Por BENICIO VIERO SCHMIDT*
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A vitória de Joe Biden na eleição presidencial dos Estados Unidos pauta a discussão no Brasil e em todo o mundo. Suas primeiras providências se concentram no enfrentamento do coronavírus. Biden convidou um conjunto de cientistas – inclusive a médica brasileira Luciana Borio – para traçarem juntos uma estratégia de combate à pandemia, ainda durante o governo Trump. Além disso, está sinalizado que as políticas ambientais passarão por uma acentuada inflexão. A “economia verde” já em ascensão nos EUA deve adquirir maior potencialidade com a nova presidência. Biden é amplamente favorável às energias limpas e contrário aos interesses dos grandes oligopólios do petróleo. Em breve poderemos observar os efeitos dessa nova política ambiental e seus impactos sobre o Brasil e a América Latina.
Do ponto de vista econômico, tudo indica que Biden não irá revogar todas as medidas de Trump. Ele também propõe uma espécie de “protecionismo afável”, que procura fazer dos Estados Unidos, novamente, o centro da inovação e da produção dos bens que o século XXI consome e produz. Ainda não se sabe como o governo democrata irá tratar as políticas protecionistas vigentes, estabelecidas sem nenhuma contrapartida para países como o Brasil. Na última etapa do governo Trump as taxas sobre os laminados oriundos do Brasil aumentaram em mais de 100%. Se adotou também medidas referentes à produção local de álcool etanol –em prejuízo das exportações brasileiras – visando favorecer os agricultores do meio oeste americano, eleitores de Trump. Vamos conferir se essa situação será modificada, se será instalada uma outra lógica.
As eleições municipais no Brasil estão na reta final. O destaque, além da rejeição a Bolsonaro nos grandes centros, é a utilização pelo ex-capitão da rede de comunicação da Presidência da República para dar apoio aos seus candidatos preferidos, a começar pelo seu filho, candidato a vereador no Rio de Janeiro. Lamentável. Não é por acaso que juristas estão chamando a atenção para a inconstitucionalidade dessas ações.
O meio-ambiente no Brasil continua em pauta. O assunto do momento é a proposta do Conselho da Amazônia, presidido pelo general Mourão, de controle das ONGs (Organizações Não-Governamentais) presentes na Amazônia. É óbvio que isso é inconstitucional. As ONGs não precisam de autorização governamental por definição, isso vai contra os seus princípios. Além disso, em sua maioria, essas ONGs são de natureza religiosa e tem recebido, aliás, apoios de grande monta do governo para atuar na Amazônia. Mais uma querela para agitar o ambiente, o meio-ambiente, digamos assim.
As medidas econômicas que o governo pretende adotar em relação à ajuda emergencial, ao prosseguimento da economia de guerra contra o coronavírus, continuam em compasso de espera. Ainda não se resolveu a indecisão acerca da manutenção ou não da lei que estipula um teto aos gastos governamentais. Isso depende de quem irá assumir o controle da Câmara e do Senado e das próprias eleições. Enquanto isso, o dólar vai caindo e a bolsa subindo, numa clara alusão ao distensionamento que a eleição de Biden cria nos Estados Unidos e no subcontinente.
Por último, é interessante notar a movimentação no sentido de tentar reorganizar o campo da centro-direita no Brasil com o trio Mouro, Huck e Dória. Sem dúvida se arrogam no direito de representar aquelas parcelas que, provindas do bolsonarismo, estão descontentes com o atual chefe da nação. Vejamos. É assunto para as próximas semanas.
*Benicio Viero Schmidt é professor aposentado de sociologia na UnB. Autor, entre outros livros, de O Estado e a política urbana no Brasil (LP&M).