores sofreram uma abrupta queda de 2014 para 2015, saindo de valores próximos de R$ 10,0 bilhões para R$ 4,0 bilhões. Houve de 2016 a 2020 uma oscilação em torno de R$ 4,0 bilhões, caindo novamente de forma abrupta para R$ 1,0 bilhão em 2021. Em relação ao valor de 2014 houve uma redução de 74,2% no período em análise.
A Função Ciência e Tecnologia
A análise dos recursos associados à Função Ciência e Tecnologia mostra um perfil de dramática redução. O gráfico 5 apresenta os valores para o período em análise.
Gráfico 5 – FUNÇÃO CIÊNCIA E TECNOLOGIA: os recursos financeiros no período 2014-2021.
Foram aplicados valores em torno de R$ 12,0 bilhões em 2014 e, em 2021, a previsão é de que sejam aplicados R$ 5,0 bilhões; uma queda de R$ (-6,7) bilhões. Isto representa uma redução de 57,1% nos recursos financeiros aplicados nesta Função.
Até aqui analisamos Funções vinculadas a setores que estavam em franco ataque desde o início da trama para o impeachment e, depois, explicitamente, pelos governos que tomaram posse pós-impeachment de Dilma Rousseff, iniciando-se com Michel Temer e se caracterizando, como já examinamos, em um projeto de desconstruir e desfazer a partir de 2019, com Jair Bolsonaro. O exame visual dos gráficos apresentados para as Funções Educação, Saúde, Cultura, Gestão Ambiental e Ciência e Tecnologia não deixam a menor dúvida sobre o cumprimento desta ordem emitida pelos grupos (LEHER, 2019) que assumiram o poder em âmbito federal a partir de janeiro de 2019.
Examinando-se, entretanto, o que ocorreu com as ações associadas ao Refinanciamento da Dívida, ao pagamento de Juros, Encargos e Amortização da Dívida e à Função Defesa Nacional, o comportamento dos recursos orçamentários no período 2014-2021 se altera completamente. Os gráficos 6 e 7 mostram como se comportaram o Refinanciamento da Dívida e o pagamento de Juros, Encargos e Amortização.
Gráfico 6 – FUNÇÃO ENCARGOS ESPECIAIS: REFINANCIAMENTO DA DÍVIDA: os recursos financeiros no período 2014-2021.
Gráfico 7 – FUNÇÃO ENCARGOS ESPECIAIS: JUROS, ENCARGOS E AMORTIZAÇÃO DA DÍVIDA: os recursos financeiros no período 2014-2021.
Em 2014 o refinanciamento da dívida foi da ordem de R$ 800,0 bilhões caindo para R$ 500,0 bilhões em 2019 e grande crescimento em 2020 e 2021, quando há a previsão de atingir valores superiores a R$ 1,1 trilhão.
O pagamento de juros, encargos e amortização da dívida teve um perfil crescente de 2014, de R$ 400,0 bilhões, para mais de R$ 650,0 bilhões em 2020 e há uma previsão de queda em 2021, para o patamar de R$ 500,0 bilhões.
Uma análise acoplada desses dois gráficos nos leva a concluir que a queda na necessidade de refinanciamento, de 2014 a 2019 se deu por um maior pagamento de juros, encargos e amortização da dívida nesse mesmo período. A elevação do refinanciamento da dívida se deve a dois fatores principais: endividamento devido aos elevados recursos vinculados à Pandemia; e o aumento da dívida pública para o pagamento de parte das despesas primárias do governo federal pela quebra da chamada Regra de Ouro, que ocorre quando o governo tem que emitir títulos além dos valores associados às despesas classificadas como investimento. Neste caso o Congresso Nacional é responsável por autorizar a emissão de títulos da dívida para o pagamento das despesas primárias do governo federal.
A comparação dos perfis desses dois gráficos com os anteriores – sempre com drásticas quedas – sinaliza que o setor financeiro é uma prioridade nesse período. Isto reflete o conteúdo da EC-95 que congelou por vinte anos as despesas primárias e não estabeleceu nenhum limite para as despesas vinculadas a esse setor.
A Função Defesa Nacional teve seus valores financeiros, de 2014 a 2021 com o perfil mostrado no gráfico 8.
Gráfico 8 – FUNÇÃO DEFESA NACIONAL: os recursos financeiros no período 2014-2021.
