O comunismo está chegando?

Imagem: Phil
Whatsapp
Facebook
Twitter
Instagram
Telegram

Por LUIS FELIPE MIGUEL*

Segundo o Datafolha, metade dos brasileiros teme a chegada do comunismo. Mas, afinal, o que se entende por comunismo? O que essa metade entende por capitalismo e as implicações que ele tem em sua vida?

Metade dos brasileiros teme que o país vire comunista, diz o Instituto de pesquisas Datafolha.

Pesquisas de opinião precisam ser analisadas com precaução. Como Pierre Bourdieu demonstrou há meio século, elas tratam como convicções o que são meras respostas a perguntas que, na verdade, as pessoas nem fazem a si mesmas.

Ainda assim, é preciso perguntar: que cazzo seria o comunismo, para que metade dos nossos compatriotas achem que ele está para chegar?

Um sentido de “comunismo” remete a sociedades em que tudo é comum a todos. Em que não há “meu” e “teu”. Como em tantos povos não europeus, para os quais a primeira tarefa do colonizador foi ensinar o sentido de “propriedade privada”.

O Brasil de hoje está neste caminho? Difícil de acreditar.

Outro sentido de comunismo se refere à sociedade imaginada por Karl Marx. Nela, não existiria Estado, repressão ou desigualdade. A necessidade estaria abolida e todos seriam integralmente livres. A harmonia entre indivíduo e comunidade ocorreria naturalmente.

Estamos chegando lá? Não parece.

É mais razoável imaginar que, por “comunismo”, as pessoas indicam o tipo de governo autoritário que imperou na antiga União Soviética e que hoje permanece em países como China, Coreia do Norte e Cuba. Alguém realmente acredita que há, no Brasil, alguma força política relevante que planeja implantar esse modelo?

Há um quarto sentido de “comunismo”. É tudo o que não é a extrema direita delirante. Quem difundiu essa acepção foi o (hoje calado) Olavo de Carvalho, que dizia que o governo FHC estava comunizando o Brasil. Então “comunista” é a Rede Globo, o Gilmar Mendes, o Joe Biden, o Emmanuel Macron. Até Sérgio Moro teve sua fase comunista, no curto período de tempo em que ficou de mal com Jair Bolsonaro e tentou se fazer de “terceira via”.

Seria bacana se, em vez de alimentar o medo irracional de um bicho-papão criado pela desinformação da direita, o eleitor brasileiro fosse capaz de discutir o que realmente quer para o seu país. Se entendesse o que é o capitalismo e quais as implicações que ele tem em sua vida, o que é e o que pode ser o socialismo, como uma democracia efetiva deveria funcionar.

Para chegarmos lá, só tem um caminho: educação política. Cabe à esquerda promovê-la – porque, para a direita, a alienação e a desinformação são vantagens.

*Luis Felipe Miguel é professor do Instituto de Ciência Política da UnB. Autor, entre outros livros, de Democracia na periferia capitalista: impasses do Brasil (Autêntica).

Publicado originalmente nas redes sociais do autor.


A Terra é Redonda existe graças aos nossos leitores e apoiadores.
Ajude-nos a manter esta ideia.
CONTRIBUA

Veja neste link todos artigos de

AUTORES

TEMAS

10 MAIS LIDOS NOS ÚLTIMOS 7 DIAS

Lista aleatória de 160 entre mais de 1.900 autores.
Luiz Roberto Alves João Feres Júnior Alexandre de Lima Castro Tranjan Flávio R. Kothe Leonardo Avritzer Francisco Pereira de Farias Tadeu Valadares Érico Andrade Eugênio Bucci José Geraldo Couto Luis Felipe Miguel Gilberto Maringoni Daniel Costa Benicio Viero Schmidt Bruno Fabricio Alcebino da Silva Rodrigo de Faria Juarez Guimarães Tales Ab'Sáber Milton Pinheiro Berenice Bento Paulo Nogueira Batista Jr Marcos Aurélio da Silva Boaventura de Sousa Santos Luiz Marques Eliziário Andrade Yuri Martins-Fontes José Dirceu Igor Felippe Santos Sergio Amadeu da Silveira Eleonora Albano Francisco Fernandes Ladeira Bruno Machado João Paulo Ayub Fonseca Alysson Leandro Mascaro Marcelo Módolo André Singer Walnice Nogueira Galvão Gerson Almeida Lincoln Secco Celso Favaretto Leonardo Boff Marcos Silva Maria Rita Kehl Tarso Genro Plínio de Arruda Sampaio Jr. José Costa Júnior Luiz Werneck Vianna Denilson Cordeiro João Adolfo Hansen Vinício Carrilho Martinez Ronald León Núñez Vladimir Safatle Mariarosaria Fabris Sandra Bitencourt Rafael R. Ioris Kátia Gerab Baggio Manuel Domingos Neto Fernando Nogueira da Costa Slavoj Žižek Alexandre de Oliveira Torres Carrasco Henry Burnett Fábio Konder Comparato Remy José Fontana Marilia Pacheco Fiorillo Valerio Arcary Paulo Martins Marcelo Guimarães Lima Bento Prado Jr. Dennis Oliveira Eugênio Trivinho Heraldo Campos Lucas Fiaschetti Estevez Airton Paschoa Valerio Arcary João Lanari Bo Anselm Jappe Luís Fernando Vitagliano João Sette Whitaker Ferreira Salem Nasser Gabriel Cohn Ricardo Antunes Lorenzo Vitral Thomas Piketty Eleutério F. S. Prado Chico Alencar Dênis de Moraes José Machado Moita Neto Leda Maria Paulani Paulo Capel Narvai Henri Acselrad André Márcio Neves Soares Ricardo Musse Marilena Chauí Carlos Tautz Andrew Korybko Ricardo Fabbrini Michael Roberts Jorge Branco Bernardo Ricupero Elias Jabbour Mário Maestri Julian Rodrigues Luiz Renato Martins João Carlos Loebens Antônio Sales Rios Neto Gilberto Lopes Ari Marcelo Solon Armando Boito Rubens Pinto Lyra Luiz Bernardo Pericás Otaviano Helene Antonino Infranca Daniel Brazil José Luís Fiori Manchetômetro Eduardo Borges Vanderlei Tenório Samuel Kilsztajn Antonio Martins Alexandre Aragão de Albuquerque Afrânio Catani João Carlos Salles Ricardo Abramovay Jean Marc Von Der Weid Alexandre de Freitas Barbosa Luiz Eduardo Soares Fernão Pessoa Ramos Daniel Afonso da Silva Everaldo de Oliveira Andrade Marcus Ianoni Ronaldo Tadeu de Souza Matheus Silveira de Souza Renato Dagnino José Raimundo Trindade José Micaelson Lacerda Morais Paulo Sérgio Pinheiro Leonardo Sacramento Paulo Fernandes Silveira Luciano Nascimento Annateresa Fabris Francisco de Oliveira Barros Júnior Flávio Aguiar Claudio Katz Luiz Carlos Bresser-Pereira Atilio A. Boron Michel Goulart da Silva Jorge Luiz Souto Maior Ladislau Dowbor Jean Pierre Chauvin Caio Bugiato Michael Löwy Osvaldo Coggiola Andrés del Río Ronald Rocha Celso Frederico Chico Whitaker Liszt Vieira Marjorie C. Marona Carla Teixeira Priscila Figueiredo

NOVAS PUBLICAÇÕES