Vozes contra o genocídio

Imagem: Leon Ferrari
Whatsapp
Facebook
Twitter
Instagram
Telegram
image_pdfimage_print

Por MUNIR NASER e MARKUS SOKOL*

Do rio Jordão ao mar Mediterrâneo – um único Estado democrático

Há dois meses é o horror em Gaza. Israel rompeu a “pausa” de sete dias, mas com honrosas exceções, a maioria dos editorialistas repete a narrativa sionista que justifica o bombardeio de civis. Há mais de 15 mil mortos, 6 mil crianças. Para nós, que aqui assinamos, de origem palestina, um, e de origem judaica, o outro, as crianças estraçalhadas na Faixa de Gaza são iguais às crianças estraçalhadas no gueto de Varsóvia.

A resistência palestina está de pé. Sucedem-se atos pelo cessar-fogo, dos judeus de Nova York aos muçulmanos de Kerala (Índia), com várias crenças e sem crença. Milhões nas capitais do mundo.

Há manifestos de intelectuais e artistas, entidades médicas e de direitos humanos. No último dia 29, 50 atos expressaram a solidariedade ao povo palestino no Brasil. No dia 30, os sindicatos de portuários europeus fizeram ações de protesto, o porto de Marselha parou por uma hora. E dia 1º de dezembro nos EUA, o poderoso sindicato UAW pediu o cessar-fogo.

Agencias da ONU já se posicionaram, mas como instituição a ONU nada fez de prático. Não obstante, ela define o genocídio como “a intenção de destruir, no todo ou em parte, um grupo nacional, étnico, racial ou religioso enquanto tal”. É o que repete Benjamin Netanyahu, armado por Joe Biden, inclusive na limpeza étnica na Cisjordânia.

Nós, que assinamos, perguntamos: como é possível o bombardeio de civis por dois meses? Para nós, isso é uma expressão, há outras – fome e miséria, desemprego, meio ambiente – de uma ordem internacional esgotada, que ameaça arrastar a humanidade para o caos das guerras, o abismo.

Rosa Luxemburgo, revolucionária de ascendência judaica assassinada na Alemanha em 1919, formulou o agudo dilema “socialismo ou barbárie”. Nada mais atual. Se a revolução está atrasada, traços da barbárie protuberam.

É um extermínio bárbaro, o que estamos vendo em Gaza. Ele vem de longe. A partilha da Palestina histórica começou em 1917. Lorde Balfour, ministro de Sua Majestade britânica, o ocupante militar, enviou uma carta ao banqueiro Rothschild prometendo-lhe um “lar nacional judaico”, bandeira do então minoritário sionismo.

A partilha final, na ONU em 1947, foi bancada por Harry Truman, dos EUA, e Joseph Stalin, da antiga URSS, interessados no enclave sionista para manipular os árabes e suas riquezas petrolíferas. Mas a maioria dos milhões de judeus traumatizados que saíram do leste da Europa no pós-guerra, não foram para Israel, foram para EUA, Canadá, Austrália, Europa Ocidental e América Latina.

Israel não respeitou as fronteiras da fundação, nem os “acordos de paz”. É um Estado em guerra permanente – com as detestáveis mortes de civis em todos os lados – para ampliar fronteiras “seguras”, frente à inaceitável expropriação e expulsão de 750 mil palestinos na Nakba. O Estado-apartheid de Israel nega aos palestinos o direito ao retorno, e aos do interior, os direitos civis.

Hoje, está claro que faliu a solução dos “dois Estados” – Israel e a chamada Autoridade Nacional Palestina.

Não é razoável que o governo do presidente Lula mantenha relações “normais” com um Estado-apartheid genocida. É hora de escalar o bloqueio dos contratos militares, de convênios culturais e de relações comerciais, até a ruptura das relações diplomáticas.

Nós, que aqui assinamos, começamos jovens a combater o sionismo em diferentes situações, todavia, juntos propomos esta reflexão à opinião pública. É preciso garantir direitos iguais aos dois povos que conviveram e, por trabalhoso que seja, podem voltar a conviver fraternalmente, sem racismo nem opressão, na forma soberana que decidam.

Nós nos associamos às todas as vozes contra o genocídio, em particular, ao One Democratic State Campaing, de palestinos e judeus como Haidar Eid, professor de literatura em Gaza, e Ilan Pappé, historiador israelense. Estamos juntos por ajuda humanitária, fim da colonização, liberdade para os palestinos, por um único estado democrático.

*Munir Naser é membro da Juventude Sanaúd.

*Markus Sokol é membro do Diretório Nacional do PT.

Publicado originalmente no jornal Folha de São Paulo.


A Terra é Redonda existe graças aos nossos leitores e apoiadores.
Ajude-nos a manter esta ideia.
CONTRIBUA

Veja todos artigos de

10 MAIS LIDOS NOS ÚLTIMOS 7 DIAS

O anti-humanismo contemporâneo
Por MARCEL ALENTEJO DA BOA MORTE & LÁZARO VASCONCELOS OLIVEIRA: A escravidão moderna é basilar para a formação da identidade do sujeito na alteridade do escravizado
Desnacionalização do ensino superior privado
Por FERNANDO NOGUEIRA DA COSTA: Quando a educação deixa de ser um direito para se tornar commodity financeira, 80% dos universitários brasileiros ficam reféns de decisões tomadas em Wall Street, não em salas de aula
Discurso filosófico da acumulação primitiva
Por NATÁLIA T. RODRIGUES: Comentário sobre o livro de Pedro Rocha de Oliveira
Cientistas que escreveram ficção
Por URARIANO MOTA: Cientistas-escritores esquecidos (Freud, Galileu, Primo Levi) e escritores-cientistas (Proust, Tolstói), num manifesto contra a separação artificial entre razão e sensibilidade
O sentido na história
Por KARL LÖWITH: Prefácio e trecho da Introdução do livro recém-editado
Carta aberta aos judeus e judias no Brasil
Por PETER PÁL PELBART: “Não em nosso nome”. O chamado urgente aos judeus e judias brasileiras contra o genocídio em Gaza
Guerra nuclear?
Por RUBEN BAUER NAVEIRA: Putin declarou os EUA "patrocinadores de terrorismo", e agora duas superpotências nucleares dançam na beira do abismo enquanto Trump ainda se vê como pacificador
Oposição frontal ao governo Lula é ultra-esquerdismo
Por VALERIO ARCARY: A oposição frontal ao governo Lula, neste momento, não é vanguarda — é miopia. Enquanto o PSol oscila abaixo dos 5% e o bolsonarismo mantém 30% do país, a esquerda anticapitalista não pode se dar ao luxo de ser 'a mais radical da sala'
Gaza - o intolerável
Por GEORGES DIDI-HUBERMAN: Quando Didi-Huberman afirma que a situação de Gaza constitui "o insulto supremo que o atual governo do Estado judaico inflige àquilo que deveria continuar sendo seu próprio fundamento", expõe a contradição central do sionismo contemporâneo
Poemas experimentais
Por MÁRCIO ALESSANDRO DE OLIVEIRA: Prefácio do autor
Escrevendo com a inteligência mundial
Por TALES AB’SÁBER: A morte do fragmento: como o Copilot da Microsoft reduziu minha crítica ao fascismo a clichês democráticos
Veja todos artigos de

PESQUISAR

Pesquisar

TEMAS

NOVAS PUBLICAÇÕES