De 2015 a 2019 houve um aumento de R$ 37,6 bilhões nos recursos associados á Função Defesa Nacional, ocorrendo uma queda em 2020 e 2021. Esta redução ainda significará uma elevação de R$ 25 bilhões em relação ao valor de 2015. Também neste caso, da Defesa Nacional, percebe-se um perfil completamente oposto ao das funções discutidas anteriormente, o que nos leva a afirmar que a Defesa Nacional foi considerada prioritária, frente à Educação, Saúde, Cultura, Gestão Ambiental e Ciência e Tecnologia.
Este resultado deixa bem explicitada uma condição estabelecida na EC-95 que é a de que esta EC congelou as despesas primárias do Poder Executivo e não de cada um dos setores que compõem esse poder. É, portanto, uma deliberação do governo federal quando elabora as propostas de leis orçamentárias e do Congresso Nacional quando as aprova, estabelecer os setores prioritários. E, nesse período, além das despesas financeiras, foi colocada nesta condição prioritária a Defesa Nacional.
Os recursos financeiros aplicados nas Universidades Federais
As Universidades Federais (UFs) constituem, em 2021, um conjunto de 69 instituições que possuem campi em todos os estados da federação e no Distrito Federal.
Analisaremos a evolução dos recursos das UFs – sem considerar os recursos aplicados nos Hospitais Universitários – em três vertentes: o pagamento de Pessoal, professores e técnico-administrativos, o que inclui o pagamento de aposentados e pensionistas; o pagamento de despesas relacionadas à manutenção das instituições nas chamadas Outras Despesas Correntes: o pagamento de água, luz, internet, vigilância, limpeza, terceirizados, aquisição de material de consumo etc; e as despesas com construções, aquisição de equipamentos e mobiliários etc., os chamados recursos de Investimentos.
O pagamento de Pessoal se elevou de valores entre R$ 39,0 bilhões e R$ 40,0 bilhões em 2014 para valores da ordem de R$ 49,0 bilhões em 2019, caindo em 2020 e 2021 num montante de R$ (-874,0) milhões em relação a 2019. O gráfico 9 mostra esses valores.
Gráfico 9 – Evolução dos recursos financeiros associados ao pagamento de Pessoal das Universidades Federais, no período 2014-2021.
Os recursos financeiros para o pagamento de Pessoal docente e técnico-administrativo apresenta um perfil de crescimento de 2014 a 2019 e de queda em 2020 e 2021. O crescimento se deve a reajustes aprovados antes do Governo Temer, às progressões na carreira, às substituições de aposentados que continuam na folha de pagamento etc. As quedas indicadas já explicitam a corrosão salarial pela inflação.
Os valores aplicados em Outras Despesas Correntes estão mostrados no gráfico 10.
Gráfico 10 – Evolução dos recursos financeiros associados ao pagamento de Outras Despesas Correntes das Universidades Federais, no período 2014-2021.
Nota-se uma drástica redução dos recursos para o pagamento de água, luz, internet, vigilância, limpeza, terceirizados, aquisição de material de consumo etc. das instituições, saindo de R$ 9,0 bilhões e caindo para valores em torno de R$ 5,5 bilhões em 2021; uma redução muita alta, de R$ (-3,5) bilhões, o que significa uma queda de 38,9%. Esta redução compromete, de forma irremediável, o funcionamento geral das instituições no ano de 2021. A Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (ANDIFES), em 18/03/2021 promoveu uma coletiva à imprensa para expor a situação orçamentária das Universidades e alertar a sociedade brasileira sobre a gravidade da situação e a possibilidade da paralização das atividades institucionais no final do primeiro semestre (ANDIFES, 2021).
O gráfico 11 mostra a evolução dos recursos para Investimentos.
Gráfico 11 – Evolução dos recursos financeiros associados aos Investimentos nas Universidades Federais, no período 2014-2021.
Os valores em 2021, da ordem de R$ 100 milhões são insignificantes frente ao tamanho do sistema e as suas necessidades de aquisição e atualização de equipamentos para os seus laboratórios. De 2014 a 2021 presencia-se uma drástica queda nesses recursos, saindo de R$ 2,8 bilhões e atingindo R$ 100 milhões, uma queda de 96,4%. Este resultado, se não revertido rapidamente levará as Universidades Federais a uma degenerescência de suas instalações e um grande sucateamento de seus laboratórios de pesquisa.
Os recursos financeiros aplicados nos Institutos Federais e Centros Federais de Educação Tecnológica
O Brasil possui, atuando em todos os estados e no Distrito Federal um total de 38 Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia (IFs) e dois Centros Federais de Educação Tecnológica (CEFETs), o do Rio de Janeiro e o de Minas Gerais.
