Roger Waters no Brasil

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Por LUIS FELIPE MIGUEL*

O cantor é o alvo preferencial do lobby sionista

Depois de mais de meio século de uma carreira de enorme sucesso, dá para considerar que as posições políticas de Roger Waters são bem conhecidas. Ele é um ativo antifascista, o que está bem registrado tanto no período do grupo Pink Floyd quanto em sua obra solo.

Pois agora o vice-presidente da Confederação Israelita do Brasil, Ary Bergher, quer impedi-lo de se apresentar no Brasil, por ser “nazista”.

Ary Bergher é um notório bolsonarista. Ficou conhecido por agredir uma senhora de 88 anos que falou contra o então candidato, em 2018, num festival de dança no Clube Hebraica: “Sua ladra, filha da puta, vou te matar”.

A repercussão do caso fez Ary Bergher renunciar à presidência da Federação Israelita do Rio de Janeiro. Como faria depois seu “mito”, pôs a culpa em “possíveis efeitos colaterais adversos de medicamentos que passei a usar recentemente”. Acredita quem quiser.

O que incomoda em Roger Waters é o antifascismo, o antirracismo. O cantor sempre se manifestou em favor de causas igualitárias. Foi ativo na luta contra o apartheid sul-africano. Denunciou Jair Bolsonaro em sua última turnê brasileira. E hoje, coerente com esse antifascismo e antirracismo, está engajado na campanha BDS – por “boicote, desinvestimento e sanções” contra o Estado de Israel, até que seja interrompida a ação genocida contra o povo palestino.

Por isso, é alvo preferencial do lobby sionista.

A denúncia absurda de apologia ao nazismo faz parte deste assédio. Foi inventada na Alemanha.

No meio do show ele usa um uniforme que remete ao nazismo? Sim. É uma referência a The Wall: o álbum, o filme (dirigido por Alan Parker), a ópera-rock. Há ali tanto a memória da Segunda Guerra Mundial quanto uma inspirada crítica à sociedade capitalista, na qual o paralelo com o nazismo cumpre papel importante.

Mal comparando, é como se um ator fosse acusado de apologia ao nazismo por se caracterizar de Hitler numa peça ou filme de teor antinazista.

A denúncia, no entanto, tem sido ecoada pela imprensa mundial e também brasileira, que abre espaço para declarações e artigos de sionistas-bolsonaristas pretensamente indignados.

Mas é pura fake news.

Chegaram a inventar que Flávio Dino anunciara que ia prender Roger Waters. O ministro negou, disse que o caso ainda não chegou até ele e explicou o óbvio: crime é usar insígnias “para fins de divulgação do nazismo”.

Lançar acusações de anti-semitismo contra os críticos é a arma de Israel para interditar o debate sobre suas políticas expansionistas e genocidas. Na imprensa, na Universidade, em todos os espaços, os sionistas abusam deste estratagema.

A solidariedade ao povo palestino, porém, se impõe como dever moral para qualquer pessoa preocupada com os direitos humanos. Roger Waters merece nosso aplauso.

*Luis Felipe Miguel é professor do Instituto de Ciência Política da UnB. Autor, entre outros livros, de Democracia na periferia capitalista: impasses do Brasil (Autêntica).

Publicado originalmente na página do Facebook do autor.


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