Da mesma forma que na análise dos recursos financeiros das Universidades Federais, apresentaremos os recursos aplicados nos IFs e nos CEFETs, separando-os em Pessoal, Outras Despesas Correntes e Investimentos. Os recursos aplicados no pagamento de Pessoal estão mostrados no gráfico 12.
Gráfico 12 – Evolução dos recursos financeiros associados ao pagamento de Pessoal dos Institutos Federais e Centros Federais de Educação Tecnológica, no período 2014-2021.
Há uma elevação de 2014 até 2020 e no ano de 2021 haverá uma queda da ordem de R$ (-187,0) milhões. Foram valores em torno de R$ 9,0 bilhões em 2014 e entre R$ 14,0 bilhões e R$ 15,0 bilhões em 2020. Assim como nas UFs, esta queda em 2021 já expressa uma corrosão salarial pela inflação.
Os valores financeiros para o pagamento de Outras Despesas Correntes sofreram fortes quedas como se pode analisar no gráfico 13.
Gráfico 13 – Evolução dos recursos financeiros associados ao pagamento de Outras Despesas Correntes dos Institutos Federais e Centros Federais de Educação Tecnológica, no período 2014-2021.
Os valores eram superiores a R$ 3,0 bilhões em 2014 e se aproximaram de R$ 2,0 bilhões em 2020 e 2021; uma redução de um terço dos recursos para a manutenção dos IFs e CEFETs, o que, da mesma forma que nas UFs, compromete a continuidade das suas atividades no ano de 2021.
O gráfico 14 apresenta a evolução dos recursos para Investimentos nessas instituições.
Gráfico 14 – Evolução dos recursos financeiros associados aos Investimentos nos Institutos Federais e Centros Federais de Educação Tecnológica, no período 2014-2021.
Há, portanto, uma drástica redução dos recursos para Investimentos, o que significa praticamente uma redução a “zero” no ano de 2021. A redução no período foi de 98,6%. Isto deixará marcas “irrecuperáveis” nos ambientes de laboratórios e infraestrutura das instituições, nas suas salas de aulas e laboratórios.
Os recursos financeiros do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação
O Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) é um organismo do MEC que desenvolve programas e ações relacionadas à Educação Básica em apoio aos Estados, Distrito Federal e Municípios. Os recursos financeiros totais do FNDE estão mostrados no gráfico 15.
Gráfico 15 – Evolução dos recursos financeiros totais aplicados pelo FNDE no período 2014-2021.
Os recursos aplicados pelo FNDE sofreram uma redução de R$ (-20) bilhões de 2014 a 2020, o que comprometeu diversas ações que estavam implementadas em 2014, dentre elas, a Complementação da União ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB), a Concessão de Bolsas de apoio à Educação Básica, o Apoio ao Desenvolvimento da Educação Básica, o Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE), o Apoio ao Transporte Escolar, o Programa de apoio à Alimentação Escolar (PNAE), a Produção, Aquisição e Distribuição de Livros e Materiais Didáticos e Pedagógicos (Programa do LIVRO DIDÁTICO), o Apoio ao Transporte Escolar para a Educação Básica – Caminho da Escola etc.
Os recursos aplicados na Capes, no CNPq e no FNDCT
A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), é um organismo do MEC que atua na pós-graduação, avaliando os programas, ofertando bolsas, financiamento eventos e pesquisas etc.
O Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) é vinculado ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e financia bolsas para a pós-graduação, pesquisas científicas etc.
O Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) “é um fundo de natureza contábil que tem como objetivo financiar a inovação e o desenvolvimento científico e tecnológico, com vistas a promover o desenvolvimento econômico e social do País” (FINEP, 2021). O FNDCT é vinculado à Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP), empresa pública do MCTI.
A evolução dos recursos totais da Capes está mostrada no gráfico 16.
Gráfico 16 – Evolução dos recursos financeiros totais da Capes no período 2014-2021.
Os recursos financeiros da Capes sofreram uma forte queda de 2015 a 2021, de 65,3%, o que significou R$ (-7,2) bilhões de redução.
Os recursos do CNPq sofreram uma redução de 69,4%, de 2014 a 2021, passando de R$ 3,0 bilhões para um valor de R$ 918,1 milhões. O gráfico 17 apresenta a evolução desta redução.
Gráfico 17 – Evolução dos recursos financeiros totais do CNPq no período 2014-2021.
O FNDCT também teve uma forte redução de em seus recursos, passando de quase R$ 4,0 bilhões em 2014 para um valor menor do que R$ 500,0 milhões em 2021, uma redução de 90,6%, como mostrado no gráfico 18.
Gráfico 18 – Evolução dos recursos financeiros totais do FNDCT no período 2014-2021.
Os gráficos 16, 17 e 18 expressam em detalhes, o cenário de distribuição do sistema de ciência e tecnologia. Há, portanto, o comprometimento do pagamento de bolsas de mestrado e doutorado, promoção de eventos acadêmicos, financiamento de pesquisas etc.
Considerações finais
Os 18 gráficos que ilustram as análises deste estudo não deixam dúvidas de que está ocorrendo no Brasil um processo de destruição de setores sensíveis ao futuro de uma Nação.
O “turbilhão” de propostas de emendas à Constituição de 1988 e o “sufocamento” financeiro imposto às áreas de educação, saúde, cultura, gestão ambiental e ciência e tecnologia, como explicitado nos números aqui apresentados, mostram o “sucesso macabro” do Programa de Governo apresentado pelo então candidato Bolsonaro e a “ordem” emitida desde Washington em março de 2019 para “desconstruir e desfazer”.
A continuidade desta política de destruição levará inevitavelmente à “falência” das Universidades Federais, dos Institutos Federais, dos Centros Federais de Educação Tecnológica, dos agentes financiadores da Educação Básica (FNDE) e da Ciência e Tecnologia (Capes, CNPq e FNDCT). É preciso que a sociedade brasileira emita, com urgência, um “grito desesperado” de chega de tanta desconstrução e desfazimento!
*Nelson Cardoso Amaral, mestre em física e doutor em educação, é professor da Universidade Federal de Goiás (UFG).
Referências
ANDIFES. Coletiva de Imprensa Remota: corte de mais de 18% do orçamento das Universidades Federais. Disponível em: youtube.com/watch?v=Ep0-BBmxVWc.
BRASIL.CAMARA DOS DEPUTADOS. Execução Orçamentária da União. Disponível em: https://www2.camara.leg.br/orcamento-da-uniao/leis-orcamentarias/loa.
BRASIL.CF. Constituição Federal de 1988. Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. BRASIL.EC-95. Emenda Constitucional No 95, de 15 de dezembro de 2016. Altera o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, para instituir o Novo Regime Fiscal, e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/emc/emc95.htm.
BRASIL.INEP. Estimativa do Investimento Público Total em Educação em Relação Gastos Público Social (GPS), por Nível de Ensino – Brasil 2000-2017, Nota 4. Disponível em: http://inep.gov.br/indicadores-financeiros-educacionais.
BRASIL.PORTARIA No 42, de 14 de abril de 1999. Atualiza a discriminação da despesa por funções de que tratam o inciso I do § 1o do art. 2o e § 2o do art. 8o, ambos da Lei no 4.320, de 17 de março de 1964, estabelece os conceitos de função, subfunção, programa, projeto, atividade, operações especiais, e dá outras providências. Disponível em: http://www.orcamentofederal.gov.br/orcamentos-anuais/orcamento-1999/Portaria_Ministerial_42_de_140499.pdf/.
EDITORIAL E&S. O Fundeb permanente em tempos de desconstrução e desfazimento: mobilização e um basta veemente. Educação & Sociedade, Campinas, v.42, 2021. Disponível em: https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-73302021000100100&lng=en&nrm=iso&tlng=pt. https://doi.org/10.1590/es.247741.
FINEP. O FNDCT. Disponível em: finep.gov.br/a-finep-externo/fndct. LÁZARO, N. Temos que desconstruir muita coisa, diz Bolsonaro sobre o Brasil, 18/03/2019. Disponível em: <metropolis.com/mundo/politica-int/temos-que-desconstruir-muita-coisa-diz-bolsonaro-sobre-brasil).>
LEHER, R. Apontamentos para análise da correlação de forças na educação brasileira: em prol da frente democrática. Educação & Sociedade, Campinas, v. 40, 2019. https://doi.org/10.1590/ES0101-73302019219831.
PROGRAMA DE GOVERNO BOLSONARO. O Caminho da Prosperidade – 2018. Disponível em: https://veja.abril.com.br/wp-content/uploads/2018/10/plano-de-governo-jair-bolsonaro.pdf.